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A POLÍTICA DA IGREJA UNIVERSAL E

SEUS REFLEXOS NOS CAMPOS


RELIGIOSO E POLÍTICO BRASILEIROS*

Ari Pedro Oro

Este texto versa sobre a inserção da Igreja um efeito mimético em outras igrejas e religiões
Universal do Reino de Deus (IURD) na política na- que procuram, como ela, também expressar o seu
cional e seus efeitos nos campos religioso e polí- capital político e poder institucional – como no
tico.1 Meus argumentos são os seguintes: em pri- campo político, provocando um interesse de
meiro lugar, o sucesso eleitoral alcançado por essa alianças por parte dos partidos políticos.
igreja, até o presente momento, relaciona-se fun-
damentalmente com o seu carisma institucional,
associado ao uso extensivo e intensivo da mídia e A Igreja Universal do Reino de Deus e
de um discurso que traz para o campo político im- a política
portantes elementos simbólicos do campo religio-
A IURD iniciou a sua efetiva prática política
so; e, em segundo, o sucesso político da Universal
em 1986 com a eleição de um deputado federal
repercute tanto no campo religioso – produzindo
para a Assembléia Nacional Constituinte. Em 1990,
elegeu três deputados federais e seis deputados
* A primeira versão deste texto foi apresentada no XXVI estaduais. Em 1994, duplicou o número de depu-
Encontro Anual da Anpocs, realizado em Caxambu,
tados para a Câmara Federal e aumentou para oito
MG, entre os dias 22 e 26 de outubro de 2002, no GT
Religião e Sociedade, coordenado por Lísias Negrão, o número de deputados para as assembléias legis-
Maria das Dores Machado e Joanildo Burity. lativas. Naquele ano, no Rio de Janeiro, também
Artigo recebido em outubro/2002 obteve a Secretaria do Trabalho e Ação Social e
Aprovado em abril/2003 apresentou uma candidatura para o senado que

