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Rio de Janeiro
Junho de 2006.
ALLAN MARTINS TERRA
Rio de Janeiro
Junho de 2006.
i
ALLAN MARTINS TERRA
REPRESENTAÇÕES DO NEGRO BRASILEIRO NOS TEMPOS DA
RETOMADA
grau
___________________________________
BANCA EXAMINADORA
___________________________________
___________________________________
___________________________________
Rio de Janeiro
Junho de 2006.
ii
Dedicatória
Sonia (mãe), Samantha (irmã) e Panda
(bebê). Obrigado pela paciência.
iii
Agradecimentos
Ao meu orientador e mestre Flávio Di Cola, uma das pessoas mais importantes ao longo
desses meses de trabalho. Sua confiança, dedicação e amizade estarão sempre em minha
memória.
Para as professoras Irene Black e Sandra Almada (minha inspiração para este projeto),
que enriqueceram minha banca e minha vida acadêmica.
Aos amigos da Estácio (especialmente para Raquel, Renata, Rafael e Carlos Henrique) e
da vida (Simone, Sebastião e André), pela trajetória já percorrida e pelos futuros passos.
Aos meus familiares (em especial para mãe, irmã, tio Zé e Eduardo), pelo apoio nas
horas certas.
iv
“Negro ou branco, ator é ator. Não tem que estar ali escrito:
‘negro de 30 anos’. Não, basta estar: ‘forte, bonito, bem-
apessoado, 33 anos’, e você pode dizer: esse sou eu. Mas é
raro o diretor que lê isso e diz para um ator negro: ‘Tem aqui
um personagem para você’. Que é o que nós queremos”.
Antônio Pitanga
v
Resumo
vi
Lista de anexos
vii
Sumário
Introdução ............................................................................................................p. 09
Anexos ...................................................................................................................p. 68
viii
9
INTRODUÇÃO
população por produções que abordam a realidade brasileira, fizeram com que os meios
“retomada brasileira” todas essas mudanças culturais, ocorridas a partir dos anos 90.
negra brasileira. No final da década de 80, por exemplo, as telenovelas com a temática
libertação, perpetuando uma relação de gratidão dos subordinados aos seus senhores.
hoje são reconhecidos pela sociedade e os seus desusos conferem uma representação
relação entre brancos e negros do século XVI ao XIX (com anexos de fotos e figuras da
Que Copiava e Meu Tio Matou Um Cara – com os filmes disponíveis em anexo no
formato DVD).
representação do negro na sociedade brasileira, até porque ainda existe muito a se fazer.
Mas como, diante de um cenário tão controlador vivido nos séculos da escravidão, todos
esses elementos resistiram e o negro conquistou o seu lugar dentro de uma sociedade tão
diversificada? Nas próximas páginas, o leitor encontrará o começo dessa história – que
brasileira.
não só uma terra rica em belezas naturais. O potencial de exploração comercial era
imenso. Mas seria preciso ocupar o território com mão-de-obra a fim de explorar as
Aos navegantes que ficaram, mais tesouros: a beleza das índias. A população de
mestiços mamelucos cresceu rapidamente, porém ainda não existiam pessoas suficientes
os nativos tinham pouca imunidade. A solução encontrada foi buscar escravos na África
chegaram ao Brasil.
concubinas, filhos, amigos, afilhados e escravos, entre outros) obedeciam e viviam sob
subordinação entre ele e suas mulheres (brancas, índias, mulatas ou negras), resultando
no alto grau de mestiçagem da época. Além disso, era preciso aumentar a população
“Casa Grande & Senzala”, defendeu que a relação entre os senhores e suas escravas
patriarcas. Nesta teoria, negros e mulatos dependeriam apenas de sua própria força de
dentro de um sistema fechado, ambientado dentro da casa grande, agora surgem novos
cenários. Os filhos do senhor começam a estudar nas faculdades e formam laços com
conhecer novos contatos nos centros urbanos. “Chega também o momento de abandonar
XIX. A proibição do tráfico escravo (1850) acabou com o comércio de negros trazidos
2. http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=412
3. Idem.
14
de pardos e 19,7% de negros”.4 A Lei do Ventre Livre (1871) deu liberdade aos filhos
de escravos nascidos desde então, apesar de mantê-los sob tutela dos seus senhores até
livre os negros com mais de 60 anos. Todos esses acontecimentos deram início a
inúmeras revoltas de negros escravos, que fugiam das fazendas e buscavam liberdade
A luta dos negros pela própria liberdade foi tão importante que suas ações
repercutiram no país e no mundo. O exército nacional pediu publicamente que não fosse
mais solicitado para a captura de fugitivos. A situação da escravidão também não era
país livre da presença de não-brancos. O negro estava livre, mas excluído da sociedade.
O que fica claro nesta relação entre brancos e negros no Brasil é uma constante
defesa dos líderes por seus ideais. O líder português descobriu, ocupou e se apropriou
do território, conferindo a ele a posse do país. O índio, primeiro habitante, foi dominado
7. ARAÚJO; 2000: 27
16
preservar seu poder e espaço, mostrando à sociedade que o liderado é diferente e não
Assim,
Mas como o negro foi apresentado, ainda durante o século XIX, para os
controle sob a natureza. O avanço científico da época registra a relação entre líderes e
fotografia.
