You are on page 1of 87

AUGUSTO CARLOS PATTI DO AMARAL

ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DE UMA COOPERATIVA DE TRABALHO


MÉDICO: UM ESTUDO DE CASO DA UNIMED CUIABÁ.

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO

PUC/SP
SÃO PAULO
2001
AUGUSTO CARLOS PATTI DO AMARAL

ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DE UMA COOPERATIVA DE TRABALHO


MÉDICO: UM ESTUDO DE CASO DA UNIMED CUIABÁ.

Dissertação apresentada a Banca Examinadora


da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
como exigência parcial para obtenção do título de
MESTRE em Administração, sob a orientação da
Profa. Dra. Neusa Maria Bastos Fernandes dos
Santos.

PUC/SP
SÃO PAULO
2001
Ficha catalográfica elaborada pela Bib. Nadir Gouvêa Kfouri - PUCSP

DM
658 Amaral, Augusto Carlos Patti do
A485e Estrutura e funcionamento de uma cooperativa de trabalho
médico: um estudo de caso da Unimed Cuiabá. - São Paulo: s.n.,
2001.
viii, 76 f.; il. fig., quadros; 31 cm.

Dissertação (Mestrado) - PUCSP


Programa: Administração de Empresas
Orientador: Santos, Neusa Maria Bastos Fernandes dos
1. Cooperativismo. 2. Sociedades cooperativas - Cuiabá, MT.

Palavra-Chave: Cooperativismo de trabalho médico - UNIMED - Receitas e


custos - Distribuição de renda
AUGUSTO CARLOS PATTI DO AMARAL

ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DE UMA COOPERATIVA DE TRABALHO


MÉDICO: UM ESTUDO DE CASO DA UNIMED CUIABÁ

Banca Examinadora

_____________________________________

_____________________________________
À Gisela, João e Julia
iii

AGRADECIMENTOS

À Profa. Dra. Neusa Maria Bastos Fernandes dos Santos, pela atenta
orientação.

Aos Profs. Drs. Antonio Vico Manâs e Onésimo de Carvalho pelas


sugestões recebidas na qualificação.

À UNIMED Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico, em especial ao ex-


Presidente, Dr. Dergan Antonio Baracat, ao atual Presidente Dr. Alencar Farina, e
a todos os cooperados, pela oportunidade de desenvolvimento do trabalho.

À Pedro Carlos Miler e João Luiz Derkoski pelas sugestões de bibliografia.

À José Herculano, Robinson Pinheiro, e Marilene Martins de Oliveira, pelo


auxílio na digitação.

Ao Dr. José Carlos Amaral Filho, pela sugestão da dissertação de N. W.


Luz, sobre a Cooperativa Unimed, singular de Florianópolis.

À Joel Pola, pelo incentivo, e ao Dr. João Carlos Regado e a AMICO


Assistência Médica, pelo financiamento parcial.
À Shirlei Cristina dos Santos, pelo interesse em ajudar os mestrandos.

À Vera Sakamoto, pela ajuda na reta final.

Ao colega, Fernando Roberto Santini, pela boa vontade em resolver as


pendências burocráticas, e pelo animado coleguismo.

Aos colegas de curso, Susan, Wanderley, Anne, Raimundo e Patrícia, pela


saudável convivência.
iv

RELAÇÃO DE FIGURAS

FIGURA 1 – Organização Estrutural das Cooperativas.........................................29

FIGURA 2 - Comparativo dos Resultados dos Exercícios 94 / 98 da Unimed


Cuiabá.....................................................................................................................47

FIGURA 3 – Organograma de Unimed Cuiabá......................................................51

FIGURA 4 – Distribuição Percentual do N.º de Cooperados em Relação à Renda


Mensal no Ano de 1999..........................................................................................66
v

RELAÇÃO DE QUADROS

QUADRO 1 – Quadro comparativo : Empresas Privadas x Empresas Estatais x


Cooperativas........................................................................................34

QUADRO 2- Comparativo de Custos entre Singulares Unimed’s..........................53

QUADRO 3 – Quantidade e Percentual de Cooperados, segundo o Tempo


de Cooperativa .................................................................................61

QUADRO 4 – Quantidade e Percentual de Cooperados, segundo o Motivo


de Ingresso na Cooperativa............................................................62

QUADRO 5 - Quantidade e Percentual de Cooperados em relação a Aumento


de Renda.......................................................................................63
vi

RESUMO

O cooperativismo nasceu há mais de cento e cinqüenta anos, agregando


idéias de equidade e justiça social. Desenvolveu-se em todo o mundo, como uma
alternativa de trabalho e inclusão social.

Em nosso país existem atualmente 5.652 cooperativas, congregando mais


de cinco milhões de cooperados, movimentando a economia em diversos setores,
tais como crédito, consumo, agropecuária, trabalho e saúde.

O presente trabalho faz um histórico do cooperativismo, e apresenta a


estrutura e funcionamento de uma Cooperativa de Trabalho Médico, e as
diferenças entre empresas privadas e sociedades cooperativas.

No estudo de caso da Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico,


no tocante a melhoria da renda dos cooperados, evidenciou-se uma grande
oportunidade de trabalho para quase mil médicos cooperados, com o aumento de
renda.
vii

ABSTRACT

The Cooperativism was born more than one hundred and fifty years ago, adding
ideas of equality and social justice. Was developed in the whole world as an
alternative of work and social inclusion.
In our country, exists 5652 cooperatives; with more than five million cooperated,
putting into motion the economy in diverse sectors such as credit, consumption,
farming, work and health.
The present work makes a description of the cooperativism and introduces the
structure and functioning of a Cooperative of Medical Work, and the differences
between private companies and cooperatives.
In the case study of Unimed Cuiabá Cooperative of Medical work, in relation of
improvement of income of the cooperated, ones almost proves a great chance of
work for a thousand doctors, with increase of income.
viii

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1

1 – O COOPERATIVISMO ......................................................................................6

1.1 Origens e evolução ...........................................................................................6


1.2 O Cooperativismo no Brasil ............................................................................13
1.3 O Cooperativismo de Trabalho........................................................................16
1.4 A Cooperativa de trabalho como meio alternativo de trabalho e renda...........19

2 – ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DAS COOPERATIVAS ........................22

2.1 Natureza jurídica............................................................................................22


2.2 Características : cooperativas x empresas privadas.....................................31

3- COOPERATIVISMO DE TRABALHO MÉDICO ..............................................37

3.1 A Medicina Liberal e Profissional Médico.........................................................37


3.2 A Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho.....................................................42
3.3 Receitas e Custos em uma Cooperativa de Trabalho Médico.........................53
3.4 Distribuição de renda na Cooperativa de Trabalho Médico..............................58

4- CONSIDERAÇÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS........................................69

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................72

ANEXO.................................................................................................................77
1

INTRODUÇÃO

O atual contexto de globalização em que se encontra a economia


moderna, fez com que as organizações, quaisquer que sejam suas atividades,
dirigissem esforços para a melhoria de seus produtos e em particular na busca da
excelência na prestação de serviços.

O fator globalização, não distingue categorias de organizações. A ênfase


no aprimoramento, para continuar na competição, nivela empresas públicas,
privadas e organizações sem fins lucrativos. A busca por novos modelos
produtivos, a inovação tecnológica com introdução maciça da informática, e a
mudança nas relações de emprego e trabalho são transformações que as
organizações têm experimentado nesta última década, com uma velocidade
bastante grande, mas com resultados nem sempre significativos para o
trabalhador, uma vez que diversos postos de trabalho, simplesmente deixaram de
existir (ALVES, 1997:24).

Quando falamos em mudanças na relação de emprego, ou em novas


formas de organização econômica, necessariamente estaremos abordando as
relações humanas que permeiam a dinâmica das organizações, e o modo de
interação entre os trabalhadores e a sociedade.

O homem como ser social assume desde sua origem uma tendência a
ajuda mútua como princípio de subsistência e força para dominar e disponibilizar a
natureza a serviço da humanidade.

Com a evolução dos tempos, o homem passou a agrupar-se e conviver


socialmente, organizando não só o espaço físico, mas também as tarefas a serem
cumpridas. Como conseqüência dos agrupamentos sociais, famílias, clãs, tribos e
comunidades passaram a enfrentar os problemas que surgem a partir desta
2

representação social e até econômica, pois na dinâmica destes relacionamentos,


estavam incluídos as trocas ou escambo. Necessariamente o homem estava
aprendendo a lidar com as dificuldades da vida em comum e procurando
estabelecer princípios que coordenassem as relações entre pessoas e
coletividade.

