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XIII CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA

29 de Maio a 1 de Junho de 2007, UFPE, Recife, (PE)

GT 9 – Ensino de Sociologia

Título do Trabalho
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA: SOCIOLOGIA E
FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO NA ESCOLA ATUAL

Autores
Maria Valéria Barbosa
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça
Vandeí Pinto da Silva

Faculdade de Filosofia e Ciências da Unesp – Câmpus de Marília


valeria.verissimo@terra.com.br
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA: SOCIOLOGIA E
FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO NA ESCOLA ATUAL.
BARBOSA, Maria Valéria; Mendonça, Sueli Guadelupe de Lima; SILVA, Vandeí Pinto da.
Departamento de Sociologia e Antropologia; Departamento de Didática. Faculdade de
Filosofia e Ciências/Unesp. Núcleo de Ensino/Unesp.

RESUMO: O retorno da Sociologia e Filosofia ao Ensino Médio — através da Resolução


CNE nº 04/2006 — enseja uma discussão mais aprofundada sobre a formação de
professores dessas disciplinas, diagnóstico de seus principais problemas, bem como
elaboração de diretrizes afinadas à realidade da educação básica. A pesquisa teve como
objetivo suscitar reflexão sobre alguns impactos da legislação e das políticas
educacionais, no processo de formação nas licenciaturas em Ciências Sociais e Filosofia,
no âmbito do Estado de São Paulo. Constata-se que essas licenciaturas foram atingidas
pelas políticas educacionais e diretrizes governamentais que regulamentam o ensino
fundamental e médio, uma vez que essas instâncias determinam o lugar das disciplinas
dessas áreas no nível básico e, conseqüentemente, o campo de atuação dos licenciados.
Por fim, são apontadas perspectivas para as licenciaturas em ciências sociais e filosofia,
dentre elas a sua integração com o nível básico, via valorização da formação humanística
do adolescente e o redimensionamento da formação docente de modo a possibilitar a
integração teoria e prática no exercício da profissão.

PALAVRAS-CHAVE: Sociologia; Filosofia; Legislação; Política Educacional e Ensino


Médio.

Introdução

O presente trabalho tem como objetivo principal refletir sobre o processo de


formação de professores de Sociologia e Filosofia, tendo como referência a situação legal
destas disciplinas no ensino básico a partir da década de 1960, o reflexo das políticas
públicas implementadas para a educação no estado de São Paulo e a prática pedagógica
dos professores. As reflexões estão pautadas em resultados de pesquisas desenvolvidas
pelo Núcleo de Ensino (NE) da Faculdade de Filosofia e Ciências (FFC) da
Unesp/Marília.

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A análise da legislação educacional contribuiu significativamente para a
compreensão do emaranhado “legal-estrutural” do lugar que ocupam as disciplinas de
Sociologia e Filosofia na estrutura do atual do ensino médio. Tal análise considerou a
avaliação das políticas educacionais implementadas nas últimas décadas, reveladoras de
uma concepção de educação incompatível com a formação humanística propiciadas por
essas disciplinas. No que se refere à formação de professores, tomou como referência as
entrevistas realizadas com várias gerações de egressos dos cursos de Ciências Sociais e
Filosofia que atuam na Rede Pública de Ensino.
Os resultados da pesquisa proporcionaram o conhecimento de aspectos
importantes da relação ensino-aprendizagem e trouxe à tona problemas decorrentes da
descontinuidade entre a formação teórica e a prática pedagógica dos professores, assim
como, entre universidade e escola pública.
Cumpre esclarecer que, parte dos problemas analisados refere-se aos cursos
de licenciatura de um modo geral e outros são específicos dos cursos de licenciatura em
Ciências Sociais e Filosofia, e, em especial, dos oferecidos pela FFC-UNESP-Marília.