17
Brasil e a Europa.
trabalharam para criar uma nova técnica que pudesse registrar imagens, sem a emoção
do desenho e da pintura. A idéia era desenvolver “uma nova técnica que, em suporte
bidimensional, conferisse fidelidade total à imagem produzida”.8 Por mais realistas que
estilos próprios. A fotografia, como hoje é conhecida, passou por diversas evoluções,
aparelho que levou o seu nome. O abade Louis Compte, amigo do inventor, veio ao
Brasil e fez uma apresentação do invento na praça em frente ao Paço Imperial, no dia 17
aparelho para reproduzir seus próprios daguerreótipos. Anos mais tarde, depois de
assumir o trono brasileiro e ser intitulado D. Pedro II, deu importante impulso ao
invento. Sua idéia foi estimular profissionais a trabalharem com o aparelho e nomeá-los
Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo, também era possível dispor de outros
pagava por ele, a possibilidade de fazer daquela cena, uma realidade. Mesmo que
fotografia era fiel ao momento registrado”. No século XIX, tal exigência era
considerada um simples capricho do cliente, mas que o bom profissional precisava estar
9. VASQUEZ; 2003: 5.
10. ERMAKOFF; 2004: 38.
11. Formato de apresentação de fotografias inventado pelo francês André Adolphe-Eugène Disdéri em
1854. Recebeu este nome em virtude de seu tamanho reduzido (apresentava uma fotografia de cerca de
9,5 x 6 cm montada sobre um cartão rígido de cerca de 10 x 6,5 cm). Em 1860, tornou-se um modismo
em escala mundial e foi produzido aos milhões em todo o mundo, inclusive aqui no Brasil. O cartão de
visita começou a declinar a partir de 1870, embora tenha sido empregado por alguns fotógrafos até o fim
do século XIX.
19
francês Victor Frond realizou um projeto com registros de paisagens, povos e costumes
realizado no país durante o século XIX”.13 A curiosidade européia pelo exótico encontra
no Brasil um rico cenário para o despertar deste espírito pitoresco. E o Brasil encontra
brasileira).
Um dos “objetos exóticos” foi o negro. Justamente por ser considerado tão
exuberante quanto às terras do Novo Mundo, o negro quase sempre foi mostrado em
situações ou com temáticas que em nada representava o seu cotidiano real. O anexo foto
1 mostra uma exceção. Dona Marcellina, ex-escrava do senhor Antônio, posa sua nova
casamento (em 1887) movido pela esposa branca de seu Antônio, que o acusava manter
tipos de pretos (...), uma coisa muito própria para quem se retira para a Europa”.
A principal diferença que se observa nas fotos dos senhores e dos escravos é a
temática do singular e do generalizado. Singular, pois assim são as fotos dos senhores;
únicas. Mesmo manipulados, estes são trabalhos que representam um indivíduo. E eram
produzidas para uso pessoal. A fotografia dos negros, produzida para fins comerciais,
não representava a história do indivíduo que ali posava. As imagens eram categorizadas,
buscavam representar um grupo ou tipo da “espécie” e seu destino eram as mãos dos
senhor é uma forma de cartão de visita, o retrato do escravo é uma forma de cartão
postal”.15
séculos XIX e XX, os fotógrafos representavam os escravos por estarem com os pés
descalços. Mesmo que bem vestidos e elegantes, eles eram fotografados em estúdio e
anexo foto 2, a idéia é mostrar uma domesticação da escravidão, o que era civilizado e
apropriado para o consumo europeu. O anexo foto 3 tem o mesmo teor, mas representa
uma ama-de-leite. Muitos escravos, após conseguirem a alforria, adquiriam algum tipo
de calçado.
Victor Frond, fotógrafo francês que se dedicou a fotografar o Brasil entre 1857 e
1862, registrou alguns momentos dos negros fora dos estúdios fotográficos. No anexo
lazer entre três mulheres: a caça aos piolhos. Frond foi o primeiro a focalizar, em 1858,
Rugendas (anexo figura 1) e Debret (anexo figura 2), seria possível documentar os maus
agressão a um escravo. Nestes casos, a informação era complementada por textos como
que ao mesmo tempo em que se constituía como uma nação moderna e civilizada,
pitoresco, aparece domesticado, bem tratado e serve como um “manequim” que, com o
auxílio de poses e cenários, desfila os elementos desta nova pátria. Para quem visualiza
a foto, seja estrangeiro ou mesmo brasileiro, fica a idéia de uma nação civilizada, em
NACIONAL.
cultural pela televisão, rádio, jornais, revistas, cinema, etc. São meios que se
desenvolveram a partir do final do século XIX e até hoje produzem atrações de enorme
sempre toda a massa brasileira se vê representada nos filmes, nas telenovelas e nas
culturais ganha destaque nas próximas páginas, que mostram velhas ideologias (como o
popular.
quando pouco restou deste período cinematográfico mudo brasileiro - chamado pelo
pesquisador Vicente de Paula Ribeiro como “bela época” por ter sido um dos momentos
documentários foi quase zero. Mas, no primeiro filme proibido no Brasil por motivos
políticos, o negro estava presente. A Vida de João Cândido (1912), contava a história
no Rio de Janeiro; uma versão paulista de A Cabana do Pai Tomás, com atores brancos
Spinelli. Das primeiras produções, ainda restam fragmentos de três obras “que mesmo
Filha do Advogado (1926); e Thesouro Perdido (1927), em que “o perfil de uma criança
feitiçaria e ao mal”.18
getulista), é um bom exemplo das produções da época. Esse filme conta um episódio da
vida de Princesa Isabel ainda jovem, em que jurava libertar todos os escravos brasileiros
ao ser afrontada por não conseguir impedir o castigo de uma proprietária à sua escrava.