Mais forte do que a solidariedade, o instinto de sobrevivência iria


impulsionar o homem a estabelecer relações de ajuda mútua, para enfrentar as
intempéries em um primeiro momento, e o mercado e o sistema capitalista logo a
seguir, conforme anunciava MARX (1998:48), em seu Manifesto Comunista:

“Os pequenos industriais, pequenos comerciantes e pessoas que possuem


rendas, artesões e camponeses caem nas fileiras do proletariado: uns porque
seus pequenos capitais, não lhes permitindo empregar os processos dos
grandes industriais, sucumbem na concorrência com os grandes capitalistas;
outros pelos novos métodos de produção”.

Decididamente, o iniciar da Revolução Industrial, fez florescer os instintos


de sobrevivência e solidariedade do homem, e o incentivou a buscar novas formas
de relacionamento econômico. Neste momento surgiram movimentos que iriam
motivar o aparecimento do Cooperativismo.

Atualmente, enquanto as políticas econômicas conduzidas por ideais


neoliberais, traduzido pelo que se denominou chamar de globalização, pretendem
solapar conquistas sociais alcançadas, surge, com maior ênfase ainda, a
necessidade de retomar os princípios e valores de cooperação, democracia e
solidariedade, que deram origem e sustento ao Cooperativismo, segundo PÉRIOS
(1997:17).

Para IRION, (1997:49) o Cooperativismo nasce então, com a base em


valores tais como justiça social e equidade. Seria desta forma, uma nova via de
participação social e econômica de fácil acesso, pois independe de capital, e se
3

cumpridos os seus valores e princípios, deverá contribuir para uma melhor


distribuição de riqueza.

ANTONI (1980:27) sintetiza a conceituação de Cooperativa. “Uma


cooperativa é um agrupamento de pessoas que perseguem objetivos econômicos,
sociais e educativos comuns, mediante uma empresa, cujo funcionamento é
democrático, sendo a propriedade coletiva”.

O ideal cooperativista disseminou-se em todo o mundo e em todas as


áreas, sendo aceita como uma forma justa, equânime e democrática de atender as
necessidades dos trabalhadores, sendo inclusive considerada como uma melhor
alternativa de combate ao desemprego, e ainda, a Cooperativa atuaria como
intermediária entre o mercado e o trabalhador, sem visar o lucro ou qualquer outra
vantagem. (QUEIROZ, 1998.21).

IRION, em relação ao cooperativismo médico (1994:12), afirma que este


foi conseqüência da evolução de ciclos ocorridos em mudanças sócio-
econômicas, em todo o mundo. Esta evolução na medicina ocorreu, segundo o
autor, em quatro ciclos:

Medicina Liberal: quem pode paga, quem não pode pagar é atendido pela
benemerência.

Medicina Estatal: o Estado é responsável pelo bem estar social e por isso
deve avocar para si toda a responsabilidade pela assistência médica.

Medicina Mercantil: a doença passa a ser tratada como mercadoria e


explorada com objetivo de lucro

Medicina Cooperativa: o homem (médico e paciente) é o fulcro das


atenções. A sociedade deve se organizar e complementar a ação do Estado.

Em verdade, houve realmente o esgotamento destas modalidades de


assistência médica: A medicina liberal praticamente desapareceu não só pelo
empobrecimento da população, como também pela majoração imposta por
4

inovações tecnológicas. A benemerência, sustentada indiretamente por toda a


sociedade também teve a mesma sorte, praticamente pelos mesmos motivos. A
medicina estatal, além da deficiência no gerenciamento, caiu junto com a
tendência de queda mundial do wellfare state, até mesmo em países de cunho
socialista. A mercantilização da medicina conseguiu provocar o descontentamento
entre todos os partícipes: prestadores de serviço, usuários e principalmente os
médicos que tiveram seus ganhos aviltados.

Nos dias de hoje, o Cooperativismo está integrado em nossa economia de


forma significativa. Segundo dados da OCB - Organização das Cooperativas
Brasileiras - existem atualmente em nosso País, 5.652 cooperativas, com
5.014.016 cooperados, empregando 167.378 funcionários.1

Resta saber se o advento do cooperativismo, com toda esta expressão na


economia Brasileira, garantindo trabalho para mais de cinco milhões de pessoas,
veio efetivamente contribuir para a melhoria nas relações de emprego e trabalho,
como também da renda do cooperado.

O objetivo geral desta dissertação, é portanto discutir o funcionamento de


uma cooperativa de trabalho médico, e as relações entre esta e seus cooperados,
em um estudo de caso da Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico.

Como objetivo específico, busca-se identificar a influência do sistema


cooperativista na distribuição de renda dos cooperados. Se há de fato uma
melhora nos ganhos dos participantes dessa modalidade de representação
econômica, ou simplesmente repete-se o modelo concentrador de renda verificado
em empresas mercantis.

A metodologia deste trabalho será o estudo de caso, conforme descrito


por RUDIO (1990:57): “... no estudo de caso faz-se uma pesquisa de um
determinado indivíduo, família, grupo ou comunidade com o objetivo de realizar

1
www.ocb.org.br
5

uma indagação em profundidade para se examinar o ciclo de sua vida ou algum


aspecto particular desta.”

Na coleta de dados utilizou-se a pesquisa documental, através da leitura


de atas do Conselho de Administração, e demais conselhos, atas das
Assembléias Gerais da Unimed Cuiabá, relatórios da gerência financeira, e
relatório do Balanço Anual, publicado em jornais de circulação, entrevistas com
diversos dirigentes cooperativistas, e cooperados, membros da diretoria e
funcionários, e questionário dirigido aos cooperados.

No primeiro Capítulo apresenta-se uma abordagem teórica sobre a história


do cooperativismo em geral, suas origens e o momento atual, bem como a
evolução do cooperativismo no Brasil. São também abordadas algumas
considerações sobre o cooperativismo de trabalho, e este como forma alternativa
de geração de renda, e como flexibilização das relações trabalhistas.

No Capítulo II são abordadas a natureza jurídica das cooperativas,


algumas de suas características, e as comparações entre as sociedades
cooperativas, e as empresas privadas. No Capítulo III, será apresentados o
cooperativismo de trabalho médico, suas origens, peculiaridades, e a empresa a
ser estudada: UNIMED Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico. Será discutidas
esta forma de atividade econômica, e as relações entre cooperativa e cooperados,
e de que forma o cooperativismo influi na renda de seus cooperados.

A contribuição desta pesquisa é conhecer a importância do sistema


cooperativista, e em particular do cooperativismo de trabalho médico, e a sua
influência nos parceiros que atuam nesta atividade econômica.

A escassez de dissertações e teses e até mesmo bibliografia versando sobre o


Cooperativismo de Trabalho Médico, também nos motivou a realizar este trabalho,
que esperamos possa contribuir para um melhor entendimento deste tema de
grande relevância, e cuja importância na economia está em franca expansão.
6

De acordo com PINHO (1991:156), “há um verdadeiro círculo vicioso: a falta de


publicações cooperativas não estimula a realização de estudos e a escassez de
estudos cooperativistas não permite a ampliação do mercado de obras sobre
cooperativismo”.

A maioria da bibliografia disponível versando sobre o tema aborda


invariavelmente o cooperativismo agrícola ou mais recentemente, o associativismo
ligado a movimentos populares.

Em relação ao cooperativismo de trabalho médico, a bibliografia existente é em


sua maioria de pessoal pertencente ao Sistema UNIMED.

Outra contribuição será alertar sobre um possível distanciamento que poderá


estar ocorrendo, dos princípios e valores cooperativistas que originaram este
movimento, e buscar uma reflexão sobre estes acontecimentos.

CAPÍTULO 1 - O COOPERATIVISMO

1.1 Origens e Evolução

Antes de falar-se em Cooperativismo, há que se citar o que CARNEIRO


(1978:19) chama de os Reformadores Sociais. Estes seriam em verdade os
precursores do Cooperativismo, uma vez que um conjunto de idéias, pensamentos
e tendências fervilhavam no final do Século XIX, em contraposição à dura
realidade que a Revolução Industrial lhes impunha: jornadas de trabalho
extenuantes até mesmo para mulheres e crianças, condições precárias de
habitação, alimentação inadequada e insuficiente, etc.