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alcançou 500 mil votos (Freston, 2000). Por oca- queles que se lançaram por conta própria, como
sião das eleições de 1998, a Universal elegeu 26 veremos mais à frente, e amargaram uma estron-
deputados nas assembléias legislativas de dezoito dosa derrota.
Estados da federação (Fonseca, 1998, p. 20) e de- Tudo indica que a retirada do apoio àqueles
zessete deputados federais (sendo catorze egres- parlamentares se deveu ao fato de que eles ou
sos da própria igreja de distintas unidades federa- não se submeteram às diretrizes e orientações es-
tivas2 e três deputados apoiados pela igreja), cuja tabelecidas pelos articuladores políticos da Igreja
soma situa-se na casa de 1.400.000 votos, “[...] fei- ou não atuaram de acordo com a expectativa ali-
to comparado a partidos de médio porte como mentada por eles.
PTB e PDT” (Conrado, 2000, p. 26). Atualmente, a IURD faz parte da aliança que
Nas eleições 2000, a IURD elegeu dezenas dá sustentação ao governo Lula. Seu senador e
de vereadores em todos os Estados do país. Já nas parte dos deputados na Câmara Federal perten-
eleições de 2002 elegeu dezesseis deputados fe- cem ao PL, partido aliado ao PT desde a campa-
derais vinculados à própria igreja,3 dois a mais do nha eleitoral. No entanto, como parte dos deputa-
que na legislatura anterior, e dezenove deputados dos da IURD se encontram em outros partidos,
estaduais, representantes de dez Estados da fede- mesmo de oposição ao governo federal, é difícil
ração.4 Nessas mesmas eleições, segundo infor- prever um apoio unilateral da Igreja posto que
mações colhidas pela Folha de São Paulo junto ao seus congressistas em cada votação terão de optar,
deputado Bispo Rodrigues – o principal coorde- embora nem sempre isso seja possível, entre as
nador político da IURD5 – a Igreja ajudou a eleger orientações partidárias e os interesses da Igreja,
outros quatro deputados federais não pertencen- não necessariamente coincidentes. Aliás, a mesma
tes a ela (Folha de São Paulo, 10/10/2001). Além situação ocorreu por ocasião do segundo manda-
disso, fato notável foi a eleição do primeiro sena- to do governo FHC (1999-2002) quando a IURD,
dor da Igreja, o bispo Marcelo Crivella, pelo PL do por razões simbólicas e instrumentais, opôs-se ao
Rio de Janeiro, com 3.235.570 votos, superando governo central. No entanto, naquele momento,
políticos tradicionais como Artur da Távora e Leo- conforme sublinha Fonseca, a passagem da Uni-
nel Brizola, além do pastor Manoel Ferreira, da versal para a oposição não se refletiu obrigatoria-
Assembléia de Deus. mente nas votações de seus parlamentares, o que
Dos catorze deputados federais da IURD significa que não haveria um “voto iurdiano” no
constantes na legislatura 1998-2002, dez foram re- Congresso Nacional. Segundo suas próprias pala-
conduzidos à Câmara Federal nas eleições de vras: “o comportamento do voto no congresso
2002. Os quatro restantes não concorreram à ree- não aponta para uma real bancada Universal. Em
leição. A questão que fica no ar é saber se houve geral os deputados seguem seus partidos [...]”
uma desistência voluntária dos mesmos ou a não (Fonseca, 1998, p. 20). Esse fato, porém, em vez
candidatura se deveu a uma decisão da Igreja. Re- de denunciar uma incapacidade política da IURD
lativamente às eleições proporcionais para os le- ou uma dificuldade de entendimento entre os de-
gislativos estaduais, a IURD enfrentou, nas mes- putados iurdianos, parece, antes, revelar o modo
mas eleições de 2002, um problema até certo “sofisticado” de fazer política dessa Igreja, que
ponto inesperado. Trata-se de parlamentares esta- distribui seus deputados em diferentes partidos
duais apoiados ou egressos da própria Igreja em para alcançar melhor poder de barganha política,
eleições passadas, mas que mesmo não receben- o que não impede que em determinadas situa-
do o apoio da Igreja das últimas eleições concor- ções os interesses da Igreja se sobreponham aos
reram “espontaneamente” à reeleição. Isso ocor- dos partidos.
reu, por exemplo, no Rio de Janeiro, no Ceará e Há que se assinalar que a crescente presença
no Rio Grande do Sul.6 Em seu lugar, a Igreja de representantes da IURD no Congresso Nacional
apresentou e apoiou outros candidatos que fo- contribuiu substancialmente para aumentar o tama-
ram, em sua maioria, eleitos, diferentemente da- nho da assim chamada “bancada evangélica”. Na le-
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gislatura 1998-2002, seu número era de 53 deputa- cional mostrou que eles se distribuíam tanto em
dos ligados a treze igrejas (Época, 2/10/2000).7 partidos tidos como de “direita” como de “esquer-
Tudo indica que essa bancada saiu mais fortalecida da”. Mais especificamente, “25 congressistas evan-
nas eleições de 2002. Segundo a Folha de São Pau- gélicos estavam em partidos da oposição e 32 em
lo, “a bancada evangélica de deputados federais partidos pro-governo” (Fonseca, no prelo).
eleitos tem pelo menos sessenta parlamentares, do-
nos de 5,1 milhões de votos”, sendo 23 deputados
filiados às Assembléias de Deus, 22 vinculados ou A eficácia política do carisma
apoiados pela Universal, oito batistas e os demais institucional
de outras denominações, o que significa um au-
mento de cerca de 25% em relação à bancada an- Como procede a Igreja Universal para alcan-
terior (Folha de São Paulo, 10/10/2002). Também çar uma tal façanha no campo político? Ela resul-
no Senado houve um aumento de senadores evan- ta de um modo próprio de fazer política que, des-
gélicos. Eram dois (Iris Rezende e Marina Silva) e de 1997, adotou, no âmbito nacional, o modelo
agora são quatro (Marina Silva, Bispo Crivella, Mag- corporativo da “candidatura oficial”, cujo número
no Malta e Paulo Otavio). de candidatos para os distintos cargos eletivos de-
No entanto, a “bancada evangélica” não pende do capital eleitoral de que dispõe. Dessa
constitui um grupo político coeso. Segundo Fon- forma, realiza, antes das eleições, uma campanha
seca, são raros os temas e as votações em que se para os jovens de 16 anos obterem seu título elei-
pode perceber a existência de uma unidade evan- toral e efetua uma espécie de “recenseamento” de
gélica. Ela aparece em assuntos ligados à moral seus membros/fiéis, no qual figuram seus dados
como a discussão em torno do aborto ou da união eleitorais. Tais dados são apresentados aos bispos
civil dos homossexuais. Por isso mesmo, continua regionais que, por sua vez, os transmitem ao Bis-
Fonseca, “uma análise do comportamento do con- po Rodrigues. Juntos deliberam quantos candida-
gressista evangélico mostra que esta ‘bancada’ tos lançam em cada município ou Estado, depen-
[evangélica] é um mito” (Fonseca, no prelo). De dendo do tipo de eleição, baseados no quociente
certo modo, a revista Ecclésia também sustenta eleitoral dos partidos e no número de eleitores re-
essa idéia ao dizer que “os congressistas ligados censeados pelas igrejas locais. Uma vez lançados
ao povo evangélico [...] são submetidos mais às os candidatos, usam os cultos, as concentrações
orientações partidárias e aos interesses pessoais em massa e a mídia própria (televisão, rádio, jor-
do que às igrejas que os elegeram” (Ecclésia, 81, nal) – de acordo com a legislação eleitoral – para
set. 2002). fazer publicidade dos mesmos.
Assim sendo, salvo em alguns casos, no ge- Nas eleições de 2002, a IURD apresentou al-
ral parece ser difícil se poder falar em “voto evan- gumas novidades em relação às eleições passadas.
gélico”, assim como já observamos ser necessário Como nas demais, ao final dos cultos mais concor-
relativizar a noção de “voto iurdiano”. Aliás, se- ridos, sobretudo os dominicais, não somente era
melhante prudência vale para a atribuição da po- mencionado o nome e o número dos candidatos
sição político-ideológica da “bancada evangélica”. da Igreja aos cargos eletivos, mas, algumas vezes,
Tida, geralmente, como “de direita e conservado- os próprios candidatos eram apresentados aos
ra”, em verdade, como frisou A. Corten, ela não é fiéis/eleitores ou, em caso de sua ausência, os bis-
mais conservadora do que a média da população. pos ou os pastores faziam subir no “palco/altar”
E, especificamente sobre o pentecostalismo, “[...] alguns banners com fotos dos candidatos. Além
não é nem mais nem menos conservador do que desses procedimentos, em 2002, em Porto Alegre,
a igreja católica” (Corten, 1997, p. 18). A título um mês antes das eleições, uma grande faixa foi
ilustrativo, um levantamento efetuado por Fonse- afixada no fundo da “catedral da fé” contendo os
ca na metade de 2001 acerca do vínculo partidá- dizeres: “vamos orar pelos nossos representantes”
rio dos deputados evangélicos no Congresso Na- (seguiam os seus nomes), após o que aparecia a
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passagem de Provérbios 29:2: “Quando se multi- nos distintos níveis da política, são também pes-
plicam os justos o povo se alegra; quando porém soas desconhecidas do grande público e da im-
domina o perverso o povo geme”. E ainda, em al- prensa especializada em política, constituindo-se,
guns domingos um banner de uma urna eletrôni- então, “na surpresa” das eleições.8
ca foi levado ao altar. Com ele o bispo ou o pas- Mas não é “qualquer um” que pode ser can-
tor que presidia a reunião ensinava, de forma didato na Igreja Universal. Ele deve ter o “germe
bastante didática, seus fiéis a votarem em seus do habitus” religioso e político, para usar a ex-
candidatos. Ainda, em Porto Alegre, no domingo pressão de Jean Séguy (1982), tal como é conce-
dia 15 de setembro de 2002, uma urna eletrônica bido pelos dirigentes da Igreja. A esse propósito,
da Justiça Eleitoral foi posta à disposição dos fiéis Conrado efetuou um levantamento no jornal Folha
no hall de entrada da catedral para os que quises- Universal acerca do que é considerado pela Igreja
sem treinar a votar. o perfil adequado do político: “pessoas despoja-
Toda essa dedicação pedagógica, que teve das de interesses pessoais”; “ter o desejo exclusi-
reincidências e diversas expressões em outras ca- vo de glorificar o bom nome do Nosso Senhor Je-
pitais e cidades do país, talvez eleve a Universal à sus Cristo [...]”; possuir “caráter” e “compromisso
condição ímpar da principal instituição brasileira com o povo de Deus”; preocupar-se com os “de-
da atualidade a se ocupar com tamanha aplicação samparados, pobres e necessitados”, “sem vaida-
à conscientização e ao direcionamento do voto de des interiores, sem egoísmos [...]” (Conrado, 2000,
seus membros. Mas, a racionalidade política da pp. 76-77).
Igreja vai além e já foi demonstrada em outras Na prática, como observou P. Freston, os
ocasiões. Dependendo da eleição, ela distribui principais pré-requisitos dos candidatos da Uni-
seus candidatos segundo os bairros, as cidades ou versal são os de serem “pastores que atuam na
as regiões para serem apoiados separadamente mídia” (Freston, 2000, p. 299). Ou seja, não se-
pelas diferentes igrejas locais. Porém, repito, na riam recém-chegados na Igreja e nem totalmente
IURD a escolha dos candidatos é prerrogativa úni- desconhecidos dos fiéis. No entanto, tais requisi-
ca e exclusiva dos dirigentes regionais e nacionais tos não são suficientes para garantir suas eleições.
da Igreja, segundo seus próprios cálculos e inte- A votação que recebem, na espantosa porcenta-
resses. Não há nenhuma consulta democrática aos gem que pode chegar a 95% do total dos fiéis da
membros das igrejas locais. Estes recebem, no IURD, como mostrou a pesquisa Novo Nascimen-
momento oportuno, o(s) nome(s) que devem to, realizada pelo ISER, em 1994,9 resulta, em últi-
apoiar. Muitas vezes, trata-se de pessoas pouco ma instância, sobretudo do fato de terem sido es-
conhecidas pelos “irmãos de fé”. Isso, porém, não colhidos, indicados e/ou apoiados pelos dirigentes
inviabiliza suas eleições. Foi o caso de Valdir Cae- da Igreja como “homens de Deus”, em favor dos
tano, um ex-metalúrgico do ABC paulista que, por quais é usada a “máquina iurdiana”.
ocasião das eleições de 2000, apesar de haver Portanto, Paul Freston tem razão ao dizer
chegado a Porto Alegre há apenas três anos e que na Universal há uma relação de complemen-
meio, e ter se tornado pastor há um ano e meio, taridade entre carisma institucional e qualidades
foi eleito vereador com quase onze mil votos pessoais dos candidatos (Freston, 2000, p. 299).10
(Zero Hora, 3/10/2000, p. 35), e de Almerindo Fi- No entanto, acredito que o primeiro pólo – insti-
lho, que por ocasião das mesmas eleições era tucional – é preeminente sobre o segundo – indi-
pastor há cinco anos e que antes de se candida- vidual –, e isso se deve à estrutura eclesial caris-
tar a vereador em Porto Alegre, embora residisse mática, centralizada e não participativa (Carneiro,
nesta cidade, atuava como pastor no município 1998)11 que prevalece nessa Igreja. Ela é reconhe-
vizinho de Viamão, distante vinte quilômetros da cida como tal pelo próprio Bispo Rodrigues,
capital gaúcha. quando afirma: “Nossa força é que temos uma
Em razão desse procedimento que vigora na hierarquia, há uma hierarquia que é seguida à ris-
Universal, algumas vezes seus candidatos eleitos, ca [...]” (Jornal do Brasil, 29/10/2001), o que im-
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plica dizer que o poder da instituição prevalece dimento comum aos evangélicos, qual seja, “reli-
sobre o dos indivíduos, sejam eles simples fiéis giogizar o político”.
ou pastores. Esse poder chega a tal ponto que, se- De fato, a IURD tende a acionar o princípio
gundo Conrado, o pastor eleito não é dono do milenarista, cuja intensidade guarda, até certo
seu próprio mandato. Ao contrário, “o político ponto, relação com as notícias veiculadas na im-
eleito pela IURD tem o seu mandato nas mãos prensa nacional acerca da corrupção no campo
dela, seguindo sua orientação nas questões de in- político. Ou seja, quanto mais a mídia divulga
teresse da igreja. A legitimidade da sua represen- casos de escândalos, mais a Igreja apela e acio-
tação deriva de um ‘ato de instituição’ que a or- na o componente milenarista que se expressa,
ganização faculta” (Conrado, 2000, pp. 54-55). por exemplo, nesta frase do Bispo Rodrigues:
Evidentemente, é impossível não perceber faz-se necessário “uma grande reforma espiritual
que por trás do carisma institucional há um reduzi- na vida do povo brasileiro” (Rodrigues, 1998, p.
do mas poderoso grupo de indivíduos, liderado 27), da qual pode resultar uma nova moral pú-
pelo Bispo Rodrigues, que exerce seu poder nos blica e uma nova ética na política. Para tanto,
vários momentos da atividade política iurdiana. continua o referido bispo, é “papel da Igreja do
Cabe a eles, de um lado, escolher os candidatos “re- Senhor Jesus Cristo: anunciar a verdade, doa a
presentantes da Igreja”, segundo o tipo de eleição quem doer e cobrar das nossas autoridades a
em questão, bem como distribui-los entre os parti- prática dos princípios éticos e morais do nosso
dos políticos, e, de outro, orientar os bispos e os povo, de acordo com a própria Carta Constitu-
pastores locais para solicitarem os votos dos fiéis. cional do país” (Idem, p. 29). Por isso mesmo,
Diga-se de passagem, semelhante poder do conclama o povo de Deus a eleger “homens e
staff dirigente da Igreja é verificado quando se tra- mulheres tementes ao Senhor Jesus [...]” (suben-
ta de enviar pastores para o exterior.12 Diferente- tende-se evangélicos).14
mente de outras igrejas missionárias, em que o Portanto, para a IURD, e outras igrejas pen-
“chamado interior” constitui um importante ele- tecostais ou reformadas, a corrupção é a antítese
mento motivador para o desempenho da ativida- dos princípios cristãos de valorização da comuni-
de missionária, na IURD esta não será a razão para dade, do bem comum e da fraternidade, consti-
alguém atuar no exterior e sim o fato de ter sido tuindo-se no inimigo do bem-estar dos cidadãos.
enviado pela cúpula dirigente da Igreja. Aliás, o A corrupção justifica e legitima o ingresso na po-
mesmo procedimento vale para as freqüentes lítica, uma vez que eles se consideram uma espé-
transferências de pastores dentro do Brasil. cie de “reserva moral” da sociedade.
É claro que o sucesso do exercício da autori- Reitero que o discurso pela ética na política
dade carismática institucional iurdiana na política é recorrente nas igrejas evangélicas em geral. No
não se dá de forma opressiva em relação aos seus entanto, como referiu R. Mariano, a experiência
fiéis. Ela é legitimada mediante a mobilização de tem mostrado que em sua prática política “vários
vários elementos práticos e simbólicos. Por um parlamentares pentecostais, membros de igrejas e
lado, a Igreja faz uso da sua bem montada rede mi- partidos conservadores, protagonizaram escânda-
diática, impressa e eletrônica, bem como de sua los variados de malversação de recursos públicos
rede assistencialista, cujo fortalecimento ocorreu e revelaram possuir uma voracidade fisiológica
em 1994 com a criação da Associação Beneficente que em nada diferia da dos piores de seus pares
Crista (Cristã) (ABC), entidade que concentra a ação não crentes” (Mariano, 2000, p. 61).
social e mantém diversos projetos assistenciais da Porém, quanto à atuação dos parlamentares
Igreja.13 Mas, por outro lado, ela traz para o campo iurdianos F. Conrado sublinha que eles não se
político e para a construção de sua representação envolveram em escândalos dessa ordem. É o que
política, elementos doutrinários e discursivos pró- também escreveu – e não há novidade nisso – o
prios do campo religioso, reproduzindo um proce- Bispo Rodrigues, em 1998:
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[...] em meio a tantas falcatruas e espertezas [que Se, portanto, o diabo atua na política – oca-
vigora na política do país] os homens e mulheres sionando a corrupção e os comportamentos ilíci-
que levam o nome de Deus [subentende-se a ban- tos e antiéticos –, a Universal se diz capaz de li-
cada parlamentar da IURD] não se deixaram con-
bertá-la do poder desse mal. Para isso, aciona
taminar pela prática comum da corrupção. Os nos-
um recurso invisível mas poderoso, a força que
sos candidatos mostraram, na prática, o que é
verdadeiramente a ética na política (1998, pp. 7-8).
purifica tudo, inclusive a política: a “força do Es-
pírito Santo”, o “poder do Senhor Jesus”, “o pai
E a defesa da ética e o combate à corrupção das luzes que vence o poder das trevas”, segun-
do o dizer dos ministros da IURD.
continuarão sendo seus objetivos, segundo decla-
A conseqüência desse discurso é que para
rou o mencionado Bispo ao jornal Folha Univer-
os fiéis iurdianos votar não constitui apenas um
sal, logo após a sua reeleição:
exercício de cidadania. Ele também é concebido
Meu compromisso é manter a ética, cumprindo como um ato que preenche um sentido quase-re-
meu mandato em favor dos pobres e da nação. ligioso. Trata-se de um gesto de exorcismo do de-
Quero combater a corrupção, lutar pela proteção mônio que se encontra na política e de sua liber-
do meio ambiente, pela reforma tributária, pela tação para que ela seja ocupada por “pessoas
melhor distribuição de renda, partilha da terra, tementes ao Senhor Jesus”, segundo a expressão
diminuindo a injustiça social (Folha Universal, de Bispo Rodrigues. Em outras palavras, o efeito
edição 550, 19/10/2002). de sentido produzido pelo discurso e pelo caris-
ma da IURD por ocasião do período que precede
Porém, a construção de uma outra socieda- as eleições é tal que seus fiéis acrescentam um
de e de uma outra política subentende a vitória na significado a mais ao ato de votar além do dever
guerra espiritual em que a Igreja está inserida. Ou cívico. O gesto de votar adquire o sentido de um
seja, a IURD, mas não só ela, apela diretamente rechaço do mal presente na política e sua substi-
para o discurso das “forças invisíveis” que atuam tuição pelo bem, ou seja, por pessoas convertidas
na política (Corten e Mary, 2000).15 Mais especifi- ao evangelho, por “verdadeiros cristãos”, por “ho-
camente, a simbólica da diabolização – que, se- mens de Deus”.
gundo Barros, constitui “[...] o eixo a partir do Esse significado simbólico do voto para os
qual o universo simbólico desta igreja é construí- fiéis da IURD ficou bem caracterizado nas elei-
do” (1995, p. 1) – é a chave pela qual a Universal ções de 6 de outubro de 2002. Com efeito, a par-
conclama seus fiéis a participarem da política para tir do domingo dia 22 de setembro todos quantos
vencer o satanás. “Não votem nos políticos que compareceram aos templos da Universal recebe-
estão a serviço de satanás, que não querem que a ram um pequeno envelope que continha um ca-
obra de Deus prospere”, disse o bispo da Univer- jado de treze centímetros de comprimento, feito
sal que presidiu o culto de 22 de setembro passa- de papelão resistente, portando os dizeres “os 10
do em Porto Alegre. “Os espíritos que atuam na dias da libertação”. Em verdade, tratava-se de
política, disse recentemente o Bispo Rodrigues, uma “campanha” que iniciou no dia 27 de setem-
são os espíritos dominadores, os príncipes das bro e que (não por coincidência) terminou no dia
trevas” (Jornal do Brasil, 29/10/2001). Em outra 6 de outubro. Como todas as campanhas promo-
oportunidade o mesmo bispo afirmou: “O diabo vidas pela Igreja, esta também se baseava na Bí-
está alojado dentro do Congresso Nacional, crian- blia, mais precisamente em João 8:36, que dizia
do lei injustas e erradas” (Folha Universal, 302, “Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente se-
18/1/1998). “A maioria dos políticos estão a servi- reis livres”, e em Êxodo 14, que narra a passagem
ço do satanás”, repetiam pastores e bispos nos de Moisés pelo Mar Vermelho.
domingos que precederam a eleição de 6 de ou- Ao explicar essa campanha na “Catedral da
tubro de 2002. Fé”, em Porto Alegre, no dia 22 de setembro, o
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bispo Alfredo Paulo acrescentou: “no dia 6 de ou- No entanto, a imitação da IURD por parte da
tubro nós vamos votar com o cajado”. E explicou: Assembléia de Deus vai até certo ponto. Nas elei-
ções de 2002, a orientação da Convenção Geral
Assim como o Senhor disse a Moisés: levanta a das Assembléias de Deus foi no sentido de não
tua vara, estende a mão sobre o mar, e o Mar Ver- exercer nenhuma “pressão ou orientação direta
melho se abriu, assim também nós vamos apertar aos fiéis”. Antes disso, afirmou o pastor João Fer-
os números na urna eletrônica com o nosso caja-
reira Filho, em declaração ao jornal Zero Hora, de
do e vamos abrir o mar do Evangelho, elegendo
Porto Alegre, “deixamos claro que cada crente é
os homens de Deus. Vamos eleger os homens de
Deus que vão trabalhar para a obra de Deus.
livre para optar por um candidato” (Zero Hora,
2/1/2002 (cad. Jornal da Eleição, p. 10).
Assim sendo, no Rio Grande do Sul, por
Como se vê, a Universal mobiliza na esfera po-
exemplo, nas eleições de 2002, a Assembléia de
lítica crenças, valores, símbolos e cosmovisões do
Deus apoiou oficialmente dois candidatos a depu-
seu universo simbólico, e a partir deles produz uma
tado estadual, ambos já deputados e assembleia-
ressemantização do voto, inscrevendo-o “numa lógi-
nos, Eliseu Santos e Edmar Vargas, este último
ca cosmológica, na perspectiva da guerra santa” (Se-
sendo inclusive pastor, que foi reeleito, com
mán, 2001, p. 96).16
49.574 votos, enquanto Eliseu Santos, com 37.640
votos, figurou na primeira suplência. Para deputa-
do federal a Assembléia apoiou oficialmente um
O efeito mimético produzido pela
único candidato, que não possuía trajetória políti-
Igreja Universal
ca, o pastor Milton Cardias. Com 40.802 votos
também ficou na primeira suplência do PTB, par-
O sucesso político da IURD parece estar
tido de todos os candidatos citados. No entanto,
produzindo um efeito mimético no campo reli-
em razão de preenchimento de cargos no primei-
gioso. Assim, por exemplo, uma parcela da As- ro escalão do governo do Estado , ambos os can-
sembléia de Deus vê a IURD como uma igreja didatos que estavam na suplência ocuparam suas
que precisa ser imitada. Foi o que declarou o cadeiras parlamentares.
pastor João Ferreira Filho, presidente daquela Os próprios líderes religiosos da Assembléia
Igreja no Rio Grande do Sul, no dia seguinte às de Deus reconhecem, porém, que a dificuldade de
eleições municipais de 2000, quando viu o fracas- eleger os candidatos “oficiais” se deve ao fato de
so eleitoral de sua denominação, que lançou em que outros membros da Igreja também se lançam
Porto Alegre quatro candidatos a vereador não candidatos, dividindo, conseqüentemente, os vo-
elegendo nenhum, diferentemente da IURD, que tos dos irmãos.17
lançou dois candidatos, elegendo ambos. Disse Como se pode notar, a política da Assem-
ele: “eu admiro muito a Universal, temos que imi- bléia de Deus consiste na indicação e na decla-
tá-la”. Vai na mesma direção o depoimento do ração de alguns candidatos por parte da cúpula
conhecido pastor da Assembléia de Deus, Silas dirigente local, mas dá liberdade aos seus fiéis
Malafaia: “Queremos exaltar o bonito exemplo da de votar em quem desejarem, e não desaconse-
Igreja Universal, que define muito bem seus re- lha outros fiéis a apresentarem seus nomes a car-
presentantes no legislativo. As outras denomina- gos eletivos.
ções deveriam imitá-la [...]” (apud Machado, 2001, Outra igreja pentecostal que, nos últimos
p. 7). E essa não é a posição de um ou de outro anos, ao menos no Rio Grande do Sul, tem se lan-
pastor da Assembléia de Deus, pois em conven- çado mais diretamente na política, é a Igreja do
ção nacional essa Igreja decidiu que nas eleições Evangelho Quadrangular. Desde as eleições de
de 2002 iria indicar a seus seguidores candidatos 2000, ela também procedeu, em parte porém,
a deputados, senadores, governador e presidente de maneira semelhante à Universal. Com efeito,
(Zero Hora, 16/10/2001). naquelas eleições, bem como nas proporcionais de
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2002, a Quadrangular efetuou em todos os municí- evangélicos em geral e da IURD em particular,


