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GT 9 – Ensino de Sociologia
Título do Trabalho
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA: SOCIOLOGIA E
FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO NA ESCOLA ATUAL
Autores
Maria Valéria Barbosa
Sueli Guadelupe de Lima Mendonça
Vandeí Pinto da Silva
Introdução
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A análise da legislação educacional contribuiu significativamente para a
compreensão do emaranhado “legal-estrutural” do lugar que ocupam as disciplinas de
Sociologia e Filosofia na estrutura do atual do ensino médio. Tal análise considerou a
avaliação das políticas educacionais implementadas nas últimas décadas, reveladoras de
uma concepção de educação incompatível com a formação humanística propiciadas por
essas disciplinas. No que se refere à formação de professores, tomou como referência as
entrevistas realizadas com várias gerações de egressos dos cursos de Ciências Sociais e
Filosofia que atuam na Rede Pública de Ensino.
Os resultados da pesquisa proporcionaram o conhecimento de aspectos
importantes da relação ensino-aprendizagem e trouxe à tona problemas decorrentes da
descontinuidade entre a formação teórica e a prática pedagógica dos professores, assim
como, entre universidade e escola pública.
Cumpre esclarecer que, parte dos problemas analisados refere-se aos cursos
de licenciatura de um modo geral e outros são específicos dos cursos de licenciatura em
Ciências Sociais e Filosofia, e, em especial, dos oferecidos pela FFC-UNESP-Marília.
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diminuir a pressão da demanda sobre o Ensino Superior” (PCNEM/Bases Legais, 1999,
p. 6).
Na década de 1980, com a implementação da Lei federal n. 7044/82
(BRASIL, 1982) e da Resolução SE/SP n. 262/83 (SÃO PAULO, 1983), abriu-se
possibilidade de inclusão das disciplinas Sociologia, Psicologia e Filosofia nas matrizes
curriculares do então 2º grau, sempre na condição de optativas, cabendo à direção de
cada escola fazer as escolhas, de acordo com suas preferências.
Entre os princípios norteadores da Lei n. 7044/82 (BRASIL, 1982) estava o
compromisso com a formação para a cidadania, que daria condições aos alunos para
compreenderem a realidade econômica, social e política em que estavam inseridos e
para promoverem processos de transformação.
Esse contexto proporcionou a re-inclusão paulatina das referidas disciplinas
no 2º grau e, conseqüentemente, possibilitou a atuação dos licenciados nessas
disciplinas junto às escolas.
A adesão pelas disciplinas de sociologia, filosofia ou psicologia poderia ter
mais expressiva, não fossem tão grandes o preconceito e a falta de clareza sobre a
importância desses conhecimentos na formação dos alunos. Em pesquisa sobre a
realidade do ensino de Sociologia no 2º grau na região de Marília/SP, Chammé & Mott
(1996:124) registram-se desoladores depoimentos de diretores de escola a respeito da
inclusão dessas disciplinas na matriz curricular. Um deles declarou: “jamais eu adotaria
uma dessas três ‘porcarias’... Não considero de utilidade, nenhuma das três”.
Se, por um lado, havia uma resistência por parte dos diretores, por outro, no
entanto, observou-se, por parte da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
(SEE/SP), certo apoio e reconhecimento da importância dessas disciplinas, mediante
iniciativas como: realização, em 1986 e 1993, de concursos públicos que incluíam os
licenciados em Filosofia e Sociologia; elaboração de propostas curriculares para todas as
disciplinas curriculares, entre elas, a de Filosofia e de Sociologia. Tais propostas
resultaram de debates, encontros e congressos com os docentes da rede pública do
Estado de São Paulo, foram sistematizados pela equipe técnica da Coordenadoria de
Estudos e Normas Pedagógicas (CENP) e seus assessores especializados. Constituem-
se até o presente como importante referencial para o trabalho dos professores.
A partir de 1996, visando a reorganizar toda a rede pública estadual de
ensino, a SEE/SP com base na Resolução SE-7, de 19/01/1998, acrescida pela SE-10,
de 23/01/1998 (SÃO PAULO, 1998), implementou as seguintes medidas: “enxugamento”
do quadro funcional e da estrutura física das escolas; fim da retenção de alunos;
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constituição de classes de aceleração e de salas ambiente; aumento do número de
alunos por turma; separação das escolas por faixa etária dos alunos. No âmbito dessa
reorganização teve-se, ainda, a implementação da municipalização do ensino
fundamental de 1ª a 4ª séries.
Além de todas essas medidas, a SEE/SP estabeleceu diretrizes para a
organização curricular dos cursos de ensino médio, instituindo-se novos percentuais na
composição da estrutura curricular: reforçou-se o ensino de Português e de Matemática,
reduziu-se a carga horária de Biologia, História, Geografia, Educação Artística e
Educação Física, o que, além de comprometer a formação geral dos alunos, gerou um
clima de disputa entre os professores, agravando a tensão existente nas escolas. As
disciplinas de Filosofia e Sociologia disputavam, no exíguo espaço destinado à parte
diversificada da matriz curricular, com outras disciplinas de interesse da escola
(informática, sexualidade, meio ambiente, etc), com disciplinas da base comum nas quais
os alunos apresentavam desempenho insatisfatório e com língua estrangeira moderna.