Estes reformadores sociais foram pensadores ingleses e franceses, que


primeiro levaram à frente suas inconformidades com o sistema Capitalista. Dentre
eles destacam-se o bretão Robert Owen, que tendo começado como aprendiz em
tecelagem, chegou a ser próspero industrial da área têxtil. (PERIOS, 1997:32).

Owen demonstrava grande preocupação com o bem estar dos


trabalhadores conseguindo, por sua iniciativa, melhorar as condições ambientais e
7

pecuniárias de seus empregados. Foi também por sua influência que o governo
inglês aprovou uma Lei em 1819, limitando o trabalho de mulheres e crianças. Não
era por outra razão, que Robert Owen foi considerado o “pai do cooperativismo”,
atribuindo-lhe inclusive a criação do termo COOPERATIVISMO.

Em verdade, não só as idéias, mas principalmente o legado de realizações


de Owen, tais como a “Bolsa de Intercâmbio de Trabalho”, ou ainda uma
“Associação de Todas as Classes e de Todas as Nações”, segundo MILLER
(1999:13), teria sido a precursora da atual ACI, Aliança Cooperativista
Internacional.

Outro reformador social seria o francês Charles Fourier, este com um


cunho mais próximo ao comunismo, sugeria a formação de colônias que
produziriam em comum bens e serviços, com especial ênfase na agricultura. (A
estes locais denominava de “Falanges” ou “Falanstérios”). Fourier acreditava que
a industrialização seria responsável pelas desigualdades econômico-sociais.
Acredita-se que a prática apregoada por ele, assemelhava-se ao atual
Cooperativismo.

Além destes dois podem-se citar outros pensadores, que segundo alguns
autores (CARNEIRO, 1978; OLIVEIRA, 1984; MILLER, 1999), tiveram influência
sobre a experiência de Rochdale. São eles:

William King (1768-1865) médico inglês, que se dedicou ao


cooperativismo de consumo, Philippe Buchez (1812-1882) francês, advogado e
político, ligado a questões trabalhistas, e Louis Blanc (1811-1882) belga de
nascimento, incentivou a criação de cooperativas de produção na França.

“Toad Lane”

Em 21 de Dezembro de 1844, na “Travessa do Sapo” (Toad Lane), no


bairro de Rochdale, região industrial de Manchester, na Inglaterra, vinte e oito
artesões cansados da exploração a que estavam sendo submetidos, tais como a
extensa jornada de trabalho a que eram obrigados a cumprir, inclusive mulheres e
8

crianças, bem como o aumento do desemprego cuja origem advinha da crescente


onda causada pela Revolução Industrial, reuniram-se com o propósito de criar
condições dignas de remunerar os seus trabalhos e conseguir levar até o mercado
as peças que produziam, além de instalar um armazém que lhes proporcionasse
alimentos, vestuário, ferramentas, e material necessário à execução de diferentes
trabalhos. Durante um ano, juntaram com grande sacrifício, a quantia de 28 Libras
esterlinas, que foi utilizada na abertura do armazém.

Foram os chamados “Pioneiros de Rochdale”, ou a “Sociedade dos


Probos de Rochdale” que, liderados pelo artesão Charles Howart, estavam
lançando as bases do Cooperativismo, e cujo sucesso iria impulsionar diversas
outras iniciativas. (POLONIO, 1999:22).

Os fundamentos da Doutrina Cooperativista ganharam impulso, após


Rochdale, com o Francês Charles Gide (1847-1932), que desenvolveu seus
postulados na Europa no que ficou conhecida como a “Escola de Nimés”, que
enxergavam a possibilidade de eliminar certos “males” da sociedade capitalista
através da implantação dos princípios cooperativistas.

Esta nova vertente, também chamada de Economia Social, deveria


promover em ambiente democrático, a produção, distribuição e o consumo de
bens e serviços de tal modo que todos fossem beneficiários.

É neste sentido que surgem as novas formas de relacionamento


econômico, o Mutualismo, o Associativismo e o Cooperativismo.

O Mutualismo, cuja origem é o empréstimo de coisas fungíveis, isto é, o


contrato pelo qual uma das partes transfere uma coisa/objeto fungível à outra,
obrigando-lhe esta lhe restituir coisa do mesmo gênero, da mesma qualidade e na
mesma quantidade. Tem como características:

a) Real: entrega efetiva da coisa/objeto

b) Unilateral: somente o mutuário contrai obrigações.


9

c) Gratuito: o mútuo é naturalmente gratuito

d) Temporário: é da essência do mútuo a restituição

O Associativismo, que é o processo pelo qual dois ou mais indivíduos se


integram em um esquema estável nas relações, tem duas formas fundamentais de
associação:

a) A integração movida por um impulso natural, quase instintivo, não


deliberado, que dá origem às chamadas associações comunitárias, ou
simplesmente comunidades. Esta forma leva a constituição das
famílias e das pequenas comunidades rurais e urbanas.

b) Os homens também se integram por determinação deliberada,


geralmente sobre uma base contratual ou estatutária. Daí surgem às
associações, ou sociedades. È a forma que cria diversos modelos de
relações estáveis, como por exemplo, sociedades comerciais,
esportivas ou culturais, onde ninguém experimenta um impulso natural
de participar desta ou daquela sociedade anônima ou clube recreativo.
Entra efetivamente em um deles, na medida em que uma reflexão
deliberada lhe mostra haver interesse nisso.

O Cooperativismo foi motivado por um conjunto de princípios e valores


que preconizavam uma mudança na organização da economia. Enquanto o
Capitalismo privilegia o Capital, o Cooperativismo visa privilegiar o Indivíduo.

Os princípios originais, constantes no estatuto de fundação em Rochdale,


são assim enunciados: (IRION, 1997:51).

1) Adesão Livre;
2) Controle Democrático;
3) Devolução ou Retorno sobre as Compras;
4) Juros Limitados ao Capital;
5) Neutralidade Política e Religiosa;
10

6) Vendas a Dinheiro e a Vista;


7) Fomento ao Ensino.

Em que pese ter sido a iniciativa de Rochdale, uma cooperativa de


consumo, os princípios serviram para todos os tipos de cooperativas e foram
adaptados no Congresso da Aliança Cooperativista Internacional (ACI), realizado
em Paris em 1937 para as demais cooperativas. Este mesmo Congresso, reunido
desta vez em Manchester, Inglaterra, no ano de 1995, fez uma última revisão cujo
enunciado sintético passou a ser:

1) Princípio da Adesão Livre e Voluntária;


2) Princípio do Controle Democrático pêlos Sócios;
3) Princípio da Participação Econômica dos Sócios;
4) Princípio da Independência e Autonomia das Cooperativas;
5) Princípio da Educação, Treinamento e Formação;
6) Princípio da Cooperação entre Cooperativas;
7) Princípio da Preocupação com a Comunidade;

Este conjunto de princípios é a base da doutrina cooperativista e a


atuação na cooperativa passa pelo entendimento, e comprometimento destes
princípios.

O primeiro princípio, “da adesão livre e voluntária”, significa que as


cooperativas são abertas a todas as pessoas aptas a usar seus serviços, sem
discriminação social, racial, política ou religiosa e de gênero. É o “princípio da
porta aberta” (IRION, 1997:59). O que não significa que a cooperativa seja
obrigada a acolher todos os que têm condições de nela ingressar, o que por vezes
possa ser confundido, podendo por em risco a situação da cooperativa.

Em verdade o princípio manifesta a possibilidade de ingresso sem


restrições que não sejam eminentemente técnicas ou estatutárias como, por
exemplo, candidato a sócio que participe de empresas concorrentes. Não parece
11

lógico um associado de uma cooperativa de produtores de leite entregar a sua


produção leiteira para outra empresa concorrente, que não a sua cooperativa.

No segundo princípio, “Controle Democrático dos Sócios”, fica


assegurado a participação decisiva na condução do destino da cooperativa. Éo
princípio do “Um homem um voto” (IRION, 1997: 65), ou seja, a titularidade do
controle da cooperativa é da pessoa e não do capital. Todo o associado tem
igualdade de votos independente do seu capital aplicado na sociedade.