Diretrizes legais e políticas educacionais

As últimas décadas foram marcadas por uma forte reestruturação do ensino


público brasileiro e, particularmente, do ensino paulista. Foram implementadas inúmeras
reformas, algumas delas afetando sobremaneira a permanência das disciplinas de
caráter mais crítico na matriz curricular da educação básica e que contribuem para a
formação geral do estudante. O resultado dessas políticas afeta, também, os cursos de
licenciatura destinados à formação de professores dessas disciplinas.
Fazendo uma breve retrospectiva histórica, registra-se que nos denominados
cursos Clássico e Científico havia expressiva presença das disciplinas da área de
humanas na matriz curricular, incluindo-se aí a filosofia. Ainda que a chamada “cultura
clássica” pudesse ser tomada como mera erudição, constatava-se a preocupação com a
formação humanística do estudante, o que de certo modo contribuía para a sua formação
integral.
Com o golpe militar de 1964 e a política de desenvolvimento industrial,
rechaçou-se o exercício do pensamento reflexivo e predominou o oferecimento de um
ensino centrado na formação técnico-profissionalizante. “Esta tendência levou o Brasil, na
década de 70, a propor a profissionalização compulsória, estratégia que também visava a

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diminuir a pressão da demanda sobre o Ensino Superior” (PCNEM/Bases Legais, 1999,
p. 6).
Na década de 1980, com a implementação da Lei federal n. 7044/82
(BRASIL, 1982) e da Resolução SE/SP n. 262/83 (SÃO PAULO, 1983), abriu-se
possibilidade de inclusão das disciplinas Sociologia, Psicologia e Filosofia nas matrizes
curriculares do então 2º grau, sempre na condição de optativas, cabendo à direção de
cada escola fazer as escolhas, de acordo com suas preferências.
Entre os princípios norteadores da Lei n. 7044/82 (BRASIL, 1982) estava o
compromisso com a formação para a cidadania, que daria condições aos alunos para
compreenderem a realidade econômica, social e política em que estavam inseridos e
para promoverem processos de transformação.
Esse contexto proporcionou a re-inclusão paulatina das referidas disciplinas
no 2º grau e, conseqüentemente, possibilitou a atuação dos licenciados nessas
disciplinas junto às escolas.
A adesão pelas disciplinas de sociologia, filosofia ou psicologia poderia ter
mais expressiva, não fossem tão grandes o preconceito e a falta de clareza sobre a
importância desses conhecimentos na formação dos alunos. Em pesquisa sobre a
realidade do ensino de Sociologia no 2º grau na região de Marília/SP, Chammé & Mott
(1996:124) registram-se desoladores depoimentos de diretores de escola a respeito da
inclusão dessas disciplinas na matriz curricular. Um deles declarou: “jamais eu adotaria
uma dessas três ‘porcarias’... Não considero de utilidade, nenhuma das três”.
Se, por um lado, havia uma resistência por parte dos diretores, por outro, no
entanto, observou-se, por parte da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
(SEE/SP), certo apoio e reconhecimento da importância dessas disciplinas, mediante
iniciativas como: realização, em 1986 e 1993, de concursos públicos que incluíam os
licenciados em Filosofia e Sociologia; elaboração de propostas curriculares para todas as
disciplinas curriculares, entre elas, a de Filosofia e de Sociologia. Tais propostas
resultaram de debates, encontros e congressos com os docentes da rede pública do
Estado de São Paulo, foram sistematizados pela equipe técnica da Coordenadoria de
Estudos e Normas Pedagógicas (CENP) e seus assessores especializados. Constituem-
se até o presente como importante referencial para o trabalho dos professores.
A partir de 1996, visando a reorganizar toda a rede pública estadual de
ensino, a SEE/SP com base na Resolução SE-7, de 19/01/1998, acrescida pela SE-10,
de 23/01/1998 (SÃO PAULO, 1998), implementou as seguintes medidas: “enxugamento”
do quadro funcional e da estrutura física das escolas; fim da retenção de alunos;

