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Inserção digital de idosos

Aledir Silveira Pereira, Norian Marranghello, Aleardo Manacero Jr. , Eli N. Bechara

Universidade Estadual Paulista (UNESP)


Rua Cristóvão Colombo 2265, Jd. Nazareth
15054-000 São José do Rio Preto – SP – Brasil

{aledir,norian,aleardo}@dcce.ibilce.unesp.br, bechara@tll.ibilce.unesp.br

Abstract. Teaching informatics to elder people is a task in which one tries to put
them in contact with the digital world. During the last eight years we have been
working with this goal within the Projeto Sênior and UNATI of UNESP at São José
do Rio Preto campus. Our experience has been with the transnmission of knowledge
through teaching/learning to a public which is quite heterogeneous having peculiar
needs which are very different from those presented by children and adolescents.
Finding out that they are still capable of learning sparkled a transformation in
students lives allowing them to forsee a new consiousness and a new way to face the
world. In this paper we describe this process and its outcome.

Resumo. O ensino de informática para idosos é uma tarefa que tenta efetuar a
inserção do aluno no mundo digital. Nestes últimos oito anos temos trabalhado
neste sentido dentro dos Projeto Sênior e UNATI da UNESP campus de São José do
Rio Preto. A nossa experiência constituiu em transmissão de conhecimento através
de ensino/aprendizagem para um público heterogêneo e com peculiaridades muito
próprias e diversas da criança, do adolescente e do pós-adolescente. Esta atividade
implicou em processo de transformação na vida das pessoas diante da descoberta
de que ainda são capazes de aprender e vislumbrar uma nova consciência e uma
nova maneira de ver as coisas no mundo em que vivemos. Aqui descrevemos este
processo e seus resultados.

1 Introdução
Historicamente o ensino para idosos é focalizado em sua alfabetização. Neste sentido,
inúmeros métodos têm sido utilizados com grande sucesso. Porém, com o surgimento de
entidades preocupadas com a ocupação dos idosos, ver Conselho Estadual do Idoso (2000),
diversos cursos têm sido oferecidos para esta faixa etária. Centros comunitários, igrejas e
serviços sociais têm oferecido cursos de interesse dos idosos e têm criado vários grupos de
terceira idade.
Segundo Trein (1995), a universidade também vem participando deste processo
através de projetos tidos como "Universidade aberta à terceira idade (UNATI)" e os Projetos
Sêniores. Em ambos os casos, diz Baba et al. (1998), a comunidade universitária estende seus
braços até a comunidade externa para oportunizar aos cidadãos de terceira idade a aquisição
de conhecimentos acadêmicos e melhorar seu sentimento de cidadania.
No campus da UNESP em São José do Rio Preto existe há oito anos o Projeto Sênior
que vem oferecendo cursos às pessoas de terceira idade da região. Dentro deste projeto existe,
há cinco anos, cursos para ensinar informática aos idosos, veja Lucena (1998), e neste
particular é que nos detemos relatando a troca de aprendizado entre aluno e docente.
2 Características do aluno idoso
O público alvo é composto de uma platéia muito heterogênea sob vários aspectos:
a) quanto à escolaridade, indo desde semi-analfabetos até pessoas com curso superior, dentre
elas diretores de escolas, supervisores escolares, advogados aposentados;
b) quanto à habilidade digital, indo desde quem nunca viu um teclado de máquina de
escrever até ex-secretárias e exímias datilógrafas;
c) quanto à destreza, indo desde sensíveis dependentes até ágeis aprendizes.
Os alunos desta faixa etária geralmente apresentam duas características interessantes:
a) são muito melindrosos, isto é, qualquer forma mais arrojada de comunicação pode
provocar-lhes mágoa, corroborando a frase: "O idoso é uma criança encerrada num corpo
envelhecido";
b) têm dificuldades no aprendizado por dois motivos: falta de habilidade motora e o medo de
errar. Com o avanço da idade o movimento motor vai tornando-se cada vez mais lento, e
a tonicidade dos membros diminui, requerendo mais tempo de resposta para o
aprendizado. Porém, se eles estão ali é porque querem superar os limites e prolongar a
lucidez em suas vidas. Já o medo de errar se caracteriza da seguinte forma: tendo eles já
constituído famílias, tiveram que orientar seus filhos e conduzir seus lares, onde não se
dão o direito de errar. Tudo que fazem é porque têm absoluta certeza, principalmente nas
orientações de seus filhos e na condução de seus lares. Tendo que aprender algo novo e
que não dominam, só atuam quando têm certeza que já sabem. Logo, eles hesitam em
tentar novas ações com medo de errar. Temos a impressão que eles temem ser
repreendidos da mesma forma que faziam com seus filhos, e um pai ou uma mãe não
podem errar sob seus pontos de vista.
Sob muitos aspectos a missão de ensinar um público deste perfil deve ser tratada com
muito cuidado, caso contrário redundará em fracasso. De acordo com Rodrigues (1998), o
conhecimento está ligado, de maneira direta ou indireta, às condições práticas de existência
dos indivíduos. Neste nosso caso os indivíduos são idosos que trazem uma formação e um
comportamento de vida muito intenso e diversificado. Normalmente sentem-se meio
excluídos do processo social por terem deixado de acompanhar as transformações sociais que
regem o cotidiano dos elementos novos e ativos no mercado de trabalho. Por vezes, este
procedimento causa certa desolação nos idosos, levando-os a tomar geralmente uma das duas
seguintes atitudes: isolar-se cada vez mais, sentindo-se abandonado e excluído, ou tomar a
iniciativa de adquirir novos conhecimentos, possibilitando em primeiro lugar estar num meio
onde a troca de conhecimentos é efervescente e depois estender esta possibilidade para todo
seu redor, conseqüentemente ampliando-o.

