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EQUIPES DE TRABALHO:
ESTUDO DA MUDANÇA
ORGANIZACIONAL EM QUATRO
GRANDES EMPRESAS INDUSTRIAIS
Resumo
O artigo apresenta uma pesquisa realizada em quatro empresas industriais sobre as mudanças em
sua estrutura organizacional e a formação das equipes de trabalho. A metodologia da pesquisa teve
caráter exploratório e descritivo em face da escassez de trabalhos empíricos sobre o tema no Brasil.
A conclusão da pesquisa revela que as equipes de trabalho têm sido fundamentais no novo projeto
estrutural dos anos 90, particularmente com relação à questão da flexibilidade do processo produtivo.
O artigo aborda também outros aspectos levantados na pesquisa, tais como a cultura organizacional,
o layout e o comportamento da gerência.
motores. Terceirizou-se grande parte das processo de adaptação das pessoas foi minimi-
atividades que não agregam valor ao produto, zado, pois os novos funcionários já se incorpo-
tais como, o fornecimento de matéria-prima ram em uma nova cultura. A utilização das
(consolidador), limpeza, restaurante, segurança, equipes de trabalho tornou-se um facilitador para
transporte interno, entre outras atividades. A a flexibilização do processo produtivo.
principal ênfase é no processo de produção que é
suportado por um alto aparato tecnológico. A 3.4 Empresa 4
nova concepção estrutural instituiu na organiza-
ção a utilização das células de produção, que é A Empresa 4 compõe um Grupo multinacio-
composta por profissionais técnicos de apoio que nal italiano, que começou suas atividades em
suportam as equipes de trabalho inseridas dentro 1919 na Itália, sempre fornecendo produtos para
das células de produção. a indústria automobilística que a suportou no seu
desenvolvimento e evolução. A empresa opera
3.3 Empresa 3 em nível mundial com fábricas na Europa, Ásia,
África e América. A unidade de negócio onde
A Empresa 3 pertence a uma multinacional foi desenvolvida a pesquisa é a divisão de
norte-americana que desenvolveu seu primeiro sistemas elétricos situada em uma cidade do
produto em 1880, nos Estados Unidos. A interior do Estado de São Paulo. Esta unidade é
companhia brasileira, é dividida em três responsável pelo desenvolvimento de compo-
unidades de negócios: Customer, Profissionais, nentes automobilísticos (velocímetro) e mon-
Pharmac. Esta pesquisa foi realizada na unidade tagem – quadros de bordo, alarmes antifurtos e
Pharmac que produz medicamentos líquidos e power train (eletrônica).
sólidos. Em 1996 a empresa passou por uma mudan-
Em 1995 esta unidade passou por uma série ça na estrutura organizacional. A estrutura antes
de adaptações em função do delineamento das da mudança era departamentalizada funcional-
novas estratégias da empresa no Brasil. Realizou mente, ou seja, as áreas de logística, engenha-
uma mudança estrutural, partindo de uma ria, qualidade, engenharia de produto e tempos
departamentalização funcional para uma e métodos compunham departamentos. A linha
estrutura por processos, a qual considera a de produção era única, exigindo grandes
empresa em três grandes processos: manufatura, movimentos operacionais na mudança de
mercado/vendas e assessorias de apoio. O produtos, restringindo a flexibilidade do
principal objetivo desta mudança foi a busca de sistema. Outras desvantagens deste tipo de
maiores níveis de integração da organização, ou layout de produção para esta empresa eram:
seja, superar a estrutura estanque em departa- dificuldades de detectar problemas, gargalos na
mentos independentes. Esta transformação produção, setups elevados, dificuldades quanto
estrutural deu-se de modo diferente de muitas ao controle de qualidade, entre outras. Estes
organizações, pois não foi acompanhada por um aspectos exerceram pressão para a empresa
enxugamento do quadro de funcionários; pelo buscar outras soluções no delineamento da
contrário, aumentou significativamente o estrutura organizacional. O arranjo matricial foi
número de funcionários (estagiários, vendedores a solução encontrada onde o ponto fundamental
e operacionais). Desta forma, a mudança da mudança foi a utilização de equipes de
estrutural não teve grandes resistências na trabalho, em função da grande variedade de
organização, pois as pessoas novas já iniciaram atividades produtivas. Nesta estrutura cruzam-se
suas atividades inseridas naturalmente em uma as necessidades dos produtos nas linhas
nova estrutura com os perfis já direcionados. verticais e as habilidades funcionais nas linhas
Fato idêntico aconteceu na Empresa 2. Assim o horizontais.