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constituição de classes de aceleração e de salas ambiente; aumento do número de
alunos por turma; separação das escolas por faixa etária dos alunos. No âmbito dessa
reorganização teve-se, ainda, a implementação da municipalização do ensino
fundamental de 1ª a 4ª séries.
Além de todas essas medidas, a SEE/SP estabeleceu diretrizes para a
organização curricular dos cursos de ensino médio, instituindo-se novos percentuais na
composição da estrutura curricular: reforçou-se o ensino de Português e de Matemática,
reduziu-se a carga horária de Biologia, História, Geografia, Educação Artística e
Educação Física, o que, além de comprometer a formação geral dos alunos, gerou um
clima de disputa entre os professores, agravando a tensão existente nas escolas. As
disciplinas de Filosofia e Sociologia disputavam, no exíguo espaço destinado à parte
diversificada da matriz curricular, com outras disciplinas de interesse da escola
(informática, sexualidade, meio ambiente, etc), com disciplinas da base comum nas quais
os alunos apresentavam desempenho insatisfatório e com língua estrangeira moderna.
Houve reação contrária dos professores de todas as disciplinas em relação às
medidas tomadas pela SEE/SP, contudo tais medidas foram mantidas. Com isso,
professores foram remanejados, perderam horas de trabalho e alguns deles, até mesmo
o emprego. No caso específico dos professores de Filosofia e Sociologia tornou-se
numericamente insignificante sua presença nas escolas.
Paralelamente a esse processo de reorganização do ensino público paulista,
ocorria, em âmbito nacional, a regulamentação do Capítulo III da Constituição Federal,
referente à Educação, que resultou na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) – nº. 9394/96.
Com a Constituição Federal e a nova LDB foram suprimidas as expressões
“Ensino de 1º Grau” e “Ensino de 2º Grau”, que deram lugar à expressão “Educação
Básica”. Com isso, em vez de três graus de ensino, a educação escolar brasileira passou
a ser dividida em apenas dois níveis: Educação Básica e Educação Superior. É
importante ressaltar essa mudança porque com ela o Ensino Médio passou a figurar
como a etapa final da Educação Básica, portanto, parte da formação exigida a todo
brasileiro, fato que se coaduna com a diretriz constitucional da progressiva
obrigatoriedade do Ensino Médio.
Quanto aos objetivos principais do ensino médio, a LDB 9394/96, no Art. 35,
prescreve:

I) a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no


ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento dos estudos; II) a

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preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores; III) aprimoramento do educando como pessoa humana,
incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual
e do pensamento crítico; IV) a compreensão dos fundamentos
científicos e tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a
teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (BRASIL,1996).

A dimensão humana da formação do aluno está explicitada nos itens II e III do


Art. 35 da lei. Cumpre ressaltar que a formação cidadã e ética e o desenvolvimento da
autonomia intelectual e do pensamento crítico são metas específicas da filosofia e da
sociologia, mesmo que não se restrinjam a elas.
Especificamente em relação a tais disciplinas o Art. 36, Par. 1º e Inc. III
determina que:

Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão


organizados de tal forma que, ao final do ensino médio, o educando
demonstre (...) domínio dos conhecimentos de Filosofia e Sociologia
necessários para o exercício da cidadania (BRASIL, 1996).

A regulamentação dessa Lei através da referida Resolução da Câmara de


Educação Básica n.º 3, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio (DCNEM), no Art. 3º, ressalta a necessidade de coerência com princípios
estéticos, políticos e éticos, na formação do estudante. No Artigo 10, esta resolução
determina que a base nacional comum dos currículos do ensino deverá contemplar as
três áreas do conhecimento, a saber: "Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências
da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias".
Contraditoriamente, a resolução é omissa a respeito da obrigatoriedade da Filosofia da
Sociologia na matriz curricular, admitindo para tais conteúdos um "tratamento
interdisciplinar e contextualizado". O Conselho Nacional, portanto, interpretou tratar-se de
referência a “tema transversal”, podendo ser abordado em qualquer disciplina já existente
na grade curricular, não sendo, necessário que Filosofia e Sociologia fossem instituídas
como disciplinas. Subjacentemente a essa interpretação está a ausência de
reconhecimento da Filosofia e da Sociologia como ciências com status próprios.
As orientações pedagógicas apresentadas pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), por sua vez, propõem currículo baseado nas
competências básicas e não no acúmulo de informações e prescrevem a formação
integral do estudante de ensino médio.

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Propõe-se, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à
formação específica; o desenvolvimento de capacidades de pesquisar,
buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de
aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de memorização
(PCNEM/Bases Legais, 1999, p. 6).

No âmbito do Estado de São Paulo, os professores da rede pública, no final


de 1999, foram ainda surpreendidos como uma proposta de Reforma do Ensino Médio de
autoria da SEE/SP, denominada “Novos rumos da Escola de Ensino Médio – desafios e
possibilidades”. O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo
(APEOESP) teve acesso à proposta antes que ela fosse disseminada para a rede e
publicou um encarte contendo o texto da proposta e as análises elaboradas pelo
sindicato.
O documento da SEE/SP afirma que as mudanças propostas estão
respaldadas nos documentos oficiais, mas não explicita onde e como.