O princípio que mais nos interessa, pois diz respeito diretamente ao objeto
deste estudo é o terceiro, cujo anunciado é: “Participação Econômica dos
Sócios”. É neste princípio que fica evidente a diferenciação entre empresa
capitalista e sociedade cooperativa, enquanto na primeira a distribuição do
excedente (lucro ou dividendos) se faz em função da participação acionária dos
associados, oriundas de em lucro extraído do trabalho de assalariados, na
cooperativa, o que existe são sobras liquidas, que serão divididas, após a dedução
de despesas administrativas.

Nas empresas mercantis o capital existe para explorar determinado


negócio e para ser remunerado, multiplicando-se pelo lucro que produz. Isto dá ao
capital caráter de investimento, e consequentemente faz do capital um fim.

RIOS (1989:31) estabelece uma conexão que dá sentido à dinâmica da


cooperativa:

”Existe, portanto uma conexão direta entre a necessidade dos sócios,


de um lado e as operações da cooperativa de outro e entre a participação
dos associados nas atividades da cooperativa, de um lado e o
funcionamento da cooperativa de outro”.

Esta conexão define que os associados não são apenas os co–


proprietários, mas também usuários. Disso resulta que a única finalidade de uma
cooperativa consiste em prestar serviços a seus próprios associados.
12

No 4º princípio, “Autonomia e Independência”, fica explícito a vontade


de autogestão, sem interferências externas até mesmo do poder público.
Respeitadas as leis em vigor, a independência e autonomia da cooperativa são
definidas pela relação entre seus associados. IRION (1997:117), alerta que nem
sempre este quarto princípio seja fator critico de sucesso para a cooperativa, ás
vezes, muito ao contrário: “a natureza democrática das cooperativas, cujas
assembléias são compostas por leigos, poucas vezes bem informados sobre
doutrinas e a natureza do negócio, e nem sempre preparadas para decisões
técnicas ou políticas, além da transitoriedade das direções compostas por pessoas
que não são profissionais de administração e negócios, fazem da independência
ou autonomia de muitas cooperativas, alvos vulneráveis”.

O 5º princípio, “Da Educação, Treinamento e Formação”, teve sua


origem em Rochdale (LUZ FILHO, 1961:18), com o objeto de perpetuar o ensino
do cooperativismo entre seus associados e descendentes, formando desta
maneira uma sociedade sensível aos princípios cooperativistas.

Este princípio está presente até hoje na legislação pertinente, que obriga
destinar um percentual da sobras auferidas a um Fundo de Assistência Técnica
Educacional e Social (FATES).

A “Cooperação entre Cooperativas” é o 6º princípio, que pressupõe


que haja integração entre as cooperativas, com o intuito de fortalecer o
cooperativismo.

O 7º princípio, “Preocupação com a Comunidade”, demonstra a


necessidade de interação e preservação da comunidade aonde a cooperativa
desenvolve o seu trabalho, cumprindo também uma função social, integrando a
cooperativa no meio sócio-econômico. Estes são, em suma os princípios que
norteiam as ações das cooperativas.
13

1.2 O Cooperativismo no Brasil

CARNEIRO (1978), atribuiu a “dificuldades de assimilação de raças


condicionadas ao primitivismo”, como causa para a não implantação de uma base
histórica do cooperativismo em nosso País.

Segundo este autor, o regime escravocrata teria influenciado além da


raça negra, os indígenas, impedindo a assimilação dos princípios associativos. Tal
afirmativa é também defendida por MILLER (1999:22), que acrescenta que os
princípios associativos eram combatidos pelos governantes da época.

Em verdade, temos a convicção de que a influência da Igreja Católica, em


particular a ação dos padres jesuítas, no trato com os índios, e na conversão ao
catolicismo, incentivou as práticas de ajuda mútua, que são próprias de povos
primitivos. A evolução, assim como a propagação de práticas cooperativistas,
entretanto, somente seriam institucionalizadas, mais tarde, com a imigração.

No Brasil, a iniciativa de movimentos cooperativistas coincide com a


chegada dos imigrantes europeus que trazem a experiência bem sucedida em
seus países de origem, bem como o ideal de construir uma nova sociedade.

Excetuando-se a experiência da Colônia Teresa Cristina no Paraná, em


1847, fruto das idéias do francês Charles Fourier, personificadas no médico
também patrício, Jean Maurice Faivre, juntamente com um grupo de europeus
recém chegados ao País, constam como primeiras iniciativas, a dos trabalhadores
da Cia. Telefônica de Limeira, em São Paulo (1891), a Cooperativa Militar de
Consumo no Rio de Janeiro (1894) e a Cooperativa de Consumo de Camaragibe,
em Pernambuco (1895).

No mesmo ano de criação da Cooperativa de Consumo em Pernambuco,


foi fundada uma entidade internacional, com sede em Genebra, Suíça, para
coordenar as atividades das cooperativas em todo o mundo: a Aliança
Cooperativista Internacional (ACI).
14

No início do século XX, em Minas Gerais, foram organizadas as primeiras


cooperativas, do ramo agrícola, incentivado pelo Governo do Estado, com o
objetivo de incentivar a cafeicultura, até então dominada pelos imigrantes.

João Pinheiro, Governador à época, garantiu isenções fiscais e estímulos


materiais para a criação de cooperativas agrícolas, exclusivas para o café, em
razão de sua importância econômica para o Estado.

No sul do País começavam a surgir cooperativas agropecuárias, em


especial formadas com imigrante alemães e italianos. Este tipo de cooperativa,
provavelmente em razão da quantidade, e do sucesso do empreendimento é a
mais conhecida e difundida nos dias de hoje.

No Rio Grande do Sul, em 1902, com base na experiência alemã,


surgiram as primeiras cooperativas de crédito, incentivadas pelo padre jesuíta
Theodor Amstad, cujo fundamento era a honestidade de seus cooperados. A
atuação deste tipo de cooperativa veio complementar a necessidade de capital
dos pequenos produtores, responsáveis pelas cooperativas agropecuárias.

O desenvolvimento das cooperativas de crédito no Rio Grande do Sul foi


bastante auspicioso, e em pouco tempo foi criada uma cooperativa central,
agrupando mais de cinqüenta cooperativas.

Em 1913, no Rio de Janeiro, surgem a Cooperativa dos Empregados e


Operários da Fábrica de Tecidos da Gávea, e a Cooperativa de Consumo
Operária do Arsenal de Guerra.

Na mesma data em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, é fundada a


Cooperativa de Consumo dos Empregados da Viação Férrea, que existiu até
1964, tendo sido considerada como a maior Cooperativa de Consumo da América
do Sul (STAUBER, 1996:45).

Em nosso País, a evolução da legislação tentava acompanhar o


crescimento dessas novas experiências. O primeiro governo a amparar tais
15

iniciativas, foi o do Marechal Deodoro, em 1890, incentivando a Cooperativa


Militar. Em seguida já nos primeiros anos do novo século, foram introduzidos
alguns decretos que regulamentavam as atividades cooperativistas, garantindo a
sua constituição, bastando para tanto o registro em junta comercial.

A rigor, o primeiro dispositivo legal, dispondo de forma abrangente sobre


as atividades cooperativistas no Brasil, foi o Decreto n. º 979 de 6 de Janeiro de
1903, que regulava as atividades dos sindicatos de profissionais da agricultura e
das atividades rurais e de cooperativas de produção e consumo.

Posteriormente foi promulgado o Decreto n. º 1637 de % de Janeiro de


1907, com 26 artigos, dos quais 16 eram destinados às sociedades cooperativas.

Em 19 de Dezembro de 1932, com a promulgação do Decreto n. º 2239,


conseguiu-se uma definição mais consistente sobre os princípios cooperativistas,
transformado em Estatuto do Cooperativismo, considerando-se então o marco da
formalização legal da atividade no Brasil (MILLER 1999).

Na época do regime militar, com base no Ato Institucional n. º 2, foi


baixado o Decreto-Lei nº60, criando o Banco Nacional de Crédito Cooperativo.

Diversos ajustes na legislação foram realizados a seguir, sempre


priorizando o caráter agrícola do cooperativismo. Os órgãos governamentais que
se dispuseram a fomentar e incentivar estas iniciativas foram em primeiro lugar a
Secretaria Nacional de Agricultura e posteriormente o Ministério de Agricultura.

Somente em 16 de Dezembro de 1971, foi promulgado o estatuto geral do


cooperativismo: A Lei 5764, elaborada pelos técnicos da Organização das
Cooperativas Brasileiras – OCB, e ajustada pela tecnocracia estatal. Com riqueza
de detalhes, a nova lei definiu a Política Nacional de Cooperativismo, e instituiu o
regime jurídico das sociedades cooperativas.
16

Após a constituição de 1988, a intervenção estatal sobre as sociedades


cooperativas terminou, e estas passaram a ser criadas livremente, sem
interferências de órgãos estatais.