pios onde está instalada um levantamento de sua embora, evidentemente, não se possa estabelecer
potencialidade política, decidindo então lançar ou uma relação direta entre os dois fatos mesmo por-
não candidaturas “oficiais” da própria Igreja, ou de que, como se sabe, essa Igreja tem historicamen-
apoiar outras candidaturas. Assim, por ocasião das te participado da vida política nacional, embora
eleições de 2000, a igreja de Porto Alegre lançou com intensidade variada segundo as conjunturas.
como candidato oficial para a Câmara de vereado- No entanto, nos últimos anos podemos per-
res o pastor Nilo Sergio dos Santos. Concorreu pelo ceber um redobrado esforço católico em relação
PTB e obteve 2.333 votos, não se elegendo. Nas à política. Em primeiro lugar, observa-se, em dis-
eleições 2002, em prévias realizadas no interior da tintas instâncias políticas, como nas câmaras de
Igreja em junho de 2002, indicou o já deputado vereadores, nos legislativos estaduais e mesmo
Manoel Maria, do PTB, membro da Igreja, como no Congresso Nacional, uma articulação entre
candidato oficial da Igreja, e para a Câmara Fede- políticos católicos e membros da hierarquia insti-
ral indicou o pastor Reinaldo Santos e Silva, tam- tucional no sentido de garantir, como diz Dom
bém pelo PTB. Ambos foram eleitos, o primeiro Antônio Cheuiche, bispo Emérito de Porto Ale-
com 38.361 votos e o segundo com 43.716 votos. gre, um “novo espaço onde os parlamentares se
Dessa forma, a prática política da Quadran- reúnam para rezar, para melhorar a sua vida es-
gular apresenta uma diferença tanto em relação à piritual e aprofundar a consciência e seus conhe-
Assembléia de Deus como à Universal. Enquanto cimentos sobre o compromisso político do cris-
essas igrejas não realizam prévias internas, a Qua- tão” (jornal Nova Versão, 18-24/10/2001, p. 5).
drangular assim procede, de maneira semelhante Tais articulações resultaram, em certas cidades e
ao que ocorre nos partidos políticos. Ou seja, essa Estados, bem como na Câmara Federal, na forma-
Igreja privilegia um procedimento democrático de ção da chamada “bancada católica”.
escolha de candidatos “oficiais”, cuja eficácia é su- A segunda forma pela qual a Igreja Católica
perior à produzida na Assembléia de Deus. se inseriu nos últimos anos mais diretamente na
Assim, nota-se que tanto a Assembléia de política é pela divulgação, nos períodos eleitorais,
Deus como a Quadrangular “imitam” a Universal de cartilhas de orientação política para os eleito-
até certo ponto. Não compartilham com o vertica- res. Se, de fato, há uma recorrência da CNBB na
lismo desta última e reconhecem a liberdade do emissão dessas cartilhas – como fez em 2002 com
fiel de escolher seu próprio candidato, evangélico o documento intitulado “Eleições 2002”, lançado
ou não, mesmo que indicado pelas igrejas. O pro- por ocasião da reunião de Itaici no início de abril
cedimento das duas tradicionais igrejas pentecos- daquele ano – o fato de, além disso, aparecerem
tais aproxima-se das orientações da Associação cartilhas “regionais”, mostra o (redobrado) inte-
Evangélica Brasileira que, em documento intitula- resse da Igreja Católica com as eleições. Foi o que
do “Voto Ético”, emitido por ocasião das eleições ocorreu no Rio Grande do Sul, onde o arcebispo
2002, preconizou, entre outras coisas, em seu De- de Porto Alegre, Dom Dadeus Grings, lançou em
cálogo Evangélico, que “Nenhum cristão deve se março de 2002 a “sua” cartilha de orientação para
sentir obrigado a votar em um candidato pelo sim- o “voto consciente” dos cristãos. Nela ressalta que
ples fato de ele se confessar cristão evangélico” (VI “a igreja não deve optar por um partido político
mandamento), e que “O pastor deve ser obedeci- ou por um candidato” e que o período eleitoral é
do em tudo aquilo que ensina sobre a Palavra de “muito bom para aprofundarmos o sentido de pa-
Deus, de acordo com ela. No entanto, no âmbito triotismo, do civismo, da cidadania, e de todos lu-
político-partidário a opinião do pastor deve ser ou- tando pelo bem comum” (jornal Versão Semanal,
vida apenas como a palavra de um cidadão, e não 21 a 27 de março de 2002).
como uma profecia divina” (X mandamento). Por fim, a Igreja Católica participa da política
A Igreja Católica, por sua vez, também não mediante a presença de membros do clero que
parece insensível diante do avanço na política dos concorrem a cargos eletivos. Nesse sentido, o setor
A POLÍTICA DA IGREJA UNIVERSAL E SEUS REFLEXOS... 61