O filme exibe cenas fortes de violência contra o negro e termina com um ex-escravo
Estado Novo, o personagem branco aparece como único salvador da raça negra.
“Nenhuma menção das fugas em massa das fazendas, das centenas de mortos, nem da
campanha dos abolicionistas, que durou quase 70 anos e empolgou negros e brancos de
todo país”.19
Grande Otelo, Pérola Negra e Chocolate traziam no nome artístico o orgulho por suas
etnias. Mas ainda sob forte intervenção da censura, os atores negros tiveram quase
nenhum espaço. Dois sucessos musicais da época exemplificam essa situação. Favela
dos Meus Amores (1935), dirigido por Humberto Mauro, foi um dos primeiros filmes
realizados fora do estúdio. O cenário era uma favela verdadeira do Rio de Janeiro e os
o negro aparece como figurante. A obra foi censurada “porque mostrava muito pobre e
muito preto”,20 mas liberada posteriormente. Já em O Ébrio (1945), dirigido por Gilda
de Abreu, apenas três negros integram o elenco. Seus personagens são empregados
família. O filme foi o maior sucesso do cinema brasileiro da época, ficando em cartaz
por duas décadas. Nos quatro primeiros anos de exibição, num Brasil que contabilizava
50 milhões de habitantes, estima-se que foi visto por mais de quatro milhões de
espectadores.21
da época, que não conseguia ler as legendas dos filmes norte-americanos. Essas
desconhecida admiradora, encantada por sua voz: “- Sou alto, branco, louro, de olhos
Alinor Azevedo), o personagem de Oscarito reclama quando tem que distrair uma
criada negra e gorda: “- Eu vou ter que me declarar... a isso?!”, “- Eu cheguei perto da
um bandido: “- Sujeito quando não é banco nem preto, cuidado com ele!”. 25
Estudos apontam que Cajado Filho (1912 – 1966) foi o primeiro cineasta
brasileiro negro. Foi um ótimo cenógrafo e escreveu algumas das melhores chanchadas
filmografia mais extensa: dirigiu, entre 1949 e 1951, três filmes: Estou Aí, Todos por
Outro negro de destaque no cinema brasileiro foi Grande Otelo (1915 – 1993).
brancos. Mas o talento também fazia dele um excelente ator dramático, que participou
Somos Irmãos (1949), de José Carlos Burle, que “trata abertamente do preconceito
especializada da época, o melhor filme do ano. Já em Rio, Zona Norte (1957), dirigido
por Nelson Pereira dos Santos, vive o personagem Espírito da Luz; “negro, favelado,
compositor de sambas, que morre ao cair de um trem, no exato momento em que sua
Nos filmes sobre a escravidão, aparece um negro mais atuante, participativo junto com
Sinhá Moça (1953), dirigido por Tom Payne e Osvaldo Sampaio, produzido pelo
estúdio Vera Cruz e premiado no Festival de Veneza; e Ganga Zumba (1964), de Carlos
Com o Golpe Militar de 1964, que durou até 1983, o Brasil entra num regime
foram altos, a liberdade temática ficou assegurada e importantes filmes para a afirmação
Espera (1969), dirigido por Antunes Filho, narra a história de um intelectual negro
brancos. Já O Amuleto de Ogum (1974), conta uma história policial ambientada nos
bastidores do culto da umbanda, enquanto A Tenda dos Milagres (1977), uma adaptação
brasileira na Bahia. Ambos foram dirigidos por Nelson Pereira dos Santos. Xica da
Silva (1976), dirigida por Carlos Diegues, baseia-se na história verídica de uma escrava
que consegue liberdade e ascensão social quando conquista a mais alta autoridade
lusitana na região de Vila Rica, a maior produtora mundial de ouro do século XVIII. Foi
uma das maiores bilheterias da história do cinema nacional e repetiu o sucesso quando
opta por uma “carnavalização de cenários, dos figurinos e até da interpretação dos
época contemporânea”,29 Walter Lima Júnior dirige Chico Rei (1985) de forma oposta.
A estética da cenografia e dos figurinos “se baseiam nas gravuras de viajantes europeus
como Debret, Rugendas e Franz Post (...). Ao contrário de Xica, a ascensão social se faz
sem a perda da dignidade”.30 A história conta a lenda de um rei africano vendido como
escravo para o Brasil. Através de seu trabalho nas minas de ouro, conquista sua
liberdade e a dos demais integrantes da sua tribo. Ainda no gênero da ficção, Olá
Balogun, cineasta nigeriano com extensa filmografia na língua ioruba, dirigiu, escreveu
A ajuda estatal foi suspensa no início dos anos 90, coincidindo com o fim do
média de 70 filmes anuais para apenas quatro. Somente a partir de 1993 o país retoma a
Nestes cem anos de cinema, o retrato do povo negro brasileiro foi mostrado de
forma tímida nas telas do país. E fora delas também. O personagem negro vive no
sua cultura. O negro espectador brasileiro assiste a uma sucessão de papéis que não
inspiram nele o orgulho de pertencer a uma raça afro-descendente, sempre regida pelo
comando dos brancos (dentro e fora da tela). Ainda assim, obras memoráveis foram
contribuição para a valorização da raça negra ainda ficou adormecida, fazendo com que
produções, mas nem sempre o papel destinado a esses atores condiz com a realidade do
nacional.
