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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

CLAUDIA DI NICOLANTONIO

ESCOLHA PROFISSIONAL E DEFICIÊNCIA:


ESTUDO DE CASO COM PESSOAS
COM DEFICIÊNCIAS AUDITIVAS E VISUAIS

Palhoça
2007
1

CLAUDIA DI NICOLANTONIO

ESCOLHA PROFISSIONAL E DEFICIÊNCIA:


ESTUDO DE CASO COM PESSOAS
COM DEFICIÊNCIAS AUDITIVAS E VISUAIS

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Curso de Graduação em
Psicologia da Universidade do Sul de
Santa Catarina, como requisito parcial à
obtenção do título de Psicólogo.

Orientador: Prof.Vanderlei Brasil

Palhoça
2007
2

A cada um conforme suas necessidades.


De cada um conforme suas possibilidades.

Desejo comunista/cristão de Marx e


Engels, expresso no Manifesto do
Partido Comunista, publicado em 1848.
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RESUMO

Observa-se, na literatura, um número significativo de investigações sobre o tema deficiência e


a identidade profissional, sobretudo no que se refere ao impacto das transformações no mundo
do trabalho contemporâneo no que diz respeito a inclusão de deficientes no mercado de
trabalho, após a implantação das leis de cotas e suas normas como uma obrigatoriedade
empresarial. Não obstante, constata-se uma produção científica limitada quanto à relação
entre a deficiência e a possibilidade de escolha de uma profissão que seja de interesse pessoal
do deficiente, como também, a falta de investimento neste processo por parte das instituições
formadoras. Hoje se trabalha apenas com a capacitação para profissões culturalmente pré-
determinadas pelas instituições empregadoras. Desta maneira, percebe-se a relevância do
interesse da pesquisa em esclarecer o posicionamento do deficiente frente às regras que lhe
são impostas, uma vez que estas se constituem como uma variável central no processo de
construção da identidade pessoal e profissional do deficiente. O objetivo da presente pesquisa
foi investigar se a deficiência foi fator limitador ou determinante no momento da escolha de
uma profissão para pessoas com deficiências. Foram priorizados os diferentes contextos e
significados das duas deficiências abordadas, considerando a realidade de cada entrevistado.
Quanto ao método, a presente pesquisa é de natureza qualitativa e possui um caráter
exploratório. Além disso, caracteriza-se em seu delineamento como um estudo de caso. O
instrumento de coleta de dados utilizado foi uma entrevista semi-estruturada. Selecionamos
três deficientes sendo dois visuais e um auditivo. Os resultados apontaram que mesmo sendo a
deficiência um fator limitador bastante significativo, os sujeitos entrevistados desta pesquisa,
não se deixaram determinar por sua condição de deficientes, demonstrando ter total
consciência de sua condição e suas limitações, sendo assim, sabem que para alcançar seus
objetivos precisam de muita dedicação e capacitação nas áreas que escolheram para atuar
dentro do mercado de trabalho. Conclui-se que para os três sujeitos abordados, há uma
singularidade no que tange à escolha profissional, ou seja, todos tiveram oportunidade de
trabalhar com clareza sua própria identidade de cego e surdo, mediados por suas vivências
familiares que permitiram e apoiaram sua escolaridade inicial para uma integração social, com
o intuito de favorecer sua inclusão. Também a forma como se constituíram, favoreceu
positivamente seus interesses pessoais. Ficou claro também a diferença de percepção no que
se refere às barreiras operacionais mais significativas para cada deficiência. Levanta-se, por
fim, que o determinismo vivencial dado como inerente a todos os deficientes, não acontece.
Sua condição limitadora pode ser superada a partir de sua criação, suas vivências, suas
necessidades e seus objetivos pessoais.

Palavras-chave: deficiência, identidade profissional; mercado de trabalho; formação para o


trabalho.
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AGRADECIMENTOS

Para a elaboração desse trabalho contei com o apoio de diversas pessoas, entre elas
familiares, amigos, professores e colegas.
Ao meu pai, Vincenzo, in memoriam, pelos valores que me ensinou.
A minha mãe, Marisa, pelo apoio incondicional.
Ao meu marido e companheiro, Fernando, pelo incentivo, pela compreensão dos meus
momentos de ausência e de intolerância, que juntamente com minha filha, Roberta, foram de
incansável entendimento.
E a toda família por terem acreditado em mim.
Aos amigos queridos, que tanto torceram por minha vitória.
Aos professores, em especial ao Adriano que fez nascer dentro de mim a vontade de
explorar o respectivo tema. Flávio por ter me compreendido em todos os momentos difíceis
no decorrer desse trabalho e por ter se tornado mais do que um professor, um amigo.
Vanderlei, por sua orientação e por ter acreditado em meu potencial desde a segunda fase.
Iúri, assim como os demais, por ter me feito visualizar a profissão em busca de um
aperfeiçoamento profissional. A todo corpo docente, muito obrigada!
Aos colegas, por todo o apoio, incentivo, credibilidade durante todo o curso.
5

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 6
1.1 PROBLEMÁTICA .......................................................................................... 7
1.1.1 Problema ...................................................................................................... 11
1.2 JUSTIFICATIVA ...................................................................................................... 12
1.3 OBJETIVOS ...................................................................................................... 15
1.3.1 Objetivo Geral ...................................................................................................... 15
1.3.2 Objetivos Específicos .......................................................................................... 15
2 REFERENCIAL TEÓRICO .............................................................................. 16
3 MÉTODO ................................................................................................................. 20
3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA .................................................................. 20
3.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA .............................................................................. 20
3.3 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ....................................................... 20
3.4 PROCEDIMENTOS DE COLETA ................................................................... 21
3.5 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE ................................................................... 21
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS ....................................................... 22
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 38
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 41
APÊNDICE ................................................................................................................... 43
ANEXO A ................................................................................................................... 44
ANEXO B ................................................................................................................... 45
ANEXO C ................................................................................................................... 46
6

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho teve como objetivo investigar se a deficiência foi fator


determinante ou limitador para a escolha profissional de pessoas com deficiência. Além disso,
pretendeu também contribuir com uma ampliação de conhecimentos acerca da questão da
profissionalização do deficiente. No trabalho constam cinco capítulos onde perpassam
revisões conceituais no campo teórico científico intercalando a temática com diversas
definições, dados e argumentos teóricos sobre a questão da deficiência e suas perspectivas.
Os autores que utilizamos para fundamentar o presente trabalho abarcam conteúdos e
descrições de diversos momentos e situações históricas da deficiência, como por exemplo:
Mazzotta (2001), Tanaka e Manzini, 2005, Amaral (1996) e Aranha (1995), foram alguns
destes autores. Além de Bastos (2002) e Bock (2002) que utilizamos para dar fundamentação
aos conceitos de projeto profissional e orientação profissional, que são alguns dos conceitos
fundamentais que compõem o presente trabalho. Em Mendes et al., (2004) e Neri (2003),
obtivemos apoio para fundamentar a análise das categorias encontradas nas falas dos
entrevistados e em nossas considerações finais.
A pesquisa foi fomentada com a leitura de textos e obras reconhecidas nas áreas da
psicologia, da educação especial e da legislação. O método utilizado caracteriza-se em seu
delineamento como um estudo de caso. Além disso, tratou-se de uma pesquisa de natureza
qualitativa com caráter exploratório. A análise de dados foi organizada por categorias
construídas a priori, baseadas nos objetivos específicos, que representam as principais
características do posicionamento dos deficientes frente aos seus objetivos profissionais e as
barreiras existentes no mundo do trabalho. Por fim são apresentadas nossas considerações
finais acerca dos resultados da pesquisa.
7

1.1 PROBLEMÁTICA

A questão da deficiência vem tomando cada vez mais espaço na sociedade atual como
tema certo em debates nas áreas da educação, da política, empresarial e até mesmo na mídia.
A Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, vide anexo A, que define o percentual de
até 20% de vagas para pessoas com deficiência em concursos públicos e a Lei nº 8.213, de 24
de julho de 1991 dispõe sobre os planos e benefícios da previdência, prevê uma cota
percentual de vagas nas empresas proporcional ao número de funcionários, variando de 2% a
5% para empresas privadas com mais de 100 funcionários, na tentativa de garantir, assim, um
espaço no mercado de trabalho, mesmo que obrigatoriamente, para pessoas com deficiência.
BRASIL (apud TANAKA E MANZINI, 2005). Também, na área educacional, a atual Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996) garante
vagas no ensino regular a partir da educação infantil, prevendo a compra de vagas pelos
governos em escolas especiais e instituições privadas sem fins lucrativos.
Contudo, o que se percebe cotidianamente é a grande dificuldade que as pessoas com
deficiência ainda enfrentam para fazer valer os seus direitos, ou seja, para uma efetiva prática
dessas leis, assim como a necessidade de estar sempre reforçando sua identidade como um ser
humano potencialmente atuante na sociedade.
No Brasil, o número de alunos que ingressam no Ensino Superior ainda é baixo, e os
últimos dados oficiais quanto ao número de alunos deficientes que conseguem chegar às
universidades, comprovam a mesma estatística, conforme vemos nas tabelas a seguir:
8

Fonte: Secretaria de Educação Especial / Coordenação Geral de Planejamento. Ministério da Educação


– Governo Federal, 2006.

Como se pode perceber na tabela acima, a grande concentração de matrículas se dá


para o Ensino Fundamental e há uma queda bastante acentuada nos níveis de ensino maiores.
Se compararmos, em termos absolutos, os números das matrículas de Ensino
Fundamental (419.309 em 2005) com os das matrículas no Ensino Superior da tabela a seguir
(5.392 em 2004) percebe-se quão discrepante é essa passagem dos níveis mais básicos da
educação para o Ensino Superior.
No quadro que segue, é possível verificar a evolução de matrículas de alunos com
necessidades educacionais especiais – N.E.E., no ensino superior no período de 2003 e 2004.
9

Fonte: Secretaria de Educação Especial/Coordenação Geral de Planejamento. Ministério da Educação


– Governo Federal, 2006.