Vocações e Ministérios da CNBB constatou que por reador, mas tiveram uma votação tão reduzida
ocasião das eleições 2000 houve um aumento de que mesmo somando todos os seus votos não lo-
candidaturas de religiosos a cargos públicos. Um grariam eleger um único vereador. Antes disso,
estudo de Moreira de Oliveira realizado junto a 176 nas eleições legislativas de 1998, outro renomado
dioceses brasileiras, correspondendo a 65,67% do pai-de-santo apresentou-se como candidato, e es-
total, apurou que nas mencionadas eleições a quan- perava receber 30 mil votos, mas obteve 3.425.
tidade de presbíteros candidatos “superou a faixa Em razão desses e de outros fracassos, as federa-
de cem padres” (Moreira de Oliveira, 2002, p. 263), ções e os terreiros não apresentaram candidatos
tendo cerca de 70% deles concorrido a cargo de nas últimas eleições.
prefeito, seguido de vice-prefeito e de vereador. Os Acredito que o insucesso político das reli-
dados da pesquisa mostraram que 41% dos padres giões afro-brasileiras guarda alguma relação com
candidatos concorreram pelo PT, seguido do sua estrutura organizacional, formada pela varie-
PMDB, com 12%, e pelo PSDB, com 9%. A pesqui- dade de federações e pulverização de terreiros,
sa revelou ainda que 44,77% dos candidatos vence- onde todos são, ao mesmo tempo, autônomos e
ram as eleições (Idem, pp. 264-265). rivais entre si. Não existe, no âmbito dessas reli-
Nas eleições de 2002, no Rio Grande do Sul, giões, uma hierarquia religiosa única, nem um po-
dois membros do clero católico candidataram-se à der centralizador e aglutinador dos centros reli-
Assembléia Legislativa, ambos pelo PT. O já depu- giosos. Ora, esse éthos constituído de permanente
tado e sacerdote Roque Grazziotin, que nas elei-
disputa, rivalidade e desqualificação mútua torna,
ções de 1998 recebera 29.113 votos, obteve 23.409
como reconhece Prandi, bastante remota a possi-
votos, ficando na segunda suplência; e Sergio
bilidade de união entre terreiros e grupos, mesmo
Goergen – membro da Ordem dos Frades Menores
em se tratando de proveito para a religião (Pran-
da Província do Rio Grande do Sul – eleito com
di, 1991, p. 163).
44.633 votos. . Durante o governo Olívio Dutra, do
No entanto, e apesar dessas considerações,
PT, Goergen trabalhou, durante dois anos, na Se-
nas eleições de 2002 em outros Estados da federa-
cretaria da Agricultura como coordenador da Re-
ção foi melhor o resultado político das religiões
forma Agrária.
afro-brasileiras. Em relação a São Paulo, por exem-
Observe-se que diferentemente das igrejas
plo, a Folha de São Paulo apresentou no dia 3 de
pentecostais, a Igreja Católica não realiza prévias
nem assume a candidatura oficial de seus mem- outubro a matéria “Os atabaques vão à forra”,
bros que concorrem a cargos eletivos. Trata-se da mostrando que as “religiões afro-brasileiras se or-
postulação pessoal do clérigo que, após autoriza- ganizam para eleger parlamentares que façam
ção do bispo e/ou do provincial o dispensando frente à bancada dos evangélicos” (Folha de São
das atividades religiosas, passa a se dedicar tem- Paulo, 3/10/2002). O candidato Sebastião Arcanjo,
porariamente à política. Geralmente, a autoriza- o Tiãozinho, vereador pelo PT de Campinas, foi
ção é um processo difícil, e nem sempre obtém eleito para deputado estadual com 57.174 votos.
êxito, pois depende da posição teológica e ideo- A tabela 1 foi elaborada a partir da observa-
lógica do bispo da diocese, ou do provincial da ção do comportamento eleitoral de igrejas e reli-
Ordem Religiosa. giões no Rio Grande do Sul nas eleições de 2002.
Finalmente, as federações e os membros das Ela sintetiza os modelos de participação política de
religiões afro-brasileiras também tentam ingressar cada um dos segmentos religiosos referidos aqui e
na esfera política, ostentando um discurso de mostra a maior ou menor eficácia eleitoral de cada
“desforra” e de enfrentamento diante dos oposito- uma delas, em função do modelo adotado. Como
res evangélicos. No Rio Grande do Sul, entretan- se pode observar, em termos de eleição de candi-
to, esse discurso não tem alcançado um resultado datos indicados e apoiados, a Igreja Quadrangular
positivo. Nas eleições 2000, em Porto Alegre, qua- conseguiu atingir o melhor índice de eficácia se-
tro importantes pais-de-santo concorreram a ve- guido da Universal e da Assembléia de Deus.
62 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 18 Nº. 53