Estas orientações estão respaldadas no que estabelece a Lei de


Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nas concepções das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e nas indicações dos
Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (APEOESP,
1999, p. 5).

Portanto, a base teórica e científica do documento está comprometida, uma


vez que não se busca resgatar as fontes nas quais supostamente o documento se apóia.
Além disso, a proposta de organização de matriz curricular baseada nas três
grandes áreas do conhecimento e a designação da parte diversificada para o
atendimento às necessidades regionais e à formação de competências, torna
inconsistente e absurda a inclusão da Filosofia e da Sociologia na parte diversificada da
grade curricular, quando são disciplinas da área de Ciências Humanas.
Configura-se também como um contra-senso a concepção veiculada de que a
interdisciplinaridade signifique supressão de disciplinas ou que a mera fusão das mesmas
assegure visão de totalidade.
Após as críticas feitas à Proposta de Reforma da SEE/SP pela APEOESP e
estudiosos do assunto não se obteve mais notícias do prosseguimento da citada reforma.
Contudo, seu ideário se fez presente na essência da política educacional em vigor no
Estado de São Paulo.
Em que pese as ambigüidades da própria legislação, o que se evidencia das
diretrizes legais e dos parâmetros oficiais para o ensino médio é que a Filosofia e a
Sociologia constituem-se como áreas do saber com importantes contribuições a dar na

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formação do jovem atualmente. As políticas públicas para a educação, no entanto,
responsáveis que são pela implementação dos requisitos legais, nem sempre confluem
para que os objetivos preconizados em lei sejam alcançados.
Chega-se, pois, ao final dos anos de 1990 com um saldo muito desfavorável
para o ensino de Sociologia e de Filosofia nas escolas públicas paulistas, bem como de
outros componentes curriculares que podem levar ao desenvolvimento do senso crítico
dos alunos e uma compreensão do mundo a partir de outras perspectivas.
Além disso, em 2001, o Presidente da República e o Governador do Estado
de São Paulo vetaram projetos de lei que instituíam a Filosofia e a Sociologia como
disciplinas obrigatórias da matriz curricular, apesar das determinações legais que exigem
formação humanística dos estudantes, principalmente as expressas na LDB em vigor em
seu Art. 35 e nos PCN e de toda a mobilização havida em prol de tais projetos.
Um arremedo de mudança dessa política, em nível estadual, se fez com as
Resoluções SE nº6/2005 e nº2/2006, na gestão do Secretário de Educação Gabriel
Chalita, que alteraram, respectivamente, a matriz curricular do ensino médio diurno e
noturno. O ensino médio diurno voltou a ter seis aulas diárias de 50 minutos e o noturno
cinco aulas de 45 minutos.
Nesse processo, a Secretaria de Educação fez uma consulta em janeiro de
2005, pela internet, junto às escolas sobre opção por Filosofia, Sociologia ou Psicologia,
aumentando a carga horária dessas disciplinas. O resultado foi mais favorável à Filosofia,
que passou a ser disciplina obrigatória no currículo com duas aulas na 1ª e 2ª séries,
respectivamente, restando à Sociologia e Psicologia duas aulas na 3ª série, de acordo
com a opção da escola entre essas disciplinas. Em decorrência desta mudança, houve
concurso para professor de Filosofia em 2005 e algumas ações, entre elas curso de
capacitação de professores, a fim de absorver, em parte, as dificuldades da implantação
da disciplina nos moldes em que ocorreu.
Em 2006 o Conselho Nacional de Educação aprovou a Resolução CNE n°
04/06, publicada no Diário Oficial da União em 21-08-2006, que institui a filosofia e a
sociologia como disciplinas obrigatórias no ensino médio, alterando, portanto, o Artigo 10
da Resolução CNE/CB, nº 3/98, passando a vigorar a seguinte redação:

Art. 1º § 2º As propostas pedagógicas de escolas que adotarem


organização curricular flexível, não estruturada por disciplinas, deverão
assegurar tratamento interdisciplinar e contextualizado, visando ao
domínio de conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao
exercício da cidadania. [...]