Entre os anos 1999 a 2004 diversas leis e instruções normativas, que estabeleciam
procedimentos a serem adotados pela fiscalização do trabalho referentes à Lei de Cotas, foram
regulamentadas, mas foi a Portaria GAB/DRT/SP nº 700, de 10 de setembro de 2004, que
viabilizou a política de parcerias, fornecendo assim, as ferramentas necessárias para a
obtenção de resultados positivos na área. (RODRIGUES, 2005, p.17)
Partindo do princípio de que a educação é um processo de interação social, as
dificuldades encontradas pelas pessoas com deficiência no campo da educação e
aprendizagem contribuem para um atraso em seu desenvolvimento educacional e
conseqüentemente leva-os tradicionalmente a ocuparem cargos de baixa qualificação e
remuneração. Quando não conseguem ingressar no mercado de trabalho, acabam tendo que
10

recorrer ao Seguro Social, o que reforça a imagem de pessoas dependentes e incapazes.


(TORRES, 2002)
São vários os fatores que corroboram para este quadro. De acordo com Tanaka e
Manzini (2005), estão entre as principais questões: fatores individuais, fatores sócio-
econômicos, o despreparo das instituições de ensino nas questões de acessibilidade, a falta de
educadores capacitados especificamente para o atendimento às necessidades básicas de ensino
para pessoas com deficiências, como também a questão da superproteção familiar. Neste
último caso, quando há superproteção familiar, hoje a maioria dos pais percebe que seus
filhos podem e devem ter a oportunidade de um desenvolvimento psíquico e físico semelhante
a qualquer pessoa. No entanto, os pais tentam prevenir o provável sofrimento causado pela
discriminação social e a necessidade de superação das barreiras inerentes a sua condição, tais
como as barreiras atitudinais, as arquitetônicas, as educacionais, dentre outras, o que acaba
fazendo com que essas pessoas mantenham-se em uma posição de incapacidade e fragilidade
que nem sempre condiz com sua realidade. (Informação Verbal)1
De acordo com Ciampa

Interiorizamos aquilo que os outros nos atribuem de tal forma que se torna algo
nosso. A tendência é nós nos predicarmos coisas que os outros nos atribuem. Até
certa fase esta relação é transparente e muito efetiva; depois de algum tempo, torna-
se mais seletiva, mais velada (e mais complicada)”. Assim, o ser humano desenvolve
suas habilidades, sua personalidade, suas atitudes na relação com o outro, e esta
relação está mediada pela sociedade. (apud BOCK, 2002, p.71).

Vivendo em sociedade, exercendo uma profissão ou mesmo uma função, a pessoa com
deficiência pode ser capaz de garantir seu próprio sustento e, por conseqüência, experimentar-
se como cidadã, mesmo que enfrentando possíveis frustrações com as escolhas profissionais e
pessoais, ao mesmo tempo possibilitando uma efetiva integração na sociedade com sua
autonomia, respeitando e sendo respeitada em todas as suas vivências. Cabe dizer que, de
acordo com Wilke (2004), é necessária a percepção de que a integração passa por um
movimento individual, tenha a pessoa deficiências ou não, ou seja, a integração é própria do
sujeito frente ao seu contexto de vida e a uma possibilidade de sua autonomia, sendo assim, a
pessoas pode mover-se com certa independência em atividades do seu cotidiano, promovendo
meios de sobreviver e de integrar-se através do trabalho, garantindo assim seu próprio

1
Comentário de Adriano Henrique Nuernberg em aula na Universidade do Sul de Santa Catarina, durante o
semestre letivo de 2006.1, na disciplina de Psicologia e Educação Especial.
11

sustento, engajando-se na sociedade a qual pertence. Contudo, cabe a sociedade o papel de


democratizar tais ideais em todos os âmbitos, tanto políticos como sociais.
Já quanto à inclusão, pode-se dizer que esta é um movimento exterior, ou seja, ação do
“mundo” que cerca o indivíduo sobre ele, fornecendo as condições necessárias para que ele
construa a sua vida.
Segundo Werneck (2000), integrar e incluir são sinônimos no dicionário, porém,
quando se trata das pessoas com deficiência, essas palavras apresentam idéias diferentes sobre
as formas de inserção social. A política de integração prevê a capacitação das pessoas com
deficiência e tem como objetivo, torná-las apta a conviver em sociedade.
O conceito de sociedade inclusiva ganha força a partir da década de 80 e defende uma
proposta radical. Propõe que todas as pessoas até então excluídas, não apenas as que têm
algum tipo de deficiência, sejam inseridas a sociedade. Esta deverá passar por transformações
como uma prática da ética da diversidade, que se apóia na certeza de que a humanidade detém
infinitas formas de se manifestar.
Em suma, não basta freqüentar uma escola, exercer uma função ou transitar em
espaços públicos para que haja inclusão, nem tampouco a existência pura e simples de leis
relativas à questão; uma mudança de atitude faz-se necessária por parte das pessoas, além da
percepção de que há diferenças, mas que estas, mesmo que não desejadas, são cabíveis em
nossa sociedade. Segundo Amaral, “pode-se pensá-las de forma inovadora, não mais e
somente como patologia – seja individual ou social – mas como expressão da diversidade da
natureza e da condição humana, seja qual for o critério utilizado” (AMARAL, 1996, p. 6).
Diante do acima exposto, o presente trabalho propôs como problema de pesquisa:

1.1.1 Problema
Qual a percepção de pessoas com deficiência auditiva e visual sobre a relação entre suas
deficiências e escolhas profissionais?
12

1.2 JUSTIFICATIVA

No decorrer do século XX assistiu-se a uma busca pela especificidade profissional


para a entrada das pessoas no mercado de trabalho, ou seja, uma tentativa cada vez maior de
especializar cada sujeito para ocupar os diversos postos de trabalho. Ainda que o modelo
toyotista tenha questionado a especialização, propondo a polivalência de funções, ainda se
percebe uma forte tendência no mercado de trabalho de buscar “pessoas certas para ocupar os
lugares certos”.
Paralelamente a este fato, surge uma lei que obriga as empresas a terem deficientes em
seu quadro de funcionários, mas que durante muito tempo só era cumprida mediante
fiscalização do Ministério Público do Trabalho – MPT, que estabeleceu punições às empresas
que não cumprissem a lei de cotas. Dessa forma, cresceu a oferta de vagas a serem ocupadas
por pessoas com deficiência nas empresas, ainda que usem afirmações como: "Não queremos
contratar portadores de deficiência só para cumprir a cota. Queremos poder incluir esse
pessoal em qualquer área do banco em que eles se sintam úteis." (FERNANDES e ROLLI,
2006, p.B1), onde a ênfase na questão da utilidade prepondera e “coloca-se o deficiente em
qualquer lugar” devido à obrigatoriedade legal.
Durante toda a história da deficiência no mundo, pode-se dizer que a pessoa com
deficiência passou de uma posição de insignificância total, para uma de dependente que só
causava prejuízo à sociedade como um ser não-produtivo, até os dias de hoje, quando mesmo
sendo valorizado como aquele que consegue superar suas limitações, ainda é visto como um
problema, um peso para a sociedade. Isto acontece principalmente em países do terceiro
mundo onde a exclusão e a desigualdade social são características mais marcantes, pois seus
recursos públicos são mais restritos e sua economia se move de maneira incerta causando
assim, uma instabilidade sócio-econômica inquietante.
Quanto ao trabalho, é importante que as pessoas possam fazer suas escolhas, ter a
opção de se especializar em áreas específicas, como também conquistar o direito de exercer
funções dentro do mercado de trabalho mediante seus desejos ou necessidades pessoais, e não
somente para que a empresa possa cumprir uma cota obrigatória pré-determinada. De fato, um
indivíduo não precisaria necessariamente trabalhar somente nas áreas ou setores em que se
sentiria útil, menosprezando suas potencialidades, seja ele deficiente ou não.
Neste sentido, a Orientação Profissional desempenha um papel bastante relevante e
atual em nossa sociedade, atuando como agente facilitador no processo de escolha
profissional, tenha o sujeito, deficiência ou não. Emprega seus conceitos não somente para
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auxiliar na escolha da carreira, mas também com o intuito de promover uma visão mais
abrangente quanto às dificuldades e possibilidades do mercado de trabalho, levando o sujeito
a ampliar as possibilidades de um projeto pessoal e social, sendo a escolha individual, seu
espaço transformador.(BASTOS, 2002)
Segundo Bock (2002), até pouco tempo atrás, para a humanidade, o trabalho era
vinculado a funções que tinham como fim a subsistência. A diferenciação do trabalho, dava-se
por gênero e classe social e descendência, sendo assim, por exemplo, filhos de artesãos
aprenderiam com seus pais a arte do artesanato e a levariam pela vida até seus filhos e assim
por diante. Somente após a Idade Média, com o fim do feudalismo e os primeiros passos do
capitalismo, é que a escolha profissional torna-se possível entre os trabalhadores. A
Revolução Industrial promove uma divisão técnica do trabalho em busca do perfil certo de
pessoa para cada função com o objetivo de aumentar a produtividade no meio de produção
capitalista.
Com a finalidade de se compreender um pouco mais sobre a relevância da escolha
profissional na atualidade, é importante entender algumas concepções referentes às teorias em
orientação profissional que Bock (2002) assim classifica:

- Teorias tradicionais: todas se valem da noção de perfis, segundo a qual as escolhas


acontecem de um “casamento” ideal entre perfil pessoal (da personalidade do sujeito) e perfil
profissional. Tais teorias se pautam numa perspectiva liberal , atribuindo ao sujeito que
escolhe todo o poder e a responsabilidade pela escolha. “Na escolha profissional, espera-se
que o indivíduo estabeleça uma correlação entre si e os vários perfis ocupacionais disponíveis,
para que possa achar aquele que melhor se ajusta à sua pessoa” (BOCK, 2002, p.45).
- Teorias críticas: retiram todo o poder de escolha do sujeito afirmando o seu
pertencimento a uma classe e com isso afirmam ser impossível uma escolha já que todas as
pessoas reproduzem o seu destino de classe, reforçados pelos aparelhos ideológicos de
Estado. Não é possível escolher profissão. “Na perspectiva crítica, é a estrutura social e
econômica que explica o posicionamento da pessoa na sociedade, empurrando-o para um lado
ou outro”(BOCK, 2002, p. 60).
- Na teoria sócio-histórica, mesmo concordando-se com as críticas feitas aos aspectos
ideológicos que dificultam a superação da condição de classe por parte dos sujeitos na escolha
de suas profissões, a escolha é vista como possível, respeitadas as condições materiais e
considerando a realidade concreta de cada sujeito.
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Mediante este quadro, foi possível perceber a necessidade de ser feito um


levantamento sobre as reais expectativas desses sujeitos em relação ao seu futuro profissional,
levando em consideração as limitações impostas pela deficiência, as próprias expectativas e as
exigências do mercado de trabalho, para que se possam pensar ações efetivas (coerentes com
as concepções sócio-históricas que prevêem o conhecimento do contexto dos sujeitos) nos
métodos de orientação profissional, que favoreçam, por sua vez, a inserção das pessoa com
deficiência no mercado de trabalho.
15

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo Geral

- Compreender, na percepção da pessoa com deficiência, qual a relação da deficiência com a


definição de seus projetos profissionais.