3 Proposta de ensino
A nossa proposta de ensino levou em consideração dois aspectos: conteúdo a ser trabalhado e
a forma de abordagem adotada.

3.1 Conteúdo programático (material)


Os cursos foram divididos em três módulos de um semestre cada e seus conteúdos
programáticos abordaram desde o ensino do que é o computador, passando pela descrição de
suas partes físicas, desmistificando a máquina, aprendendo a trabalhar com um sistema
operacional, no caso o Windows, e ensinando três aplicativos: editor de texto (word), planilha
eletrônica (excel) e processador de imagens (power point). Também, foi ensinado para os
alunos: a utilização da internet (correio eletrônico) e como navegar nela.

3.2 Objetivo pedagógico


Pressupondo que qualquer ação pedagógica é presidida por um corpo de conhecimentos e
subjetividade que estão presentes no professor e no aluno, conforme Rodrigues (1998),
podemos diante do conhecimento do perfil complexo de nossos alunos estabelecer metas que
não seriam apenas da aquisição de informações, mas de conhecimentos que refletissem na sua
relação com as pessoas que os cercam no dia-a-dia. Uma constatação que norteou nosso
trabalho foi perceber que tínhamos idosos com perfil já definidos e com objetivos que iriam
implicitamente além do aprendizado de dominar um computador nos seus mais simples
conceitos. Estes objetivos seriam:
a) a integração do idoso em um núcleo familiar, pois numa família em que os filhos e netos
usam normalmente o computador e desenvolvem um diálogo em "computês", quem não
sabe este novo "idioma" fica alijado do referido diálogo. Já o domínio do "computês"
permitiu uma reintegração do idoso no contexto familiar;
b) integrar o idoso no mundo cada vez mais globalizado através do uso da internet,
propiciando-lhe adquirir informações mais rapidamente e poder participar mais das
discussões do dia-a-dia;
c) retornar o idoso ao núcleo de aprendizado, propiciando-lhe uma continuidade de ensino a
partir de onde parou e uma atualização diante de tantas novidades surgidas após seu
último dia numa escola;
d) fazer o idoso sentir-se na universidade e como um aluno de graduação, isto é, integrá-lo a
um ambiente cheio de perspectivas de um novo amanhã, que normalmente ao idoso parece
mais um caso encerrado. A busca de soluções para os problemas passa a fazer do idoso
um elemento com capacidade de participação e como parte integrante da solução,
abandonando a situação de "reclamões" incuráveis a espera que alguém resolva os
problemas de caráter mais coletivo.
Para atuação efetivamente no ensino tivemos que lançar mão de observações sobre o processo
de aprendizado e trabalhar junto deles. Observamos que pelo menos três eram os processos de
aprendizado encontrados: auditivos, visuais e táteis. Os primeiros, que eram poucos,
aprendiam apenas com a informação teórica; os segundos, na amostragem de exemplos
práticos e os últimos pelo toque, manipulação e experimentação do equipamento. Baseado
nestas premissas as aulas foram ministradas primeiro com a exemplificação e ações de cada
item de aprendizado e só depois foi efetuada a conceituação teórica do aprendizado.