Tabela 1
Religião Prévias Candidatura oficial Exerce algum tipo de pres
são para direcionar
o voto dos fiéis
Quadrangular Sim Sim Sim
Universal Não Sim Sim
Assembléia de Deus Não Sim Não
Católica Não Não Não
Afro-brasileiras Não Não Não

É evidente que o efeito mimético produzido geral, acrescentaria eu. Assim, há quem diga que
pela inserção política da Universal sobre as de- por trás do empenho do PT em selar aliança com
mais igrejas e religiões não significa a existência o Partido Liberal nas eleições 2002 – cuja razão
de uma relação direta, do tipo “causa e efeito”. mais explícita teria sido atrair o setor empresarial
Por essa razão, é possível interpretar esse fenô- para o PT em torno de José de Alencar, empresá-
meno a partir da teoria girardiana. rio bem-sucedido e senador crítico da política
Com efeito, para René Girard, a mímese ex- econômica do governo FHC – figuraria também,
pressa rivalidade e desejo mediatizado pelo outro. mesmo que com motivação reduzida, o interesse
Nesse caso, a Universal, assumindo o papel de velado de ter a Universal (e seus votos cativos?)
mediador, atua no sentido de se fazer presente na ao seu lado. Esta é, por exemplo, a leitura que faz
política, o que desperta o mesmo desejo – ingres- A. Fonseca, para quem “o Partido dos Trabalha-
sar na política – em outras igrejas e religiões. Ou dores prefere referir essas negociações (com o
seja, segundo essa teoria, o desejo (entrar na po- PL) como sendo não com a IURD mas sim com o
lítica) aparece nas outras igrejas – evangélicas, ca- PL” (Fonseca, no prelo).
tólica e religiões afro-brasileiras – porque ganhou Seja como for, o PT e a Universal já estabele-
força primeiramente na Universal. Assim, esta- ceram alianças em outras eleições e, nos últimos
mos diante de grupos concorrentes, embora, con- anos, mantiveram boas relações na Câmara federal.
tinua Girard, os que têm o desejo despertado pelo No entanto, lembremos que no primeiro turno da
outro tendem a dissimulá-lo, afirmando que “seu campanha presidencial de 2002 a Universal apoiou
próprio desejo é anterior àquele de seu rival”. o também evangélico, Anthony Garotinho, do PSB.
Além disso, “tudo o que vem desse mediador é Isso ocorreu mesmo nos Estados em que a Igreja
sistematicamente depreciado embora secretamen- lançou candidatos a deputados e a senador pelo
te desejado”, e, até mesmo, “secretamente venera- PL, partido aliado ao PT. Neste caso, prevaleceu o
do” (Girard, 1961, pp. 25-27). vínculo evangélico do candidato a presidente, so-
mado às alianças produzidas, por exemplo, no Rio
de Janeiro, entre os candidatos da Universal e a
A Igreja Universal, os partidos políticos e candidata vitoriosa ao governo do Estado.
os candidatos No segundo turno das eleições presiden-
ciais, porém, a Universal e o PL declararam seu
Se, no campo religioso, o avanço iurdiano apoio a Lula. “Temos a obrigação de entrar de ca-
na política tende a produzir um “efeito mimético”, beça na campanha do Lula”, disse o Bispo Rodri-
no campo político também não passa despercebi- gues à Radio CBN. “Nossos deputados, agora que
do. Ou seja, como afirma Flavio Conrado, o cam- já estão eleitos, devem se empenhar em mobilizar
po político não está mais alheio à força política as suas bases”. Bispo Rodrigues falava como vice-
que detém hoje a Universal na vida pública brasi- presidente nacional do PL e como responsável
leira (Conrado, 2000, p. 77), e os evangélicos em político da Igreja Universal. Além disso, a opção
A POLÍTICA DA IGREJA UNIVERSAL E SEUS REFLEXOS... 63