1.3.2 Objetivos Específicos

- Verificar os posicionamentos das pessoas com deficiência sobre suas condições


profissionais.
- Identificar a percepção dos sujeitos da pesquisa com referência às exigências profissionais
do mercado de trabalho.
- Verificar, na perspectiva da pessoa com deficiência, se esta interfere no processo da escolha
profissional.
- Identificar, caso ocorra a interferência da deficiência no processo de escolha profissional dos
sujeitos investigados, como esta acontece.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO

De acordo com Aranha (1995), em termos históricos2 podemos dizer que a agricultura,
a pecuária e também o artesanato eram as bases da economia na antiguidade. Os donos de
terras produtivas e dos rebanhos eram representados pelos senhores membros da nobreza, os
demais indivíduos, ou seja, os não senhores ou subumanas como eram considerados,
trabalhavam na produção dos bens destes senhores. A deficiência não era considerada como
um problema visto que crianças nascidas com anomalias eram abandonadas.
Durante a Idade Média, o Cristianismo concede ao deficiente um status humano e
como tal dotado de uma alma. A partir desta nova visão as pessoas com deficiência não eram
mais exterminados, a Igreja e os familiares deveriam se responsabilizar por sua custódia,
porém os deficientes ainda sofriam com a intolerância da sociedade.
No final do século XV e o início da Revolução Burguesa, o clero traz uma nova visão
de homem e sociedade. É o fim da Inquisição Católica e da Monarquia, o capitalismo
mercantil surge como novo método de produção onde os operários passam a vender sua força
de trabalho. Os deficientes são vistos neste momento, como não produtivos e dependentes
totais de seus mantenedores gerando prejuízo à sociedade.
De acordo com Pessotti (apud ARANHA, 1995), a partir de Paracelso, Cardano e
Willis, há uma leitura organística favorecida pelo avanço da medicina, que pressupõe a
deficiência como um problema médico e não mais como uma condição divina, sendo assim,
surge o primeiro hospital psiquiátrico que mais serviam para afastar o deficiente de uma
sociedade incomodada com sua presença, do que propriamente para tratá-los.
Nos séculos seguintes o meio de produção capitalista ganha força, assim como o
sistema de valores e as normas sociais que acabam desenvolvendo uma atitude de
responsabilidade pública pelas necessidades do deficiente, porém ainda cabe ao setor privado
o papel de financiar grande parte das instituições de apoio.
Com a chegada do século XX e o capitalismo moderno, surgem os grandes capitalistas
que passam a determinar o perfil do trabalhador que a empresa precisa para alcançar seus
objetivos e aumentar seu capital, porém a visão que se tem das pessoas com deficiência
permanece negativa, ele ainda é visto como não-produtivo. Isso fica mais claro se pensarmos
nas pesquisas de Taylor ao medir o tempo das ações das pessoas nos processos de trabalho,

2
Com o propósito de resgatar o processo de constituição histórica desta relação de equivalência entre quem tem
valor ou não dentro do sistema, apresentaremos um resumo com dados históricos sobre este movimento pela
integração do deficiente levando-se em consideração as diferentes características que influenciaram cada
momento histórico.
17

conseguindo com isso implementar um padrão de eficiência dos empregados para a empresa.
Evidentemente que tais padrões levam em consideração as pessoas com o melhor desempenho
nas tarefas e, neste sentido, as pessoas com deficiência estariam em clara desvantagem e por
isso descartadas.
O século XX foi repleto de fatos e conflitos decisivos para a humanidade, como as
duas grandes guerras, que tiveram como saldo das batalhas um grande número de soldados
feridos e com deficiências físicas que necessitavam de assistência e treinamento especializado
para que pudessem reintegrar-se a sociedade com uma ocupação rentável dando-lhes
condições de conquistarem uma existência o mais próximo possível da normalidade, de
acordo com a sociedade em que viviam. Surgiram também modelos diversos de leituras sobre
a deficiência, como o modelo metafísico que coexistia com o modelo médico, o modelo
educacional, o modelo da determinação social e no final desse século, o modelo sócio-
construtivista ou sócio-histórico. Sendo assim, pode-se afirmar que a natureza do fenômeno
ainda é sócio-político-econômica, mesmo sua leitura sendo feita em diferentes dimensões e
aparentemente desvinculadas desta realidade, e foi neste contexto, principalmente após as
duas grandes guerras que a questão da integração social do deficiente começou efetivamente a
ser tratada com seriedade.(ARANHA, 1995, p.67)
Segundo Mazzotta (2001), as experiências européias e norte-americanas do século
XIX influenciaram alguns brasileiros a tomarem iniciativas para implantação de organizações
com serviço de atendimento a cegos, a surdos, a deficientes mentais e físicos.
De 1854 a 1956, a partir de iniciativas oficiais e particulares isoladas, educadores
mais interessados iniciaram o atendimento educacional dos deficientes, mais especificamente
em 12 de setembro de 1854 quando o Imperador D. Pedro II com o Decreto Imperial nº 1428,
fundou na cidade do Rio de Janeiro o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, mais tarde
Instituto Benjamin Constant – IBC. Em 26 de setembro de 1857, D. Pedro II fundou o
Imperial Instituto dos Surdos-mudos pela Lei nº 839, mais tarde Instituto Nacional de
Educação de Surdos - INES que desde a sua fundação dedica-se também a educação literária e
ao ensino profissionalizante com meninos surdos de 7 à 14 anos.
Tanto no Instituto Benjamin Constant – IBC, como no Instituto Nacional de Educação
de Surdos – INES, foram criadas oficinas para a aprendizagem de ofícios como tipografia e
encadernação para meninos cegos e tricô para as meninas, e para os meninos surdos foram
criadas oficinas de sapataria, encadernação, pautação e douração. No ano de 1882, o
Imperador convocou o 1º Congresso de Instrução Pública que ocorreu em 1883 e um dos
temas era a sugestão de currículo e formação de professores para cegos e surdos.
18

De acordo com Mazzotta (2001), até 1950 o número de instituições de ensino regular
para deficientes mentais mantidos pelo poder público chegava a 40, sendo 39 estaduais e 1
federal e mais 14 para alunos com outras deficiências sendo 1 federal, 9 estaduais e 4
particulares. Em Santa Catarina no município de Joinville, temos o Colégio dos Santos Anjos
de ensino regular particular fundado em 1909 com atendimento a deficientes mentais, sendo
um dos que se destacam entre os cinqüenta e quatro estabelecimentos de ensino regular e as
onze instituições especializadas.
No período de 1957 a 1993 com iniciativas oficiais de âmbito nacional, o governo
federal assumiu o atendimento educacional para pessoas com deficiências, criando campanhas
específicas como a da Educação do Surdo Brasileiro - C.E.S.B., pelo Decreto Federal nº
42.728 de 03 de dezembro de 1957 que instalada no INES, tinha como fim viabilizar a
educação e assistência em todo território nacional.

É preciso salientar que as principais propostas e planos mantêm-se numa abordagem


reducionista, interpretando a Educação Especial como questão meramente
metodológica ou de procedimentos didáticos. E, nesse sentido, cabe lembrar que a
Educação Especial não deve ser entendida como simples instância preparadora para
o ensino comum, embora se deseje que o maior número possível dos alunos possa
dele se beneficiar. (MAZZOTTA, 2001, p.200).

Hoje, já se podem encontrar diversas organizações que têm como prioridade a imersão
de pessoas deficientes nas instituições de ensino e no mercado de trabalho. Algumas dessas
organizações desenvolvem estudos e projetos que facilitam a inserção social e econômica das
pessoas com deficiências, como a Acessibilidade Brasil que é uma Organização da Sociedade
Civil de Interesse Público - OSCIP,

[...]constituída por especialistas da área de educação especial, professores,


engenheiros, administradores de empresas, arquitetos, desenhistas industriais,
analistas de sistemas e jornalistas, que têm como interesse comum o apoio, ações e
projetos que privilegiem a inclusão social e econômica de pessoas portadoras de
necessidades especiais. (ACESSIBILIDADE BRASIL, out. 2006).

