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CONFERÊNCIA

DE IMPRENSA

O endividamento externo do País


e as propostas do PCP

Jerónimo de Sousa
Secretário-Geral do PCP

Lisboa, 5 de Abril de 2011


Renegociar a dívida pública - Desenvolver a produção nacional

Como há muito o PCP vem denunciando, o endividamento externo líquido do país é uma
das consequências mais visíveis da política de desastre nacional que PS, PSD e CDS
impuseram nos últimos 35 anos. Uma dívida, pública e privada, em que a dívida privada é
maior que a dívida pública, que assume hoje a colossal dimensão de mais de 107% do
PIB e que é inseparável de um processo de desindustrialização, do abandono da
produção nacional, das privatizações, da submissão às imposições da União Europeia e
ao grande capital nacional e estrangeiro.

Uma dívida que resultou, não de um povo “a viver acima das suas possibilidades”, mas de
um processo de aprofundamento da dependência externa e de subordinação aos grupos
económicos e financeiros.

Com o endividamento do país ganharam aqueles que nos impuseram a liquidação do


aparelho produtivo – como a França e a Alemanha – e a quem passámos a comprar
aquilo que o país deixou entretanto de produzir.

Com o endividamento do país ganharam e ganham os bancos da Alemanha, da


Inglaterra, da Espanha, da Holanda, da França e também de Portugal, que de forma
escandalosa se financiam junto do BCE a taxas de juro de cerca de 1%, para depois
adquirirem dívida pública cobrando 6%, 7% e até 8% ao estado português, numa ilegítima
usurpação de recursos nacionais.

Com o endividamento do país ganharam os banqueiros, a quem o Estado limpou


prejuízos (como no BPP e no BPN) e adiantou garantias, transformando dívida privada
em dívida pública, distribuindo depois os respectivos sacrifícios pelos trabalhadores e o
povo.

Como consequência desse endividamento, da cumplicidade e papel da União Europeia e


do quadro decorrente da natureza e funcionamento do capitalismo, Portugal encontra-se
hoje confrontado com um insuportável e ilegítimo processo de extorsão dos seus
recursos nacionais por via do agravamento dos juros sobre a dívida pública portuguesa.

Com a escalada no valor das taxas de juro sobre a dívida pública portuguesa –
designadamente a 5 e a 10 anos – a ultrapassarem já os 10%, e o serviço da dívida a
ultrapassar em 2010 os 5 200 milhões de euros, sendo que a perspectiva para este ano
de 2011 é de mais de 7 100 milhões de euros, o processo de financiamento do Estado
português e da economia nacional encontra-se numa insustentável espiral de
agravamento.

Este é um processo que decorre com a cumplicidade e o papel activo da União Europeia
que, apostada na salvaguarda dos interesses do capital financeiro e das grandes
potencias (em particular da Alemanha) é conivente com esta onda especulativa, quando
teria condições – mesmo no actual contexto político e institucional – para lhe pôr fim. Em
vez disso, a UE assume as concepções e políticas do FMI, chamando-se assim, ou
chamando-se Fundo Europeu de Estabilização Financeira, com consequências
devastadoras para vários países – como a Grécia e a Irlanda – onde os resultados
ficaram à vista com a subida das taxas de juro, o aprofundamento da recessão
económica, o agravamento do desemprego e das injustiças sociais.

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Ao contrário do que foi sendo dito, as chamadas medidas de austeridade impostas por PS
e PSD em sucessivos PEC's e no último Orçamento do Estado, longe de conterem o
roubo em curso ou de acalmarem os “mercados”, são em si mesmas – designadamente
pelo efeito recessivo que produzem – um factor de agravamento das taxas de juro
cobradas e do processo de chantagem e extorsão com que o grande capital está a
confrontar o país. Hoje é o défice, amanhã é a recessão: a espiral especulativa nunca
parará enquanto o chantageado ceder ao chantagista.

A indispensável rejeição pela Assembleia da República do chamado PEC 4 em Portugal –


que corresponderia a mais um salto qualitativo contra os direitos dos trabalhadores e do
povo português - não anulou os impactos negativos das chamadas medidas de
austeridades assumidas nos últimos meses pelo PS, PSD e CDS. Mas também não
tornou necessário, como alguns procuram fazer crer, o recurso à ingerência externa no
nosso país, designadamente ao FMI.

