You are on page 1of 3

FÁTIMA, MECA OU JERUSALÉM?

Pr. João Pedro Robalo

Pode parecer estranho ou despropositado colocar juntos estes três lugares “sagrados” para as
grandes religiões monoteístas. Cada uma delas tem significado profundo para os crentes das
diferentes confissões e exerce uma forte influência para a peregrinação de todos os que intentam
essa premissa.

Já nos tempos idos do Antigo Testamento os judeus eram impulsionados a deslocarem-se


regularmente à cidade que fora escolhida para a edificação do templo. Faziam-no com sentimento
profundo de encontrar naquele lugar, para além de um requisito da sua religião, um lugar de paz,
aceitação, celebração e identidade nacional de um povo escolhido para adorar o único Deus
verdadeiro.

Os muçulmanos, por sua vez, seguem esta tradição como uma condição de obrigatoriedade, pelo
menos uma vez na vida, a que juntam uma profunda reflexão e devoção ao seu Deus.
Para os muçulmanos toda a devoção, fé e crença estão intimamente ligados à peregrinação a
Meca, sem a qual não existe uma verdadeira e completa dedicação na vida religiosa e crença
islamita.

Fátima, como um dos grandes lugares sagrados do catolicismo romano, até considerado por
alguns como o altar do mundo, é sem dúvida um lugar que trás aos seus fiéis uma profunda
reflexão interior e uma prova visível de toda a devoção à religião que professam.
É considerado um lugar de pagamento de promessas, tem por isso uma carga de dever e
compromisso com a religião que o patrocina.

Como cristão evangélico poderá parecer estranho o nomear estes três lugares e compara-los
como referência para as devoções e peregrinações das referidas religiões monoteístas.
Coloca-se a questão: Os evangélicos têm algum lugar de peregrinação? A resposta óbvia é não!
Mas a premissa que me faz escrever esta pequena reflexão, é parecer-me que ultimamente,
Jerusalém, se transformou como um lugar de “peregrinação” para alguns cristãos evangélicos,
pois a carga e a propaganda que circula nos nossos meios para a “necessidade” ou pelo menos
importância em fazer esta viagem tem exercido sobre os fiéis uma influência que para muitos já
não é possível cumprir a sua vida devota a Deus sem esta deslocação à “cidade santa”.
Aceito sem qualquer reserva a viagem para o conhecimento arquitectónico, arqueológico, turístico
ou mesmo de interesse cultural bíblico. Mas reparo que não é por vezes esse o argumento que
motiva alguns dos meus irmãos a faze-lo.
Quando é sugerido que se baptizem “de novo” no rio Jordão, quando é trazido e vendido água do
referido rio, como tendo propriedades santas ou curativas, quando existe e prolifera a venda de
“relíquias” da “terra santa”, quando são feitos pedidos e orações a Deus no muro das
lamentações, quando o monte das oliveiras é o lugar próprio para se fazer petições especiais,
etc., muito mais poderia aqui nomear de comportamentos que todas estas “peregrinações” são
profícuas, só uma ideia me salta à mente: Jerusalém tornou-se, ainda que timidamente, o lugar de
“peregrinação” para muitos evangélicos que consideram crucial e prioritário deslocar-se lá para
seu conforto espiritual.

É comum ouvir entre os cristãos evangélicos expressões que são recorrentes nos crentes das
outras confissões monoteístas quando se deslocam aos seus lugares sagrados de peregrinação,
tais como: Há uma atmosfera especial que se respira neste lugar. Encontro paz e conforto
espiritual quando estou aqui, etc.

Numa perspectiva preterista Jerusalém tem o seu significado histórico, religioso, referencial e
tipológico para a fé cristã.
Foi nesta cidade que a História teve o seu epílogo principal e determinante com a morte e
ressurreição do nosso Salvador.

É também esta a cidade que vê Deus fazer a derivação crucial para a abertura final a todo o
mundo. O mistério que estava oculto, a igreja que se abre a todos os povos, línguas e nações, foi
inicialmente revelado e tomou forma a partir desta cidade.

Mas não pode ser ignorado que foi sobre esta cidade que o Senhor Jesus chorou e profetizou o
fim do seu significado estrutural na relação entre Deus e os homens.
Mt.23.27-38 “Jerusalém, Jerusalém! Que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados!
Quantas vezes quis eu juntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintainhos debaixo das
asas, e tu não quiseste! Agora a vossa casa ficará deserta”

A cidade que era ícone da aliança entre Deus e o seu povo seria julgada e ficaria deserta, ou por
outras palavras despida do seu significado tanto para Deus como para a nação Santa, que
surgiria a partir do despertar da igreja desde o dia de Pentecostes.

Jerusalém continua a ter o seu significado histórico e simbólico para todos os cristãos em todo o
mundo, só que, e de acordo, com esta afirmação de Jesus, tudo o que passa além disso pode ser
considerado em certa medida “idolatria” pois estamos a elevar um lugar a um posição e
significado espiritual que já não tem.

Deixo esta última questão para reflexão a todos os que planearem fazer um viagem a Jerusalém,
quanto às motivações e razões porque o fazem.

Na sua conversa com a samaritana, Jesus deixou claro que o anterior paradigma de adoração
havia sido revertido e mudado para a sua verdadeira dimensão espiritual.
Jo.4.21,23 “Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me, a hora vem em que nem neste monte nem em
Jerusalém adorareis o Pai.
Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em
verdade; pois o Pai procura a tais que assim o adorem.”

A todos bem-haja

João Pedro Robalo

You might also like