Outro exemplo é o Portal da Câmara dos Deputados (Federal) que tem como um de
seus links a Acessibilidade no Portal, que informa sobre a possibilidade das pessoas com
deficiência utilizarem os meios de informação e comunicação através da internet, de forma
equivalente às demais pessoas. “Mais concretamente, significa uma Web projetada de modo a
que estas pessoas possam perceber, entender, navegar e interagir de uma maneira efetiva com
a Rede Mundial de Computadores, bem como criar e contribuir para com o seu conteúdo”
(BRASIL, Portal da Câmara, out. 2006).
19

Em Santa Catarina, temos a Rede Catarinense de Empregabilidade Especial – RCEE,


que é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, fundada por 33 instituições
com a participação do Estado, de empresas e da sociedade civil organizada. Tem como foco
construir e compartilhar conhecimento com a sociedade, propor e realizar ações efetivas
voltadas para inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, divulgando
gratuitamente as oportunidades de trabalho, renda e captação das pessoas com deficiência,
gerando assim uma base qualificada de currículos e oportunidades através do Portal de
Oportunidades que está disponível em seu sítio. (RCEE, out. 2006)

Promover saúde significa compreender e trabalhar com o indivíduo a partir de suas


relações sociais; significa trabalhar estas relações construindo uma compreensão
sobre e a sua transformação necessária. Promover saúde significa trabalhar para
ampliar a consciência que o indivíduo possui sobre a realidade que cerca,
instrumentando-o para agir, no sentido de transformar e resolver todas as
dificuldades que essa realidade lhe apresenta. AGUIAR & BOCK (Apud BOCK,
2002, p. 75).
20

3 MÉTODO

3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA

A presente pesquisa é de natureza qualitativa e possui um caráter exploratório. Além


disso, caracteriza-se em seu delineamento como um estudo multi-casos.
De acordo com Chizzotti (1998), a pesquisa qualitativa descreve o sujeito através do
método histórico-antropológico, que avalia dados e acontecimentos vivenciados pelo sujeito,
de acordo com seu contexto cultural. O objeto de estudo não é inerte ou neutro, mas está
permeado de significados que surgem para esse sujeito nas relações com o mundo que o
cerca.
A pesquisa exploratória não traça relação entre variáveis e segundo Gil (1991), tem
como objetivo principal ampliar a familiaridade com o problema em seus variados aspectos.
O estudo de caso tem como característica, compreender o fenômeno através de um
estudo amplo e detalhado. Pode ser visto como técnica psicoterápica, como método didático
ou como método de pesquisa que é o de define nosso trabalho. (GIL, 1991, p.59)

3.2 POPULAÇÃO E AMOSTRA

Tratando-se de um estudo de casos, constituem-se como unidades-caso desta pesquisa


três pessoas com deficiências congênitas, sendo duas deficientes visuais e uma com surdez.
Duas das pessoas selecionadas para o estudo possuem algum tipo de trabalho e uma delas é
estudante universitária que não trabalha atualmente.

3.3 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

O instrumento de coleta de dados utilizado foi uma entrevista semi-estruturada. Vide


apêndice.
21

3.4 PROCEDIMENTO DA COLETA DE DADOS

Primeiramente foi feito contato com os possíveis participantes da pesquisa para


explicação dos objetivos da mesma, sua disponibilidade em participar das entrevistas, já que
seriam gravadas e transcritas e também para marcar o local, data e horário para que as
entrevistas fossem realizadas.
No primeiro momento da entrevista foi apresentado o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido, para que então, sob sua concordância e assinatura, as entrevistas acontecessem.
Cabe ressaltar que nas três entrevistas, o referido Termo foi lido para os dois deficientes
visuais pela entrevistadora e para o deficiente auditivo foi lido e interpretado pela intérprete
ao entrevistado a pedido da entrevistadora.

3.5 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Realizadas as entrevistas, foi feita a transcrição das mesmas para que se pudesse
selecionar as partes dos discursos dos entrevistados que melhor respondessem as categorias
pré-estabelecidas de acordo com os objetivos da pesquisa. Após a seleção do material foi feita
a análise de conteúdo, que constitui o método adotado para a interpretação dos dados.
Com base na análise de dados, propôs-se responder à pergunta que orienta essa
pesquisa.
22

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Neste momento da pesquisa será feita a análise dos dados coletados por meio das
entrevistas feitas, buscando-se fazer o cruzamento entre as variáveis que interferem na escolha
profissional diante da problemática da deficiência e relacionando, quando possível, tais dados
com o referencial teórico.
É importante ressaltar que por motivos éticos, os nomes citados nos relatos das
análises são fictícios, com o intuito de preservar a identidade dos entrevistados.

Caracterização geral dos três sujeitos entrevistados:

Sujeito 1, sexo feminino, com 24 anos de idade;


Entrevista realizada dia 04/04/2007.
Renata tem cegueira congênita (glaucoma), que foi identificada na infância, seu processo
foi gradativo, porém a cegueira total veio ao longo de sua vida acadêmica. Atualmente,
Renata é universitária, não trabalha, é solteira e reside na casa dos pais em
Florianópolis.

Sujeito 2, sexo masculino, com 37 anos de idade;


Entrevista realizada dia 11/04/2007.
Paulo tem cegueira congênita. Nasceu cego, aos 7 anos recuperou parte da visão, teve
baixa visão e aos 18 anos teve perda total. A causa patológica é seqüela de rubéola.
Atualmente, Paulo é professor de filosofia, atua como instrutor musical em uma
comunidade carente de Florianópolis, é casado e pai de 1 filho.

Sujeito 3, sexo masculino, com 24 anos de idade.


Entrevista realizada dia 24/04/2007.
Rodrigo tem surdez congênita. Nasceu com surdez total, e sua entrevista foi feita com a
mediação de sua mãe (seus pais hoje, trabalham como intérpretes para pessoas com
deficiência auditiva) e também de uma intérprete amiga da família que alfabetizou
Rodrigo aos 17 anos. Atualmente, ele também atua como intérprete na associação dos
surdos em São José, é solteiro e reside na casa dos pais.
23

A apresentação dos dados obedecerá a seguinte sistemática:

- Nos quadros a seguir, à esquerda, estão relacionadas as categorias de análise que foram
elaboradas a partir dos objetivos específicos da pesquisa.
- À direita, estão os recortes feitos a partir da fala dos entrevistados que estão diretamente
relacionados com as categorias selecionadas e ao final de cada recorte, consta o nome
fictício do entrevistado em questão.
- Em determinados momentos, fez-se necessária a menção de ressalvas no discurso dos
entrevistados para melhor entendimento. Tais ressalvas, feitas pela pesquisadora, estão
entre colchetes [ ], para reconhecimento do leitor. Além disso, cabe dizer que se buscou
manter o discurso dos entrevistados da maneira original como foi expresso durante as
entrevistas e, portanto, as falas dos entrevistados foram mantidas de acordo com as suas
próprias expressões. Esclarece-se, contudo, que as falas mesmo que possuam problemas
quanto às regras da língua portuguesa, não foram identificadas com a expressão “sic”.
- Na análise dos dados será apresentada a seguinte sistemática: serão destacadas em negrito
as falas que correspondem às subcategorias de análise após cada quadro.
24

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Em primeiro lugar uma independência financeira;
(Renata)
- O trabalho é uma das formas da gente poder estar
- sobre a importância do dizendo que é igual a todo mundo; (Renata)
trabalho - E também porque tem a necessidade de se sustentar; e de
se manter; (Renata)
- Penso que através do trabalho que você garante alguma
coisa, primeiro é a subsistência, uma subsistência com
mais dignidade; (Paulo)
- Você pode através do trabalho planejar a sua própria
vida, dar rumo, dar direção a sua própria vida, e o
trabalho, ele resgata a auto-estima; (Paulo)
- O trabalho, ele reforça a nossa identidade. (Paulo)
- O trabalho é importante para poder viver, trabalhar e
ganhar dinheiro, para poder sair e comprar o que quer.
(Rodrigo)

A categoria denominada “sobre a importância do trabalho” foi construída lavando-se


em consideração o objetivo específico que pretende verificar os posicionamentos das pessoas
com deficiência sobre suas condições profissionais.
Verificamos no quadro acima que os três entrevistados têm a mesma compreensão
sobre a importância do trabalho, no que diz respeito aos aspectos financeiro e da subsistência.
Contudo, apenas Renata e Paulo fazem referência à importância da possibilidade de
construção de sua identidade. Por exemplo, quando Renata menciona o trabalho como
forma de ser “igual a todo mundo”, está implícita a noção de afirmação de uma identidade por
meio do trabalho. Assim como Paulo fala que o trabalho garante “uma subsistência com mais
dignidade” e “resgata a auto-estima”, deixando clara a noção de qualificação do sujeito.
Conforme Jannuzzi (apud MENDES et al., 2004), “a ausência da possibilidade de trabalho
para o deficiente aumenta sua exclusão, acentuando, então, sua subordinação aos outros,
esmaecendo a própria identidade, tornando-o aquele que precisa emprestar a voz de outrem
para se fazer ouvir” (p.22).
Rodrigo ao mencionar “poder sair e comprar o que quer”, demonstra que tem o trabalho
como uma forma de ajustamento social e pessoal quando enfoca sua importância material.
25

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Quando eu pensei em fazer, é para estar colaborando
com as pessoas que perderam a visão, principalmente as
que nunca tiveram contato com pessoas cegas, como fica o
psicológico delas; (Renata)
- sobre a interferência da - Eu nunca pensei que por ser cega não conseguiria
deficiência na escolha [trabalhar como psicóloga]; (Renata)
profissional - Agora que tu me fez a pergunta eu percebi que nunca
achei que [a deficiência] seria um empecilho; (Renata)
- Devido a pouca adaptação dos vários espaços de
trabalho, a gente, na minha opinião, acaba optando por
algumas atividades que você teoricamente não precisaria
dessas adaptações; (Paulo)
- Eu optei em não ir para o ensino especial para ensinar
cegos, eu optei por tentar trabalhar com videntes, no
sentido de estar elaborando essa problemática da cegueira
de uma outra maneira, estar colocando a cegueira em uma
nova perspectiva. Não na perspectiva do limite, da
limitação, mas na perspectiva da possibilidade, propor
para as pessoas não parar na deficiência; (Paulo)
- Se eu nascesse ouvinte, ia dirigir avião, mas surdo não
pode, então por isso escolhi computador. (Rodrigo)

A categoria denominada “sobre interferência da deficiência na escolha profissional”


foi construída lavando-se em consideração o objetivo específico que pretende verificar, na
perspectiva da pessoa com deficiência, se esta interfere no processo da escolha profissional e
também identificar, caso ocorra a interferência da deficiência no processo de escolha
profissional dos sujeitos investigados, como esta acontece.
Ao observarmos esta categoria citada no quadro acima, é possível analisar que a fala
de Renata condiz com sua realidade, visto que sua cegueira, mesmo sendo congênita, não
impossibilitou muitas vivências de sua infância e juventude conforme relata em sua
entrevista: “eu não era vista como uma pessoa com deficiência, porque o meu médico disse
que eu tinha problema de visão, mas não disse que era a esse ponto [glaucoma congênito],
tipo, já sabia que eu tinha uma dificuldade grande, mas sabe, aquela coisa de esperança de que
um dia vai curar? Ainda mais de pai e mãe, então assim, eu não tinha a noção exata de que eu
era uma pessoa com deficiência, então eu fui tratada muito naturalmente. Brincava, andava de
bicicleta, subia em árvore”. Sendo assim, Renata teve a oportunidade de se experimentar
vidente durante seu processo de escolha profissional e, talvez por isso, tenha sido capaz de
visualizar sua trajetória profissional para exercer a profissão que escolheu. Esta observação
fica clara no momento em que diz “nunca pensei que por ser cega não conseguiria [ser
psicóloga]” ou ainda, “nunca achei que seria um empecilho [a deficiência]”.
26

Paulo, no entanto, vivenciou todas as dificuldades que a deficiência pôde impor, e


mesmo tendo escolhido fazer o que gosta, tem consciência de que poderia estar fazendo mais.
Mediante esta possibilidade, propõe que as pessoas devam tentar superar seus obstáculos
conquistando seu lugar na sociedade com dignidade e esta idéia fica clara quando afirma que
resolveu trabalhar com as pessoas cegas a possibilidade de uma nova perspectiva para a
cegueira que não a limitação. Averiguando a resposta de Rodrigo que afirma “ia dirigir avião,
mas surdo não pode”, evidencia-se a interferência da deficiência na escolha de sua profissão,
pois sua opção foi diretamente influenciada por sua condição de deficiente auditivo.

