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6. Formação de gotas d'água e de cristais de gelo na atmosfera.

6.1 - Nucleação homogênea.

Se o ar fosse completamente isento de impurezas, a formação de um simples aglomerado


de moléculas d'água (êmbrio) deveria acontecer por colisão seguida da aglomeração de molécu-
las. Esse processo é referido na literatura como nucleação homogênea.

Levando-se em conta a baixa concentração do vapor d'água em relação aos demais constituintes
do ar, a ocorrência de nucleação homogênea é pouco provável, mesmo em ambientes controlados, com
umidade relativa bastante superior a 100%. Experiências feitas em câmaras, usando ar filtrado, mostraram
que foi necessária uma sobre-saturação de 400% para que ocorresse condensação em torno de íons nega-
tivos e de 600% em torno de íons positivos (Peixoto, 1970).

Outro aspecto que torna improvável a nucleação homogênea em condições naturais é que
a aglutinação de poucas moléculas não permitiria o desenvolvimento de forças coercitivas sufici-
entes para mantê-las agregadas. Assim, as moléculas mais externas tenderiam a se libertar rapi-
damente do êmbrio, o que exclui a possibilidade de tais agregados moleculares se formarem len-
tamente. O surgimento de um êmbrio estável (cujas moléculas não voltassem à fase gasosa), por
colisão seguida de aglutinação de um grande número de moléculas, teria de ser praticamente
instantâneo, o que é virtualmente impossível de ocorrer na atmosfera.

Segundo Byers (1965), mesmo sob uma sobre-saturação de 200%, à temperatura de 0oC,
por exemplo, um êmbrio somente se manteria estável se seu raio ultrapasse 0,00173P, o que si-
gnifica que deveria possuir 714 moléculas. A probabilidade de que tantas moléculas se choquem
simultaneamente e se aglutinem é diminuta. Sob umidade da ordem de 400%, para formar um
êmbrio estável com 0,00087P de raio, àquela temperatura, seriam requeridas 89 moléculas agluti-
nadas, o que ainda é pouco provável. É evidente que na atmosfera, onde não ocorrem tais condi-
ções de supersaturação, a formação de um êmbrio por nucleação homogênea está descartada.

6.2 - Nucleação heterogênea.

Diz-se que há nucleação heterogênea quando a condensação (ou a sublimação) do vapor


d'água se processa na superfície de partículas não hídricas, solúveis ou não, naturalmente pre-
sentes no ar. Tais partículas são genericamente conhecidas como núcleos de condensação ou de
sublimação, conforme originem êmbrios líquidos ou sólidos (gelo). Os núcleos de condensação
podem originar gotículas d'água a temperaturas superiores ou inferiores a 0oC (gotas sobrefundi-
das). Na alta troposfera é comum a existência de gotas d'água sobrefundidas a temperatura tão
baixa quanto –10, ou mesmo –40oC.

Na atmosfera existem inúmeros tipos de partículas em suspensão, oriundas do oceano, do


próprio solo, de erupções vulcânicas, de meteoritos etc. e, evidentemente, da combustão e de
outras atividades humanas (poluição). Quando o processo de condensação (ou de sublimação) se
inicia na superfície dessas partículas, costuma-se dizer que elas se tornaram ativas.

Algumas das partículas encontradas na atmosfera são genericamente conhecidas como


núcleos de Aitken; têm raios compreendidos entre 0,01 e 0,1P e se tornam ativas em condições

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de sobre-saturação de 0,5 a 2% (no sentido convencional). Partículas maiores, com 0,1 a 3P de


raio, exigem supersaturações menores que 0,5%. Há, ainda, núcleos gigantes de cloreto de sódio,
com cerca de 5P de raio, que foram encontrados na proporção de 1000 m-3. Os núcleos gigantes
começam a se tornar ativos quando a umidade relativa do ar está bem aquém da saturação.
Mesmo com 75% de umidade relativa no ar esses núcleos podem manter em equilíbrio gotas de
solução com 10P de raio (Riehl, 1965). Admite-se que os núcleos de cloreto de sódio são proveni-
entes da evaporação de gotas d'água salgada retiradas ao mar pelo vento. Uma outra categoria
importante de núcleos de condensação é representada pelos produtos de combustão. Eventual-
mente, constata-se a atividade dos poluentes ácidos, altamente higroscópicos.

Ressalta-se que as gotículas só conseguem se manter em equilíbrio quando seus raios


atingem um valor mínimo (r), designado por raio crítico, que obedece à equação de Kelvin
(VIII.4.10).

A formação de cristais de gelo por nucleação heterogênea é creditada principalmente à


atividade de partículas não solúveis, de origem mineral, destacando-se as argilas.

6.3 - Crescimento de gotas.

