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Ângelo Atalla
Publicação: Out-2005
Outra limitação é que a faixa de normalidade é ampla e, a partir de valores no limite superior,
pode haver queda e não se caracterizar anemia. Além disto, como o limite inferior é definido a
partir de dois desvios-padrões abaixo da média, 2,5% da população abaixo dos limites
definidos serão arbitrariamente caracterizados como anêmicos.
As hemácias são células anucleadas, de forma discóide e de natureza flexível para passar
facilmente pela microcirculação. Têm como função transportar o oxigênio, o que é feito por
meio de sua ligação com a hemoglobina. A integridade de sua membrana é mantida pela
produção intracelular de ATP. Elas têm vida média de 120 dias, o que significa que 0,8% a 1%
das hemácias circulantes devem ser repostas diariamente. Essa tarefa é eficazmente cumprida
pela medula óssea, que ainda pode aumentar sua produção em 2 a 3 vezes agudamente e 6 a
8 vezes, cronicamente.
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Professor Adjunto da Disciplina de Hematologia da Faculdade de Medicina da UFJF.
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para a linhagem eritropoiética não parece ser regulada por fatores externos, sendo um
processo intrínseco a ela. Na medula, o primeiro precursor eritróide reconhecido
morfologicamente é o proeritroblasto. A partir dele, toda a eritropoese é influenciada por fatores
de crescimento e hormônios, com destaque para a eritropoetina.
A eritropoetina é uma glicoproteína produzida e liberada pelos capilares peritubulares dos rins
e, em níveis muito menores, nos hepatócitos. O estímulo para a secreção desse hormônio é a
redução do oxigênio que chega aos rins, o que pode acontecer na anemia, na hipoxemia ou,
mais raramente, na redução da perfusão renal (estenose da artéria renal). Quando cai o nível
de hemoglobina, aumenta-se a secreção da eritropoetina, estimulando a proliferação das
células precursoras medulares eritróides, aumentando a produção de hemácias. Essa resposta
também é observada na vigência de hipoxemia, nesse caso levando a policitemia. Mas para
que o todo o processo se dê, é necessária, além da função renal normal, integridade da
medula óssea e suprimento adequado dos substratos necessários para a síntese da
hemoglobina, sobretudo o ferro.
Normalmente, os eritrócitos liberados pela medula ainda contêm RNA residual, sendo
denominados reticulócitos. A taxa normal de reticulócitos é de até 0,5-1,5%, sendo sua
determinação importante para caracterizar a taxa de liberação pela medula e expressar a
eficácia da eritropoese.
Após 120 dias de vida, as hemácias são fagocitadas pelo sistema retículo-endotelial. A
hemoglobina é processada e os aminoácidos e o ferro são reutilizados. O anel de protoporfirina
do grupo heme é catabolizado em bilirrubina indireta, conjugada no fígado e excretada na bile.
Assim, há um mecanismo dinâmico de produção e destruição de hemácias, cujo equilíbrio
mantém os níveis normais.
Nos quadros agudos não há tempo para compensações. A redução do intravascular leva a
hipotensão postural, queda do débito cardíaco, desvio do sangue da pele para outros órgãos,
dispnéia e choque.
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10 - Quais são os sintomas das anemias?
Nas formas leves e de instalação crônica o paciente pode ser assintomático, pela eficácia dos
mecanismos compensatórios. Com a progressão do quadro surgem:
• cefaléia,
• vertigens e zumbidos,
• palpitações,
• diminuição da libido,
• alteração do humor,
• incapacidade de concentração,
• anorexia,
Os principais são:
• taquicardia leve,
• ictus forte,
• edema discreto.
O quadro clínico é diferente nas anemias agudas, pois não há tempo para os mecanismos de
compensação. Nestes casos o quadro clínico refere-se à hipóxia tecidual e à hipovolemia. Há
hipotensão postural e taquicardia e, nos casos mais graves choque, dispnéia, sudorese,
palidez e confusão mental, que pode evoluir para rebaixamento de consciência ou mesmo
coma.
História clínica detalhada é a base da investigação das anemias. O início da anemia, a duração
dos sintomas, hábitos alimentares, alteração de hábitos intestinais, história familiar, social,
medicamentosa e ocupacional podem trazer dados que levarão ao diagnóstico etiológico da
anemia. A história ginecológica também é importante, sendo relevantes dados como
laqueadura tubária, mais de sete dias de fluxo menstrual mensal, coágulos a partir do segundo
dia e/ou uso de mais de 12 absorventes por ciclo, abortos ou gestações com curto intervalo de
tempo.
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14 - Existem sinais ou sintomas específicos que podem auxiliar no diagnóstico
etiológico das anemias?
Ela deve incluir hemograma com medida dos índices eritrocitários, sobretudo o volume
corpuscular médio (VCM) e o índice de anisocitose (RDW), contagem de plaquetas e de
reticulócitos, além do esfregaço de sangue periférico.
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18 - O que é o volume corpuscular médio (VCM)?