Apesar da diminuição da ingerência do Estado, com a nova constituição,


conseguiu-se aproveitar boa parte da Lei 5764/71, e incluem-se diversos artigos
apoiando e incentivando tanto o associativismo, quanto o cooperativismo, em
setores como a agropecuária, trabalho, mineração e crédito.

1.3 O Cooperativismo de Trabalho

As cooperativas variam segundo a sua atividade e podem ser


classificadas nos seguintes tipos; (QUEIROZ 1998:51).

Cooperativa Agropecuária: voltada para a produção rural, com objetivos


de reunir esforços e obter maior tecnologia e preços para seus produtos.

Cooperativa de Consumo: com a finalidade de adquirir bens de consumo


para seus cooperados.

Cooperativa de Crédito: agregam poupadores e tomadores de


empréstimos, com taxas mais acessíveis. Também estimulam a poupança. Muitas
acabam tornando-se Bancos Cooperativos, como é caso do BANCOOP e
BANSICREDI, outrora cooperativas de crédito.

Cooperativa Educacional: formada em geral de pais e mestres, visa


capacitar seus cooperados e dependentes a um custo acessível.

Cooperativa Especial: aberta para o atendimento a necessidades


especiais, tais como portadores de deficiências, menores, incapazes. Esta
cooperativa é parcialmente autogerida pelos seus cooperados.

Cooperativa Habitacional: visam prover moradias para parcelas da


população, a preço de custo.
17

Cooperativa de Mineração: permite a categoria de mineradores,


partilharem bens de produção ou outros recursos.

Cooperativa de Produção: em geral voltada para a área industrial, aonde


os cooperados são responsáveis pela produção e comercialização dos bens
produzidos.

Cooperativa de Serviços: para prestar serviços exclusivamente aos


cooperados.

Cooperativa de Trabalho: são cooperativas que reúnem pessoas de


diversas atividades ou profissões para vender o seu trabalho. Podem ser de
Médicos, Contadores, Programadores, Engenheiros, Enfermeiros, etc.

De todas as atividades exercidas até hoje, através das sociedades


cooperativas, talvez o segmento trabalho seja o que mais esteve presente na raiz,
como pedra fundamental do cooperativismo mundial, culminando com a formação
da primeira cooperativa em Rochdale.

O desemprego já preocupava, e a união daqueles tecelões em


cooperativa, era enxergada como um meio de se conseguir trabalho, e como
tentativa de dar equilíbrio ao estrangulamento social propiciado com a substituição
da fiação artesanal pela industrial.

O Cooperativismo atua em diversos segmentos: de consumo, de crédito,


de habitação, de produção, de ensino, entre outros, e o de trabalho, sendo este
último objeto de nosso interesse, em particular o Cooperativismo de Trabalho
Médico, representado pelo Sistema Unimed.

A presença das cooperativas de trabalho em nosso País foi consolidada


em 1932, com a promulgação do Decreto-Lei n. º 22.232, cujo artigo 24 era assim
redigido:

“Art. 24: São cooperativas de trabalho aquelas que, constituídas


de operários de uma determinada profissão ou ofício ou de ofícios
18

vários de uma mesma classe, tem como finalidade primordial


melhorar os salários e as condições de trabalho pessoal de seus
associados e dispensando a intervenção de um patrão ou
empresário, se propões contratar obras, tarefas, trabalhos, ou
serviços públicos ou particulares, coletivamente por todos ou por
grupos de alguns”.

Através deste Decreto, promulgado pelo governo de Getúlio Vargas, ficava


facilitado o acesso a formação de cooperativas, pois estava prevista a
possibilidade de contratação através das cooperativas de trabalho, junto aos
tomadores dos seus serviços.

Mais tarde, em 1943 ao se decretar a Consolidação das Leis do Trabalho,


manteve-se inalterados os artigos que citavam as cooperativas, sendo válido até
1966, com uma primeira modificação, e em seguida em 1971, com a efetivação da
“Lei Cooperativista”, o Decreto-Lei 5764/71.

As Cooperativas de trabalho são constituídas por profissionais da mesma


ocupação (uniprofissionais) ou de diversas profissões do mesmo ramo de
atividade (multiprofissionais).

LIMBERGER (1969:42), explicita a essência do que é uma cooperativa de


trabalho:

“A cooperação supõe necessariamente a liberdade de trabalhar em


comunidade. Assim, a cooperação possui duas condições importantes
e imprescindíveis: liberdade e comunidade; trabalho livre e grupal.
Igualmente se opõe à competição e concorrência (...). Concebe-se a
cooperativa, então, como associação e empresa, com base na
cooperação. Associação porque constitui a reunião de pessoas, que
trabalham juntas, livremente e com o mesmo objetivo. Empresa
porque representa a conjugação dos fatores de produção: trabalho,
19

capital, administração, tecnologia e natureza (...). Destacam-se as


duas dimensões caracterizadoras da cooperativa: econômica e social.
Se faltar uma, já não é cooperativa”.

As cooperativas de trabalho atuam na contratação de serviços para seus


associados. É ela quem vai ao mercado e consegue o cliente, no entanto este é
automaticamente repassado a um cooperado para que este efetivamente realize
os serviços desejados. Os serviços podem ser prestados na cooperativa, nas
dependências de terceiros, em locais públicos ou nos estabelecimentos dos
tomadores de serviços.

Os objetivos das cooperativas de trabalho são basicamente os seguintes


(QUEIROZ, 1998:25):

1) Melhoria de renda de seus associados, conseguindo valorizar o


trabalho e obtendo melhor negociação com referência à remuneração.
Atuando como um todo, o sistema cooperativista, fiel a seus princípios,
devolve o excedente gerado pelo trabalho coletivo de seus associados,
na mesma proporção da quantidade e da qualidade do trabalho
prestado.

2) Incrementos nas condições de trabalho, uma vez que a cooperativa


transforma os trabalhadores (cooperados), em empresários,
determinando de forma democrática as regras de atuação da
cooperativa.

1.4 O Cooperativismo como meio alternativo de trabalho e renda

Atualmente o cooperativismo tem demonstrado ser uma resposta a


situação econômica do País, no que diz respeito à disponibilidade de mão de obra,
gerada pelo desemprego. As cooperativas de trabalho são os meios com grande
potencial e possibilidades para gerar uma mudança social importante e útil,
20

quando atuam como intermediadora de negócios, podendo gerar trabalho,


valorizar atividades profissionais e tentar emancipar trabalhadores.

Sendo a cooperativa pessoa jurídica, organiza e orienta o trabalho de seus


associados, negocia melhor os contratos de fornecimento de serviços, ordenando
as categorias profissionais, e os orientado no sentido de atender as demandas de
mercado.

È importante, entretanto, que as cooperativas estejam fortalecidas


internamente, e sejam integradas no sistema cooperativista, aliando-se entre
outras singulares ou federações, com o propósito de angariar força política e
econômica, de vital importância para sua sobrevivência e atendimento das
necessidades de seus cooperados e da sociedade.

A terceirização experimentada pelas empresas, com especial ocorrência


na última década, nem sempre alcançou os objetivos propostos, entre eles o de
diminuição de custos para as empresas, pois todas as iniciativas são alicerçadas
na legislação trabalhista, exceto as cooperativas de trabalho, que baseadas na
doutrina e princípios do cooperativismo, vem ao encontro tanto do interesse de
empresas quanto trabalhadores, pois reduz os encargos trabalhistas para o
empresário, mas atende aos anseios do trabalhador, uma vez que mantém o
posto de trabalho, com outro viés.

Desta forma, através da terceirização com as cooperativas de trabalho,


existe a possibilidade de expansão das empresas, sem aumento de custos
trabalhistas, e gerando novos postos de trabalho.

SANTOS (1999:72) evidencia que a mudança na legislação brasileira,


versando sobre cooperativismo, e o aumento da confiança do empresariado nas
cooperativas de trabalho, propiciaram um incremento na quantidade de
cooperativas em nosso país.

Esta evolução, segundo o autor, motivou a transferência de empregados


antes regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para a uma situação
21

de trabalhador autônomo, consolidando uma mudança na relação de trabalho nas


empresas, favorecendo inclusive o Estado, que não tem capacidade de absorver
esta mão de obra.

