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DIREITO INTERNACIONAL – ACOLHIMENTO DE TRATADOS

INTERNACIONAIS

O artigo 49 da Constituição Federal, inciso I versa que:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:


I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais
que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;

Por sua vez, o artigo 84 inciso I determina que:

Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República:


VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a
referendo do Congresso Nacional;

Desta forma conclui-se que os tratados internacionais


demandam a integração entre a vontade do Presidente da República que
celebra os mesmos e do Congresso Nacional que os aprova.

Ainda, o artigo 4º inciso II estabelece que:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações


internacionais pelos seguintes princípios:
II - prevalência dos direitos humanos;

Já o artigo 5º § 1º e § 2º tem a seguinte redação:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

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§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata.
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem
outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais
em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Embora a Constituição Federal não mencione expressamente a


qualquer das correntes, monista ou dualista a grande parte da doutrina tem
entendido que o Brasil adota a corrente dualista por considerar que, para que o
tratado ratificado entre em vigor, é necessária a edição de um ato normativo
decretado pelo Presidente da República visando conferir execução e
cumprimento ao tratado ratificado.
Porém Silvia Steiner considera monista por em virtude do
ensinamento pregado por Pedro Dallari “o tratado ingressa no direito brasileiro
– e entendo que esta é uma questão pacífica hoje – com vida própria, com
forma própria, por força do compromisso internacional firmado pelo Brasil,
sendo o decreto presidencial a via pela qual se dá a publicidade ao seu
conteúdo e se fixa pela qual se dá a publicidade ao seu conteúdo e se fixa o
início de sua vigência no território nacional. Prevalece, assim, a solução
monista para o dilema da integração dos tratados de direito internacional
público ao direito interno".

1 - Emenda Constitucional 45:

Publicada no Diário Oficial da União no dia 31/12/2004, a


Emenda Constitucional nº 45, que foi promulgada no dia 08 do mesmo mês,
trouxe profundas alterações em diversos dispositivos constitucionais.
Com o advento da referida Emenda, abriram-se novos
caminhos, prevendo específico procedimento para que os tratados
internacionais de direitos humanos passem a integrar o ordenamento jurídico
na qualidade de Emendas Constitucionais.
Com sua promulgação, os tratados, para alcançarem um
patamar constitucional, deverão ser enviados ao Congresso Nacional,

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respeitando os requisitos de aprovação qual sejam, quórum especial e votação
em dois turnos.
Aspecto de extrema relevância, a ratificação dos tratados,
constitui fato imprescindível para a determinação do inicio da vigência,
vinculando o Estado brasileiro ao plano internacional. Somente a Presidência
da Republica tem o poder de celebrar tratados, comunicando aos demais
países a aceitação interna.
Essa prerrogativa não se coaduna com a separação de poderes,
fato da essencialidade do estado de direito. Nesse prisma, a EC 45 deixa um
ponto em aberto, vez que, o Congresso não tem essa função e, muito menos,
se faz representar diplomaticamente no exterior.
Como bem leciona Professor Antônio Celso Alves Pereira:
(...) “do prisma internacional, sem promulgação
não há ratificação, pois este é o modo formal de se dar notícia aos
demais países quanto a ter sido o tratado internacionalizado”.

2 - Monista ou Dualista?

Francisco Rezek considera que o Brasil, juntamente com


outros países do Ocidente adota a teoria monista nacionalista.
Ao analisar o conflito entre direito internacional e direito interno,
conclui que os monistas da linha nacionalista destacam a soberania de cada
Estado e a descentralização da sociedade internacional.
Como cultuam a Constituição, buscam em seu texto o grau de
aceitação das normas internacionais escritas.

3 - O emblemático caso Cesare Battisti:

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Ao estudarmos o assunto em tela, podemos trazer à tona o
conhecido caso do italiano Cesare Battisti, condenado à revelia por quatro
homicídios em seu país. Ele recebeu pena de prisão perpétua pelo assassinato de
quatro pessoas entre 1977 e 1979. Na época, Battisti, que alega inocência,
integrava a organização Proletários Armados Pelo Comunismo.

Dentro do contexto cronológico, podemos observar os fatos:

Em Junho de 1979, Cesare Battisti foi preso em Milão. Era alvo de


uma investigação pelo assassinato de um joalheiro.

Em 1981 é condenado a 12 anos e 10 meses de prisão por


"participação em grupo armado" e "ocultamento de armas". Ele escapa da prisão
de Frosinone, perto de Roma, e se refugia na França. Foge para o México em
1982.