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Art. 2º § 3º No caso de escolas que adotarem, no todo ou partes,
organização curricular estruturada por disciplinas, deverão ser incluídas
as de Filosofia e Sociologia. [...]
Art. 3º Os currículos dos cursos de Ensino Médio deverão ser adequados
a estas disposições.
Parágrafo único. No caso do § 3º, acrescentado ao artigo 10 da
Resolução CNE/CEB nº 3/98, os sistemas de ensino deverão, no prazo
de um ano a contar da publicação desta Resolução, tomar as medidas
necessárias para a inclusão das disciplinas de Filosofia e Sociologia no
currículo das escolas de Ensino Médio (BRASIL, 2006).

Com estas mudanças, a presença da Filosofia e da Sociologia, como


disciplinas obrigatórias no Ensino Médio, fica assegurada e, deste modo, a área de
Ciências Humanas ganha maior espaço na formação do estudante. Entretanto, essas
mudanças não estão asseguradas no estado de São Paulo em 2007, em função da
Indicação CEE N° 62/2006 - Aprovada em 20-9-2006 - Não obrigatoriedade da introdução
de Filosofia e Sociologia no currículo em 2007.
A citada indicação se pautou nos seguintes argumentos:

1.2 Considerando que existem dúvidas relevantes quanto à legalidade da


Resolução (c.f. - Art. 36 § 1° inciso III da Lei n° 9394/96 - LDB), na
medida que interfere na autonomia dos sistemas de ensino e das
unidades escolares, além do tratamento não homogêneo dado às
diversas formas de organização curricular adotado pelas diferentes
escolas e sistemas de ensino;
1.3 Considerando que a Resolução CNE n.º 04/06 tem implicações não
desprezíveis quanto aos recursos humanos e financeiros necessários a
implementação com qualidade;
1.4 Considerando que pelas razões acima apresentadas serão
necessários estudos aprofundados pelas Câmaras e Comissões desse
Conselho, além de consultas à Secretaria de Estado da Educação;
O Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo pronuncia-
se pela não obrigatoriedade da introdução de Filosofia e Sociologia no
currículo das Escolas de Ensino Médio, no âmbito de sua jurisdição, no
ano de 2007, respeitado o já disciplinado pela Secretária da Educação
para as escolas da rede pública estadual, bem como, pelas escolas da
rede privada de ensino. (SÃO PAULO, 2006).

Diante desta indicação, o Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão da UNESP


(CEPE) elaborou documento solicitando explicações ao Conselho Estadual de Educação
quanto à legalidade de sua decisão. Em sua resposta o Conselho explicita a sua
interpretação de que o prazo de um ano para implementar a Resolução nº 4/2006 do
CNE/CEB incidirá para o ano letivo de 2008. Por outro lado, não faz mais referência à
possível ilegalidade da referida Resolução do CNE. Ainda assim, no estado de São Paulo
há prejuízos quanto à implementação da Resolução do CNE na sua amplitude, pois com
as políticas adotas pela SEE em 2005 e 2006 houve preponderância da inclusão da

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Filosofia em detrimento da Sociologia e, com isto, até o presente não há previsão de
concurso público para Sociologia.

Sociologia e Filosofia: um olhar a partir dos egressos

Esta parte da pesquisa consistiu, inicialmente, no levantamento, junto à


Diretoria de Ensino Regional de Marília, da relação dos professores que ministram as
disciplinas Sociologia, História, Geografia e Filosofia, nas escolas da Rede Pública
Estadual de Marília e região. Deste universo, foram realizadas entrevistas com os
egressos da FFC1.
Da análise das entrevistas, destacam-se três conjuntos de questões que
subsidiam a reflexão sobre a formação de professores em Sociologia e Filosofia,
indicando-se, ainda, algumas pistas para construir alternativas às dificuldades
enfrentadas atualmente pelos cursos de licenciatura.