Até os anos 70, as novelas brasileiras sofreram forte influência das indústrias de
Ess patrocinaram cerca de dois terços das produções da época. O esquema foi o mesmo
adotado pela soap opera 32 norte-americana, programa que surgiu nos anos 30 em rádios
adaptações de obras de diversos países da América Latina, realizadas por autores que
meados da década de 60, quando o país vivia os dias do golpe militar. Mas na
telenovela, a história era outra. “Eram velhos clichês folhetinescos, que nada têm em
32. O nome soap opera surgiu da seguinte combinação: soap faz referência aos patrocinadores, empresas
do ramo de higiene pessoal como a Procter and Gamble; e opera pela semelhança com os espetáculos
teatrais, caracterizados pelo caráter musical e dramático.
33. ARAÚJO apud FERNANDES; 2000: 82.
32
do autor cubano Félix Caignet, conta a história do jovem branco Albertino Limonta
(vivido por Amílton Fernandes), recém-formado em medicina, que fora adotado desde
bebê por uma criada negra, Maria Dolores Limonta. Interpretada pela atriz negra Isaura
Bruno, Mamãe Dolores (como era chamada carinhosamente pelo público) foi um dos
dois estereótipos:
A Rede Globo, que estreou sua primeira novela em 1965, levou ao ar A Cabana
do Pai Tomás, em 1969. Na época, a novela era a que mais havia apresentado atores
negros em seu elenco, mas também protagonizou um dos mais polêmicos episódios
sobre a questão racial na televisão brasileira. O papel do negro Pai Tomás foi
interpretado pelo ator branco Sérgio Cardoso. Para dar vida ao personagem, Sérgio era
“pintado de preto e usava rolhas no nariz e atrás dos lábios para aparentar uma pessoa
personagem principal, já que era comum dar a eles papéis secundários, de pessoas
subalternas.
“No Brasil, representar outras raças, tais como negros e índios, sempre
foi uma prerrogativa unilateral dos atores euro-brasileiros, e não dos
atores afro-brasileiros (...). Em Aritana, apresentada em 1979, o
34. ARAÚJO; 2000: 90.
33
vida urbana no Brasil e criar diálogos mais próximos do dia-a-dia nacional. Mas foi na
Rede Globo que a busca por uma novela mais brasileira encontrou espaço e sucesso. A
emissora contratou grandes nomes do teatro brasileiro, como Dias Gomes, buscou
apostou tudo nesse novo jeito de fazer telenovelas, com ingredientes que faziam parte
da realidade nacional. Mas foi com Janete Clair que a rede conseguiu seu primeiro
sucesso: Irmãos Coragem (1970). A autora ficou famosa pelos personagens femininos
que criou, sempre abordando a luta pela emancipação familiar, sexual e profissional.
Janete Clair foi a autora que menos utilizou personagens estereotipados e “quem
mais contribuiu para a revalorização do negro (...)”.35 Na novela Selva de Pedra (1972),
a atriz Léa Garcia interpretou uma secretária negra de classe média, inteligente e
sofisticada. Milton Gonçalves atuou e co-dirigiu, junto com Daniel Filho e Reynaldo
brasileira. E foi para Milton o papel negro de maior destaque desenvolvido pela autora:
Vitória (Tereza Amayo), mulher branca, irmã de sua paciente. Mas o affair entre os dois
não aconteceu por pressões do público e da censura política. Para o ator Milton
raciais.
escravidão. A Escrava Isaura foi escrito em 1875, pelo autor abolicionista Bernardo
branca”, para ser a escrava heroína, refletia a necessidade “de provar uma exceção à
regra de que negros eram escravos por natureza e para não ofender suscetibilidades de
romances oitocentistas era difícil imaginar uma negra inocente e pura, e por isso os
homônima foi interpretada pela atriz Lucélia Santos. O fim da falta de ousadia na
televisão brasileira só viria a ser decretada quase 20 anos depois, na Rede Manchete,
dos escravos. O escravo era dócil, não tinha orgulho pela raça e nem lutava contra a
escravidão. Nos anos 80, Sinhá Moça (1986) – de Benedito Ruy Barbosa - mostra, no
dirigida por Herval Rossano, mostrou a luta contra a escravidão liderada por
estima foram abordados e ganharam vida nas mãos de grandes personagens. Atores
negros de destaque como Ruth de Souza (a babalorixá Mãe Quitinha), Angela Corrêa (a
líder guerreira Baoni), Haroldo de Oliveira (Damião) e Zezé Motta (Maria) fizeram
parte da história que, apesar de continuar trazendo nas tramas principais romances de
da Rede Globo. Sônia, interpretada por Zezé Motta, vive um romance com Cláudio
classe média. Nenhum dos personagens lutam nas questões de conflitos raciais.
aconteceu na vida real. A trama de Gilberto Braga foi o cenário de “uma das cenas mais
história, Raul Pelegrini (Tarcísio Meira), acusou injustamente o seu jardineiro Kennedy
(Alexandre Moreno) de ter roubado seu cofre. Começam as agressões verbais contra o
empregado:
dignidade (...). Teve uma conduta que não reflete o comportamento do negro
conscientizado por outros personagens negros. Depois de mais manifestações (de outras
entidades negras paulistanas e de poucos atores negros), a trama levaria ao ar uma cena
em que Kennedy desabafa com sua madrinha Zilá (Chica Xavier). Na conversa, o jovem
“‘às vezes, fico achando que não é só o doutor Raul, não, tem muita
gente que acha que...’. Zilá o interromperia energicamente,
evidenciando o tabu: ‘Que negro é inferior a branco?’. Ele: “Não sei.