Nesse ínterim, em 1985: o presidente francês François Mitterrand


se compromete a não extraditar os ex-ativistas de extrema-esquerda italianos que
rompessem com o passado, embora tenha excluído os que cometeram "crimes de
sangue".

Em 1990, Battisti regressa à França e se converte em autor de


romances policiais. Em 21 de maio de 1991, a corte de apelações de Paris nega
uma demanda italiana de extradição.

Em 31 de março de 1993, a corte de apelações de Milão o


condena à prisão perpétua por quatro "homicídios agravados" praticados entre
1978 e 1979 contra um guarda carcerário, um agente de polícia, um militante
neofascista e um joalheiro de Milão (o filho do joalheiro ficou paraplégico, depois de
também ser atingido).

Em 20 de julho de 2001, Battisti pede naturalização francesa. Uma


decisão favorável de julho de 2003 foi anulada em julho de 2004.

Em 20 de dezembro de 2002, a corte italiana reitera seu pedido de


extradição ao governo francês.

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Em maio de 2004, Cesare Battisti é detido em Paris a pedido da
justiça italiana, em meio a protestos de intelectuais, artistas e personalidades
políticas francesas de esquerda. É libertado, mas mantido sob vigilância. A câmara
de instrução da corte de apelações de Paris se declara favorável à extradição.
Battisti recorre. O italiano não se apresenta à polícia como exige o sistema de
vigilância judicial, e passa para a clandestinidade. A promotoria da corte de
apelações de Paris expede uma ordem de detenção. O recurso de Battisti é
rejeitado, e a extradição para a Itália torna-se definitiva. O primeiro-ministro francês
Jean Pierre Raffarin assina o decreto de extradição. Nesse espaço de tempo,
Battisti foge.

No ano de 2005, o Conselho de Estado da França confirma a


extradição. Os advogados de Battisti apresentam um recurso ante a Corte
Europeia de Direitos Humanos contra o decreto de extradição.

Foge para o Brasil e, em 18 de março de 2007, é detido no Rio de


Janeiro. Desde então, cumpre prisão preventiva para fins de extradição na
penitenciária da Papuda, em Brasília.

Em 2009, o então ministro da Justiça, Tarso Genro, concede


status de refugiado político a Battisti, baseado no “fundado temor de perseguição
por opinião política”, contrariando decisão do Comitê Nacional para os Refugiados
(Conare). O status não permite o seguimento de qualquer pedido de extradição
baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.

A ação do ministro foi criticada por autoridades italianas,


incluindo o premiê Silvio Berlusconi e o presidente Giorgio Napolitano. A
decisão do governo brasileiro provocou ainda uma crise diplomática com a
Itália, que chamou de volta seu embaixador no Brasil para manifestar "surpresa
e pesar" e discutir o caso.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da extradição,


pedida com base no tratado existente entre o Brasil e a Itália, entendeu que a
decisão do ministro da Justiça concessiva do refúgio foi proferida contra a lei
brasileira e a Convenção de Genebra de 1951, além de usurpar competência
do STF.
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A Convenção de Genebra estabelece que, não será concedido
refúgio a quem haja praticado crime de direito comum.

A lei 9.474, de 1997, artigo 3º, inciso III- veda a concessão de


refúgio aos que tenham cometido crime hediondo:

Artigo 3º - Não se beneficiarão da condição de refugiado os


indivíduos que:

(...)

III - tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra,


crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou
tráfico de drogas;

A Justiça francesa, em atenção ao pedido de extradição


formulado pela Itália, deferiu o pedido nas mais altas instâncias, o Tribunal de
Apelação de Paris, a Corte de Cassação e o Conselho de Estado. Battisti
recorreu à Corte Europeia de Direitos Humanos, que negou provimento ao
recurso.

Havia, pois, desfavoráveis a Battisti, sete decisões: duas da


Justiça italiana, três da Justiça francesa, a decisão da Corte Europeia de
Direitos Humanos e a decisão brasileira do Conare. O decidido pelo Supremo
Tribunal Federal não teve, por conseguinte, sabor de novidade.

O tribunal, em seguida, deferiu a extradição, pelo voto dos


ministros Cezar Peluso, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie, Carlos Britto e
Gilmar Mendes.

O STF, por 5 votos a 4, decidiu que, mesmo tendo sido


deferida a extradição, caberia ao presidente da República à palavra final.