Avalia a média do tamanho (volume) das hemácias, expresso em fentolitros (fl). Calculado pela
seguinte fórmula:
Por ser medido eletronicamente, seus resultados não são sensíveis a pequenas populações de
micrócitos ou macrócitos, podem sofrer alterações por distorções de forma e aglutinação
eritrocitária. Por isso, é fundamental a análise do esfregaço de sangue periférico na
investigação das anemias.
Reflete o conteúdo médio de hemoglobina por hemácia. Como é expressa em picogramas (pg),
reflete a massa de hemoglobina. Calculada pela fórmula:
Índice que analisa a heterogeneidade do volume das hemácias. A análise dessa variação
permite a obtenção deste índice, que representa a amplitude de distribuição dos glóbulos
vermelhos. Serve como um índice de anisocitose, que se altera precocemente na deficiência de
ferro, mesmo antes da alteração de outros parâmetros, como o VCM e a diminuição da
hemoglobina. Seu valor normal situa-se entre 11,5 a 14,5%.
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23 - Quais as alterações mais freqüentemente reveladas na hematoscopia?
Anemias normocíticas são aquelas que têm VCM entre 80-100 fl. Elas podem estar
relacionadas a uma doença subjacente obrigando o clínico a desenvolver extensa pesquisa na
busca etiológica.
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28 - Como investigar as anemias normocíticas hiperproliferativas?
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30 - Como proceder a investigação das anemias microcíticas?
A maioria das anemias microcíticas (VCM inferior a 80 fl) é devido a deficiência de ferro ou
distúrbios de sua utilização. Elas podem cursar com reticulócitos elevados, diminuídos ou
normais, o que novamente fará de sua contagem o passo inicial da investigação etiológica
(figura 4).
• Ferritina sérica: reflete o estoque tecidual de ferro. Por ser proteína de fase rápida,
pode estar elevada em condições de inflamação aguda ou crônica. Valores normais
são diferentes para sexo e dependem do método utilizado.
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32 - Com a classificação funcional e a cinética de ferro, como investigar as anemias
microcíticas hipoproliferativas?
Em vigência de macrocitose (VGM acima de 100 fl) e na ausência do uso de drogas que
cursam com macrocitose associada (hidroxiuréia e zidovudine), a pesquisa deve ser dirigida
principalmente para as deficiências de folato e de vitamina B12 (figura 7).
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35 - O que é anemia aplástica?
Na anemia aplástica ocorre lesão da célula tronco medular, dando origem a pancitopenia. A
etiologia pode ser por radioterapia, quimioterapia, solventes (benzeno, tolueno) ou drogas
(cloranfenicol, sulfa, fenitoína carbamazepina, sais de ouro). Casos idiopáticos são descritos e
provavelmente têm natureza auto-imune. Além do quadro clínico da anemia, o paciente pode
apresentar infecções e sangramentos, sobretudo de pele e mucosas. O laboratório revela
pancitopenia com VCM normal. A biópsia de medula evidencia acentuada hipocelularidade com
poucos focos de hematopoiese.
Formas leves podem receber apenas suporte clínico e hemoterápico. Imunossupressão com
ciclofosfamida, corticóides, ciclosporina e globulina antitimócito pode ser tentada. Pacientes
jovens (menos de 50 anos) e com formas graves (menos de 500 neutrófilos, menos de 20.000
plaquetas, menos de 1% de reticulócitos e medula com celularidade inferior a 20%) têm
indicação de transplante de medula óssea.
Diferentes doenças crônicas cursam com anemia por falência na produção medular, cada uma
com seu quadro clínico específico. Os mecanismos aventados são diminuição da eritropoetina,
seqüestro de ferro pelos macrófagos, efeito inibidor de citocinas inflamatórias (IL-1). São
habitualmente anemias leves e com esfregaço pouco alterado (discreta anisocitose, pouca
microcitose). Embora 70% dos casos apresentem-se como normocítica, em 30% elas são
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microcíticas, mas geralmente com discreta microcitose (VCM entre 70-80, enquanto VCM
inferior a 70 sugere deficiência de ferro ou talassemia).
Não. Elas têm mecanismos fisiopatológicos diversos. Na insuficiência renal crônica, o principal
fator responsável pela anemia é a deficiência de eritropoetina. Outros fatores contribuintes
incluem: deficiência de ferro (ferritina < 60 sugere esse dado), de folato, toxicidade pelo
alumínio (microcítica), fibrose de medula óssea, anemia hemolítica microangiopática (por
hipertensão grave, glomerulonefrite, púrpura trombocitopênica trombótica, hemolítico-urêmica).
A deficiência de ferro é a causa mais comum de anemia em todo o mundo. O clínico deve ter
em mente que a anemia ferropriva é sempre uma manifestação de uma doença subjacente e
que todos os esforços devem ser dirigidos à descoberta etiológica e seu tratamento. A
negligência deste fato e reposição de ferro aleatoriamente poderá propiciar a evolução de uma
doença grave, como neoplasia de cólon.