Isso tudo fica martelando na minha cabeça’. A partir daí, Zilá faria um
longo depoimento em que concluiria, com veemência: ‘Nunca deixei
safadeza de racista atrapalhar a minha vida. Se você, Kennedy, entrar
nessa de complexo, vai estar fazendo o jogo dos safados, dos burros. E
eu vou ficar muito decepcionada’”. (ARAÚJO; 2000: 274).
polêmica serviu para mostrar que a população negra, através de entidades políticas,
machista, não gosta quando a sua esposa Fátima (Zezé Motta) pensa em voltar a
trabalhar como secretária. Sidney (Norton Nascimento), filho mais velho, gerente bem-
preconceito acontece de forma invertida, quando a filha caçula do casal Patrícia (Camila
Pitanga) leva o namorado Cláudio (Roberto Bataglin), um fotógrafo branco, para jantar
Patrícia quer assumir. A trama foi um sucesso de público porque o autor criou um
núcleo negro com pessoas bem sucedidas, “uma família de classe média comum e
negro brasileiro”.41
nas telas a abordagem é diferente. A constatação foi feita em pesquisas realizadas por
Joel Zito Araújo nas telenovelas dos anos 80 e 90 produzidas pela Rede Globo, época
período, com exceção das que traziam como tema a escravidão, não foram encontrados
descendentes conseguiu ultrapassar 10 por cento do total do elenco, sendo este o maior
telenovelas no Brasil. Ruth de Souza, Milton Gonçalves, Zezé Motta, Nelson Xavier,
Grande Otelo, Jacyra Silva, entre outros. Mas somente uma atriz negra conseguiu, até o
momento, protagonizar uma novela. E por duas vezes. Taís Araújo interpretou Xica da
Silva, na produção homônima da extinta Rede Manchete (1996) e reprisada pelo SBT
período do século XVIII. A atriz interpreta Xica, escrava que luta para viver ao lado da
maior autoridade da região, o contratador João Fernandes. Nas duas ocasiões em que foi
mais um casal de raças diferentes sofre nas mãos de vilões, brancos e negros, até
patrocínio semelhante ao da soap opera americana. Ao longo dos anos, o que se vê são
folclorização de sua cultura em cenários e sobre seres subalternos, “que buscam compor
trazendo para as telas heróis negros na luta pela liberdade. Somente a partir dos anos 90,
passou a ser mais natural e o negro ganhou papéis de maior destaque dentro da trama,
também usa os elementos nacionais (o povo, a natureza, o estilo de vida) para criar uma
cada vez mais das revistas, que tentavam acompanhar os pedidos para manter suas
especialização veio depois das Revoluções de 1930 e 1932, que paralisaram totalmente
as propagandas. Nos anos 40, a J. Walter Thompson cria o primeiro escritório no país,
vindo para servir a conta da General Motors, fazendo, então, com que o seu
veículos em que uma grande empresa poderia anunciar seu(s) produto(s). A propaganda
século XX. Seja em revista ou na televisão, no outdoor ou no jornal, sua presença era
apenas solicitada quando era preciso expressar uma situação coadjuvante dentro do
anúncio. Quando se tratava de uma campanha para anunciar marcas e/ou empresas de
renome, o negro não servia. “A lógica da sociedade, dos empresários e dos publicitários
– e que aponta para o fato do negro ser sinônimo de pobre e que, portanto, é igual a
Tal pensamento pôde ser constatado em 1986, diante de um debate entre representantes
encontro revelou um pouco mais sobre esse cenário limitado para a atuação de negros
na publicidade. Em resumo:
período, nas capitais do Rio de Janeiro e Minas Gerais. O resultado foi o seguinte:
brancos, em alguns países essa situação não é a mesma. Na revista Veja, em 23 de junho
acordo com uma leitora brasileira, que vivia em uma cidade da Dinamarca, existiam
muito mais negros, mulatas e japoneses nas propagandas dinamarquesas do que nas
publicações, enviadas pela leitora. O caso comprova que a elite publicitária ainda não
via no grupo negro brasileiro uma força econômica para integrar o mercado publicitário.
“Na lógica dessa maioria, preto é igual a pobre, que é igual a consumo de
subsistência”.49
1997, 28% dos brasileiros que têm uma renda superior a vinte salários mínimos são
atores negros representavam uma família de classe média negra, chamada a família do
A C&A foi pioneira em apostar no negro brasileiro para representar sua marca.
Desde 1990, a loja optou pelo mineiro Sebastião Fonseca, o Sebastian. Para o ator, a
escolha faz da empresa uma multinacional mais brasileira: “A C&A completou 25 anos
uma nova visão sobre o consumidor negro (principalmente a partir dos anos 90, como
exaltar a mensagem de que belo é ser branco, destinando aos negros uma posição de
ganhou as ruas e o país parou. Os anos seguintes foram marcados pela retomada do
descendente neste produto cultural. As histórias de Lázaro Ramos (ator – negro) e Jorge
Furtado (diretor – branco) como personagens deste momento cultural e a análise de duas
racial e incentivar políticas anti-racismo. Mas a partir dos anos 90, as ações se tornaram
1964, com a ditadura militar, o movimento teve seu fim decretado pela perseguição
política. O público negro só voltaria a ter uma publicação específica para os seus
leitor, o orgulho de ser negro. Todo cidadão precisa dessa dose diária de auto-estima:
ver-se bonito, a quatro cores, fazendo sucesso, dançando, consumindo. Vivendo a vida
feliz”.54 Nota-se que, como nos primeiros periódicos do início do século XX, um das
afro-descendente.