Há duas teorias clássicas que procuram explicar o desenvolvimento de gotas ou de cristais


de gelo até alcançarem o tamanho com o qual costumam cair à superfície (precipitação). A primei-
ra diz respeito às nuvens frias, isto é, àquelas que estão total ou parcialmente submetidas a tem-
peraturas inferiores a 0oC. A outra aplica-se às chamadas “nuvens quentes”, ou seja, àquelas cuja
temperatura é superior a 0oC, comuns na Região Tropical.

A explicação da origem dos produtos de precipitação em nuvens frias foi desenvolvida por
T. Bergeron e aperfeiçoada por F. Findeisen (Berry et al., 1945). A teoria de Bergeron-Findeisen
se fundamenta no fato da pressão de saturação sobre gelo ser menor que sobre a água sobrefun-
dida. Assim, em uma nuvem fria, onde coexistem gotas d'água e cristais de gelo a temperaturas
bem abaixo de 0oC, estes crescem às custas daquelas. Atingindo a um tamanho suficiente o cris-
tal de gelo iniciaria sua queda em direção à superfície.

Admite-se que no início da sublimação alguns cristais possam se fragmentar, passando


cada pedaço a atuar como se fora um núcleo de sublimação. Por outro lado, uma vez iniciado o
movimento para baixo, os cristais podem atravessar regiões onde a temperatura é superior a 0oC,
fundindo-se total ou parcialmente, aglutinando-se a outros ou englobando pequenas gotas encon-
tradas em sua trajetória. Eventualmente são reconduzidos de volta ao topo da nuvem por fortes
correntes ascendentes.

No caso das nuvens quentes, o tamanho das gotículas inicialmente aumenta por conden-
sação de mais vapor d'água em sua superfície ou seja, o crescimento resulta somente da difusão
do vapor. O aumento do volume é relativamente elevado nessa fase e, mesmo havendo uma so-
bre-saturação pequena, em pouco tempo alcançam raios de 5 a 10P, típicos de uma gotícula de
nuvem (Haltiner e Martin, 1957). Acredita-se que, nessa fase inicial, a presença de núcleos hi-
groscópicos e em particular os gigantes, desempenhe um papel muito importante e facilitem o
surgimento de gotículas de tamanhos diferentes. Como se sabe, as gotas grandes tendem a cres-
cer às custas das pequenas de mesma concentração salina, devido à diferença da pressão de
saturação. O efeito do raio de curvatura, porém, pode ser parcial ou totalmente compensado em

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virtude da diferença de concentração.

O processo de crescimento apenas por difusão requer cerca de um dia para que um gotí-
cula possa atingir o tamanho característico de uma gota de chuva (0,5mm de diâmetro). A experi-
ência mostra, no entanto, que uma nuvem quente pode se formar e iniciar precipitação em poucas
horas, fato muito comum na Região Tropical, por exemplo. É evidente, portanto, que outros meca-
nismos devem estar envolvidos no crescimento das gotículas.

As gotículas possuem um movimento desordenado, o que aumenta a probabilidade de


colisões, seguidas de aglutinação, processo que se denomina acreação. Esse efeito é maior em
nuvens cumuliformes devido à turbulência em seu interior. Por outro lado, gotas grandes desen-
volvem velocidade de queda maior e varrem um volume claramente cônico, englobando várias
gotículas em sua trajetória. Durante o movimento ascendente, por serem mais pesadas movem-se
mais lentamente e podem ser atingidas por gotículas (mais velozes). Duas gotinhas que tenham
trajetórias paralelas e próximas são atraídas (pela descompressão do ar que flui entre elas) e ten-
dem a coalescer. O mecanismo de acreação (colisão-coalescência) é importante para explicar o
crescimento de gotas, mas sozinho não justifica as chuvas torrenciais.

I. Langmuir desenvolveu uma teoria explicando que, em seu movimento vertical, as maio-
res gotas normalmente se fragmentavam e as gotinhas resultantes, não tão pequenas, continua-
vam a crescer por colisão-coalescência com as gotículas circunjacentes, numa verdadeira reação
em cadeia (Peixoto, 1970). O efeito multiplicador desse processo seria suficiente para justificar
como as nuvens cumuliformes conseguem desenvolver aguaceiros em tão pouco tempo.

7. Estimulação artificial de nuvens.

As nuvens mais propícias à estimulação artificial são precisamente os cúmulos e cumulo-


nimbos. Uma nuvem convectiva (cumuliforme) deve ser entendida como uma fábrica de chuva em
potencial. A matéria prima é o vapor d'água e as partículas capazes de se tornarem ativas. Estas
são, em geral, tão abundantes na atmosfera que aparentemente não chegam a constituir fator
limitante. É, então, o suprimento de vapor d'água que vai condicionar a produção de precipitação.
No caso de nuvens cumuliformes em desenvolvimento, o suprimento é o assegurado pela umida-
de do ar que ascende, penetrando na base da nuvem. Ao atravessá-la, uma considerável quanti-
dade de vapor d'água se condensa, de maneira que o ar estará muito menos úmido ao ultrapassar
o topo da nuvem.

