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David Norton explica, em entrevista exclusiva à Executive Digest, como todos somos responsáveis pela
implementação estratégica.
O sucesso da execução da estratégia depende do envolvimento total da força de trabalho no processo de negócio e
da vontade de aprender dos líderes. Mesmo que isso signifique admitir perante o Conselho de Administração que
estavam errados. E para que a estratégia resulte é necessária uma participação proativa dos gestores de recursos
humanos. É o que defende David Norton, “guru” da estratégia e co-criador com Robert Kaplan do Balanced
Scorecard, um dos modelos de gestão estratégica mais em voga no momento.
Como a maioria das boas ideias, o Balanced Scorecard é simples, nasceu do acaso e é rentável. Segundo reza a
história, David Norton descobriu o termo "Balanced Scorecard" numa conversa com John Thompson, na altura
presidente da IBM Canadá. O executivo regressava de uma partida de golfe e disse a David Norton que precisava de
um cartão de pontos igual ao que usava no golfe para medir a performance do seu negócio. E assim, a partir dessa
conversa, Norton criou um negócio bem eficaz. Inicialmente, o Balanced Scorecard representava um cartão que se
guardava no bolso do casaco e que contém uma tabela com as medidas dos fatores críticos de sucesso do
departamento e da organização. Os resultados dessas medidas mostram se a organização está executando
eficazmente a estratégia ou não, onde estão as falhas e quais os fatores que poderão motivar os empregados a serem
mais produtivos. Nas palavras de David Norton, "uma carta de navegação da gestão". O “guru” esteve em Portugal,
num seminário organizado pelo Institute for International Research e explicou, em entrevista à Executive Digest,
como encontrar a "estrela do norte" nos turbulentos mares econômicos em que as empresas são obrigadas a
navegar.
Qual o valor acrescentado do Balanced Scorecard para a execução da estratégia de uma organização?
Recentes estatísticas da Fortune mostram que 9 em cada 10 empresas falham na execução da estratégia. Se a
empresa conseguir alcançar esse objetivo, o valor criado é enorme. As empresas, nos EUA, que alcançaram este
objetivo tiveram ganhos de bilhões de dólares. Não estou a afirmar que o Balanced Scorecard é uma máquina de
fazer dinheiro, mas sim que conduz à execução da estratégia. Esse é o valor.
Mas o Balanced Scorecard é apenas um sistema medidor de desempenho. O que possui de diferente em relação a
outras ferramentas semelhantes?
É verdade que o Balanced Scorecard mede o desempenho nas organizações. Mas vai além da tradicional medição de
desempenho, que apresenta essencialmente em informações financeiras, que é um indicador retardado, porque
apenas descreve os resultados e os feitos importantes realizados anteriormente. Se medirmos a performance pelo
simples fato de a medir, estamos apenas a escrever a história do passado. A medição deverá ser utilizada para
motivar as pessoas, porque aquilo que medimos comunica-lhes o que é importante para a organização. Portanto, um
bom sistema de medição deverá combinar os resultados financeiros com os vários fatores que os originaram. O
Balanced Scorecard decompõe a estratégia em quatro fatores básicos de criação de valor: o financeiro, os clientes e o
mercado (sociedade), os processos internos do negócio e o aprendizado e crescimento.
Como se interagem?
Em termos muitos simples, as finanças satisfazem os acionistas através da satisfação dos clientes. Para que isso
aconteça, a organização terá que fazer funcionar as atividades que os satisfaçam, isto é, os processos internos de
negócio. E para que estes sejam efetivos há de se utilizar com eficácia as competências e ferramentas que lhes são
inerentes. Por isso a aprendizagem e o crescimento suportam o processo de negócio que cria valor para o cliente e
que depois gera valor para o acionista.
Embora cada organização possua uma cultura, processos produtivos e ambientes de trabalho próprios, quais os
fatores críticos de sucesso da implementação do Balanced Scorecard?