Hoje, a revista Raça Brasil é a única no país dedicada ao público negro. Sua
principalmente, produtos de higiene e beleza étnicos. Em 1999, Raça Brasil passou por
um novo projeto a fim de tentar superar uma crise nas vendas. Sandra Almada, na época
“O que aconteceu com a Raça, no meu modo de ver, é que esse leitor
negro é meio arredio, como devem ser os outros leitores e outros
pesquisas mais comentadas sobre o consumo da raça negra brasileira foi realizada pela
revelou que 1,7 milhão de famílias eram formadas por negros com alto nível de
renda familiar média chegava a pouco mais dois mil dólares mensais. Esse nicho era
bem atrativo e mereceu do mercado uma atenção especial para motivar uma grande
variedade de negócios.
Shizen oferece a linha Essenza para tratamento capilar desde 2003, que corresponde a
5% do seu faturamento no país e por 25% em São Paulo.55 De acordo com a Associação
55. “Cheios de Raça”. In: Revista Veja. São Paulo, ed. Abril, edição 1789, 21/01/2004, p. 60.
47
fora do país.
(Empresa Brasileira de Filmes S.A.). Em 1992, a situação ficou tão grave que apenas
duas obras de longa-metragem foram lançadas no Brasil.58 No mesmo ano, Collor foi
deposto por impeachment e o seu vice, Itamar Franco, assumiu o mandato. Para o
sua função era aperfeiçoar leis antigas de incentivo fiscal. O Prêmio de Resgate do
Cinema Brasileiro promoveu três seleções entre 1993 e 1994, contemplando 90 projetos
funcionaria antes de tudo como uma estratégia de marketing. Para José Joffily, quem é
produzindo, já nas primeiras obras, sucessos de bilheteria. Entre eles, Carlota Joaquina
despontar, mostrando um Brasil além do eixo Rio-São Paulo (como Jorge Furtado, do
Rio Grande do Sul, que será comentado ainda neste capítulo). E a participação feminina
para 3% o limite de dedução de impostos das empresas. Cineastas dirigem suas câmeras
agilidade dos videoclipes popularizados pela MTV Brasil), dão uma nova “roupagem”
ao cinema brasileiro. Ivana Bentes, conhecida pelas críticas contra este tipo de
numa “cosmética da fome” da Retomada.62 Para uns, tal comparação entre esses dois
nacional como temática. Para outros, como o crítico do jornal Folha de São Paulo,
ao contrário do que acontecia nos anos 60. Entre a retomada e o Cinema Novo mudou
E foi com esse turbilhão imagético que o filme “Cidade de Deus” (2002, de
Fernando Meirelles). O filme foi baseado no romance homônimo de Paulo Lins e conta
a história da favela carioca, surgida nos anos 60. O longa trouxe à tona a realidade local
Meirelles fez questão de levar à tela jovens de diversas comunidades e favelas do Rio de
Janeiro. Muitos deles nunca tiveram contato com a arte de atuar, gerando mais de 2000
entrevistas e testes para capacitar parte do elenco. No cenário internacional, o longa foi
A retomada do cinema brasileiro está longe de ser constituída apenas por casos
de sucesso. Algumas obras fracassaram, outras nem saíram do papel. Mas, nos últimos
tempos, nunca se assistiu tanto aos filmes nacionais. Até no exterior, o momento é de
destaque. Três obras foram indicadas ao Oscar de melhor filme estrangeiro65 e um Urso
momento é tão grande que outros ciclos do cinema são referências para os novos
O cinema da retomada diversificou para uns, mas outros grupos ainda continuam
produtores brasileiros estabelecidos no Sudeste, que têm acesso às verbas das grandes
páginas, duas personalidades que fazem desse momento cinematográfico uma realidade
Furtado (diretor).
65. O Quatrilho (indicado em 1996); O Que É Isso, Companheiro? (1997, de Bruno Barreto, indicado em
1998); e Central do Brasil (indicado em 1999). A atriz Fernanda Montenegro, protagonista de Central do
Brasil, foi indicada ao Oscar de melhor atriz, também em 1999.
66. NAGIB; 2002: 17.
67. NAGIB apud CARIRY; 2002: 15.
52
nacional, isso acontece. Mas quando um diretor escolhe, por duas vezes seguidas,
protagonizar seus filmes com um ator negro, a situação muda. Principalmente quando,
retomada.