À medida que aumenta a pressão - externa e interna - para a entrada do FMI em Portugal,
mais claro fica que aquilo que o grande capital pretende é perpetuar a agenda da
“austeridade”, agravar a exploração e a dependência externa, comprometendo as
próximas décadas do nosso país em função dos seus próprios lucros e interesses.

Isso mesmo foi confirmado hoje pela posição assumida pela banca nacional, que depois
de beneficiar de apoios e financiamentos do Estado a fundo perdido, de especular com a
dívida pública, de fugir ao pagamento de impostos, veio publicamente recusar
empréstimos ao Estado português e exigir o recurso ao FMI, para prosseguir com a
especulação financeira que lhe enche os bolsos. Esta é uma declaração inaceitável. O
país não precisa dos “favores” da banca privada, o que país precisa é de um forte sector
financeiro nas mãos do Estado, com papel determinante da Caixa Geral de Depósitos,
única forma de defender o interesse e a soberania nacionais.

Portugal não pode, assim, aceitar que sejam aqueles que mais beneficiaram do processo
de endividamento do nosso país – grande capital nacional e estrangeiro - a querer ditar o
modo e as condições nas quais o nosso país deveria continuar a ser saqueado.

O PCP considera que a resposta não pode ser outra senão a da firme recusa deste rumo
de “austeridade” seja por via do PEC, seja por via do FMI. A resposta não pode ser outra
senão a afirmação clara de que Portugal não pode continuar a pagar juros agiotas e a ser
vítima dos especuladores, dos agora chamados mercados.

Face à situação insustentável que está criada e aos seus possíveis desenvolvimentos nos
próximos tempos, o PCP considera que o Estado português deverá assumir, em ruptura
com a actual política, as seguintes posições:

A renegociação imediata da actual dívida pública portuguesa – com a reavaliação


dos prazos, das taxas de juro e dos montantes a pagar – no sentido de aliviar o Estado
do peso e do esforço do actual serviço da dívida, canalizando recursos para a promoção
do investimento produtivo, a criação de emprego e outras necessidades do país.

A intervenção junto de outros países que enfrentam problemas similares da dívida


pública – Grécia, Irlanda, Espanha, Itália, Bélgica, etc – visando uma acção convergente
para barrar a actual espiral especulativa, a par da revisão dos estatutos e objectivos do
BCE e da adopção de medidas que visem o crescimento económico, a criação de
emprego e a melhoria dos salários.

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A adopção de uma política virada para o crescimento económico onde a defesa e
promoção da produção nacional assuma um papel central – produzir cada vez mais
para dever cada vez menos, com medidas imediatas que visem o reforço do investimento
público, a aposta na produção de bens transaccionáveis e um quadro excepcional de
controlo da entrada de mercadorias em Portugal, visando a substituição de importações.

A diversificação das fontes de financiamento, retomando uma política activa de


emissão de Certificados de Aforro e de Tesouro e de outros instrumentos vocacionados
para a captação de poupança nacional, bem como o desenvolvimento de relações
bilaterais encontrando formas mais vantajosas de financiamento. Uma política de
diversificação também das relações comerciais, mutuamente vantajosas, com outros
países designadamente de África, Ásia e América Latina.

A avaliação do conjunto de situações que envolvem as chamadas Parcerias Publico


Privadas, visando, de acordo com o apuramento, a renegociação ou cessação de
contractos que se mostrem ruinosos para o Estado.

Os trabalhadores e o povo português não podem continuar a alimentar os super lucros da


banca com juros obscenos, nem a salvar os accionistas de bancos falidos como
aconteceu com o BPN e o BPP. Os trabalhadores e o povo português não podem
continuar a suportar sacrifícios para encher os bolsos dos especuladores e da banca, ao
mesmo tempo que o país se afunda na recessão económica, o desemprego alastra e o
custo de vida aumenta.

Para o PCP não há outra atitude patriótica e de defesa do interesse nacional que não seja
a da recusa clara de manter o país sujeito ao saque e à especulação e isso exige que se
considerem as medidas que aqui propomos. Esta é a opção indispensável e urgente,
inserida na política e no governo patriótico e de esquerda que o PCP propõe ao país.

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