Na realidade o que ocorre é uma flexibilização nas relações de trabalho,


uma vez que nas cooperativas existe a possibilidade de alternância na
substituição de mão de obra (cooperados), sem que a atividade sofra solução de
continuidade. Ou seja, substitui um trabalhador por outro, que irá desempenhar as
atividades com a mesma eficácia e interesse.

Outro aspecto que definitivamente contribui para esta flexibilização, e


consequentemente para um aumento da absorção de mão de obra é no tocante
aos encargos trabalhistas. Considerando-se que a atividade cooperada tem
relação civil e não trabalhista, a remuneração do trabalhador cooperado poderá
ser maior do que a do empregado, uma vez que não existem os encargos normais
de uma vinculação trabalhista.

Para os tomadores de serviço de cooperativas, há uma sensível


otimização econômica e financeira considerando-se que o reembolso para
remunerar uma atividade terceirizada via cooperativa é menor tendo em vista não
ser uma relação vinculada à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT),
desobrigando neste caso dos recolhimentos tradicionais observados em uma
relação trabalhista.

QUEIROZ (1998:125) alerta, entretanto para os riscos jurídicos dos


tomadores de serviços de cooperativas, quando as cooperativas se revestem de
condições irregulares, caracterizando o que êle chama de “fraudoperativa” ou
“gatoperativa”, que são as cooperativas que deixam de cumprir suas obrigações
previdenciárias ou ainda quando há a clara intenção de somente burlar a justiça
trabalhista, na transformação de ex-empregados em cooperados que prestam
serviços unicamente para a o empregador anterior.
22

A cooperativa de trabalho é acima de tudo, uma alternativa essencial para


o desemprego. Qualquer grupo de pessoas, com objetivo comum, e com poucos
recursos financeiros conseguem criar o seu meio de trabalho e renda através da
cooperativa.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), desde 1966, durante a


Conferência Internacional do Trabalho, realizada em 21 de Junho, já expressava
preocupação e a importância devida ao cooperativismo e as cooperativas de
trabalho, conforme consta da Recomendação 127, daquela Conferência:

“Com a finalidade de melhorar as oportunidades de emprego, as


condições de trabalho e as receitas dos trabalhadores agrícolas sem-
terras, deveriam estes ser ajudados, quando for conveniente, a
organizarem-se, voluntariamente, em Cooperativas de Trabalho”.

Se naquela época, há mais de 30 anos as Cooperativas de Trabalho já eram


consideradas fonte alternativa de emprego e renda, atualmente a iniciativa está
mais presente do que nunca, principalmente com as mudanças que
aceleradamente vem ocorrendo na economia mundial.

CAPÍTULO 2 – ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DAS COOPERATIVAS

2.1 Natureza jurídica

Em sua natureza jurídica, as cooperativas estão regulamentadas através


da Lei n. º 5764, de 16/12/71, a chamada “Lei Cooperativista”, que institui o regime
jurídico das sociedades cooperativas, e da outras providências.

Obrigatoriamente, segundo a citada Lei, as características que devem


estar presentes nas sociedades cooperativistas, são o que relacionam os incisos I
a XII, artigo 4º:
23

Art. 4º - As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e


natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência,
constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das
demais sociedades pelas seguintes características:

I- Adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo


impossibilidade técnica de prestação de serviços.

II- Variabilidade do capital social, representado por quotas-partes;

III- Limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado,


facultado, porém o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se
assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;

IV- Inacessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à


sociedade;

V- Singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e


confederações de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade
de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;

VI- “Quorum” para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral


baseado no número de associados e não no capital;

VII- Retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações


realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia
Geral;

VIII- Indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica,


Educacional e Social;

IX- Neutralidade política e não discriminação religiosa, racial e social;

X- Prestação de assistência aos associados, e, quando prevista nos estatutos,


aos empregados da cooperativa;
24

XI- Área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião,


controle, operações e prestações de serviços.

XII- Nota-se com clareza, a influência dos princípios de ROCHDALE, na Lei


Cooperativista. A diferença básica entre uma empresa Capitalista e uma
Sociedade Cooperativista está expressa no inciso V, da singularidade de
voto: “Um homem, um Voto”. O privilégio é da pessoa e não do capital.

O Inciso VII traz também outra diferença típica: é quanto ao resultado do


final do exercício. Ao prestar serviços aos seus associados, a sociedade
cooperativa movimenta, em nome destes, recursos que são entregues em
trabalho. Ao final do exercício, é levantado um balanço que demonstra o resultado
obtido. Em caso de sobras, estas são retornadas aos associados, de acordo com
a proporção da sua movimentação. O cooperado que mais produz, por
conseguinte, participa da maior fatia das sobras. As sobras resultam quando a
parcela apropriada dos associados supera os custos e as despesas da
administração.

A denominação “sobras” expressa na lei, quer dizer que o resultado


positivo, nas sociedades mercantis denominado de lucro, não pertence à
cooperativa e sim aos seus cooperados.

É quando o cooperado emprega seu trabalho, e por ele recebe em forma


de adiantamento a maior, para dar cobertura às despesas administrativas e
operacionais.

As sociedades cooperativas visando atender suas finalidades sociais


realizam diversas atividades, interagindo ora com o associado cooperado, ora com
o terceiro isoladamente ou com ambos em um mesmo ciclo operacional. Em uma
cooperativa de trabalho, este ciclo é o de contratação e prestação de serviço do
trabalhador.

O artigo 79 da Lei 5746/71, definiu a distinção entre os ciclos, como atos


cooperativos e atos não cooperativos:
25

“Art. 79 Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as


cooperativas e seus associados, entre esses e aquelas pelas cooperativas
entre si quando associadas, para consecução dos objetivos sociais”.

FRANKE (1973:26), diferencia o ato cooperativo do não cooperativo,


denominando o primeiro de “negócio-fim”, aquele que é realizado entre o
associado e a cooperativa, e “negócio-meio”, o realizado entre a cooperativa e o
mercado.

Esta distinção é importante, pois há implicações tributárias diferenciadas:


não há incidência de tributos sobre o ato cooperativo.

As Assembléias de Cooperados

A Assembléia é o órgão máximo da cooperativa. Pode ser geral, ordinária


ou extraordinária. Nas assembléias, dentro dos limites legais e estatutários é que
se deliberam os destinos da sociedade, tomando resoluções convenientes ao
desenvolvimento e à defesa da cooperativa. As decisões tomadas em
assembléias pelos cooperados, atingem a todos os sócios, independentes de seu
comparecimento ou não.

É necessário cumprir alguns trâmites para que a assembléia surta efeito


legal. São eles: convocação prévia de 10 dias, publicada em editais e jornais de
circulação normal, quorum de 2/3 do número de associados, em primeira
convocação ou de dez associados em terceira e última convocação. Não poderá
haver representação individual do cooperado.

Em assembléia ordinária, obrigatoriamente realizada nos três primeiros


meses do ano seguinte do balanço, os associados são obrigados a deliberar pelo
retorno das sobras. Licitamente, por exemplo, depois de rateadas as sobras, em
vez de receber em espécie, podem optar por deixá-las no caixa da cooperativa, a
título de aumento de capital, ou ainda, decidir pela constituição de fundos.
26

Do mesmo modo, em não havendo “sobras”, mas “perdas”, estas deverão


necessariamente ser rateadas, caso não haja cobertura do fundo de reservas,
dentro do exercício seguinte em que ocorreu, na exata proporção das operações
que houveram sido realizadas com a cooperativa, após a aprovação do balanço
pela Assembléia Geral Ordinária.

A Administração de uma cooperativa seja de qualquer natureza, é de


responsabilidade total de seus cooperados. Para conduzir os trabalhos de uma
cooperativa, são eleitos em Assembléia Geral, um Conselho de Administração, e
um Conselho Fiscal.

O Conselho de Administração é o órgão superior na administração da


Cooperativa, e é formado por cooperados no gozo de seus direitos sociais, com
mandatos de duração e renovação, funções e atribuições estabelecidas pelo
Estatuto Social. É de sua competência a decisão sobre qualquer interesse da
cooperativa e de seus cooperados, nos termos da legislação, do Estatuto Social, e
das determinações da Assembléia Geral.