Grande do Sul. Começou a cursar Medicina, largou, optou por Artes Plásticas, desistiu,
e seguiu Jornalismo. Não terminou nenhum curso. Mas foi com o jornalismo que teve
seu primeiro curta. O Temporal, baseado numa história de Luiz Fernando Veríssimo, foi
produzido com o mesmo grupo do programa de TV. A vontade de fazer cinema surgiu
nessa época,
Depois de dois anos como diretor de televisão, Furtado foi convidado a dirigir o
Museu de Comunicação Social de Porto Alegre, segundo ele, uma espécie de Museu da
lhe rendeu descobertas, como o filme Limite (1931), de Mário Peixoto. Furtado conta
que Cabra Marcado para Morrer (1984), de Eduardo Coutinho, é seu filme brasileiro
preferido, mas declara que o cinema brasileiro não fez parte da sua formação
de Gramado com outros dois filmes. Em 1995, Furtado dirigiu o episódio Estrada, do
filme Felicidade É..., uma produção que, apesar do resultado comercial fraco,
como a pobreza, o desperdício alimentar, a fome e a exclusão social. Sua edição lembra
José orienta o espectador e se torna um marco nas obras de Furtado (como será visto na
última parte deste capítulo). O projeto, que se confunde com ficção e documentário,
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ganhou inúmeros prêmios nacionais e internacionais, dentre eles, melhor filme de curta
metragem (júri oficial, júri popular e prêmio da crítica), melhor roteiro, melhor
montagem e mais quatro prêmios regionais (melhor filme, melhor direção, melhor
metragem. Houve Uma Vez Dois Verões (2002), que caiu nas graças do público e da
"Em cartaz em São Paulo, Houve Uma Vez Dois Verões consegue
retratar os adolescentes, suas dúvidas e ansiedades com irreverência e
fidelidade. Furtado constrói personagens que têm como trunfo uma
aparente normalidade. São jovens sem afetação e sem rótulos
estampados na testa, gente comum que você acha que pode encontrar
a toda hora em qualquer lugar. (...) No lugar de pirotecnias
tecnológicas, Furtado usou duas armas: um roteiro bem estruturado,
com um humor sutil, e um modo de filmar clássico, seguro, sem
grandes invenções."
Miami em 2004, o filme marca a estréia da dupla com Lázaro Ramos, escolhido após
diversos testes com outros atores. Segundo Furtado, que assinou roteiro e direção da
obra, todos os personagens foram escritos já com os seus respectivos atores escolhidos,
menos André:
“Eu testei vários atores antes de escolher o Lázaro. Ele tem uma voz
muito boa, uma boa vivência de teatro. A voz era muito importante,
porque nos primeiros 40 minutos ele praticamente não tem um
diálogo, tem uma longa narração em off. A escolha foi um contato de
olhar.”69
Bahia. Aos 10 anos, começou a fazer teatro, substituindo o primo numa peça infantil.
da Bahia, mas nunca foi a uma aula sequer. Sua primeira participação no cinema foi em
Cinderela Baiana (1998), estrelado por Carla Perez. Depois desse filme, parou de
Em 2000, Lázaro foi convidado por João Falcão para fazer o espetáculo A
Máquina, junto com Wagner Moura, Vladmir Brichta e Gustavo Falcão. A partir daí,
surgiram vários convites para atuar no cinema. No mesmo ano, ao lado de Penélope
Mas foi em 2002 que o ator virou sucesso nacional. No filme Madame Satã, de
Karim Aïnouz, Lázaro interpreta João Francisco dos Santos, transformista que virou o
mito Madame Satã da boemia carioca na década de 30. O filme lhe rendeu dois prêmios
nacionais de melhor ator (Mostra de São Paulo e Troféu APCA) e mais três
“O primeiro teste para o Madame foi três anos antes de filmar. Mas foi
só três semanas antes de começar a filmagem que o Karim me
convidou. Não sabia se ia dar conta – mas sabia que seria um presente:
não é toda hora que você encontra um personagem lírico desse. Aí,
você se entrega. Fiz musculação, capoeira, estudei a entrevista dele no
Pasquim, um vídeo com imagens já velho... Ele inventava tanta
mentira [risos]!”(“Homem Invisível”. In: Revista V. São Paulo, ed.
Parágrafo, edição 10, 01/02/2005, p. 14.)
Fonseca. Mas seu segundo protagonista seria o personagem André em O Homem que
Copiava (2003), de Furtado. Atuou ao lado de Leandra Leal, com quem fez par
Bruno Gracia a série Sexo Frágil (2003), na Rede Globo. Os quatro atores
Pastores da Noite. Mas seu primeiro papel em novelas só surgiu este ano, em 2006, na
trama de João Emanuel Carneiro, Cobras & Lagartos, também na Rede Globo. Seu
Ezequiel e fez uma pequena participação em Nina (2004), de Heitor Dhalia. Em Meu
Tio Matou Um Cara (2005), mais uma parceria com Furtado, o personagem Éder lhe
rendeu outro protagonista, o terceiro da sua carreira no cinema. O ator conta sobre como
Também em 2005, mais quatro filmes chegaram aos cinemas com a participação
inspirada em um personagem real saído das senzalas do século XIX. O filme foi rodado
Baixa, mais um papel principal, agora dividido com o amigo Wagner Moura. E em A
Máquina, de João Falcão, o sétimo personagem onde atua ao lado de Moura. O filme foi
quando fez uma pequena participação em Jenipapo (1996), até hoje, são 14 personagens
Para o ator negro brasileiro, o caso de Lázaro Ramos ainda é uma exceção. Mas
não deixa de ser também um novo caminho. Com a imagem em circulação nos
Em julho deste ano, 2006, mais uma obra com a parceria de Jorge Furtado e
Lázaro Ramos se somará à lista de filmes do cinema brasileiro.73 A seguir, a análise dos
dois projetos da dupla: O Homem Que Copiava e Meu Tio Matou Um Cara.
Análise dos filmes O Homem Que Copiava e Meu Tio Matou Um Cara.
