You are on page 1of 4

LAZER, ESPORTE E NATUREZA NA EDUCAÇÃO FÍSICA

Prof. Dr. Giuliano Gomes de Assis Pimentel


Grupo de Estudos do Lazer/Universidade Estadual de Maringá

Pode causar estranheza que exista relevância, dentro de um congresso de


Educação Física, em discutir a articulação entre lazer, esporte e natureza. Isso
porque ela não foi contemplada em nenhuma das conhecidas propostas
metodológicas para a Educação Física escolar, se formos tomar o quadro
configurativo proposto por Castellani Filho (1998). Esse silenciamento do
esporte/lazer na natureza, só tangenciado por meio de um dos eixos transversais
dos PCNs, levou a uma análise empírica muito apressada de que essa temática não
gera conhecimentos na área. Ainda, para alguns, se trata de uma invenção do
mercado, dizendo respeito ao comércio pós-moderno de práticas hedonistas.
Portanto, não carregaria nenhum valor educativo crítico e digno de análise ou
desenvolvimento acadêmico.
Indo na contramão desse pensamento imobilista, é possível ampliar essa
discussão realizando alguns ajustes conceituais. Primeiro, se toma a diferença entre

que vão do acampamento


em ambiente selvagem ao piquenique no parque verde urbano. O esporte na
natureza, portanto, é parcela desse movimento de (re)aproximação que o Homem
estabelece entre aquilo que ele mesmo separou como sendo Cultura e Natureza.
Essa dinâmica é, por si própria, contraditória, pois nem sempre está carregada de
práxis dita ecológica. Pode-se até tomar que essa relação, especialmente no campo
da Educação Física, é mediada por outro norte: a aventura. Portanto, a natureza é
vista como cenário para a atividade, a qual é contabilizada conforme o nível das
emoções. Nesse sentido, o esporte na natureza se aproxima de certas atividades
praticadas no ambiente urbano (parkour, skate) ou em ambos meios (BASE Jump,
rapel, balonismo) cuja metáfora é a adrenalina.
Portanto, pensando não somente no esporte tal como está convencionado na
área (em moldes olímpicos: regulamentado, federado, profissionalizado e
universalizado), mas nas atividades, no sentido anteriormente apontado, é possível
pensar em diversificadas práticas corporais (e não só o esporte) que promovem uma
interface (imediata ou mediada) com a natureza. Daí concebe-se que essa conexão

Primeiro porque a questão ecológica toma lugar nos debates fundamentais da área,
dados os impactos de certas atividades no ambiente (e aí, isso transcende a
natureza, passando a ser assunto de todo o meio). Segundo, pesa a crescente
busca por serviços relacionados às atividades na natureza, o que atinge o âmbito da
recreação (acampamentos, excursões), mas também atravessa a saúde (spas
naturais, terapias na natureza), o turismo (turismo de aventura, turismo rural, entre
outras commodities), a educação (visitas ao meio, educação ambiental), e o
treinamento esportivo (escaladas a grandes montanhas, exercícios personalizados
para aventureiros, competições e ralis em paisagens naturais). Enfim, tanto nos
processos educativos para desenvolver a autonomia do escolar frente a essas
possibilidades quanto no usufruto sustentável desses mercados, se vê a
necessidade da Educação Física (como uma prática eminentemente pedagógica)
possuir conhecimentos acumulados para agir e refletir sobre tais nichos.
Assim, as atividades de lazer na natureza e, mais especificamente os
esportes, apresentam diferencial motriz, volume de pesquisas, quantidade de
praticantes e diversidade de modalidades que incitam a incorporação desse
conteúdo ser tratado na formação inicial em Educação Física.
Porém, é fundamental fugir das ilusões difundidas, entre as quais o impulso
pelo contato com a aventura e/ou a natureza é compartilhado pela maioria da
população. Conforme investigações quantitativas, ainda que exploratórias, é
possível perceber que mulheres, idosos e pessoas com baixa escolaridade e renda
formam grupos propensos a rejeitarem tais atividades, por considerarem-nas
perigosas, extenuantes ou caras para seu perfil (PIMENTEL, SAITO, 2010). Logo,
não é possível falar dessas atividades sem um questionamento sócio-econômico
sobre a concepção de Atividade de lazer na natureza difundida no capitalismo.
Trata-se de um modelo que abrange hedonismo, áreas naturais exclusivas, e
equipamentos e material de ponta (o fetiche tecnológico), estando baseado na
esportivização das práticas. Boa parte do ensino e da produção intelectual nas
universidades acaba sucumbindo a esse padrão, sem questionamentos.
Logo, é necessário pensar em um modelo contra-hegemônico não só em
relação ao capitalismo, mas contrário ao dualismo Homem-Natureza. Em
conseqüência, cabe aos intelectuais da área contribuir com mudanças na estrutura
do conhecimento e, também, nas estratégias adotadas frente ao objeto Atividade de
lazer na natureza. Considerando os limites de
lguns tópicos precedem essa discussão, tais como o estado da arte
brasileiro nessa temática; a realidade do campo profissional e do mercado; e a
evolução do debate ecológico.
Não obstante a carência desse suporte, há de se apontar iniciativas
teóricas e metodológicas que apontam para saídas. De início, é recorrente a
proposta de aprendizagem sequencial difundida internacionalmente por Cornell
(1996) e amplamente adaptada no ensino da Educação Física junto a diferentes
públicos e lugares. Para esse autor, primeiro se desperta ludicamente o entusiasmo,
para depois focar a atenção sobre a atividade, seguido pela transformação da
atividade em experiência dirigida a uma descoberta que, por fim, é compartilhada.
Em termos nacionais vale citar uma experiência ocorrida anexa ao principal
programa governamental de esporte no contra-turno escolar, o Programa Segundo-
Tempo (PST). Por meio do projeto Recreio nas Férias, foi desenvolvida educação
ambiental concomitante à educação para o lazer. Além de trabalhar com as
premissas do lazer como direito e da diversificação dos conteúdos, em 2009 o
projeto atuou com o tema gerador Meio ambiente, concebido como lugar onde se
vive e se estabelecem as relações (OLIVEIRA, PIMENTEL, 2009).
Apesar dos avanços, há carência de um pensamento ecológico na Educação
Física e que amplie o suporte teórico dessas intervenções. Promissor nesse sentido
é a teorização de Rodrigues e Gonçalves Júnior (2009) sobre a Ecomotricidade, cuja
principal premissa é a sinergia entre educação ambiental, pedagogia dialógica e
motricidade humana. Para concluir, se espere que o amadurecimento dessas ideias
possa superar a lógica mecanicista, que ainda teima em separar lazer e natureza,
particularmente visível nos currículos e nas práticas (pedagógicas) da Educação
Física.

REFERÊNCIAS
CASTELLANI FILHO, Lino. Política educacional e Educação Física. Campinas:
Autores Associados, 1998.
CORNELL, Joseph. Brincar e aprender com a natureza. São Paulo: Melhoramentos:
Senac,1996.
OLIVEIRA, Amauri Aparecido; PIMENTEL, Giuliano G. de A. (Orgs.). Recreio nas
férias: reconhecimento do direito ao lazer. Maringá, PR: Eduem, 2009.
PIMENTEL, Giuliano G. de A.; SAITO, Caroline F. Caracterização da demanda
potencial por atividades de aventura. Motriz, Rio Claro, v.16, n.1, p.152-161,
jan./mar. 2010.
RODRIGUES, Cae; GONÇALVES JÚNIOR, Luiz. Motriz, Rio Claro, v.15, n.4, p.987-
995, out./dez. 2009.

You might also like