Houve reação contrária dos professores de todas as disciplinas em relação às
medidas tomadas pela SEE/SP, contudo tais medidas foram mantidas. Com isso,
professores foram remanejados, perderam horas de trabalho e alguns deles, até mesmo
o emprego. No caso específico dos professores de Filosofia e Sociologia tornou-se
numericamente insignificante sua presença nas escolas.
Paralelamente a esse processo de reorganização do ensino público paulista,
ocorria, em âmbito nacional, a regulamentação do Capítulo III da Constituição Federal,
referente à Educação, que resultou na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB) – nº. 9394/96.
Com a Constituição Federal e a nova LDB foram suprimidas as expressões
“Ensino de 1º Grau” e “Ensino de 2º Grau”, que deram lugar à expressão “Educação
Básica”. Com isso, em vez de três graus de ensino, a educação escolar brasileira passou
a ser dividida em apenas dois níveis: Educação Básica e Educação Superior. É
importante ressaltar essa mudança porque com ela o Ensino Médio passou a figurar
como a etapa final da Educação Básica, portanto, parte da formação exigida a todo
brasileiro, fato que se coaduna com a diretriz constitucional da progressiva
obrigatoriedade do Ensino Médio.
Quanto aos objetivos principais do ensino médio, a LDB 9394/96, no Art. 35,
prescreve:
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preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com
flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento
posteriores; III) aprimoramento do educando como pessoa humana,
incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual
e do pensamento crítico; IV) a compreensão dos fundamentos
científicos e tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a
teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (BRASIL,1996).
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Propõe-se, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à
formação específica; o desenvolvimento de capacidades de pesquisar,
buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de
aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de memorização
(PCNEM/Bases Legais, 1999, p. 6).
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formação do jovem atualmente. As políticas públicas para a educação, no entanto,
responsáveis que são pela implementação dos requisitos legais, nem sempre confluem
para que os objetivos preconizados em lei sejam alcançados.
Chega-se, pois, ao final dos anos de 1990 com um saldo muito desfavorável
para o ensino de Sociologia e de Filosofia nas escolas públicas paulistas, bem como de
outros componentes curriculares que podem levar ao desenvolvimento do senso crítico
dos alunos e uma compreensão do mundo a partir de outras perspectivas.
Além disso, em 2001, o Presidente da República e o Governador do Estado
de São Paulo vetaram projetos de lei que instituíam a Filosofia e a Sociologia como
disciplinas obrigatórias da matriz curricular, apesar das determinações legais que exigem
formação humanística dos estudantes, principalmente as expressas na LDB em vigor em
seu Art. 35 e nos PCN e de toda a mobilização havida em prol de tais projetos.
Um arremedo de mudança dessa política, em nível estadual, se fez com as
Resoluções SE nº6/2005 e nº2/2006, na gestão do Secretário de Educação Gabriel
Chalita, que alteraram, respectivamente, a matriz curricular do ensino médio diurno e
noturno. O ensino médio diurno voltou a ter seis aulas diárias de 50 minutos e o noturno
cinco aulas de 45 minutos.
Nesse processo, a Secretaria de Educação fez uma consulta em janeiro de
2005, pela internet, junto às escolas sobre opção por Filosofia, Sociologia ou Psicologia,
aumentando a carga horária dessas disciplinas. O resultado foi mais favorável à Filosofia,
que passou a ser disciplina obrigatória no currículo com duas aulas na 1ª e 2ª séries,
respectivamente, restando à Sociologia e Psicologia duas aulas na 3ª série, de acordo
com a opção da escola entre essas disciplinas. Em decorrência desta mudança, houve
concurso para professor de Filosofia em 2005 e algumas ações, entre elas curso de
capacitação de professores, a fim de absorver, em parte, as dificuldades da implantação
da disciplina nos moldes em que ocorreu.
Em 2006 o Conselho Nacional de Educação aprovou a Resolução CNE n°
04/06, publicada no Diário Oficial da União em 21-08-2006, que institui a filosofia e a
sociologia como disciplinas obrigatórias no ensino médio, alterando, portanto, o Artigo 10
da Resolução CNE/CB, nº 3/98, passando a vigorar a seguinte redação:
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Art. 2º § 3º No caso de escolas que adotarem, no todo ou partes,
organização curricular estruturada por disciplinas, deverão ser incluídas
as de Filosofia e Sociologia. [...]
Art. 3º Os currículos dos cursos de Ensino Médio deverão ser adequados
a estas disposições.