Sob o ponto de vista dinâmico, o requisito básico para que essa fábrica funcione é a exis-
tência de instabilidade atmosférica, favorecendo o desenvolvimento de correntes ascendentes
intensas as quais irão facilitar o crescimento das gotas. Caso não existam mecanismos capazes
de assegurar a requerida instabilidade, a nuvem formada certamente não conseguirá produzir
precipitação, ou o fará em quantidades insignificantes. Tampouco haverá precipitação abundante
na ausência de um suprimento adequado de vapor d’água.

Diversas tentativas têm sido feitas no sentido de provocar a formação de gotas grandes,
capazes de desencadear precipitação. A técnica mais comum, no caso de nuvens quentes, con-
siste em aspergir nelas (a partir de uma aeronave) grandes gotas de solução salina,. A hipótese
assumida é a de que tais gotas irão iniciar a reação em cadeia. Em nuvens frias costuma-se efe-
tuar a estimulação mediante a dispersão de neve carbônica (CO2 congelado), visando à geração

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de núcleos de sublimação.

A estimulação de uma nuvem com vistas a provocar chuva só tem cabimento em época de
estiagem (no período chuvoso não teria sentido algum). Mas, durante esses períodos secos, a
chuva torna-se naturalmente escassa ou inexistente justamente porque não há bastante umidade
atmosférica, ou existem mecanismos inibidores da instabilidade atmosférica (como a camada de
inversão dos ventos alísios, por exemplo), ou ambos os fatores. Na época chuvosa estão espon-
taneamente satisfeitas essas condições (suprimento de vapor e instabilidade) e é evidente que as
nuvens tendem a se desenvolver e, sem nenhuma estimulação, produzem chuva. A questão que
se coloca é se o efeito das estimulações consideradas bem sucedidas não teria sido apenas o de
antecipar o que iria acontecer naturalmente mais tarde. Aliás, esse é o argumento usado diante
dos juizes quando alguém se sente prejudicado pelo fato do vizinho ter recorrido à indução artifici-
al da chuva.

A inoculação de uma nuvem com produtos estimulantes, sem que as condições de supri-
mento e de instabilidade estejam satisfeitas, no máximo produziria uma quantidade muito pequena
de chuva, que nem sempre chega a atingir o solo. Precipitação da ordem de 2 a 5 litros por metro
quadrado do terreno, em plena época de estiagem, não parece ter efeitos consideráveis sobre as
culturas. Questiona-se, caso a temperatura à superfície do solo seja elevada durante o período
não chuvoso, se uma precipitação dessa magnitude efetivamente chega a ser aproveitada, mes-
mo que parcialmente.

O alto investimento e o elevado custo operacional envolvidos na operação de estimulação


de nuvens, aliados à incerteza dos resultados, tornam desaconselhável sua prática como ativida-
de de rotina, atualmente. Iniciativas dessa natureza deveriam ser estimuladas mas permanecendo
restritas ao âmbito da investigação científica, até que resultados mais promissores pudessem futu-
ramente ser alcançados, como decorrência natural do desenvolvimento de novas tecnologias.

8. Definição e classificação dos meteoros.

Em Meteorologia o termo meteoro é aplicado à qualquer fenômeno, diferente de uma nu-


vem, observado na atmosfera ou na superfície terrestre, porém decorrente da presença da at-
mosfera (O.M.M., 1970). Esses fenômenos podem resultar de depósitos ou da queda de partícu-
las de natureza aquosa ou não, no estado sólido ou líquido, bem como manifestações óticas, elé-
tricas ou sonoras.

Considerando a constituição e as condições em que se formam, os meteoros podem ser


classificados em quatro grupos: hidrometeoros, litometeoros, fotometeoros e eletrometeoros. Esse
tópico destina-se tão somente à definição dos principais meteoros. Os mais interessantes serão
abordados, com algum detalhe, posteriormente.

8.1 - Hidrometeoros.

Um hidrometeoro é um conjunto de partículas de constituição hídrica, no estado líquido ou


sólido, em suspensão ou em queda livre (precipitação) na atmosfera, ou levantadas da superfície
terrestre pelo vento, ou depositadas sobre objetos, sobre seres vivos ou no solo. Uma breve des-
crição dos hidrometeoros mais comuns será feita adiante, segundo o Atlas Internacional de Nu

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