por Lula foi decidida pela cúpula da Universal, e morado os 78 anos dessa Igreja na capital gaú-
também do PL, na esperança de que ele realizas- cha. Também em Brasília, segundo o jornal Cor-
se um governo voltado para os pobres, uma vez reio Braziliense, de 14 de outubro de 2002, os
que, nas palavras do bispo, dois candidatos que chegaram ao segundo turno
no Distrito Federal disputaram os votos do elei-
[...] todos estão cansados de ideologia. A popula- torado evangélico.
ção quer saber como serão resolvidos problemas É evidente, porém, que o apoio declarado
do transporte, educação, saúde, como será redu-
pelos líderes evangélicos, mesmo que, segundo
zida a miséria. Por isso vamos adotar uma nova
forma de fazer política. Trata-se do socialismo de
dizem, tenham consultado as “bases”, não se tra-
resultados (Jornal do Brasil, 13/10/2002). duziu em votos cativos, seja para um, seja para
outro candidato. Isto porque, como se sabe, no
Também Anthony Garotinho declarou seu momento preciso da decisão de voto outras variá-
apoio a Lula já na largada do segundo turno. De veis entram em pauta, sem falar na divergência
acordo com a imprensa, tanto Rodrigues como existente, tanto na hierarquia como na base des-
Garotinho atuaram como mediadores junto a ou- sas igrejas, em relação à questão de participar ou
tras igrejas evangélicas para conseguir apoio a não da política e de apoiar unânime e explicita-
Lula nas eleições de 27 de outubro de 2002. As- mente determinado candidato.
sim, em 15 de outubro daquele ano a Igreja Renas- Portanto, em primeiro lugar, se por ocasião do
cer em Cristo expressou seu apoio à candidatura primeiro turno das eleições presidenciais os evan-
Lula e, no dia 17, o candidato reuniu-se no Rio de gélicos se inclinaram majoritariamente para a candi-
Janeiro com cerca de 900 pessoas de diversas igre- datura de Garotinho, no segundo turno houve uma
jas que manifestaram seu apoio. Entre as igrejas divisão de intenção de voto entre os candidatos
estavam a Metodista, a Batista, a Sara Nossa Terra, Lula e Serra.19 Em segundo, nunca na história repu-
além da Universal e dos pastores da Assembléia blicana brasileira recente ocorreu uma aproximação
de Deus que não seguiram a decisão das duas tão grande entre política e religião, um interesse tão
principais convenções da igreja de apoiar Serra. explícito e uma disputa tão aberta pelos votos evan-
De fato, o candidato José Serra mobilizou-se gélicos. Isso quer dizer que os candidatos e os par-
pessoalmente para obter o apoio das Assembléias tidos se deram conta de que os evangélicos consti-
de Deus, bem como da igreja Quadrangular. Em 10 tuem hoje uma importante força política, podendo
de outubro de 2002 recebeu o apoio da Conven- até decidir uma eleição. Esta era, aliás, a pondera-
ção Nacional das Assembléias de Deus (Conade) e, ção/advertência feita por J. Burity, em 1997: “os
em 16 de outubro, o apoio da Convenção Geral partidos e candidatos que não levam em considera-
das Assembléias de Deus no Brasil (CGADB) e da ção os grupos religiosos em seu discurso e estraté-
Igreja Quadrangular.18 gia correm sério risco de se complicarem ou invia-
Vale registrar que semelhante interesse pelo bilizarem eleitoralmente” (1997, p. 46).
apoio evangélico ocorreu nas eleições majoritárias Assim, como já havia aludido anteriormente,
dos Estados. Assim, por exemplo, no Rio Grande a aliança entre o PT e a Universal não é uma no-
do Sul o candidato a governador Tarso Genro lan- vidade – já tinha se concretizado em muitos muni-
çou em 27 de setembro de 2002, em Cachoeiri- cípios e Estados por ocasião das eleições de 2000.
nha, na região metropolitana de Porto Alegre, o Naquela oportunidade, o denominador comum
Comitê Religioso de Apoio à Frente Popular, com entre o partido e a Igreja foi o discurso pela ética
a presença de representações de 36 igrejas evan- na política. Durante o segundo turno da campa-
gélicas. No dia 19 de outubro, ambos os candida- nha eleitoral de 2000, Bispo Rodrigues compare-
tos ao governo do Estado, T. Genro, da Frente Po- ceu em Porto Alegre, no programa eleitoral do PT,
pular, e G. Rigotto, da União pelo Rio Grande, enaltecendo a “ética em governar” desse partido,
compareceram em Porto Alegre na matriz da Igre- e finalizou seu discurso com a frase: “Vote em
ja Assembléia de Deus, onde estava sendo come- quem governa com ética. Vote no PT”. Por seu tur-
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no, durante a campanha desse partido em todo o cita, entre outras coisas, duas importantes ques-
Brasil, nas mesmas eleições, foi constante, de um tões teóricas. Uma diz respeito às fronteiras entre
lado, a denúncia contra a falta de ética por parte o religioso e o político, e outra versa sobre as
de governantes e políticos que davam sustentação conseqüências do ingresso evangélico no univer-
política ao governo federal e, de outro, a irretocá- so político para a democracia e a cultura política
vel conduta moral do PT: “passamos por essa brasileiras.
campanha [de 2000] sem sermos alvos de uma úni- Com efeito, malgrado a separação oficial en-
ca denúncia de corrupção”, afirmou Lula (Isto É, tre igreja e Estado, a história das relações entre po-
8/11/2000, p. 4). Ou seja, a afinidade discursiva lítica e religião no Brasil sugere menos a existên-
entre a Universal e o PT fundamentou-se, então, cia de autonomia e oposição entre esses campos
na idéia de “purificação da política” ou de “ética do que de continuidade, ponte, trânsito e passa-
pela política”. Nas eleições de 2002, a esse discur- gem, o que resulta na dificuldade de se traçar
so foi acrescido um outro, que aproximou o parti- fronteiras claras. E mesmo atualmente, sugere J.
do e a Universal, qual seja, o da atenção aos po- Burity, verifica-se no Brasil “um arrefecimento da
bres e ao trabalho na área social. distinção entre religião e política” (1997, p. 77),
Há, porém, que se considerar, como já analisei ou, de acordo com J. J. de Carvalho, uma luta “[...]
em outro artigo (Oro, 2001), as importantes diferen- para ampliar a dimensão religiosa do espaço pú-
ças ideológicas existentes entre o partido e essa igre- blico e não por laicizá-lo” (1999, p. 16). Essa situa-
ja no que concerne à defesa da ética na política. ção por certo ocorre não sem relação com a pró-
Com efeito, para o PT, trata-se de um princípio de pria cultura brasileira e do lugar que nela detém o
respeito e valorização da cidadania, devendo os po- religioso. De fato, nosso país, como vários autores
líticos, gestores da coisa pública (e não de interesses já sublinharam, malgrado o avanço da modernida-
pessoais ou corporativos), cumpri-la com responsa- de, é muito marcado pelo imaginário religioso (Ri-
bilidade, transparência, justiça social e participação beiro, 2000), em que “o domínio do ‘sobrenatural’
popular. Ademais, via de regra os eleitores do PT aparece como fundamental” (Velho, 1991, p. 31),
realizam a cidadania num contexto de racionalidade o que faz do Brasil um país que jamais deixou de
diferente da que prevalece entre os eleitores da Uni- ser “religioso” (Giumbelli, 2002, p. 54). Conse-
versal. Para estes, o discurso pela moralização en- qüentemente, completa Regina Novaes, são hoje
quadra-se no âmbito da batalha espiritual, o que muito “delicadas as relações entre religião e polí-
abre espaço ao apelo de “forças invisíveis” que atua- tica” (2002, p. 64).
riam na política. Em outras palavras, a política é Em contrapartida, pode-se perguntar se o
“suja”, “corrupta” e “desonesta” devido, de acordo ofuscamento ou o deslocamento ou, ainda, a flu-
com a Igreja, à presença do demônio. tuação das fronteiras entre religião e política, para
No entanto, a idéia de moralização da polí- os quais, em nosso país, tem muito contribuído o
tica, presente nos dois discursos, precisa ser ana- ingresso recente das igrejas evangélicas na políti-
lisado como um componente do imaginário polí- ca, não revelam, como sugere Renato Janine Ribei-
tico dessas duas instituições, o que não garante, ro, desgaste, esvaziamento, descrença ou mesmo
por si só, sua efetivação empírica. Por isso, é ne- desencantamento em relação à política, observa-
cessário que se verifique até que ponto a prática dos em parcelas importantes de nossa sociedade
política está isenta de ações corruptas e da pree- e, eu diria, também em outros países da América
minência dos interesses pessoais e corporativos. Latina e da África.20 Não haveria, nesse caso, uma
“energia nova” pulsando em áreas que não têm
Conclusão: tradição política, como, por exemplo, a esfera da
religião, política e democracia religião? (Ribeiro, 2002). André Corten também
discute essa idéia, ao sugerir que existe uma for-
O envolvimento da IURD, em particular, e ma de política fora do âmbito político tradicional,
dos evangélicos, em geral, na política nacional sus- mas a “extrema timidez” do pesquisador prejudi-
A POLÍTICA DA IGREJA UNIVERSAL E SEUS REFLEXOS... 65