Os líderes da organização devem considerar como fator mais importante a execução da estratégia. Não estão
preocupados com sistemas de medição e “scorecards” (indicadores de desempenho), mas sim em saber qual a
estratégia e a forma de executá-la. O executivo deve ser um apaixonado pela mudança nas organizações. Se ele não
for assim, o Balanced Scorecard não funcionará, porque o sucesso não se baseia na medição, mas sim na estratégia, o
que implica mudança. O Balanced Scorecard é uma ferramenta que utiliza a medição para trazer a mudança. Mas se
os executivos não conseguirem identificar as direções básicas nas quais desejam situar a mudança, então nada
acontecerá.
Mas a execução não depende só do líder, mas também das ações dos seus subordinados. E estes muitas vezes
"sabotam" a estratégia de mudança dos seus superiores...
Por isso é que a estratégia tem de passar de "10 executores para 10.000 implementadores". Ou seja, é verdade que a
estratégia tem de começar no topo e requer um movimento de mudança em várias direções - mudar produtos,
mudar clientes, mudar o financiamento - que as pessoas de topo são as únicas que o podem fazer, porque detêm o
poder. Mas assim que o processo de mudança esteja em curso, a capacidade de execução da estratégia nas
organizações modernas depende dos seus empregados. E isso não se reduz às pessoas fazerem aquilo que lhes é
ordenado, mas a saberem o que estão a fazer. Se elas não perceberem a estratégia, não sabem o que vão fazer. E
para executar efetivamente a estratégia, esta tem de ser comunicada a todos os intervenientes na organização.
Temos de comunicá-la e motivar as pessoas para a executarem.
Enfatiza-se o papel do fator humano na execução da estratégia. Neste contexto, deverá ser o novo enfoque do
sistema de recursos humanos?
Inevitavelmente, os departamentos de RH também têm de se tornar estratégicos. Isto quer dizer que devem
focalizar-se na estratégia da organização e verificar o que podem fazer na função de RH para aumentar a qualidade
do capital humano. Os gestores de RH são responsáveis por muitos dos "botões" que podem mudar e desenvolver as
organizações: compreendem o funcionamento dos programas de desenvolvimento de RH, como mudar a cultura,
geram os sistemas de recompensa e concebem os programas de educação e comunicação da organização. Mas não
podem fazer tudo isto sozinhos, porque todos os outros trabalham por toda a organização e não somente para o
gestor de recursos humanos. Por isso têm de agir em parceria estreita com os gestores dos outros departamentos.
Isto é irrefutável.
Salienta-se que os departamentos de recursos humanos tradicionais são importantes no alinhamento da estratégia
de negócio. Não é uma contradição?
Agora, a gestão de RH tradicional tem um papel muito importante a desempenhar, porque a necessidade do
conhecimento e da vontade das pessoas para contribuem para a organização é crítica. As pessoas sempre foram
importantes. Mas hoje são mais ainda, visto que a estratégia acontece no dia-a-dia, nos momentos em que os
empregados encaram os clientes. Por isso hoje mais do que nunca temos de preparar os empregados para a forma
como interagem com os clientes. E quando eles interagem com os clientes estão sozinhos. Portanto, a forma como se
educa as pessoas a se comportarem é crucial.
Mas a função de RH ainda é vista como uma função de “staff”, e não de linha, com capacidade decisória...
Acredito que aí reside a oportunidade para uma mudança efetiva do poder da função de RH. Mas para que tal
aconteça, os gestores de RH têm de acreditar e adaptar-se, definitivamente, a este novo mundo.
Mas será que os gestores de RH se sentem confiantes para adotar uma atitude desse gênero, dado que não têm
suporte da gestão de topo?
Isso varia conforme a organização. Os gestores de RH devem sentir que pertencem ao corpo executivo e possuir
sentido de responsabilidade no desenvolvimento do ativo que todos os colaboradores utilizarão, que é o
conhecimento, que só se obtém através da formação de empregados qualificados. Se atuarem desta forma, provarão
na prática o seu novo poder na organização.