O Conselho Fiscal é constituído por três membros efetivos e três


suplentes, também eleitos em Assembléia Geral para a função de fiscalização da
administração, das atividades e das operações da cooperativa devendo examinar
livros e documentos, entre outras atribuições. È um órgão independente da
administração, que representa a Assembléia Geral no desempenho de suas
funções estabelecidas no Estatuto Social, com duração prevista de doze meses.

No uso de suas atribuições, o Conselho de Administração poderá


contratar técnicos para assessoramento na condução dos negócios da
Cooperativa. Assim, os cooperados que são eleitos para conduzir a Cooperativa,
organizam um corpo funcional, de não cooperados, para gerir o cotidiano
operacional, e em muita das vezes dotam a cooperativa de uma administração
profissional, recrutada no mercado de trabalho, para garantir não somente uma
padronização de procedimentos administrativos, mas a sobrevivência da
organização frente ao competitivo ambiente em que atuam. Não é pelo fato de
27

uma cooperativa não visar lucros, que a sua administração possa ser relegada a
leigos ou curiosos. Uma gerência eficaz e profissional pode ser o diferencial entre
a perpetuação no mercado ou o desaparecimento da iniciativa cooperativista.

A Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), mostra como elas são


organizadas, seguindo o artigo 6º, do Capítulo III, da Lei 5764 de 16/12/71: As
sociedades cooperativas são consideradas:

I- Singulares, as constituídas pelo mínimo de 20 pessoas físicas, sendo


excepcionalmente permitida a admissão de pessoas jurídicas que tenham
por objeto as mesmas ou correlatas atividades econômicas das pessoas
físicas ou, ainda, aquelas sem fins lucrativos;

II- Cooperativas centrais ou Federações de cooperativas, as constituídas de


no mínimo três singulares, podendo excepcionalmente admitir associados
individuais.

III- Confederações de cooperativas, as constituídas de pelo menos três


federações de cooperativas ou cooperativas centrais, da mesma ou de
diferentes modalidades.

IRION (1997.227), divide em termos de hierarquia o funcionamento da


organização estrutural de uma cooperativa, conforme demonstrada na figura 1:

- Superestrutura

- Macroestrutura

- Estrutura Funcional

- Infra-estrutura

A Superestrutura, órgão máximo na organização estrutural, é composta


pela totalidade de seus associados, que quando reunidos, formam a Assembléia
Geral.
28

A Macroestrutura, também formada exclusivamente de seus associados,


mas somente aqueles eleitos ou designados pela Assembléia Geral, a quem são
delegados funções de administração.

A Estrutura Funcional tem natureza funcional, com atribuições distribuídas


em organograma próprio. De modo geral é composta por um corpo técnico de não
associados, com os quais se mantém vínculo trabalhista.

A Infra-estrutura é composta pelos sócios (cooperados) individualmente,


de onde provém os negócios da cooperativa oriundo dos sócios na qualidade de
produtores, fornecedores, ou consumidores dos bens e serviços cooperativados.

Além da estrutura interna de uma singular, há também uma organização


em rede que atua em conjunto com os cooperados, as singulares, as federações e
a confederação.

Pelo seu valor democrático, o sistema cooperativista, garante autonomia


aos escalões intermediários, componentes do sistema: singulares e federações.

É essencial a participação do médico cooperado, através de seus


representantes, no cotidiano da cooperativa, pois as decisões que envolvem
valores, métodos de trabalho, maneira de atendimento do usuário, e uma série de
outras que atingem o trabalho do médico, são decididos no âmbito da
macroestrutura, e irão afetar os componentes da infra-estrutura.

Deve-se, entretanto, evitar o gigantismo da estrutura, com início em


representações da classe cooperativista e reproduz-se em federações e
confederações, conforme anuncia MACEDO, in CRUZIO (2000:59) sob pena de
haver um distanciamento dos associados e da própria associação.

Nesta relação, não há uma hierarquia imposta, com ordens emanando da


cúpula, para as bases, como ocorre na relação matriz x filial. Existem apenas
orientações a serem seguidas, oriundas de um consenso entre os atores do
processo.
29

Figura 1

ORGANIZAÇÃO ESTRUTURAL DAS COOPERATIVAS


Fonte : IRION (1997:229)

SUPER ASSEMBLÉIA GERAL


ESTRUTURA

CONSELHO FISCAL

MACRO ADMINISTRAÇÃO
ESTRUTRURA DIRETA E INDIRETA

ESTRUTURA QUADRO
FUNCIONAL FUNCIONAL

INFRA
ESTRUTURA SÓCIO
INDIVIDUALMENTE
30

2.2 Características: cooperativas x empresas privadas

A definição de empresa, segundo D’AVILA (1972:264), ”é uma unidade de


produção na qual se combinam os diversos fatores produtivos para o fornecimento
de bens ou serviços à comunidade”.

Entre os fatores, segundo este autor estão: o trabalho, a direção e o


capital, compreendendo também máquinas e instalações, e matéria prima.

Em sua natureza jurídica, poderá ser: pública; de propriedade do Estado;


privada, de propriedade de pessoa ou grupo; mista, combinando as duas formas
anteriores; ou ainda de caráter social, como no caso de uma cooperativa, cuja
propriedade é dividida igualitariamente entre os membros de uma comunidade.

A empresa moderna nasceu com a revolução industrial, resultante


basicamente da convergência de três fatores:

1º) a ruptura das corporações da idade média;

2º) o avanço da tecnologia, aplicada a novas formas de produção,


descoberta de novas fontes de energia;

3) a ampliação dos mercados, levando a substituição da produção


artesanal pela industrial.

Em uma fase inicial, chamada de capitalista, (HUNT & SHERMAN 1998:


107) a empresa segrega capital e trabalho, com unidades de produção cada vez
maiores, e uma concentração dos meios produtivos, em um ambiente de
concorrência acirrada. Era a época de exploração do trabalhador, com jornadas
extenuantes e salários vis. Situação esta que iria motivar novas formas de
relacionamento no trabalho, entre exata o cooperativismo.
31

Uma segunda fase há uma evolução para o neocapitalismo, quando surge


certa humanização da empresa e melhoria das condições de trabalho, embora a
hegemonia do processo produtivo continue detida unilateralmente pelo capital.

Atualmente existem novas formas de participação do capital e trabalho,


criando mecanismos que estimulem a participação de todos no processo
produtivo, assumindo, desta forma, uma função social e de prestação de serviços
na comunidade onde está inserida.

Entre as sociedades cooperativas e as sociedades anônimas, alguns são


os pontos de divergências, destacamos os principais:

Quanto à expectativa de remuneração do capital aplicado: Nas sociedades


anônimas os acionistas assumem o papel de investidores, esperando uma
retribuição financeira como remuneração do capital investido. Nas sociedades
cooperativas, o investimento efetuado pelos cooperados deixa de ter importância
em relação ao benefício que lhes é proporcionado. Nas cooperativas, o cooperado
assume dois papéis: associado e cliente, sendo este último o mais importante,
pois é a cooperativa que irá gerar trabalho para êle.

Quanto à participação nas operações da sociedade: Nas cooperativas, é


condição sine qua non que os cooperados participem das operações como
beneficiários dos serviços por ela prestados. Já nas sociedades anônimas não há
esta necessidade. Em geral os acionistas só participam nas assembléias.

Quanto à responsabilidade dos cooperados: A responsabilidade dos


cooperados pode ser limitada ou ilimitada, conforme o estatuto da cooperativa.
Nas sociedades anônimas, a responsabilidade será sempre limitada ao capital
integralizado.

Quanto à distribuição dos resultados: A distribuição dos lucros, nas


sociedades anônimas é calculada com base na participação de cada acionista no
capital social, ao passo que nas cooperativas a distribuição das sobras é calculada
de acordo com a produção de cada cooperado, realizada na cooperativa.
32

Quanto ao direito de voto: Nas sociedades anônimas o direito de voto está


relacionado com o tipo de ação pertencente ao sócio, se preferencial ou ordinária.
A ação preferencial, via de regra não dá direito de voto a seu titular, enquanto que
na ação ordinária este direito está implícito. Nas cooperativas não há distinção
entre os sócios, todos possuindo o mesmo direito a voto.

As diferenças que separam as sociedades cooperativas das sociedades


anônimas são significativas. As empresas têm finalidades mercantilistas e
sobreviverão se obtiverem lucros. As cooperativas têm como foco a promoção do
trabalho de seus associados, sem visar lucro e efetivando-se pela contribuição e
colaboração mútua de seus sócios.