ca sua compreensão a esse respeito, posto que quanto à possibilidade de haver uma relação be-
ele ainda superestima “o instituinte político” (Cor- néfica entre religião e política (Dodson, 1997, pp.
ten, 2001, p. 159). 25-26). Seja como for, importa destacar alguns
Eventualmente, prossegue Ribeiro, essas no- pontos. Em primeiro lugar, os evangélicos seguem
vas energias “[...] passam para o campo político e aceitam as regras da vida democrática e do jogo
ou são absorvidas por ele” (2002, p. 104). O pro- político estabelecido;21 em segundo, o fato de eles
blema, nesse caso, é saber “por que essa energia, comparecem na esfera política comprova a possi-
que passa para o campo político, torna-se estéril?” bilidade democrática de participação; em terceiro,
(Idem, ibidem). Semelhante observação é feita como sublinha Alexandre B. Fonseca, os evangé-
por Corten quando afirma que se o pentecostalis- licos, pelo seu discurso crítico contra determina-
mo pode, por um lado, ser considerado um insti- dos procedimentos políticos anti-éticos, pela de-
tuinte da sociedade – por exemplo, pela produ- núncia da situação difícil em que se encontram
ção de identidades coletivas –, por outro, não largos setores da sociedade, efetivamente contri-
constitui uma fonte instituinte do político, ou
buem , mesmo que de forma indireta, para a con-
seja, não imprime uma marca diferenciadora em
solidação democrática no Brasil, (Fonseca, no pre-
sua prática política (Corten, 2001). Essa situação
lo); finalmente, em quarto lugar, os evangélicos
ocorreria, segundo Mariano, em relação aos par-
constituem uma fonte de mobilização política de
lamentares evangélicos na política brasileira –, em
setores sociais desfavorecidos. Para muitas pes-
razão da aceitação, e conseqüente submissão por
soas, diz Fonseca, participar de uma igreja como a
parte desses indivíduos, às regras democráticas vi-
IURD significa a primeira experiência de “conver-
gentes, ao império da lei e às normas jurídicas que
sar sobre política” e de valorizar o voto (Fonseca,
regulamentam o funcionamento das instituições,
dos partidos políticos, do regimento interno da 1997). Se assim ocorre, para certos segmentos so-
Câmara etc. Isso imporia, caso haja intenção, limi- ciais, a política não passa mais rigorosamente pe-
tações a toda e qualquer pretensão de ordem reli- las instâncias tradicionais de sua expressão, tais
giosa, teológica ou mesmo teocrática na política como sindicatos, cooperativas e partidos políticos.
(Mariano, 2000). Em outras palavras, os políticos Em conseqüência– e no aguardo de novos dados
religiosos estariam submetidos a uma espécie de etnográficos e de mais informações empíricas –
camisa-de-força: para atuar na esfera política pre- entendo, assim como Regina Novaes, que hoje
cisam se submeter às regras, mas uma vez lá den- “ser evangélico” “[...] tornou-se uma nova variável
tro encontram pouco espaço para uma prática po- neste jogo de relações entre campo político e cam-
lítica diferenciada. po religioso” (Novaes, 2002, p. 91) e que uma boa
Caso essa hipótese seja confirmada de ma- postura epistemológica seria a de nem subestimar
neira mais definida, poder-se-ia afirmar que, até o a inserção evangélica na política (brasileira e lati-
presente momento, o efeito, sobretudo o da pre- no-americana), reduzindo-a a uma simples mani-
sença da IURD na política, é mais perceptível no festação de uma cultura religiosa corporativa, nem
âmbito religioso, na medida em que, direta ou in- supervalorizá-la, vendo-a como potencializadora
diretamente, a Universal instiga outras igrejas e da democratização da cultura política brasileira.
outras religiões a também participarem da vida
política.
Quanto à relação com a democracia, como NOTAS
sublinha Dodson, podem-se observar diferentes
tendências: alguns autores têm enfatizado as conse- 1 Embora este texto pretenda ter uma abrangência
qüências sociais da expansão pentecostal; outros, heurística nacional, os exemplos ilustrativos resul-
sublinhado os efeitos políticos do pentecostalis- tam, sobretudo, do Rio Grande do Sul, onde reali-
mo, particularmente no estímulo aos valores e às zei uma pesquisa de campo mais longa e sistemáti-
práticas democráticas; outros, ainda, são céticos ca sobre o tema em questão.
66 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 18 Nº. 53

2 Quatro do Rio de Janeiro, três de São Paulo, dois de do Reino de Deus”. O mesmo ocorreu no Rio Gran-
Minas Gerais, e um de cada um dos seguintes Esta- de do Sul, com o pastor Paulo Moreira.
dos: Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Ceará, Rio 7 Para uma análise da formação da bancada evangé-
Grande do Sul, Pernambuco e Paraná e Distrito Fe- lica por ocasião da Constituinte de 1988, ver Pieruc-
deral (Machado, 2001). ci e Prandi (1996). Para uma análise mais geral da
3 A saber: Almeida de Jesus (Ceará), Oliveira Filho bancada evangélica na Câmara Federal, ver Freston
(Paraná), Jorge Pinheiro (Brasília), João Paulo (Mi- (1996 e 2000).
nas Gerais), Paulo Gouvea (Rio Grande do Sul), Re- 8 Por exemplo, o jornal Zero Hora referiu-se à eleição
ginaldo Germano (Bahia), Heleno (Sergipe), Bispo do pastor da Universal Valdir Caetano como a “surpre-
Wanderval (São Paulo), Bispo João Batista (São
sa do pleito no último domingo” (3/10/2000, p. 35).
Paulo), Edna Macedo (São Paulo), Marcos Abrahão
9 Essa pesquisa constatou que “os fiéis da Universal
(São Paulo), Bispo Rodrigues (Rio de Janeiro), Bis-
po Vieira Reis (Rio de Janeiro), Bispo João Mendes concentram seus votos (95%) em candidatos da
(Rio de Janeiro), Divino (Rio de Janeiro) e Marcos própria igreja Universal” (Fernandes et al., 1998, pp.
de Jesus (Pernambuco). 146-147).

4 São eles: Ronaldo (Ceará), Edson Praczyk (Paraná), 10 Como se sabe, para Weber carisma é uma qualidade
George (Minas Gerais), Sergio Peres (Rio Grande do extraordinária, de caráter extra-cotidiano – reconhe-
Sul), Marcio Marinho (Bahia), Madoqueu (Sergipe), cida como tal por um grupo social –, que caracteriza
Souza (São Paulo), Maria de Jesus (São Paulo), Ro- certos indivíduos (profetas, feiticeiros, chefes milita-
berto (São Paulo), Milton Vieira (São Paulo), Wag- res, “demagogos”), mas também instituições. A Igre-
ner Salustiano (São Paulo), Bispo Caetano (Rio de ja, por exemplo, possui um carisma de função, ou
Janeiro), Bispo Jodenir (Rio de Janeiro), Bispo Leo de instituição, derivado da apropriação de um caris-
Vivas (Rio de Janeiro), Armando José (Rio de Janei- ma pessoal fundador (profético), rotinizado (Weber,
ro), Ely Patrício (Rio de Janeiro), Edna Rodrigues 1971, p. 249). Segundo J. Séguy, “[...] para Weber, o
(Rio de Janeiro), Dilma Lins (Pernambuco) e Odete carisma de função representa uma derivação institu-
de Jesus (Santa Catarina). cional do carisma pessoal quando este se rotiniza e
5 Bispo Rodrigues foi eleito em 1998 deputado fede- assume, no processo, significações e funções novas.
ral pelo Rio de Janeiro pela legenda do PFL com 76 O carisma pessoal, por sua vez, caracteriza o profe-
mil votos. Foi reeleito no pleito de 2002 com ta (no domínio religioso), ou o ‘demagogo’ (no do-
192.640 mil votos – quarta maior votação no conjun- mínio político), ou ainda o chefe de guerra de qua-
to dos candidatos à Câmara Federal do Rio de Janei- lidades excepcionais (no campo militar)” (1988, pp.
ro. Ele é hoje vice-líder do Partido Liberal (PL) na 14-15). A relação entre carisma pessoal e graça insti-
Câmara Federal. Fundou a Igreja Universal na Ar- tucional, diz Bourdieu, é de luta pelo monopólio do
gentina e na Espanha e trabalhou em Portugal, An- exercício legítimo do poder religioso. Ou seja, a igre-
gola, África do Sul e Moçambique antes de se dedi- ja, “é incondicionalmente hostil ao carisma ‘pessoal’,
car integralmente, em 1996, à tarefa de coordenador isto é, profético, místico ou extático, que pretende
político da Igreja. Conrado atribui o sucesso eleito- indicar um caminho original em direção a Deus”
ral da IURD, entre outros fatores, à liderança desse (Bourdieu, 1987, p. 95). Ao mesmo tempo, a institui-
bispo que, desde a campanha presidencial de 1989, ção religiosa preconiza que seus funcionários (pa-
coordena candidaturas e define estratégias políticas dres ou pastores) “deve[m] se subordinar à graça ins-
da Igreja, além de conduzir na Câmara Federal a titucional sob pena de condenação [...]” (Séguy, 1982,
ação política dos parlamentares nas questões que in- p. 33); eles devem reproduzir as obrigações articula-
teressam à sua instituição religiosa. das pela instituição proprietária do carisma de fun-
6 O jornal Folha Universal (15-21 set. 2002) divulgou ção (Idem, p. 40).
uma nota esclarecendo que os deputados e os can- 11 Isto é, uma instituição em que “o carisma apresen-
didatos à reeleição para a Assembléia Legislativa do ta-se como o único elemento de organização do po-
Rio de Janeiro, Mário Luiz e Magaly Machado, bem der, da igreja local à organização nacional, consti-
como o ex-pastor Eriberto da Silva Faria, também tuindo um espaço institucional pouco propício à
candidato a deputado estadual no Ceará, “não con- participação dos fiéis nos assuntos da Igreja” (Car-
tam com o apoio dos membros da Igreja Universal neiro, 1998, p. 187).
A POLÍTICA DA IGREJA UNIVERSAL E SEUS REFLEXOS... 67

