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Cinética da esterilização
Douglas Augusto Guilherme*
As empresas utilizam processos de esterilização em seu expostos a um agente letal, não morrem todos ao mesmo
ia a dia, mas nem sempre entendem a cinética do pro
d tempo. Na verdade, o número de organismos vivos reduz
cesso que executam. Alguns conceitos como o modo que exponencialmente com o tempo (Fig. 1).
o microorganismo morre quando submetido a um efeito Embora a ausência de todos os organismos vivos poder
esterilizante, a esterilização mais como uma probabilida ser assegurada somente após exposição infinita, esterili
de que um fato absoluto, o uso das informações para dade deve ser encarada como um conceito de probabili
entender o efeito do potencial mortífero de condições dade. Por exemplo, a probabilidade de existir um organis
esterilizantes, o efeito das mudanças nas condições do mo sobrevivente em uma carga. Para a esterilização, a
efeito mortífero ou como as informações podem ser usa probabilidade de menos de um em um milhão é conside
das para determinar total letalidade de um processo este rada aceitável. Este é o comumente chamado “Nível de
rilizante e como este conhecimento pode nos assegurar esterilidade assegurada” (NEA) maior que 10-6.
quantitativamente a esterilidade são conceitos que O desenho de um processo de esterilização que atingirá
podem ser aplicados para todos os tipos de processos de uma probabilidade definida de ocorrência de sobreviven
esterilização tanto físicos como químicos. tes depende de:
Para ilustrar conceitos, a esterilização a vapor será utili - Conhecimento da população microbiana inicial (bio
zada como referência. burden)
- Cinética da mortalidade microbiana (resistência / sus
cetibilidade)
Cinética da morte microbiana
FI = 10VRL VRL = t/D rida para reduzir o valor-D dos organismos em 90% ou
Novamente, usando esterilização a vapor como exem ara produzir um decréscimo de um ciclo logarítmico no
p
plo, para calcular o declínio da população de Bacillus traço de resistência termal.
stearothermophilus submetido à 121ºC por 15 minutos: Para esterilização por calor, as unidades de valor-Z são
D = 1,5 graus de temperatura. O valor-Z pode ser estimado grafi
T = 15 camente ou matematicamente usando a equação:
FI = 1015/1,5 = 1010 Z = T2 - T1
VRL = 15/1,5 = 10 log D1 - log D2
Então, as condições esterilizantes podem ser esperadas
para reduzir a população em 10 logs. onde D1 e D2 são valores-D a temperaturas T1 e T2 res
Portanto, se a população original era de 103, a probabi pectivamente.
lidade de uma unidade não estéril é de:10 log da população
inicial – VRL = 10 3 -10 = 10-7, portanto NEA = 10-7.
A precisão com a qual os valores-Z podem ser estima
Tais cálculos são cabíveis se for sabido que somente um dos depende da precisão de que cada valor-D pode ser
tipo de bactéria está presente no material a ser esterilizado, experimentalmente determinado. Em particular, se os
mas este quase nunca é o caso. Populações misturadas dados a diferentes temperaturas forem para condições de
estarão presentes com diferentes resistências ao efeito este teste diferentes eles não podem ser combinados para
rilizante. Nestes casos a utilização de pior caso é necessária. produzir um significável valor-Z.
Daí assumir-se que Bacillus stearothermophilus é o conta O conhecimento do valor-Z nos permite comparar o efei
minante do processo de esterilização a vapor. to mortífero de um conjunto de condições de esterilização
com outro conjunto de condições, e permite também, cal
Efeitos de mudanças nas condições de cular o efeito mortífero total de um ciclo de esterilização.
esterilização
A resistência microbiana à morte, como exemplificada Comparação de condições esterilizantes
pelo valor-D, é específica para um conjunto dado de con
dições, se as condições mudam, o valor-D mudará. Imagine se desejássemos saber a efetividade relativa de duas
Por exemplo, se a temperatura de esterilização é aumen condições esterilizantes: 121ºC / 15 min e 131ºC / 6 min.
tada, o organismo morrerá mais rapidamente e o valor-D Se assumíssemos que o organismo é o Bacillus stearo
diminui. Se a temperatura diminui, o valor-D aumenta. thermophilus nós sabemos que D121 = 1,5 e D131 = 0,15.