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Eu sentia dificuldade em preencher um recibo, estar na
frente de alguém e eu não admitir que não enxergava,
então o que eu fazia, eu deixava para fazer o recibo
depois; (Renata)
- Usava de artimanhas para disfarçar isso pelo fato de eu
- dificuldades/barreiras e não ter me aceitado; (Renata)
meios para superar a - Tem muitas barreiras de acessibilidade mesmo porque
deficiência nem todos os estabelecimentos estão preparados; (Renata)
- Nem toda empresa tem um sintetizador de voz que faça
essa ponte entre o computador e eu que sou cega; (Renata)
- Tem algumas burocracias no sentido do papel que teria
que ter “um olhinho” para estar ajudando; (Renata)
- Há o costume de pegar um bloquinho e estar fazendo
anotações ali, para nós não dá, quero dizer, fazer dá, mas
ler não dá; (Renata)
- As pessoas deixam [os deficientes] ali num cantinho e eu
não pude aprender porque as coisas não estão adaptadas
ou as pessoas não têm muito interesse; (Renata)
- Às vezes nem precisa muito gasto para adaptar [a
empresa], é mais um detalhezinho aqui outro ali; (Renata)
- As pessoas com deficiências reunidas em associações ou
individualmente, se capacitando, se preparando, e as
instituições se empresas, abrindo esse horizonte; (Renata)
- Porque que o cego está fora do mercado de trabalho?
Porque o empregador para na deficiência; (Paulo)
- É a questão da acessibilidade [maior barreira]; (Paulo)
- Não é mais o enfoque na questão do preconceito ou da
discriminação; (Paulo)
- Não há uma ação concreta, efetiva, para que ele possa se
desenvolver de acordo com as suas especificidades, e isso
acaba sendo um fator muito limitante; (Paulo)
- Você tem que se adaptar ao mundo que parece não ser o
seu, um mundo comum, convencional, é de todos, e você
tem que ingressar nesse mundo, acertar esse mundo, e
nem sempre a gente consegue; (Paulo)
27

- Para exercer a minha profissão por exemplo, eu tenho


que me adaptar a um diário de classe, que é a tinta, e não
tem como fazer, tem uns canhotinhos que é para entregar e
não tem como entregar em discket porque é o canhotinho
que serve, e nenhum dos meus recursos de adaptação
cabem na convencionalidade, e aí eu fico fora, fico
excluído do processo, então a acessibilidade é uma
questão bem profunda; (Paulo)
- Para conversar ele sinaliza que teria que escrever.
Mãe: Mas se você não conhece palavra?(refere-se a língua
portuguesa)
Rodrigo: Tem que chamar um intérprete. (Rodrigo)

A categoria denominada “dificuldades/barreiras e meios para superar a deficiência” foi


construída lavando-se em consideração o objetivo específico que pretende verificar os
posicionamentos das pessoas com deficiência sobre suas condições profissionais.
Verificamos que a barreira da acessibilidade, categoria trabalhada no quadro acima, é,
sem dúvida, a que mais impossibilita o dia-a-dia do deficiente. Segundo Renata, bastariam
pequenas modificações para a adaptação dos deficientes nas empresas: “é mais um
detalhezinho aqui outro ali”. Mas também uma mudança na visão das empresas em relação
ao potencial de mão-de-obra e capacidade de atuação do deficiente no mercado de trabalho.
Esta percepção está subentendida quando Renata fala que “as pessoas deixam [os deficientes]
ali num cantinho”. No entanto, para Paulo a luta contra o preconceito não deve ser mais o
foco e sim, dadas as especificações da deficiência, propiciar oportunidades de aprendizado
durante o desenvolvimento escolar, para que o deficiente possa ter as mesmas chances dos
demais. No seu comentário, não há uma ação concreta, efetiva, para que ele possa se
desenvolver de acordo com as suas especificidades. Paulo nos demonstra também a
facticidade da idéia de adaptação ao meio em que se vive, mencionando que “você tem que se
adaptar ao mundo que parece não ser o seu, um mundo comum, convencional, [que] é de
todos, e você tem que ingressar nesse mundo, acertar esse mundo”. Jodelet (apud
FERNANDES, 2001) enfatiza o fato de que, como ser social, o homem precisa ajustar-se ao
mundo em que vive, sobretudo para adequar-se a ele, no que se refere a comportamento e
sobrevivência. Isso implica uma busca contínua de informações sobre esse mundo,
informações essas que são de grande importância à vida cotidiana, na medida em que
instrumentalizam o indivíduo para o convívio em sociedade.
Existem diversas dificuldades para o desenvolvimento cultural do deficiente auditivo,
como por exemplo a linguagem. Deste modo, faz-se necessária a utilização de formas ou
sistemas culturais auxiliares. Rodrigo tem um vocabulário bastante restrito e por
28

conseqüência, dificuldade de compreender a língua portuguesa, sendo assim, demonstra que


na atualidade sempre se fará necessária a presença de um(a) intérprete, visto que a Libras –
Língua Brasileira de Sinais ou linguagem de sinais, é desconhecida para a maioria dos
demais, ou seja, os ouvintes. Há também, dificuldades para se encontrar intérpretes, pois é um
campo novo ainda não explorado. As empresas nem sempre irão se dispor a contratar um
segundo profissional, um intérprete, apenas como suporte para funcionários com deficiência
auditiva. Estes dados, tornam o acesso de pessoas com deficiência auditiva bastante restrito no
mercado de trabalho.
Podemos ainda marcar que a exclusão não se dá apenas pela falta de acesso e neste
sentido, a fala de Eizirik é bastante oportuna ao reforçar que

Os processos de exclusão são culturais, são acumulados, nunca vêm


sozinhos; desenvolvem-se e se reproduzem através do tempo, por
meio de um sem número de formas que se entrelaçam no tecido
social e se movimentam através das instituições, dos regulamentos,
dos saberes, das técnicas e dos dispositivos que se instalam na
cultura. (apud Quintão, s/d)

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- As coisas estão se ampliando, não digo que naturalmente,
ta se usando picareta para abrir esse horizontes; (Renata)
- As pessoas com deficiência estão procurando se
qualificar, pois eles [os empregadores] dizem que não tem
qualificação, e em parte estão certos; (Renata)
- como está o mercado de - Eles [os empregadores] pedem determinada capacitação
trabalho que sabe que não vai ter ninguém para preencher a vaga.
(Renata)
- Já avançou em alguns aspectos, mas eu penso que [o
mercado de trabalho] poderia ser ainda melhor. (Paulo)
-Tem muita gente fora do mercado, um pouco porque as
instituições, aí uma crítica, que trabalham com deficientes,
preparam os deficientes para um mercado que não existe,
sobretudo jovens. Eu não vejo sentido preparar os jovens
para o mercado de trabalho, trabalhando com ele por
exemplo, uma pessoa cega com intelectualidade
preservada, trabalhar artesanato, “cola tampinha aqui”, esse
mercado não existe, ele não vai chegar lá; (Paulo)
- Acho que tem que preparar para o mercado real, o
mercado que existe, então penso de uma maneira geral, que
as instituições devem se atentar para esse detalhe, de você
não trabalhar na virtualidade, eu vou preparar o cara para o
mercado de trabalho dando estímulos para ele trabalhar.
Ora, estímulo para trabalhar é trabalho; (Paulo)
29

- Eu acho que se deve ter essa coisa concreta, dar


preparação, capacitação profissional, mas uma capacitação
que realmente leve a pessoa a ingressar no mercado com
condições, e essas condições vai desde o entendimento da
própria condição, até a questão prática mesmo, de como
fazer determinadas coisas. (Paulo)
- Os ouvintes ganham mais, os cegos também, salário
igual, normal. O surdo ganha menos e precisa estudar mais.
(Rodrigo)

A categoria denominada “como está o mercado de trabalho” foi construída lavando-se


em consideração o objetivo específico que pretende identificar a percepção dos sujeitos da
pesquisa com referência às exigências profissionais do mercado de trabalho.
Observamos que Renata e Paulo têm a mesma idéia em relação a como está o mercado
de trabalho e aos seus avanços e conquistas, como também os obstáculos que os deficientes
vivenciam ao ingressar no mercado de trabalho que está cada vez mais competitivo para
todos. Temos como exemplo claro a fala de Renata quando diz que “as coisas estão se
ampliando, não digo que naturalmente, tá se usando picareta para abrir esses horizontes”, e
também quando Paulo menciona que “já avançou em alguns aspectos, mas eu penso que [o
mercado de trabalho] poderia ser ainda melhor”. Renata e Paulo concordam também que tais
avanços podem ampliar-se na medida em que o deficiente investir efetivamente em sua
capacitação. Renata afirma que as pessoas com deficiência estão procurando se qualificar e
Paulo fala que se deve dar: “preparação, capacitação profissional, mas uma capacitação que
realmente leve a pessoa a ingressar no mercado com condições”. As condições a que Paulo se
refere vão desde a capacitação para exercer determinadas funções, até a questão da
compreensão de sua própria condição, a de deficiente. Paulo ainda faz uma reflexão crítica
quanto às instituições que trabalham com capacitação de deficientes para o ingresso no
mercado de trabalho. Essa crítica refere-se ao fato de que algumas instituições preparam o
deficiente para um mercado restrito, sendo que as atividades ensinadas se restringem a tarefas
sem perspectivas de crescimento, com um claro sentido de limite, como se os deficientes não
tivessem capacidade para mais. Neri (2003), acredita que as políticas existentes que trabalham
com a inclusão, não procuram combater as causas da exclusão social, mas as conseqüências.
Temos como exemplo a baixa escolaridade, que em muitas situações impossibilita uma ação
mais efetiva do deficiente como um sujeito ativo dentro da sociedade em que vive. Para que
se modifique este quadro, são necessárias ações políticas que corroborem para uma oferta
qualificada de trabalho para deficientes no mercado de trabalho e ações complementares de
incentivo, com o intuito de motivá-los a viver com mais autonomia e independência.
30