140 Sacomano Neto, Escrivão Filho – Estrutura Organizacional e Equipes de Trabalho
Líder da célula
Manutenção Logística
Áreas de apoio
Qualidade Tecnologia
Mudança
Mercado Estrutura Equipes
Estrutural
Empresa 1 Linha Branca Linha Assessoria Desverticalização Operacionais
Automobilística
Empresa 2 Linha Assessoria Nova Unidade Operacionais
(motores)
Empresa 3 Fármacos Processos Expansão Operacionais, Abertas
Empresa 4 Autopeças Matricial Desverticalização Operacionais, Melhorias
empresa; além das equipes operacionais existem ção tem um “dialeto” próprio para a manifesta-
as equipes abertas que são estabelecidas a partir ção de como as tarefas se realizam dentro do
de um projeto que visa a intervenção em algum complexo de informações e relações que compõe
problema ou até mesmo a criação de algo novo. a estrutura organizacional. Assemelha-se a um
A Empresa 4 trabalha no mercado de autope- caleidoscópio, sempre mutante aos olhos, mas
ças, produzindo painéis, sistemas de segurança, que mantém rigorosamente sua geometria,
bombas injetoras entre outros; a estrutura enquanto não se muda o instrumento.
organizacional é classificada como matricial de Quanto ao tipo de estrutura encontrada nas
acordo com HAMPTON (1990); a mudança empresas, percebe-se uma combinação variada
estrutural considerada foi a desverticalização da dos tipos tradicionais, principalmente a estrutura
empresa; as equipes encontradas são: operacio- linha-assessoria e matricial, com diferentes tipos
nais, qualidade, eficiência e desenvolvimento de de departamentalização, entre eles, por produto,
novos produtos. processo, geográfica e celular. Este fato reflete a
Nos processos de mudança estrutural e de dificuldade no processo de caracterização dos
formação das equipes de trabalho esta análise diferentes tipos de estrutura e de departamentali-
personalizada de cada organização é fundamen- zação encontrados nas empresas pesquisadas.
tal para a efetivação e entendimento das Identificou-se que as estruturas organizacionais
mudanças. Esta análise permite a consolidação têm tornado-se crescentemente mais enxutas,
de um projeto organizacional para a formação buscando focos de atuação para a realização de
das equipes, condizente com as estratégias, suas atividades produtivas.
tecnologias, estruturas e pessoas. Em comple- Nas empresas que realizaram desverticaliza-
mento a este fato TUSHMAN & O’REILLY III ção estrutural, as áreas de apoio foram as
(1996) colocam que a chave do sucesso para um primeiras atividades a serem terceirizadas, por
alto desempenho das organizações está na não pertencerem à competência ou ao know-how
congruência entre os elementos da organização, das empresas. Este fato proporcionou um
principalmente entre a estratégia, a estrutura, as enxugamento estrutural nas empresas pesquisa-
pessoas e sua cultura. das, que buscam a delimitação dos focos de
atuação e das atividades que agregam diretamen-
5. Análise da Mudança Estrutural e a te valor aos produtos.
Formação das Equipes As assessorias fornecem um suporte impor-
tante para as estruturas organizacionais nas
não tenham uma subordinação similar aos outros estrutural destas empresas em relação às demais.
departamentos. Na estrutura matricial da A Empresa 2 criou uma estrutura nova e a
Empresa 4, estas assessorias compõem as linhas Empresa 3 expandiu sua estrutura. A diferencia-
horizontais da matriz, mostrando a importância ção destas empresas está exatamente na
de combinar profissionais mais técnicos e mais “mudança” da cultura para a criação das equipes
generalistas. Na Empresa 2 as assessorias estão em contrapartida à “criação” da cultura para a
diretamente ligadas às células de produção. Na formação das equipes.
Empresa 3 a assessoria é um dos processos de Os conflitos ocorrem em qualquer forma de
suporte. Estas atividades de apoio voltam-se organização social. Nas empresas este fato
principalmente às atividades de recursos depende da abertura dos níveis gerenciais para a
humanos, qualidade, finanças, tecnologia de resolução dos mesmos e das relações sociais
informação, entre outras. estabelecidas entre os membros. As quatro
A descentralização da autoridade das empre- empresas estimulam a resolução dos conflitos no
sas pesquisadas, principalmente aquelas que próprio nível operacional, e quando não resol-
desverticalizaram sua estrutura, volta-se vido, o problema sobe na escala hierárquica para
principalmente aos aspectos ligados ao trabalho a sua resolução.
operacional, tais como: requisição de material, A liderança encontrada nos níveis operacio-
manutenção de equipamentos, qualidade, nais das empresas, principalmente nas empresas
tecnologias, planejamento de férias, logística. 1, 2 e 4, volta-se ao elemento facilitador da
Percebeu-se uma preocupação das empresas em equipe, que intermedia a relação entre os níveis
integrar estas atividades aos processos de operacionais e os níveis gerenciais. Em algumas
produção. Na Empresa 2 estas atividades empresas este líder incorpora inclusive ativida-
fornecem suporte aos processos de produção, des administrativas. Na Empresa 1 o líder é
gerando maior autonomia nos níveis operacio- rotativo, estimulando todos a realizarem esta
nais. A autonomia quanto aos aspectos operacio- atividade, nas demais o líder é fixo. Nas
nais é crescente, principalmente com a implanta- Empresas 2, 3 e 4, o líder pode ser escolhido
ção das equipes de trabalho que facilitam a pelos níveis gerenciais, mas também se acata as
flexibilidade e rapidez no processo decisório. sugestões de indicação dos níveis inferiores.