Esta mudança na taxa de inativação microbiana com a Então, se aumentássemos a temperatura 10ºC, reduzi
mudança da temperatura é o coeficiente temperatura ríamos o valor-D ao fator de 10.
para processo letais. Se o logaritmo do valor-D for grafi Então para 121ºC/15 min: VRL = t/D = 15/1,5 = 10 e para
cado contra temperatura, há um resultado de relação 131ºC/ 6 min: VRL = t/D= 6/0,15 = 40. As condições de
linear (Fig. 3). A figura é chamada de Curva de resistência temperatura mais alta são mais efetivas no fator de 1030!
termal. Um conjunto de condições equivalentes a 121ºC / 15
A recíproca negativa da curva nesta linha é o valor-Z. min seria 131ºC / 1,5 min.
O valor-Z representa o aumento de temperatura reque
Cálculo da letalidade total de um ciclo de
esterilização
O conhecimento do valor-D pode permitir o cálculo de
efeito mortífero sob condições conhecidas. No entanto, a
maioria dos ciclos de esterilização leva tempo para atingir
um estado regular e tempo para retornar para condições
seguras. Por exemplo, durante esterilização por calor há
um período de aquecimento e resfriamento.
Segue-se, então, que pelo menos uma porção do perío
do de aquecimento e resfriamento contribuirão para a
letalidade total (efeito mortífero) do ciclo.
Fig 3. Curva de resistência termal típica Conhecimento destas contribuições podem ser válidas
por várias razões como:
• permitir-nos determinar a total letalidade do ciclo e
então determinar a garantia de esterilidade; Para ciclo de esterilização a vapor com Fo de 8 para:
• Bacillus stearothermophilus
• baseado no desenho dos ciclos (somente na contribuição
do período de estabilidade) poderia levar a ciclos extre RL = t/D = 8/1,5 = 5,3 portanto para um desafio de 10
V
mamente longos que poderia diminuir a estabilidade do organismos por unidade,
produto. NEA = 101 – 5,3 = 10-4,3 (menos que 10-6). Assim, o desafio
por unidade deve ser menor que 10-2 para atingir NEA
Munido destes conhecimentos de D e Z, podemos deter
maior que 10-6
minar o total efeito mortífero por integração de todas as fases
MAS qualquer desafio não será Bacillus stearothermo
do ciclo de esterilização e converter o ciclo total a um ciclo
philus pois este nunca é encontrado em produtos.
equivalente sob um estado regular de condições “referência”.
Podemos derivar o valor-F para o ciclo. “F” é definido • Clostridium sporogenes
como o tempo equivalente da condição regular com seu RL = t/D = 8/0,8 = 10 para desafio de 10 organismos por
V
efeito letal. unidade
Usando esterilização a vapor por exemplo, podemos NEA = 101 – 10 = 10-9
representar o ciclo como sendo equivalente a uma suces • Staphylococci
são de períodos de 1 minuto a diferentes temperaturas.
Convertendo cada minuto de exposição a um tempo RL = t/D = 8/0,3 = 23 para desafio de 10 organismos
V
equivalente do estado regular, podemos representar o por unidade
ciclo total em termos de minutos do estado regular. Por NEA = 101 – 23 = 10-22
exemplo, 21 min à 121ºC para Bacillus stearothermophi Podemos ver que para contaminantes normais, mesmo
lus, D121 = 1,5 min. Portanto, a letalidade total (VRL) = c iclos curtos podem atingir Níveis de Esterilidade Asse
21/1,5 = 14; então, para o desafio de população inicial de gurada altamente satisfatórias. ◆
10 organismos por unidade: NEA = 101-14 = 10-13
Então, o ciclo dá-nos uma garantia muito alta de esteri
lidade baseado no desafio de pior caso com organismo
altamente resistente.
Suponha, entretanto, que o produto seja termo-sensível
e que estas condições reduzem a estabilidade do produ
to. Seria possível reduzir a total letalidade do ciclo abaixo
de VRL = 8 (Fo = 12) e ainda atingir NEA de 10-7.
Por vários métodos de esterilização, os valores-F foram
determinados baseados em condições de referência padrão.
Por exemplo:
• Esterilização a vapor Fo tempo equivalente em minutos
a 121ºC
• Esterilização por calor seco Fh tempo equivalente em
minutos a 170ºC