1. Integração entre a universidade e a escola básica.


- conteúdos extremamente teóricos dos cursos, o que dificulta, na prática pedagógica, a
socialização desses conteúdos, a fim de propiciar aos alunos a compreensão das
disciplinas ministradas na educação básica;
- desarticulação dos saberes pedagógicos com os de conteúdos específicos,
prejudicando o efetivo exercício da docência. Esse fato explicita a necessidade de
reformulação da licenciatura na sua concepção e organização;
- desconhecimento ou visão distorcida do cotidiano escolar e de seus agentes (alunos,
professores, funcionários, comunidade local), indicando ausência de relação sistemática
entre universidade e escola básica, gerando defasagem entre o conhecimento da
realidade escolar e sua abordagem teórico-prática na licenciatura;
- esgotamento do modelo tradicional de estágio supervisionado, pois o estágio restrito às
atividades de observação de sala de aula, numa situação de constatação de
problemática, sem a possibilidade de atuação articulada na escola. Este modelo de
estágio, ao não proporcionar ao licenciando a compreensão científica de tais problemas,

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A amostragem consistiu em 50% do universo total dos egressos atuantes da Rede Pública de Ensino,
considerando a localização geográfica das escolas em Marília e região, bem como as disciplinas que
ministravam (Sociologia, Sociologia/Geografia, Sociologia/História, História/Geografia, História, Geografia,
Filosofia)

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gera sentimento de impotência e desânimo para o futuro profissional e, muitas vezes,
afasta-o da opção pelo exercício da docência.

2. O impedimento de ser professor de Sociologia e de Filosofia e a compulsoriedade de


lecionar outras disciplinas
A quase inexistência de carga horária de Sociologia e de Filosofia na escola
básica tem criado um problema muito sério: a compulsoriedade do exercício profissional,
na medida em que tais licenciados não conseguem ser professor de Sociologia ou
Filosofia, sendo compelidos a exercer a docência em outros conteúdos curriculares para
os quais não têm a formação adequada.
A maioria dos cientistas sociais entrevistados atua, principalmente, como
professores de História e Geografia. Tal fato gerou o grave problema de despreparo e
defasagem de conteúdos por parte dos egressos, tendo em vista a carga horária
insuficiente dessa formação na licenciatura; o mesmo despreparo foi apontado em
relação à disciplina Geografia, talvez em proporções mais acentuadas, principalmente no
que se refere ao conteúdo de Geografia Física. Semelhantemente, a maioria dos filósofos
entrevistados atua também em História. Tal situação obriga a busca de Cursos
Complementares de Graduação para a formação em outras disciplinas. Muitos dos
entrevistos alegaram que a complementação não trouxe a reposição de conteúdo que
esperavam, obrigando-os a aprender esses conteúdos por meio da prática pedagógica
cotidiana, na troca de conhecimento com outros professores. A não reposição do
conteúdo pode ser explicada, entre outros, pela má qualidade de ensino das instituições
particulares de ensino superior, onde ocorreu essa complementação, quase sempre em
finais de semana.
A complementação deve também ser considerada como decorrência da
impossibilidade de os licenciados em Ciências Sociais e Filosofia prestarem concurso nas
disciplinas História e/ou Geografia ou mesmo para Diretor de Escola. Na verdade, muitos
professores buscam, antes de uma complementação de conteúdo, o diploma de História,
Geografia ou Pedagogia, que representa sua habilitação legal como professor e o
credencia prestar concursos para provimento de cargo público nas disciplinas História,
Geografia e Direção de Escola.
Esse diploma representa, portanto, garantia de trabalho e sobrevivência. Sem
ele, a situação dos professores formados em Ciências Sociais e Filosofia é muito
precária, mesmo dos que têm muitos anos de magistério. Desde 1993, a SEE/SP não
tem realizado concursos para a Sociologia. As poucas escolas que mantêm essa

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disciplina na grade curricular, fazem-no em função do reconhecimento do trabalho
específico de professores que já as lecionam na própria escola e não em decorrência de
uma orientação mais geral dos órgãos oficiais. No caso da Filosofia, com a sua inserção
na matriz curricular do ensino médio diurno em 2005 e noturno em 2006, e realização de
concurso público em 2005, a situação de trabalho dos professores de filosofia apresenta
maior estabilidade.
Outro fato relevante é a falta de assessoria técnica pedagógica específica
para a Sociologia e a Filosofia, bem como de material didático-pedagógico de referência
para o desenvolvimento do trabalho pedagógico.
Apesar das dificuldades enfrentadas, os professores reconhecem que a boa
base teórica e o senso crítico adquiridos ao longo do curso de Licenciatura que
realizaram na FFC-UNESP-Marília permitiram-lhes superar muitas das deficiências da
própria formação.