12 A Igreja Universal, como se sabe, está hoje presen- patrocinar nenhum projeto ou lei que viesse a ferir
te em oitenta países, de todos os continentes, e a os princípios e os interesses dos evangélicos, tais
maioria dos pastores que atuam nesses lugares são como: a união civil de homossexuais, a tributação
brasileiros. da renda das igrejas evangélicas e a lei do silêncio.
13 Como bem frisou A. Corten: “[...] as obras assisten- 19 Por isso mesmo, o jornal Zero Hora, de Porto Ale-
ciais permitem [às igrejas pentecostais] a constitui- gre, no dia do segundo turno das eleições, ironizou
ção de uma base eleitoral (1997, p. 29). dizendo que a disputa não seria entre Lula e Serra,
14 Eis o pronunciamento completo do Bispo Rodrigues: mas entre a Universal do Reino de Deus e a Assem-
“Conclamo o povo de Deus a que nos unamos em bléia de Deus (27/10/2002, Jornal da Eleição, p. 10).
torno dos nossos ideais e não tenhamos medo de 20 Para uma visão atual e abrangente do pentecostalis-
participar do processo político, elegendo homens e mo na América Latina e na África, ver Corten e
mulheres tementes ao Senhor Jesus a fim de que Mary, 2000.
nossa sociedade seja transformada e possa ser orien- 21 Nesse sentido, escreveu Bispo Rodrigues: “O povo
tada, segundo os verdadeiros princípios cristãos” brasileiro deseja que a verdadeira política exerça a
(Folha Universal, 6/08/2000). O sociólogo e teólogo isonomia, trazendo à existência a democracia es-
metodista Leonildo Campos lembra que o sonho de quecida desde os tempos da Antiga Grécia” (Rodri-
uma nova condição social, de uma reconstrução so- gues, 1998, p. 8).
ciopolítica, vigora no conjunto do protestantismo
brasileiro e se expressa nesta quase palavra de or-
dem: “O Brasil será um país diferente quando à sua
frente estiver um homem de Deus” (2000, p. 21). BIBLIOGRAFIA
Para uma análise atual do milenarismo pentecosta-
lista, ver A. Corten (1995). BARROS, Mônica do Nascimento. (1995), A bata-
15 Para esses autores, o pentecostalismo dá continuida- lha de Armagedom. Dissertação de mes-
de a um processo de diabolização realizado pelos trado, UFMG, Belo Horizonte.
missionários, contribuindo, assim, para a globaliza-
BOURDIEU, Pierre. (1987), A economia das trocas
ção de um imaginário de forças do mal (Corten e
simbólicas. 2 ed. São Paulo, Perspectiva.
Mary, 2000, p. 19).
16 Por outro lado, fica implícito que votar, para os fiéis BURITY, Joanildo. (2000), Religião e política na
da Universal, consiste na expressão de sua relação fronteira: desinstitucionalização e deslo-
identitária com a Igreja mais do que com qualquer camento numa relação historicamente
político ou partido. Ou, então, em certa medida a polêmica. Trabalho apresentado no VIII
própria Igreja torna-se seu partido. Esse fato condiz Congresso Latino-americano de Religião
com a concepção prevalecente na cultura brasileira, e Etnicidade, promovido pela Associa-
em que, segundo M. Palmeira, “o voto não é asso- ção Latino-americana para o Estudo das
ciado ao exercício de um direito individual, mas a Religiões, Pádua, Itália, 27 jun.-5 jul.
uma sinalização de adesão a um ‘lado’ (facção) da
sociedade” (Palmeira, 2000, p. 11), nesse caso, um _________. (1997), Identidade e política no cam-
vínculo identitário religioso e político. po religioso. Recife, IPESPE, Editora Uni-
17 Exemplo típico disso ocorreu em Porto Alegre por versitária/UFPE.
ocasião das eleições para vereador de 2000, quando
CAMPOS, Leonildo Silveira. (2000), “Composições
a Assembléia de Deus apoiou oficialmente dois can-
e recomposições do poder espiritual e
didatos, mas não impediu que outros dois também
político”. Tempo e Presença, 22 (313):
se apresentassem como candidatos independentes.
O resultado foi que nenhum deles se elegeu, per-
20-23, set.-out.
dendo, assim, uma cadeira, cujo representante ocu- CARNEIRO, Leandro Piquet. (1998), “Cultura cívi-
pava há duas legislaturas. ca e participação política entre evangéli-
18 Segundo a Folha Online (de 18/10/2002), em troca cos”, in Fernandes et al., Novo nasci-
do apoio José Serra (PSDB) comprometeu-se a não mento: os evangélicos em casa, na igreja
68 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 18 Nº. 53

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176 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 18 Nº. 53

A POLÍTICA DA IGREJA UNI- THE POLITICS OF THE UNI- LA POLITIQUE DE L’ÉGLISE


VERSAL E SEUS REFLEXOS VERSAL CHURCH AND ITS UNIVERSELLE ET SON
NOS CAMPOS RELIGIOSO E CONSEQUENCES IN THE IMPACT DANS LES DOMAINES
POLÍTICO BRASILEIROS BRAZILIAN RELIGIOUS AND RELIGIEUX ET POLITIQUE
POLITICAL FIELDS BRÉSILIENS

Ari Pedro Oro Ari Pedro Oro Ari Pedro Oro

Palavras-chave Key words Mots-clés


Igreja Universal do Reino de Deus; Universal Church of the Kingdom of Eglise Universelle du Royaume de
Campo político brasileiro; Campo God; Brazilian political field; Bra- Dieu; Domaine politique brésilien;
religioso brasileiro; Evangélicos na zilian religious field; Evangelicals in Domaine religieux brésilien; Evan-
política; Pentecostalismo. Politics; Pentecostalism géliques dans la politique; Pente-
côtisme.
Este texto versa sobre a inserção da The paper analyses the insertion of
Igreja Universal do Reino de Deus the Universal Church of the Ce texte se rapporte à l’insertion de
(IURD) na política nacional e seus Kingdom of God (UCKG) in the l’Église Universelle du Royaume de
efeitos nos campos religioso e políti- national politics scenario and its Dieu (EURD) dans la politique
co. Em razão da eficácia de seu effects in the religious and political nationale et de ses effets dans les
carisma institucional, a Universal fields. Due to the efficacy of its insti- domaines religieux et politique. Du
procedeu, dentro do próprio grupo tutional charisma, the Universal fait de l’efficacité de son charisme
religioso, a uma ressemantização do Church of the Kingdom of God institutionnel, l’Église Universelle du
ato de votar em particular e da per- (UCKG) has given, within its own Royaume de Dieu a procédé, à l’in-
cepção da política em geral, religious group, a new meaning to térieur de son propre groupe
inscrevendo-os em sua lógica reli- the specific act of voting and to the religieux à une nouvelle interpréta-
giosa. Isso é uma importante chave general perception of politics in tion de l’acte de voter et, de façon
explicativa para o elevado grau de general, putting both of them in its plus globale, de la propre perception
fidelidade de votos e o êxito político own religious logic. This is an de la politique, en les inscrivant dans
cada vez maior constatado nas últi- important explanatory key for the sa logique religieuse. Cela peut expli-
mas eleições. Ademais, a prática high level of loyalty in voting and quer le taux élevé de fidélité élec-
política da Universal está produzin- the growing political success veri- torale et le succès politique croissant
do um efeito mimético em outras fied in every new election. que l’on a pu constater lors des
igrejas evangélicas, que tendem a Furthermore, the political practice of dernières élections. En outre, la pra-
imitar seu modelo de fazer política. the UCKG is producing a mimetic tique politique de l’Universelle est en
Sua inserção política, sobretudo por effect on other evangelic churches, train de produire un effet mimétique
intermédio do Partido Liberal, não which tend to imitate its way of à l’extérieur de l’Église, surtout dans
passa despercebida pelos partidos, doing politics. Its political insertion, d’autres églises évangéliques qui imi-
constituindo-se, assim, em um ator mainly through the Liberal Party, tent sa façon de faire de la politique.
relevante na atual conjuntura política has not remained unnoticed by the Parallèlement, l’insertion politique de
brasileira. political parties, making the fact a l´EURD, en particulier par le Parti
relevant actor in the current Libéral, ne passe pas inaperçue aux
Brazilian political conjuncture. autres partis politiques et transfor-
ment cette église en un nouvel acteur
politique de la scène politique
brésilienne.

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