Quando o diagnóstico não é alcançado, deve-se fazer mielograma para avaliação histoquímica
da reserva de ferro nos macrófagos. Eventualmente, havendo motivos clínicos para se
suspeitar da deficiência de ferro, pode-se tratar como tal por três a quatro semanas e repetir o
hematócrito.
Alguns exames laboratoriais também podem auxiliar na distinção entre a anemia ferropriva e as
talassemias (tabela 4).
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Tabela 4. Diferenciação laboratorial entre anemia ferropriva e a associada a doença
crônica
Anemia Ferropriva Talassemia
Ferro Sérico Diminuído Elevado ou normal
Ferritina Diminuída Elevado ou normal
RDW Elevada Normal
Saturação de Transferrina Diminuída Normal ou elevada
Com a reposição de sulfato ferroso oral, antes das refeições (325 mg duas vezes ao dia). Deve
ser mantido por três a seis meses depois da normalização do hematócrito, para restaurar os
estoques. A adição de vitamina C não parece influenciar em melhor absorção. A reposição
parenteral pode ser a opção em pacientes que não toleram a reposição oral, não aderem a ela
ou tenham doença gastrintestinal que impeça a absorção.
São doenças hereditárias com redução da síntese das cadeias de globina (alfa ou beta):
• alfa – deleção do gene responsável pela síntese da cadeia alfa. Ocorre em negros e
asiáticos.
Anemia grave (Htc menor que 10%), que surge após seis meses de vida. Praticamente não há
HbA, com predomínio da HbF e variável quantidade de HbA2 (0 a 10%). Pela redução de
cadeia beta, as cadeias alfa em excesso se precipitam e lesam a membrana das hemácias,
levando a grave hemólise com icterícia e hepatoesplenomegalia. Transfusões repetidas
acabam determinando hemossiderose com endocrinopatias, falência cardíaca e hepática.
Os quadros leves não precisam de tratamento. Suplementação de folato está indicada nas
fases de crescimento, vigência de infecções ou gravidez. Nas formas graves há necessidade
de transfusão e reposição de folato. A deferrioxamina, quelante de ferro, deve ser usada para
evitar hemossiderose. Esses pacientes não devem receber reposição de ferro, daí a
fundamental importância de diferenciá-la da ferropriva.
São distúrbios na síntese de DNA pelos precursores dos eritrócitos por deficiência de folato ou
vitamina B12.
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48 - Quais são as principais causas de deficiência de vitamina B12?
o Gastrectomia total.
As anemias megaloblásticas cursam, além dos sintomas habituais de anemia, com alterações
na língua (glossite atrófica). Pode haver anorexia, perda de peso e febre. Na deficiência de
vitamina B12 é comum o surgimento de sintomas neurológicos (neuropatia, com parestesias
em mãos e pés; alterações do equilíbrio, alterações mentais, com confusão e demência).
A anemia megaloblástica pode ser de intensidade variável, mas sempre com VCM elevado,
entre 100-140 fl. O esfregaço com macro-ovalócitos e neutrófilos hipersegmentados é
importante para o diagnóstico. O VCM eleva-se precocemente, às vezes antes da queda do
hematócrito. A eritropoese ineficaz, com destruição de precursores de eritrócitos pode levar a
falsa anemia hemolítica, com elevação de bilirrubinas indireta e LDH, mas os reticulócitos não
se elevam. Quando a medula óssea é avaliada ela se mostra com hiperplasia eritróide e
alterações megaloblástica nas três séries mielóides.
Deficiência de B12
Vitamina B12 1000 mcg intramuscular: diariamente, por duas semanas, depois semanal até
normalização do hematócrito e depois mensalmente, pelo resto da vida na anemia perniciosa
ou enquanto persistir a causa nas outras etiologias.
Deficiência de folato
Ácido fólico 1 mg/dia por via oral por quatro a oito semanas ou enquanto persistir a causa.
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53 - Leitura recomendada
Adamson JW, Longo DL. Anemia and polycythemia. In. Fauci AS, Braunwald E, Isselbacher KJ
et al. Harrison’s Principles of Internal Medicine. The Mc-Graw-Hill, 2001.
a
Bickley LS, Hoekelman RA. Propedêutica Médica. 7 Edição. Guanabara Koagan, 1999.
Greer, John P.; Foerster, John; Lukens, John N.; Rodgers, George M.; Paraskevas, Frixos;
Glader, Bertil Wintrobe's Clinical Hematology . Publisher: Lippincott Williams & Wilkins. 11th
Edition, 2003.
Schrier S. Approach to the adult patient with anemia. In: Up To Date, Rose BD (Ed), Up To
Date, 2005.
st
Tierney Jr LM, McPhee SJ, Papadakis MA. Current Medical. Diagnosis & Treatment. 41
Edition. Lange Medical Books. New York, 2002.
Toh BH, van Driel IR, Gleeson PA. Pernicious anemia. N Engl J Med 1997;337:1441-1448.
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