4 Dificuldades encontradas
Devido à heterogeneidade dos grupos de alunos, a transmissão de conhecimento seguiu o
ritmo do aluno mais lento. Isto ajudava a não desestimular o aprendizado dos mais idosos e
menos informados, porém provocava um pouco de ansiedade nos mais novos e mais rápidos
no aprendizado.
A memorização é pouco estimulada nos idosos e conseqüentemente o aprendizado
tinha que ser mais lento para permitir um menor número de novas informações por vez e uma
constante repetição nas aulas seguintes para melhor fixação de conceitos. Portanto, os
conceitos vistos nas aulas anteriores tinham que ser reafirmados sempre no início de uma
nova aula.
5 Avaliação e resultados
Com o encerramento dos cursos optamos por fazer uma avaliação para detectar o que
significou o aprendizado do uso do computador para os alunos, bem como o que significou ao
longo dos três semestres esse novo conhecimento adquirido. Para tanto se realizou uma
pesquisa, baseada no questionário a seguir, cujos resultados com a amostragem de 152 alunos
são apresentados junto às questões.
Questionário final aplicado a 152 alunos.
5.1 Você já utilizava o computador antes do primeiro curso que fez no Projeto Sênior?
21% dos alunos disseram que sim e 79% disseram que não.
5.2 Você já utilizava a internet antes do curso?
3% disseram sim e 97% disseram que não.
5.3 O que facilitou para você, tendo adquirido conhecimentos em informática?
A maioria dos alunos (97%) respondeu que os conhecimentos em informática
aumentaram a facilidade com que se relacionam com o mundo informatizado de hoje. Os
principais argumentos foram:
a) ficaram atualizados;
b) adquiriram segurança ao usar um computador;
c) perderam o medo de usar outras máquinas computadorizadas, como caixas eletrônicos
dentre outras;
d) melhoraram o lazer e a comunicação (via internet) com parentes e amigos;
e) ganharam independência de serviços de terceiros e/ou passaram a poder prestar ajuda a
parentes e amigos.
Apenas uma pessoa respondeu que os novos conhecimentos não tiveram utilidade
ainda.
5.4 Qual a importância em saber informática atualmente?
Todos os alunos reconheceram a importância dos conhecimentos adquiridos em
informática frente à evolução e tendência mundiais.
5.5 Você conhece outras pessoas interessadas em fazer estes cursos?
82% dos alunos disseram que por estarem fazendo este curso acabaram por despertar
interesse em outras pessoas em fazer um curso deste formato.
5.6 Você achava difícil utilizar um computador? E agora?
Apenas um aluno admitiu que não achava difícil utilizar o computador antes de
realizar o curso, dentre os demais alunos 88% disseram ter suas dificuldades a respeito de
computação sanadas e 12% disseram que as dificuldades diminuíram sensivelmente, porém
ainda encontravam algum grau de dificuldade. O principal motivo apresentado para as
dificuldades ainda existentes é não terem à sua disposição um microcomputador para
treinarem em casa.
5.7 O que representou em sua vida o aprendizado de computação realizado através deste
curso?
A maioria respondeu que o aprendizado de informática foi muito importante por
facilitar o seu trabalho, sentir-se mais seguro no mundo informatizado e representar uma nova
etapa da sua vida.
5.8 Quais as mudanças na relação familiar em função de seus conhecimentos de informática?
Aumentou o diálogo com filhos e netos, passou a ser mais valorizado e melhorou a
comunicação com parentes.