3. Anseios e contradições
Os depoimentos dos egressos apresentam anseios e contradições. A
situação peculiar e dramática que vivenciam para o exercício da profissão docente
propicia a busca de alternativas imediatistas para o enfrentamento desse problema.
A reivindicação, por exemplo, por parte de egressos do Curso de Ciências de
criação de complementação em História e/ou Geografia organizado pela própria
instituição formadora conflita com as licenciaturas de História e Geografia mantidas pela
própria UNESP, em relação à identidade de cada curso e seu respectivo campo de
conhecimento e, ao mesmo tempo, desconsidera a tendência da política educacional
vigente de desvalorização das Ciências Humanas na formação dos alunos.
Por outro lado, os entrevistados apresentam uma visão crítica da realidade
atual da educação brasileira, pontuando as questões fundamentais da crise social que
assola os jovens e influencia as relações no interior da escola, dificultando um melhor
desempenho na atuação do professor; mesmo com todos esses problemas, sentem
satisfação em serem educadores e sugerem uma articulação mais estreita entre a
universidade e os outros níveis de ensino, para pensar, conjuntamente, saídas para a
crise social e política da educação; apontam, ainda, a necessidade de uma proposta de
estágio participativa, visando a um melhor conhecimento da escola e uma interação entre
professores, alunos e futuros professores-estagiários.

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Considerações Finais

A análise da situação do ensino de Filosofia e Sociologia na formação básica


do estudante quanto ao aspecto legal, quanto às determinações das políticas
educacionais implementadas no Estado de São Paulo e à formação dos licenciados em
Filosofia e Sociologia permite a formulação de algumas considerações.
De uma perspectiva ampla, evidencia-se a interdependência entre os
interesses políticos de classe e o direcionamento da escola, tal como se verificou nas
propostas formuladas no Regime Militar, no período da abertura política e, atualmente,
nas propostas que estão sob a égide da nova LDB. Os fatores que obstaculizam a
consolidação do ensino de Filosofia e Sociologia se devem a embates constantes entre
projetos antagônicos de sociedade e que sujeitam o processo de formação dos alunos a
avanços e recuos.
No caso do Estado de São Paulo as medidas de "enxugamento da máquina"
administrativa frearam a expansão do Ensino Médio, diminuíram o número de aulas,
superlotaram classes e fecharam escolas. Contrariando as diretrizes legais que
preconizam a formação integral do estudante, a SEE/SP, por meio de suas reformas,
cortou várias disciplinas, principalmente na área de ciências humanas, que já se
encontrava fragilizada na estrutura curricular.
Tais mudanças também estiveram sujeitas às concepções dos educadores,
especialmente dos que exercem cargo de gestão: a ausência de fundamentação teórica
na definição do perfil de ser humano que se quer formar permitiu a adoção de medidas
ditas “simplesmente administrativas", mas que desqualificaram profundamente a
formação do aluno.
Em relação ao campo profissional dos professores de Sociologia e Filosofia,
este, como se viu é ainda restrito, especialmente, quanto à Sociologia, o que obriga os
licenciados a ministrarem aulas em outras disciplinas e em condições desfavoráveis. A
expectativa é a de que as deliberações do CNE contida na Resolução 04/2006 sejam
devidamente implementadas e garantam melhores condições ao exercício profissional
dos licenciandos.
Não há, ainda, respostas para todas as questões e indagações levantadas
pelos professores. Porém, o permanente diálogo com a escola pública pode ser a chave
para essas respostas. Será necessário articular reflexão e prática pedagógica como
condição para a transformação da situação do ensino de Filosofia e Sociologia. Nesse

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sentido, as atividades do Núcleo de Ensino têm sido de grande valia para a
implementação desse objetivo.
A formação do professor não pode ser pensada como uma tarefa isolada da
universidade, desvinculada da realidade em que atuarão os futuros professores. Com
efeito, a superação dos problemas constatados requer ação conjunta entre universidade
e escola pública básica de modo que tanto no âmbito das licenciaturas quanto do ensino
fundamental e médio os objetivos estejam pautados em diagnósticos de pesquisa e não
em contingências políticas ou em preferências subjetivas.

Referências Bibliográficas

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Secretaria Estadual da Educação do Estado de São Paulo. Encarte: APEOESP, 1999.
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