A fala de Paulo expressa sua idéia explicitamente quando afirma que: “uma pessoa cega
com intelectualidade preservada, trabalhar artesanato, cola tampinha aqui, esse mercado não
existe, ele não vai chegar lá”, ou ainda quando diz: “vou preparar o cara para o mercado de
trabalho dando estímulos para ele trabalhar. Ora, estímulo para trabalhar é trabalho!”.
Observamos em Rodrigo, quando fala que “o surdo ganha menos e precisa estudar
mais”, que em relação ao mercado de trabalho, sua percepção limita-se a questão salarial e ao
esforço maior que o surdo deve fazer para conseguir um bom salário. Daí se observa a
importância do trabalho como instrumento de inserção e participação social para o
deficiente.

De acordo com Perosa (apud MENDES et tal., 2004):

Pessoas com deficiências que estão inseridas no mercado de


trabalho, atuando em situações semelhantes aos demais
cidadãos de sua comunidade, têm mais possibilidades de
expandir suas perspectivas de vida, inclusive sob o aspecto dos
relacionamentos sociais. Isto as diferencia sobremaneira
daqueles que continuam segregados em instituições ou escolas
especializadas, em condições de trabalho protegido, sendo
considerados incapazes e eternamente tutelados.

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- A [questão] que é mais relevante e mais discutida é a
questão das cotas... Precisa dessa questão das cotas, senão,
não se cumpre à lei, claro que seria melhor uma coisa
espontânea, mas sabe que não se tem, então é preciso
impor; (Renata)
- questão das cotas - Ela é necessária no momento que a gente se encontra,
porque se não houvesse, não seria possível as pessoas
estarem no mercado de trabalho em um número
satisfatório; (Renata)
- Precisa desse espaço para mostrar que tem condições,
que estamos nos qualificando, nos preparando, buscando
isso; (Renata)
- Tem pessoas que estão qualificadas, mas não estão tendo
essa oportunidade. (Renata)
- Conheço bastante a questão da legislação, mas eu penso
que ela não tem tido muita aplicabilidade, a fiscalização é
ineficiente (Paulo)
31

- Algumas empresas forjam pseudo deficientes para


cumprir a cota, e é assim, o cara tem 0,25 no olho e eles
colocam lá para cumprir a cota, e aí um cara que é cego tá
fora do mercado, e a gente sabe que tem essas burlas, por
conta de uma fiscalização ineficiente; (Paulo)
- Não se atribui o valor de importância realmente a essa
lei, não se atribui cobrança do resultado dessa lei; (Paulo)
- Eu acho que a lei em si é boa, só que ele precisa de um
exercício de execução; (Paulo)
- [sobre a existência das cotas] acha bom, para ter
trabalho, pois é importante ter trabalho, ter dinheiro. Nós
temos sonhos. (Rodrigo)

A categoria denominada “questão das cotas” foi construída lavando-se em


consideração o objetivo específico que pretende identificar a percepção dos sujeitos da
pesquisa com referência às exigências profissionais do mercado de trabalho.
Percebemos que nesta categoria, todos concordam sobre a importância e a relevância
das leis de cotas, mas que precisaria também de uma fiscalização efetiva por parte das
autoridades para que as leis fossem cumpridas. Renata e Paulo mencionam em vários
momentos a importância de se fazer cumprir um direito garantido que, no entanto, sofre com
o descompromisso por parte das empresas que tentam burlar as leis em benefício próprio.
Renata deixa sua idéia clara quando fala que “tem pessoas que estão qualificadas, mas não
estão tendo essa oportunidade”.
Paulo levanta um fato muito preocupante no que diz respeito à relação das empresas
com a questão da obrigatoriedade da cota de vagas para deficientes, dizendo que “algumas
empresas forjam pseudodeficientes para cumprir a cota”. Além disso, na percepção de Paulo,
a lei é boa, mas precisa ser executada, e que uma fiscalização mais efetiva é necessária para
resolver o problema. Quando diz que “não se atribui o valor de importância realmente a essa
lei, não se atribui cobrança do resultado dessa lei”, revela-se sua frustração a esse respeito.
Segundo Neri (2003), “Como o Brasil é um país onde algumas leis ‘não pegam’, é importante
avaliar qual é o impacto da nova legislação, assim como os resultados se a mesma fosse
atendida”. De fato, parece que a percepção dos entrevistados revela a descrença na eficácia
da legislação, que mesmo sendo boa precisa ser aplicada, ser posta em prática pois, senão,
“não pegará”.
Rodrigo considera importante a existência das cotas para que os deficientes tenham
acesso ao mercado de trabalho e conseqüentemente, dinheiro. Diz que: “Nós temos sonhos”
[como todo mundo], e o trabalho é o meio de alcançá-los.
32

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Acho que a maioria das profissões se encaixam, não vejo
muita dificuldade, a não ser uma coisa que requer muita
visão como motorista, vigilante; (Renata)
- Isso [a deficiência] pode ser um facilitador para ele não
ficar tão inibido. Eu sou muito positiva, eu acho que a
cegueira pode me ajudar no processo em eu estar “vendo”
- profissões com maior coisas que as pessoas com visão talvez não percebam;
facilidade de inserção no (Renata)
mercado de trabalho - Tenho certeza de que estarei alerta a tudo isso, não só ao
conteúdo do que fala, mas em como fala. (Renata)

- Hoje tem a questão da telefonia, que só esbarra na


questão de adaptação de algumas máquinas. A informática
tem ajudado muito nisso, os programas de ledor de tela
tem ajudado muito nisso, a gente sabe de muitos cegos
que são massagista, tem muitos surdos no mercado de
trabalho, tem cadeirantes trabalhando em banco, então eu
acho algumas funções sim; (Paulo)
- Como algumas questões [profissões] não tem como
fazer, e isso é assim como todo mundo; (Paulo)

- Eu acho que tem áreas mais fáceis porque... para


trabalhar em mercado é mais fácil, para organizar as
coisas. Já para trabalhar em computação, é mais profundo,
precisa ter mais conhecimento, saber mais sobre textos.
(Rodrigo)

A categoria denominada “profissões com maior facilidade de inserção no mercado de


trabalho” foi construída lavando-se em consideração o objetivo específico que pretende
identificar a percepção dos sujeitos da pesquisa com referência às exigências profissionais do
mercado de trabalho.
Nesta categoria percebemos que Renata não vivencia sua deficiência como um fator
limitador para a escolha de sua profissão, ao contrário, tem uma interpretação da deficiência
como um possível facilitador na intervenção terapêutica. Demonstra isso quando fala: “eu
acho que a cegueira pode me ajudar no processo em eu estar ‘vendo’ coisas que as pessoas
com visão talvez não percebam”.
Paulo cita profissões que já são consideradas como profissões específicas para pessoas
com deficiência. Argumenta quanto às dificuldades que todas as pessoas, deficientes ou não,
podem encontrar para exercer determinadas profissões, ou seja, fala que é inerente a todas as
pessoas certa dificuldade no que diz respeito ao exercício de determinadas funções.
Na fala de Rodrigo observamos que sua percepção sobre as áreas de trabalho, é
permeada pela noção da necessidade de aprendizagem e capacitação para deficientes. Ele
33

distingue o trabalho maquinal, que seria o trabalhar em mercado como organizador, e o


trabalho que exige maior concentração e dedicação, como é o caso da informática. Em sua
entrevista, Rodrigo relata que gosta muito de trabalhar com o programa Autocad, portanto
reconhece o empenho que é necessário para se trabalhar com computação.

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Capacitação. Imprescindível, principalmente nós que
já somos rotulados de incapazes; (Renata)
- A capacitação é totalmente importante porque quando
tu começa a fazer, já faz bem feito e começa a mudar
- sucesso no mercado de trabalho essa visão, plantando uma dúvida [nos empregadores,
sobre as reais capacidades dos deficientes], e o
surgimento de novas oportunidades, e a partir disso, a
construção de uma nova imagem; (Renata)
- Não capacitado, a imagem negativa vai ser reforçada;
(Renata)
- A questão da capacitação é importante também na
busca e exigência dos seus direitos; (Renata)
- Como uma pessoa capacitada, tenho o direito de estar
no mercado de trabalho como outra pessoa qualquer;
(Renata)
- Direito de exigir, mas também de assumir
determinados cargos porque estou capacitada, e isso é
essencial. (Renata)
- É ele dominar o que ele vai fazer, é ter segurança para
dominar, ter condições reais de acordo com as suas
possibilidades de poder executar; (Paulo)
- Eu não posso dar aula de filosofia sem conhecer a
filosofia, sem estar preparado para atuar no mercado de
trabalho; (Paulo)
- No começo as pessoas admiram a sua deficiência,
depois passam a admirar o seu trabalho, você tem que
ter paciência para ir mostrando, para devagar ir
quebrando os estigmas, os rótulos; (Paulo)
- Ir percebendo as pessoas com dificuldades e
compreensão que ela tem, não querer impor uma cultura
de cego, uma cultura de surdo, e estabelecendo isso
dentro de um processo lógico, consistente de paciência e
de conhecimento também; (Paulo)
- Que precisa estudar, faculdade. O mais importante de
tudo é estudar. (Rodrigo)

A categoria denominada “sucesso no mercado de trabalho” foi construída lavando-se


em consideração o objetivo específico que pretende identificar a percepção dos sujeitos da
pesquisa com referência às exigências profissionais do mercado de trabalho.
34

