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Por João Carlos Holland de Barcellos
Abril 2003
Filosofia Genética
As raízes do genismo datam de uns 20 anos atrás, pelos idos da década de 80.
Naquela época eu havia criado o que eu chamei de "Filosofia Genética". A Filosofia
Genética era uma doutrina simples baseada na constatação de que não podíamos mudar
nossos instintos mas poderíamos fazer isso com nossa cultura, nossas crenças. Para mim era
claro , na época, que muito de nosso sofrimento residia na dicotomia entre nossos valores,
religiosidade, ética e moral, por um lado, e nossos instintos , vontades e desejos, por
outro. Então, o melhor que poderíamos fazer era adequar, o máximo que pudéssemos,
nossa cultura à nossa biologia e não o contrário já que isso seria biologicamente impossível.
Colocar nossas crenças e cultura contra nosso imperativo biológico só poderia produzir
mais sofrimento e infelicidade.
Diga-se, de passagem, que a teoria da sexualidade de Freud pode ser vista como uma
das facetas do genismo pois a sexualidade desempenha um importante papel, talvez tanto
quanto a sobrevivência, na perpetuação genética e, deveria ser esperado, que uma violenta
repressão nestes instintos pudessem provocar sofrimentos e distúrbios variados.
Pois bem, o livro mostrava claramente que os seres vivos tinham sido programados,
por seleção natural, para perpetuar seus genes. Na verdade, os organismos podiam ser
vistos como carcaças, dispositivos biológicos ou "Máquinas de sobrevivência" , como era
chamado pelos biólogos evolucionistas da época, para sobreviverem e passarem seus genes
às próximas gerações.
No livro, talvez por prudência, Dawkins não utilizava exemplos humanos para
demonstrar seu ponto de vista e, na verdade, e para minha própria sorte, ele declarava
justamente que deveríamos ir contra nossos genes : "...Compreendamos o que pretendem os
nossos próprios genes egoístas, para que possamos ter a oportunidade de frustrar as suas
intenções, uma coisa que nenhuma outra espécie alguma vez aspirou a fazer...."
Assim, a "filosofia genética" evoluiu para o genismo após eu ter lido "O Gene
Egoísta" e percebido que deveríamos, não ir contra nossos genes, e sim a favor deles. Claro
que deveríamos estar restritos a algum domínio ético mas, ainda assim, teríamos um amplo
campo de ação que minimizaria nossos sofrimentos , nos daria um sentido à vida e uma
forma de imortalidade não mais baseada em ilusões mas em entidades reais : Os genes.
O genismo nesta fase que , podemos dizer, durou de 1990 a abril de 2003, estabelecia
que deveríamos assumir nossa condição de "Máquinas Perpetuadora de Genes" e agir no
sentido de perpetuá-los. Como resultado de tais ações, que chamei de ações-gene-
perpetuativas, maximizaríamos nossa felicidade pois reduziríamos ao mínimo os conflitos
cultura x instinto ( conflito meme x gene ) e integraríamos nossa cultura com nossa
essência biológica mais profunda.
É importante frisar que nossos genes não estão apenas em nossos corpos individuais
mas espalhados pela humanidade. Partilhamos a maior parte de nossos genes com nossos
descendentes e parentes mas a variação com outros membros da espécie não é tão grande
assim. Compartilhamos cerca de 86% de genes idênticos ( não de cromossomos ) com
nossos filhos e cerca de 68% de genes idênticos com outra pessoa qualquer da mesma
espécie.
Os genistas devem ser tolerantes aos infectados (crentes) pois seus cérebros foram
contaminados com poderosos vírus meméticos e, como estes memes levam o indivíduo a
uma continua e persistente aceitação das contradições ( implícitas nestas religiões ) com os
fatos, através da fé, fica extremamente difícil faze-los perceber que estas contradições
( com os fatos ) deveria implicar na falsidade do seu conjunto de premissas ( crenças ).
"Devemos respeitar outros genes para que os nossos também sejam respeitados"
Em abril de 2003 o genismo dá mais um passo evolutivo: Vinha se tornando cada vez
mais claro para mim que a nossa consciência não era a nossa essência e sim nossos genes.
Antes, o genismo fazia um tratamento por demais diferenciado entre "nós e nossos genes".
Tratávamos nossos genes como "Eles". Deveríamos servi-los, e viver em função deles.
Implicitamente estávamos privilegiando a nossa consciência como sendo nosso verdadeiro
"eu". Agora não mais.
A nossa consciência, assim como nossos braços , estômagos, olhos e unhas devem ser
visto como apêndices de nosso verdadeiro eu : nossos genes.
Embora nossa consciência tenha o controle de nossas ações ela é resultado de uma
pequena parte do processamento cerebral. Talvez, quem sabe, de uma diminuta área de
nossos cérebros. Assim, até fisicamente, é mais razoável pensarmos que somos nossos
genes já que eles permeiam todas as células de nosso corpo: das unhas dos pés ao núcleo
de cada um de nossos neurônios.
Mas a ditadura da consciência fez raízes profundas. Ainda vai levar tempo para que
este novo paradigma se reflita em nossa linguagem coloquial e por isso deveremos ser
tolerantes quando ainda tratarmos os genes como "eles" e nossa consciência como "nós".
Mas o genista saberá que quando falávamos ou falarmos que estamos batalhando para
perpetuar nossos genes deveremos entender que estamos trabalhando para a nossa própria
imortalidade.