Nas obras O Homem Que Copiava e Meu Tio Matou Um Cara, Jorge Furtado
constrói personagens comuns, com problemas reais, mas que encontram caminhos
inusitados para resolver seus problemas. E o ator Lázaro Ramos protagoniza essas
tramas, acrescentando seu talento a dois grandes sucessos do cinema nacional, que estão
que mora com a mãe e a ajuda com as despesas. Trabalha em uma papelaria tirando
jovem por quem é apaixonado, do seu quarto, de binóculos. Sílvia trabalha numa loja de
roupas e, assim como ele, ganha um salário modesto. Um dia, o rapaz resolve seguí-la e
estabelece o primeiro contato com a moça na loja onde ela trabalha. Promete voltar no
fim daquela semana e comprar um chambre de presente para a mãe, com o intuito de
impressionar a moça. Na realidade, ele não tem como pagar a roupa. Começa, então,
uma série de planos para conseguir dinheiro e mudar sua vida. Entre eles, copiar cédulas
de R$ 50 e assaltar um banco.
Cardoso) entram na trama e participam dos planos com André. O final é feliz para o
nosso anti-herói e seus amigos: ele vai para o Rio de Janeiro com Sílvia. O personagem
de Lázaro Ramos é o único negro de destaque na trama (o outro é a mãe dele, com uma
amorosos inter-raciais é abordada nas duas obras por Furtado, como veremos a seguir.
classe média afro-descendente, formada por Éder – o tio (Lázaro Ramos), Duca – o
sobrinho (Darlan Cunha), Laerte – pai de Duca / irmão de Éder (Ailton Graça) e Cleía –
mãe de Duca / cunhada de Éder (Dirá Paes). A trama conta a história de Éder, que mata
o ex-marido de sua namorada Soraya (Deborah Secco). Duca, jovem de quinze anos,
aficionado por jogos e Internet, começa a desconfiar da história contada pelo tio e
resolve investigar o caso. Apaixonado por sua amiga de infância Isa (Sophia Reis), que
é apaixonada pelo amigo Kid (Renan Giolli), os três amigos se envolvem em diversas
aventuras.
sobre o caso do tio. A narração é feita por Duca e, como na outra obra, orienta o
oportuna dentro do filme (como o provedor Terra, que sempre aparece quando Duca
mudou de nome e virou Soraya, depois que Furtado ouviu a música Soraya Queimada,
de Zeu Britto.
Duca descobre, no final, que seu tio Éder não era o assassino e acaba
(o primeiro é o de Éder e Soraya). Ao contrário da outra obra, Meu Tio Matou Um Cara
apresenta pequenas questões sobre discriminação, mas sempre muito bem resolvidas
Ao “ator sem cor” , como defende Antônio Pitanga na epígrafe deste projeto, surge mais
uma oportunidade de trabalho, que não denigre nem enaltece; mas gera visibilidade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
interesse pelas “coisas” do Brasil. Inserido nessa temática, o negro brasileiro conquista
diversidade cultural.
começou antes dos anos 90. E o resultado dessas ações ratifica, hoje, uma posição
negro, a Raça Brasil; e a existência de uma classe média negra consumidora, com
filmes O Homem Que Copiava e Meu Tio Matou Um Cara), surgem relações inter-
brasileiro, que continua ruim (e se torna péssima quando comparada aos índices da
população branca). Em 1992, por exemplo, 26% dos negros com mais de 25 anos não
sabiam ler e o salário chegava a ser menos da metade do trabalhador branco.74 Mas a
mas exceções que exercitam a auto-estima da própria raça. Para a outra parte da
Ramos vitais para a sustentação da obra dentro e fora da tela. O sol, segundo o ditado,
nasce para todos. Mas cada um precisa conhecer o seu lugar. O negro brasileiro, agora,
74. “Cheios de Raça”. In: Revista Veja. São Paulo, ed. Abril, edição 1789, 21/01/2004, p. 61
64
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Livros:
DA CUNHA, Manuela Carneiro. Olhar escravo. Ser olhado. In: Jr., Cristiano
(Org.). Escravos brasileiros do século XIX na fotografia de Cristiano Jr. São Paulo:
1998;
Pallas, 2001;
Editora, 2003.
65
Dissertação:
Revistas:
CUENCA, João Paulo. Homem invisível. In: Revista V. São Paulo, Editora
VANNUCHI, C.; MELO, L.; DUARTE, S. Cheios de raça. In: Revista Isto É.
Sites:
CasaCinePoa. http://www.casacinepoa.com.br/port/filmes/ilhadasf.htm -
consultado em 02/06/2006;
CineWeb. http://www.cineweb.com.br/index_textos.php?id_texto=276 -
consultado em 07/06/2006;
10/06/2006;
Histórianet.com. http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=412 -
consultado em 03/04/2006;
em 09/05/2006
O Fuxico. http://ofuxico.uol.com.br/Materias/Noticias/noticia_24153.htm -
consultado em 16/06/2006;
em 06/04/2006.
DVD:
Lavigne, Guel Arraes, Nora Goulard e Luciana Tomasi. Roteiro: Jorge Furtado e Guel
Arraes. Brasil: Natasha Filmes e Casa de Cinema de Porto Alegre, 2004. 1 DVD (85
e Luciana Tomasi. Roteiro: Jorge Furtado. Brasil: Casa de Cinema de Porto Alegre,
ANEXOS
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