Parágrafo único. No caso do § 3º, acrescentado ao artigo 10 da
Resolução CNE/CEB nº 3/98, os sistemas de ensino deverão, no prazo
de um ano a contar da publicação desta Resolução, tomar as medidas
necessárias para a inclusão das disciplinas de Filosofia e Sociologia no
currículo das escolas de Ensino Médio (BRASIL, 2006).
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Filosofia em detrimento da Sociologia e, com isto, até o presente não há previsão de
concurso público para Sociologia.
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A amostragem consistiu em 50% do universo total dos egressos atuantes da Rede Pública de Ensino,
considerando a localização geográfica das escolas em Marília e região, bem como as disciplinas que
ministravam (Sociologia, Sociologia/Geografia, Sociologia/História, História/Geografia, História, Geografia,
Filosofia)
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gera sentimento de impotência e desânimo para o futuro profissional e, muitas vezes,
afasta-o da opção pelo exercício da docência.
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disciplina na grade curricular, fazem-no em função do reconhecimento do trabalho
específico de professores que já as lecionam na própria escola e não em decorrência de
uma orientação mais geral dos órgãos oficiais. No caso da Filosofia, com a sua inserção
na matriz curricular do ensino médio diurno em 2005 e noturno em 2006, e realização de
concurso público em 2005, a situação de trabalho dos professores de filosofia apresenta
maior estabilidade.
Outro fato relevante é a falta de assessoria técnica pedagógica específica
para a Sociologia e a Filosofia, bem como de material didático-pedagógico de referência
para o desenvolvimento do trabalho pedagógico.
Apesar das dificuldades enfrentadas, os professores reconhecem que a boa
base teórica e o senso crítico adquiridos ao longo do curso de Licenciatura que
realizaram na FFC-UNESP-Marília permitiram-lhes superar muitas das deficiências da
própria formação.
3. Anseios e contradições
Os depoimentos dos egressos apresentam anseios e contradições. A
situação peculiar e dramática que vivenciam para o exercício da profissão docente
propicia a busca de alternativas imediatistas para o enfrentamento desse problema.
A reivindicação, por exemplo, por parte de egressos do Curso de Ciências de
criação de complementação em História e/ou Geografia organizado pela própria
instituição formadora conflita com as licenciaturas de História e Geografia mantidas pela
própria UNESP, em relação à identidade de cada curso e seu respectivo campo de
conhecimento e, ao mesmo tempo, desconsidera a tendência da política educacional
vigente de desvalorização das Ciências Humanas na formação dos alunos.
Por outro lado, os entrevistados apresentam uma visão crítica da realidade
atual da educação brasileira, pontuando as questões fundamentais da crise social que
assola os jovens e influencia as relações no interior da escola, dificultando um melhor
desempenho na atuação do professor; mesmo com todos esses problemas, sentem
satisfação em serem educadores e sugerem uma articulação mais estreita entre a
universidade e os outros níveis de ensino, para pensar, conjuntamente, saídas para a
crise social e política da educação; apontam, ainda, a necessidade de uma proposta de
estágio participativa, visando a um melhor conhecimento da escola e uma interação entre
professores, alunos e futuros professores-estagiários.
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Considerações Finais
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sentido, as atividades do Núcleo de Ensino têm sido de grande valia para a
implementação desse objetivo.
A formação do professor não pode ser pensada como uma tarefa isolada da
universidade, desvinculada da realidade em que atuarão os futuros professores. Com
efeito, a superação dos problemas constatados requer ação conjunta entre universidade
e escola pública básica de modo que tanto no âmbito das licenciaturas quanto do ensino
fundamental e médio os objetivos estejam pautados em diagnósticos de pesquisa e não
em contingências políticas ou em preferências subjetivas.
Referências Bibliográficas
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SÃO PAULO (Estado). Parecer CEB nº 15 de 15 de janeiro de 1998. Estabelece a não
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______. Resolução CEB nº 3 de 26 de junho de 1998. Estabelece Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio. Revista de Educação, São Paulo, n. 10, p. 68, maio
1999.
______. Resolução SE-10, de 23 de janeiro de 1998. Estabelece matriz curricular básica
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Diário Oficial do Estado de São Paulo, São Paulo, out.1983.
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organização curricular do ensino médio, no período diurno, nas escolas estaduais.
http://cenp.edunet.sp.gov.br/Portal/ensino/medio.asp. Acesso em 21 de abr. de 2006.
______. Resolução SE nº2, de 11 de janeiro de 2006. Estabelece diretrizes para a
organização do ensino fundamental e médio, no período noturno, nas escolas estaduais.
http://cenp.edunet.sp.gov.br/Portal/ensino/medio.asp. Acesso em 21 de abr. de 2006.
______. Indicação CEE nº 62/2006. Não obrigatoriedade da introdução de Filosofia e
Sociologia no currículo em 2007. Diário Oficial do Estado. São Paulo, 28 de setembro
de 2006.
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