Nas falas dos entrevistados deste quadro, percebemos que a questão da capacitação
aparece para os três entrevistados, e todos concordam que para se obter sucesso no mercado
de trabalho, é necessário que se invista em capacitação para exercer funções diferenciadas.
Assim como, para que os deficientes tenham, na medida do possível, as mesmas chances nos
processos de seleção, e também, que possam exercer as mesmas funções dos demais.
Renata afirma que: “Capacitação [é] imprescindível, principalmente nós que já somos
rotulados de incapazes”, corroborando, assim, a idéia de que para os deficientes a capacitação
é fundamental, pois esta é a opção mais viável para que os deficientes consigam seu lugar de
direito no mercado de trabalho. Segundo Renata: “capacitação é importante também na
busca e exigência dos seus direitos”.
Ao analisarmos a fala de Paulo, percebemos que há coerência ao que se refere às
possibilidades de atuação do deficiente no mercado de trabalho quando fala: “é ter segurança
para dominar, ter condições reais de acordo com as suas possibilidades de poder executar”.
Outro ponto importante citado por Paulo, é a admiração que os demais, ou seja, os videntes
têm pelo deficiente que está ativo, incluído no contexto, para depois, ultrapassadas as
barreiras, nascer a admiração pelo profissional capaz independente de sua limitação. Este
processo demanda paciência por parte dos deficientes que, segundo Paulo, deve demonstrar
seu trabalho e seu potencial, e cita: “que ter paciência para ir mostrando, para devagar ir
quebrando os estigmas, os rótulos”.
Percebemos na fala de Rodrigo que cursar uma faculdade e estudar são os meios para
se obter sucesso no mercado de trabalho. Durante esta entrevista, observamos que Rodrigo
sempre expressava suas idéias quanto às dificuldades que os surdos têm para se comunicar,
para aprender e conseqüentemente, para ingressar no mercado de trabalho. Segundo Rodrigo,
os cegos e os ouvintes, não têm as mesmas dificuldades de aprendizagem ou adaptação ao
mundo e a surdez seria a mais limitadora das deficiências, sendo assim, as chances de
integração dos surdos seriam menores e sua força de trabalho, desvalorizada pelos
empregadores.
35

Categoria de análise Discurso do entrevistado


- Partindo da minha experiência, sim [se as escolhas são as
mesmas para pessoas com deficiências e as demais];
(Renata)
- Mas a realidade não é muito essa, em função da
escolarização, do acesso à escola, da acessibilidade que ele
- gosto, escolhas e exigências, teve para ter acesso ao conhecimento, já restringe [o
impostas pela deficiência e pelo momento da escolha profissional]; (Renata)
mercado de trabalho - A pessoa acaba escolhendo profissões que são coerentes
com aquilo que ela tem de escolarização. Ela [deficiente]
acabou sendo prejudicada lá no primário, no ginásio, e
isso delimita muito a questão da profissão; (Renata)
- Escolher não em função de deficiência somente, mas em
função do que a deficiência te acarretou, em função de não
ter tido acesso a tudo; (Renata)
- Eu acho que tu tem que correr muito atrás da vida, além
do normal, e às vezes, as pessoas com deficiências não
estão dispostas a correr atrás, tanto assim, talvez por isso
se acomodem, se cansem por estarem sempre dando murro
em ponta de faca. Tem que se preparar, para se preparar,
não está preparado [em função da falta de escolarização
adequada], e assim vai;
(Renata)
- Se eu não gostar do que eu fizer, não me importa
mercado de trabalho ou o que for; (Renata)
- Tentar conciliar os dois [gosto pessoal e exigências do
mercado de trabalho], mas acho que em primeiro lugar
entra a tua satisfação para tu produzir e poder trabalhar
coerentemente com aquilo que tu acredita; (Renata)
- Não, não faz porque o campo dela é limitado, se eu não
trabalhasse como professor, obviamente eu não poderia ser
um motorista, e com a minha deficiência especificamente,
tem um monte de coisa que não posso fazer; (Paulo)
- Determinadas coisas eu não faço porque também nunca
fui preparado para isso, porque não tenho os recursos para
que pudesse estar realizando; (Paulo)
- No momento atual, não tem muita liberdade de escolher,
você tem que ficar procurando a profissão que vai ficar
mais adequada ao seu estilo de vida, sua especificidade;
(Paulo)
- Algumas pessoas podem dizer que para os videntes,
também é assim, mas não é. Para os videntes tem uma
séria de possibilidades, dentro de uma gama imensa de
coisas, que não é o caso nosso, nós procuramos também
isso, mas dentro de um processo um pouco mais limitado
de ação; (Paulo)
- O bom seria se pudéssemos juntar essas coisas [gosto e
exigências]; (Paulo)
36

- Se fosse responder para você de uma maneira geral, eu


diria que, e é o que eu preparo meus alunos, eu diria que,
faça o que vai dar valor a vocês, mas no nosso caso, por
exemplo, eu gosto muito de carro e não vou poder
trabalhar com isso; (Paulo)
- Embora que na minha situação, eu estou fazendo o que o
mercado me permite e o que eu gosto [lecionando
filosofia], mas não é uma regra que possa tomar para
pessoas com deficiência, ela escolhe por um motivo ou
por outro, geralmente é a acessibilidade do mercado, é o
que o mercado está propondo; (Paulo)
- Esse é o mundo que nós temos, o que nós queremos é
outra coisa. É onde a gente possa estabelecer uma relação
de prazer com o trabalho; (Paulo)
- Eu acho que o deficiente, o cego, o surdo... eu acho que a
escolha é diferente porque as vagas também são
diferentes e a gente não consegue vaga, é bem difícil;
(Rodrigo)
- Eu acho que é pelo trabalho [gosto]; (Rodrigo)
Rodrigo respondeu: Só pelo que gosta.
Mãe questiona: Mas e se tu gosta, gosta, gosta e o salário
for pequenininho, tu continua trabalhando igual?
Rodrigo respondeu: Sim
(Rodrigo)

A categoria denominada “gosto, escolhas e exigências, impostas pela deficiência e


pelo mercado de trabalho” foi construída lavando-se em consideração o objetivo específico
que pretende verificar, na perspectiva da pessoa com deficiência, se esta interfere no processo
da escolha profissional e identificar, caso ocorra a interferência da deficiência no processo de
escolha profissional dos sujeitos investigados, como esta acontece.
Para a categoria do quadro acima, Renata diz que: “sim [se as escolhas são as mesmas
para pessoas com deficiências e as demais]”, e partindo desse pressuposto ela afirma: “tentar
conciliar os dois [gosto pessoal e exigências do mercado de trabalho], mas acho que em
primeiro lugar entra a tua satisfação”. Porém, há um agente limitador que é a precariedade
da escolarização e como conseqüência do difícil acesso ao conhecimento, os deficientes têm
menos oportunidade de escolher a profissão de seu agrado, como demonstra em sua fala: “da
escolarização, do acesso à escola, da acessibilidade que ele teve para ter acesso ao
conhecimento, já restringe [o momento da escolha profissional]”, e também: “Ela acabou
sendo prejudicada lá no primário, no ginásio, e isso delimita muito a questão da profissão”.
A realidade de Paulo se expressa de maneira diferenciada da de Renata. Mesmo ele
tendo a chance de exercer o que gosta, quando afirma “eu estou fazendo o que o mercado me
37

permite e o que eu gosto [lecionando filosofia]”, Paulo tem consciência de que a cegueira
gerou impossibilidades para seu projeto pessoal. Conforme relatou durante sua entrevista,
queria ser motorista, pois adora carros, mas obviamente teve que esquecer seu sonho e
trabalhar com sua realidade, sua identidade cega. Outra questão bastante relevante levantada
por Paulo foi que: “determinadas coisas eu não faço porque também nunca fui preparado para
isso, porque não tenho os recursos para que pudesse estar realizando”, ou seja, reafirmando a
afirmativa de Renata em relação a precariedade do ensino e da preparação necessária para que
os deficientes possam se incluir socialmente.
Segundo Rodrigo em sua entrevista, as escolhas são diferentes porque as vagas
também são diferentes para deficientes como também, são diferentes para cada deficiência.
Quando questionado sobre o querer fazer estar relacionado ao gostar e à realização pessoal,
ele afirma que sim, que sua prioridade na escolha é pelo que gosta, independente do valor do
salário.
38

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta inicial durante a elaboração do projeto de pesquisa era que fossem


feitas entrevistas com três deficientes do sexo feminino, com menos de trinta anos, sendo uma
com deficiência auditiva, uma com deficiência visual e uma com deficiência física. Porém,
encontramos dificuldades em contatar participantes com as características acima propostas
para constituírem os casos da pesquisa. Cabe ressaltar que no caso de Rodrigo, pela
dificuldade de comunicação por parte do deficiente e o fato de que em toda mensagem
transmitida para um deficiente auditivo pode ocorrer uma interferência da interpretação por
parte de seu(sua) intérprete, na transmissão para a pessoa com deficiência, pode existir uma
margem de incompreensão entre as perguntas e as respostas da entrevista. Neste caso
específico, em diversos momentos, tivemos que interferir e solicitar que a pergunta fosse
reformulada, pois percebemos que esta estava sendo feita com um foco diferenciado da
questão originalmente elaborada. Para diminuir os riscos de falhas na comunicação no
processo, solicitamos às intérpretes presentes que verbalizassem todo e qualquer comentário
feito ao entrevistado no decorrer da entrevista. Sendo assim, nossos resultados coletados
ficaram limitados à interpretação das respostas dadas pelo entrevistado, mas que chegaram a
nós, por sua vez, com o crivo da interpretação de suas intérpretes.
Durante a elaboração das análises das categorias, percebemos sutis diferenças
entre as idéias dos três entrevistados no que se refere ao tema trabalho e suas atribuições.
Levamos em consideração as características pessoais e suas diferentes experiências de vida,
assim como os diferentes contextos sociais vividos por cada deficiente, quais sejam, no nosso
caso, a deficiência visual com dois entrevistados cujos nomes fictícios foram Renata e Paulo,
e a deficiência auditiva com um entrevistado cujo nome fictício foi Rodrigo.
Cabe ressaltar que no material bibliográfico encontrado para servir de suporte
teórico da análise, embora se fale sobre a questão da inserção do deficiente no mercado de
trabalho, evidenciou-se também a existência de uma grande tendência a não se considerar a
questão do direito a uma escolha profissional pessoal por parte dos deficientes. Mendes (et al,
2004), fala de uma falácia conceitual referindo-se ao emprego da palavra profissionalização ,
não propriamente ao ensino de uma profissão ou a possibilidade de escolha por uma profissão
de seu interesse pessoal, mas ao desenvolvimento pessoal e profissional do deficiente,
beneficiando seu ingresso no mercado de trabalho competitivo, com o intuito de auxiliar a
inserção social por intermédio do emprego. Esta barreira atitudinal direciona estas pessoas a
programas de educação para o trabalho, que têm como objetivo desenvolver habilidades
39