Quanto à tipologia das equipes, encontrou-se A Empresa 1 partiu, desde alguns anos atrás,
a utilização das equipes operacionais pelo menos de uma cultura autocrática para uma cultura
nas quatro primeiras empresas. Na Empresa 3 participativa. A mudança estrutural no sentido de
foram instituídas as equipes abertas, que descentralização foi intensa e a formação das
apresentam um alto grau de flexibilidade, em equipes significou um suporte fundamental à
função da adequação do tipo de equipe para flexibilidade dos processos de produção. Entre-
determinado problema. Na Empresa 4, além das tanto observa-se uma estrutura ainda tradicional;
equipes operacionais, também foram encontra- reforçou-se desta forma uma mudança princi-
das as equipes de eficiência, qualidade e palmente no comportamento e na cultura partici-
melhoria dos produtos. pativa, embora a estrutura não apresente inova-
A cultura voltada para as equipes depende ções quando comparada às outras empresas.
essencialmente do contexto em que as mesmas A Empresa 4 obteve uma mudança estrutural
foram criadas. Nas Empresas 1 e 4, o esforço no sentido de uma descentralização, antes
para a disseminação desta característica é estruturada de forma funcional e passou a ser
fundamental para o bom funcionamento das estruturada de forma matricial. Nesta estrutura as
equipes. Nas Empresas 2 e 3, as dificuldades equipes fornecem um suporte indispensável à
foram mais amenas para a criação desta cultura, realização das atividades, principalmente pela
em função da diferenciação da mudança interação entre as linhas que compõe a matriz.
GESTÃO & PRODUÇÃO v.7, n.2, p. 136-145, ago. 2000 143
Esta empresa inovou na instituição das equipes seqüência pelas empresas 4 e 3, até o da
de eficiência, qualidade e novos produtos. Empresa 2, uma evolução do desenho estrutural.
A Empresa 3 obteve uma mudança estrutural Quando se observa cada estrutura percebe-se
no sentido de expansão de suas atividades. Antes diferenciais na forma de representação e que
estruturada funcionalmente, passou a ser facilitam ou dificultam a formação das equipes
estruturada por processos. Sua inovação está na de trabalho.
horizontalização da estrutura. Considera-se três Presume-se que a estrutura tenha que suportar
grandes processos ao invés de muitos departa- não só seu aspecto formal de poder, responsabi-
mentos, facilitando a eficiência do conjunto lidade e controle. A estrutura tem um escopo
corporativo. A formação das equipes forneceu mais amplo de variáveis e elementos que a
um suporte importante para tais mudanças. As compõe. As estruturas horizontalizadas têm
equipes abertas são extremamente flexíveis e novos desafios: lidar com a informação rápida,
mostram-se como uma alternativa adequada aos utilizando autonomia de decisões. Isto requer um
momentos de grandes mudanças e problemas desenvolvimento organizacional em conjunto,
adversos. tanto da filosofia da organização, como dos
A Empresa 2 teve sua estrutura organizacio- gerentes e operários de nível operacional.
nal criada por meio de um projeto extremamente O papel da estrutura organizacional também é
inovador. Do ponto de vista estrutural, percebe- discutido por HANDY (1997). O autor coloca
se a delimitação essencialmente na produção, e que o poder nas novas organizações provém das
as atividades de logística, manutenção, tecnolo- relações e não das estruturas. A confiança sendo
gia e qualidade são diretamente ligadas aos o principal meio de controle, torna as pessoas
processos de produção, que mostra a concepção mais eficazes, criativas e capazes de atuar em
das células de produção. Este fato evidencia uma um ambiente dinâmico. Esta colocação corrobo-
adequação da estrutura organizacional aos ra com a visão de que a função da estrutura não
objetivos da empresa. Esta adequação fornece o está somente na designação do poder, mas sim
suporte necessário para a realização eficiente das nas relações que a mesma implica.
atividades, onde o foco está na produção e as No mesmo sentido DRUCKER (1998) ressal-
demais áreas dão apoio. ta que as mudanças organizacionais estão
centradas principalmente no indivíduo, no
6. Considerações Finais funcionário qualificado e dotado de cultura. Sua
análise parte da perspectiva de que nas organiza-
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