Fato inédito porque nunca ocorrera a hipótese de o presidente


da República descumprir decisão concessiva de extradição. E essa hipótese

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nunca ocorreu porque nem a lei nem a Constituição autoriza tal procedimento.
Em Estado de Direito, tudo se faz de conformidade com a lei.

O Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80), nos artigos 76 a 94,


cuida minuciosamente do tema.

Concedida à extradição, será o fato comunicado pelo Ministério


das Relações Exteriores à missão diplomática do Estado requerente, que, no
prazo de 60 dias, deverá retirar o extraditando do território nacional (artigo 86).

Se não o fizer, o extraditando será posto em liberdade, sem


prejuízo da expulsão, se o motivo da extradição o recomendar (artigo 87).

Se o extraditando estiver sendo processado ou tiver sido


condenado no Brasil, a extradição será executada depois da conclusão da
ação penal ou do cumprimento da pena, ressalvado o disposto no artigo 67
(artigo 89).

É dizer, ele poderá ser expulso, ainda que haja processo ou


tenha ocorrido condenação (artigo 67).

Todavia, o governo poderá entregar o extraditando ainda que


responda a processo ou esteja condenado por contravenção (artigo 90;
extradições 947 – Paraguai - e 859 - Uruguai).

Seguem-se os trâmites finais da extradição (artigo 91). Depois


de entregue ao Estado estrangeiro, se ele escapar à ação da Justiça e
homiziar-se no Brasil, será detido, mediante pedido feito por via diplomática, e
de novo entregue, sem outras formalidades.

Não há na lei, portanto, uma só palavra que autorize o


presidente da República a deixar de cumprir a decisão concessiva da
extradição, decisão que encontra base na Constituição (artigo 102, I, g), na lei
(lei 6.815/80, artigos 76 a 94) e no Regimento Interno do STF (artigos 207 a
214).

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Todavia se comprovado por laudo médico que o extraditado
sofre de moléstia grave, a sua entrega poderá ser adiada. (artigo 89, parágrafo
único, da lei 6.815/80).

Não há nos dispositivos mencionados, constitucionais ou


infraconstitucionais, nada que autorize o presidente da República a deixar de
cumprir o decidido pelo STF.

Carlos Mário da Silva Velloso, professor emérito da UnB


(Universidade de Brasília) e da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais), ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE
(Tribunal Superior Eleitoral), autor do livro “Temas de Direito Público”, por uma
solicitação do governo italiano, deu seu parecer do caso Battisti no STF:

“A menos que seja ressuscitado o que o constitucionalismo


sepultou há mais de 200 anos: o direito divino dos reis e dos imperadores, que
podiam decidir contra a lei.”

A decisão de Lula causou indignação na Itália. "É uma posição


contrária ao mais elementar sentido de Justiça", protestou em nota o presidente
do Conselho da Itália, Silvio Berlusconi. "Gostaria de expressar minha profunda
tristeza e pesar pela decisão tomada pelo presidente Lula de negar a
extradição do assassino Cesare Battisti, apesar dos repetidos apelos e
pressões em todos os níveis do lado italiano." O premiê também lembrou os
parentes de vítimas do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), ao
qual Battisti pertenceu.

Após o anúncio da decisão do ex-presidente Lula de não


conceder a extradição de Cesare Battisti, o ministro italiano das Relações
Exteriores, Franco Frattini, decidiu chamar de volta à Itália para consultas o
embaixador italiano em Brasília, Gherardo La Francesca.

O ministro da Defesa italiano, Ignazio La Russa, por sua vez,


disse em entrevista ao diário "La Reppublica", que a decisão é "injusta e
gravemente ofensiva". "A pior previsão se cumpriu, mas a Itália não vai deixar
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pedra sobre pedra para que o Brasil recue desta decisão injusta e gravemente
ofensiva", disse La Russa.

Rebatendo as pesadas críticas, Lula afirmou que os italianos


deveriam "respeitar" a "decisão soberana" do Estado brasileiro.

Em fevereiro de 2011, o STF negou pedido de liminar do


governo italiano contra a decisão de conceder refúgio a Battisti.

Fica ai, cristalizado a inobservância e descumprimento de


tratado internacional estabelecido entre as duas nações sobre aspectos dessa
natureza, alçando o ex-presidente ao patamar de soberano máximo, quase
uma figura ditatorial, que ultrapassa limites legais, para uma contraposição ao
excelente relacionamento diplomático que o Brasil sempre adotou frente às
nações de todo globo.

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