específicas, atitudes e hábitos de trabalho, revelando-se assim, uma profissionalização


limitadora, onde há um treino para habilidades específicas monótonas e repetitivas, muitas
vezes com pouco ou nenhum significado para o sujeito, aproximando-se mais de um
“adestramento” para algumas funções. Os deficientes são lançados em ambientes regulares na
tentativa de melhorar suas condições de integração, com objetivos remotos de uma real
profissionalização.
Atualmente com os avanços nas descobertas das reais condições, capacitações e
limitações dos deficientes, permite-se seu ingresso, aos poucos, no mercado de trabalho, em
diversas áreas e funções. Contudo, sua integração ao ambiente de trabalho e a comunicação
com os demais ainda são precárias.
Nos países mais desenvolvidos, este fato é chamado de “inexperiência social”, ou
seja, as pessoas com deficiências apresentam dificuldade em lidar com esta nova situação.
Porém, atuar como trabalhador, ser produtivo, conquistar a confiança dos empregadores, dos
colegas de trabalho e a sua própria, lidar com a possibilidade de fazer escolhas, tomar
decisões, ter uma certa autonomia, é com certeza uma nova realidade não somente para os
deficientes, mas também para todos os envolvidos no processo de ingresso das pessoas com
deficiência ao mercado de trabalho. Segundo Amaral (1994, p.49) “se o deficiente não foi seu
colega de banco de escola, como ser seu colega de bancada de trabalho? Como ser seu
empregado?”.
Outro aspecto importante a ser discutido é que não há dúvidas de que a viabilidade
de investimentos em programas educacionais e de capacitação para o trabalho deve ter
objetividade e trabalhar com a realidade do contexto atual brasileiro. Sabe-se que ainda hoje
no Brasil, a grande maioria das pessoas com deficiências sequer têm tido a chance de
ingressar na escola e sabe-se também que o número de desempregados da população dita
normal, mesmo que capacitada para ingressar no mercado de trabalho, cresce a cada ano, e
estes dados não podem ser desconsiderados, pois o investimento na capacitação dos
deficientes trará a médio e a longo prazo, uma demanda maior de postos de trabalho antes
ocupados apenas pelos demais trabalhadores.
Concluindo, as análises trazem informações que possibilitam uma reflexão acerca de
como é a realidade vivida pelo deficiente no contexto atual. Por ter sido uma pesquisa de
natureza qualitativa e sendo seus participantes, de uma forma geral, pessoas que tiveram
alguma chance de escolha por conseqüência de seus históricos pessoais, a resposta à questão
da pesquisa é que a deficiência, segundo os entrevistados, pode interferir limitando ou
determinando a profissão de um deficiente, mas no caso específico da população desta
40

pesquisa, constatou-se que os sujeitos puderam escolher com relativa liberdade suas
profissões.
Conforme percebemos durante a elaboração do trabalho, principalmente durante a
análise dos resultados das entrevistas, o tema da pesquisa não pode mais ser considerado
novo, contudo, faz-se necessária a continuidade da pesquisa. Sugerimos que seja feita uma
pesquisa de natureza quantitativa também de caráter exploratório, com a finalidade de tomar
ciência das instituições que disponibilizam vagas para pessoas com deficiência em áreas
diferentes das já estabelecidas pelas empresas.
Na expressão de um dos sujeitos entrevistados, fica a síntese da percepção sobre o
problema: “esse é o mundo que nós temos, o que nós queremos é outra coisa. É onde a gente
possa estabelecer uma relação de prazer com o trabalho”(Paulo).
41

REFERÊNCIAS

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público – OSCIP. Disponível em: <www.acessobrasil.org.br>. Acesso em: 14 out. 2006.

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42

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Universidade do Sul de Santa Catarina, Palhoça, 2004.
43

APÊNDICE

ROTEIRO DE ENTREVISTA

1- Atualmente você está trabalhando? Qual sua função/cargo?


2- Em sua perspectiva, qual a importância do trabalho na vida das pessoas?
3- Você gosta do seu trabalho? (da função que exerce)
4- A deficiência foi um fator que interferiu no momento da escolha de sua profissão?
Sim/Não. De que modo?
5- Quais as maiores dificuldades/barreiras que você encontra para exercer sua função?
6- Em sua opinião como está o mercado de trabalho para pessoas com deficiência?
7- Você conhece a legislação sobre a questão do trabalho para pessoas com deficiência?
Sim/Não. Qual a sua opinião sobre ela?
8- Você considera que existem áreas ou profissões com maior facilidade para a inserção
da pessoa com deficiência no mercado de trabalho? Por quê?
9- O que você acha que é importante para pessoa ter sucesso no mercado de trabalho?
10. Você considera que as pessoas com deficiência fazem as mesmas escolhas
profissionais que as demais? Por quê?
11. Você considera que é mais importante para a escolha de uma profissão: a) os gostos ou
interesses pessoais na área profissional; ou então, b) a existência de mercado de trabalho
em áreas pré-definidas pela sociedade? Por quê?
44

ANEXO A
LEI Nº 8.112 DE 11/12/1990

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 8.112, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1990

Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das
fundações públicas federais.

PUBLICAÇÃO CONSOLIDADA DA LEI Nº 8.112, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1990,


DETERMINADA PELO ART. 13 DA LEI Nº 9.527, DE 10 DE DEZEMBRO DE 1997.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a


seguinte Lei:

Título I

Capítulo Único

Das Disposições Preliminares

o
Art. 1 Esta Lei institui o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das
autarquias, inclusive as em regime especial, e das fundações públicas federais.

o
Art. 2 Para os efeitos desta Lei, servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público.

o
Art. 3 Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura
organizacional que devem ser cometidas a um servidor.

Parágrafo único. Os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com
denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou
em comissão.

o
Art. 4 É proibida a prestação de serviços gratuitos, salvo os casos previstos em lei.
45

ANEXO B

CONTEÚDO JURÍDICO DO ARTIGO 93 DA LEI Nº 8.213/91

O CONTEÚDO JURÍDICO DA PROTEÇÃO AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA


FÍSICA PREVISTA NO ART. 93 DA LEI Nº 8.213/91*

I – Introdução

Além das garantias previstas na própria Constituição Federal destinadas aos


portadores de deficiência a Lei nº 8.213, de 24.6.91, que trata dos Planos de
Benefícios da Previdência Social, no capítulo que disciplina a habilitação e
reabilitação do trabalho, traz um sistema de cotas (de contratações) para os
trabalhadores reabilitados ou pessoas portadores de deficiências, habilitadas (art.
93), prevê que a dispensa do trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado
somente poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante (§
1º) e a responsabilidade do Ministério do Trabalho e Emprego em criar um banco de
dados sobre os postos de trabalho (§ 2º).
O presente estudo cuida do conteúdo jurídico da proteção ao portador de
deficiência física prevista no art. 93, da Lei nº 8.213/91.

II – A proteção jurídica ao portador de deficiência física inserida no art. 93, da


Lei nº 8.213/91

O art. 93, caput, da Lei nº 8.213/91, determina a empresa, com 100 ou mais
empregados, a obrigação quanto ao preenchimento de 2% a 5% dos seus cargos
com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, com
a observância da seguinte proporção: a) de 100 a 200 empregados, 2%; b) de 201 a
500, 3%; c) 501 a 1.000, 4%; d) de 1001 ou mais, 5%.3

*
Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante. Advogado. Professor da Faculdade de Direito
Mackenzie. Ex-procurador chefe do Município de Mauá. Mestre em Direito Político e Econômico pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestrando em Integração da América Latina pela
Universidade de São Paulo – USP.
Francisco Ferreira Jorge Neto. Juiz Titular da 1ª Vara do Trabalho de São Caetano do Sul. Mestre
em Direito das Relações Sociais – Direito do Trabalho pela PUC-SP. Ex-professor concursado do
Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano do Sul – IMES. Professor convidado no curso
de pós-graduação lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor contratado do UNI-
A – Centro Universitário de Santo André na matéria de Direito do Trabalho (Individual e Coletivo).
3
O art. 36, do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, contém idêntica regra.
46

ANEXO C

DOCUMENTO REFERENTE A IGUALDADE DE CONDIÇÕES DE EDUCAÇÃO


PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA


CAPITAL

II - Do direito à IGUALDADE no acesso à educação garantido a toda criança ou


adolescente

A Constituição da República prevê como primeiro direito social básico a educação:

Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a


previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na
forma desta Constituição.

E, estampou-se essa igualdade no acesso e permanência ao ensino expressamente no


art. 2º, inciso I, letra “e” da Lei nº 7.853/89, que assegurou o acesso de alunos portadores
de deficiência aos mesmos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive
material escolar e merenda escolar.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei Federal nº 9394/96) após
consagrar o princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola
(art. 3º, inciso I), atribui ao Município o dever de assumir o transporte escolar dos alunos
da rede municipal (art. 11, inciso V). Tal dispositivo associado ao art. 59, inciso V da
mesma Legislação, e ao ar. 2º, inciso I, letra “e” da Lei 7.853/89 resolve definitivamente
a questão. É que, nesses dispositivos, restou assegurado aos alunos da rede especial o
acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o
respectivo nível do ensino regular (art. 59, V).
Com isso, se dúvida havia quanto ao direito postulado, tal norma responde a essas
inquietações.

São Paulo, 02 de outubro de 2006.

JULIO CESAR BOTELHO


Promotor de Justiça

LAURO LUIZ GOMES RIBEIRO


Promotor de Justiça

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