6 Reflexos da atividade de aprendizado na vida pessoal


Alguns alunos que estavam acomodados com a vida e já davam por encerrada a construção de
seu projeto de vida tiveram novo impulso, empreenderam novos negócios e mudaram suas
vidas.
Outros alunos admitiram que nunca passaram nem pela calçada da universidade e hoje
transitam pelo pátio da universidade como os alunos da graduação e pós-graduação.
Os alunos de um modo geral compreendem melhor o papel da universidade após este
contato semanal através de cursos.
Particularmente uma aluna reprimida pelo sistema familiar por marido autoritário e
que não tinha qualquer iniciativa, agora já atua intensamente dentro do diretório acadêmico da
terceira idade.
Duas alunas após participarem dos cursos sentiram sua potencialidade e seu poder de
empreendedorismo e montaram no litoral de Alagoas uma pousada e têm seu próprio negócio.
Estes são apenas alguns relatos, pois muitos alunos após terminarem os cursos perdem
o contato conosco.

7 Conclusão
Estes cinco anos de experiência nos possibilitaram compreender o processo de aprendizado de
idosos no contexto regional de São José do Rio Preto.
A transmissão de informações, para a compreensão por todos alunos idosos, deve ser
feita de forma mais lenta do que a realizada para alunos adolescentes e pós-adolescentes. Ela
também deve ser revisada várias vezes, pois a fixação de conhecimentos é mais morosa em
função das próprias condições orgânicas dos alunos desta faixa etária. Costumeiramente se diz
“a memória já não ajuda”.
A matéria a ser ensinada quando transmitida primeiro mecanicamente, através do
exercício prático, e só depois explicada a sua fundamentação teórica, propicia o melhor
aproveitamento de compreensão por parte dos idosos. Tendo em vista que os alunos após a
primeira etapa (prática) sentem que dominam o conteúdo, então só depois se tornam sensíveis
à fundamentação teórica.
Como o esperado, o ritmo de cada aluno é muito diferente, pois cada um carrega
consigo uma carga de vida particular e uma compreensão de mundo muito diversa, porém
estão ali reunidos dispostos a aprender a respeito de uma só coisa: computação. Estas
diferenças devem ser administradas de maneira que uma atuação localizada junto a cada aluno
possa ser utilizada para passar informações complementares para os que possuem velocidade
de aprendizado maior do que a da maioria da classe, impedindo que os mesmos fiquem muito
ansiosos por novos conhecimentos e sintam presos ao ritmo do aluno mais lento.
Ficou muito marcado que a relação professor-aluno é muito rica, pois existe uma troca
muito grande de ensinamento e aprendizado, uma vez que eles são pessoas que tiveram,
criaram e educaram seus filhos, isto é, ensinaram seus filhos e isto lhes credenciam como
professores (de vida) também. Mas não podemos deixar de mencionar que o respeito, o
carinho e a gratidão, tão esquecidos ultimamente, está presente nesta relação. São alunos que
após cada aula despedem-se dizendo muito obrigado professor. Por isso este trabalho é muito
gratificante para nós e um estímulo para continuarmos com esta atividade.

Referências

Conselho Estadual do Idoso (2000) “A cidadania do idoso no estado de São Paulo”, Secretaria
do governo e gestão estratégica, p. 6-45.

Trein, F. (1995) “A Universidade e a atividade de extensão na construção da cidadania”,


Contexto & Educação, Editora UNIJUI, ano 9, n. 37, p. 44-55.

Baba, Y.M. et al. (1998) “O projeto: estendendo o horizonte: Educação e Tecnologia na


FCT/Unesp”, XVIII Congresso Nacional da Sociedade Brasileira de Computação, IV
Workshop de Informática na Escola, Belo Horizonte, Vol 1, p597-603

Lucena, S.M.P. (1998) “O laboratório de informática como ferramenta para o ensino


multidisciplinar”, XVIII Congresso Nacional da Sociedade Brasileira de Computação, IV
Workshop de Informática na Escola, Belo Horizonte, Vol 1, p. 581- 586

Rodrigues, F.P.M. (1998) “A prática do professor no ensino de informática”, Editora


EDUCAT, Pelotas.

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