QUEIROZ (1998:53), faz um comparativo entre os encargos despendidos


pelas empresas e pelas cooperativas, chegando a um diferencial de 18,96% a
favor destas, pois não há recolhimento de FGTS, férias e seus respectivos
encargos, 13º salário mais encargos, e aviso prévio: como também o recolhimento
ao chamado sistema ”S”, ou seja, SESC, SENAC, SENAT, SENAI, dependendo
do ramo de atividade da cooperativa.

Da mesma forma, este autor credita as cooperativas o feito de poder


remunerar de forma mais vantajosa seus cooperados, tendo em vista a economia
gerada com a não incidência dos tributos trabalhistas, e em tese, o cooperado
deva ser mão de obra mais valorizada, pois há estatutáriamente, e previsto em lei,
o uso de recursos do FATES, fundo de assistência educacional e social, para
treinamento e capacitação do cooperado.

Cabe observar, entretanto, que o trabalhador que não está em uma


cooperativa apesar de receber menos, conta com a segurança que lhe confere as
leis trabalhistas, em caso de demissão involuntária.
33

Em um quadro demonstrativo elaborado por PINHO (1982), in (IRION


1997:22), são comparadas as características existentes entre instituições públicas,
privadas e sociedades cooperativas, conforme mostrado no quadro 1, com
adaptações do autor.

As vantagens apresentadas, em termos da legislação trabalhista e da


facilidade de constituição, além do objetivo social diferenciam acentuadamente as
sociedades cooperativas das demais.

Em que pese às cooperativas guardarem alguma semelhança na gestão,


com as empresas estatais, talvez pela característica da administração envolver
democraticamente um número maior de pessoas na tomada de decisão ou ainda
pela dependência das cooperativas do Estado, em grande parte, no início de suas
atividades, as demais características, são bastante diferentes.

Em especial, no tocante a propriedade, e participação na distribuição da


renda, pontos fundamentais, e que constam como princípios da doutrina
cooperativista.

Quadro 1: Comparativo: Empresas Privadas x Empresas Estatais x Cooperativas


34

INSTITUIÇÕES
EMPRESA EMPRESA COOPERATIVA
PRIVADA ESTATAL
VARIÁVEIS
1. Propriedade É privada. Pertence É estatal ou pública. É social. Pertence ao
aos capitais que Pertence ao Estado. conjunto de usuários ou
investem dinheiro trabalhadores sócios

2. Que é? (forma) Uma sociedade Uma atividade Uma associação de


capitalista econômica pessoas que organizam
organizada pelo uma atividade
Estado. econômica em benefício
comum

3. Que busca? (objeto) O máximo benefício O máximo do O serviço ao homem e à


econômico do capital benefício econômico sociedade em geral
ou do dinheiro para o bem comum.
investido (lucro).

4. Renda (como se Em função do capital. Para o Estado. Em função do trabalho


distribui) Quem tem mais capital aportado e/ou do
financeiro recebe serviço realizado
maior lucro.

5. Gestão (governo Em função do capital e Pelo Estado. Através Democrática: exercida


administração e em forma autoritária dos funcionários pelos sócios.
fiscalização) vertical e descendente. públicos

6. Trabalho É uma mercadoria a A serviço do Estado. Forma de realização do


serviço do capital. homem

7. Capital Submete e domina o Em mãos do Estado A serviço do homem.


homem. (Em poucas Não submete o homem.
mãos)

8. Homem Considerado objeto A serviço do Estado. Considerado como


dividido: proprietário e sujeito ativo – livre
trabalhador. igualitário e solidário

9. Número de Limitado: aos que O Estado: o único Ilimitado: limitado


membros podem investir grande associado. apenas pela capacidade
soma de dinheiro. humana.

Fonte: adaptado de PINHO (1982), in IRION (1997: 22).


35

ZYLBERSTAJN (1997:81), no XI Congresso Brasileiro de Cooperativismo,


indicava os principais problemas da empresa cooperativista, reunidos em
consenso:

a) A falta de profissionalização na gestão,

b) A incipiente organização do sistema,

c) As dificuldades de capitalização,

d) A ausência de um sistema financeiro próprio, e

e) O nível de educação cooperativista do associado.

Estas dificuldades apontadas, que são comuns nas cooperativas em


geral, e que vivenciamos na Cooperativa de Trabalho Médico, acreditamos ter
influência na origem doutrinária do cooperativismo, e na sua eficiência em gerir a
empresa.

A falta de agilidade nas tomadas de decisão é uma decorrência natural


das estruturas democráticas de decisão, assim como o fato do cooperado ser ao
mesmo tempo “usuário” e “proprietário” de seu negócio, sem uma nítida separação
entre propriedade e controle, faz com que o cooperado questione qualquer
decisão tomada por que m possui o controle, com base na afirmativa de que
afinal, êle é “dono” da empresa.

Não raro os questionamentos são realizados por decisões empresariais


necessárias e acertadas, mas que contrariam interesses pessoais ou de grupos.

Seria necessário repensar a cooperativa com orientação exclusivamente


voltada para o associado, e manter o foco também no mercado e no usuário,
buscando novas possibilidades de capitalização, e reorientar os objetivos de
negócio.
36

A exigência do mercado levará inexoravelmente para este caminho. Seria


importante que a empresa cooperativa esteja preparada para este novo desafio, e
não se deixe atropelar pelo ambiente de negócios, que exige eficiência e
competitividade.

O cooperativismo somente sobreviverá se a empresa cooperativa


sobreviver forte, e competitiva.

CAPÍTULO 3 - O COOPERATIVISMO DE TRABALHO MÉDICO

3.1 A Medicina Liberal e o Profissional Médico

A disseminação das escolas médicas em todo o mundo, e a nova


formação do profissional médico, baseado além das práticas tradicionais, no
advento da tecnologia e no uso de máquinas para auxílio diagnóstico, passou a
exigir do futuro médico, condições de técnicas especializadas que só lhe davam
credenciais após anos de estudo e para os quais se exigia a sua responsabilidade
econômica para provisão desses estudos.

È neste contexto que se propicia a prática da medicina liberal,


distanciando-se da medicina antiga, ligada ao humanismo e a benemerência.

Ao longo do tempo, o relacionamento médico-paciente sofreu


consideráveis modificações, em razão da evolução social. A auréola de respeito
que cercava o médico e a medicina foi perdendo importância na medida em que a
medicina foi afastando-se da filosofia e se aliando à ciência.

DONNANGELO (1975), observa que um dos fatos notórios para o


afastamento do médico foi à instituição do consultório, que marcaria o primeiro
passo para afastar o cliente das relações familiares do médico, tornando o
diagnóstico, a terapêutica e a prevenção antes um conjunto de aplicações técnico-
científicas do que uma influência pessoal do médico.

A livre escolha de seu médico pelo paciente é uma das molas mestras
desta relação, e da própria essência da profissão liberal do médico. Torna-se,
37

entretanto difícil exercer esta livre escolha em um sistema Capitalista aonde há


gigantesca diferença de classes sociais, praticamente excluindo desta opção,
parcela significativa de população.

Em verdade, a dificuldade está exatamente no preço desta escolha, e não


na escolha em si. Para vencer este obstáculo, é necessário colocar produtor e
consumidor, em contato direto sem intermediários. Mas não basta isto, é
necessário que haja algo mais, uma ideologia, valores e princípios que norteiem
esta relação.

CARNEIRO (1978:75), afirma que o Cooperativismo médico propõe


manter a livre escolha do médico, mas não o preço livre dos honorários. De fato, o
sistema cooperativista busca uma saída para o mercantilismo. Sem dúvida
alguma, esta saída esbarra em uma questão: como garantir a livre escolha do
médico, sem que a demanda force um preço inacessível, e tampouco obrigue o
médico a vender sua força de trabalho a empresas mercantilistas que o comprarão
a preço vil?

Se de um lado da balança tenta-se manter os preços da medicina baixos,


de outro se pode querer explorar o trabalho médico, com o fulcro de auferir lucros
para as empresas contratantes.

A chave para esta equação encontramos em CARNEIRO (1978:77): “o


preço justo defendido pelo cooperativismo é aquele que possa ter finalidade social
para o usuário e propósito econômico para o cooperado”.

Desta maneira, através da cooperativa, estaria estabelecido o vínculo


ligando o médico ao paciente. Como cooperado ele é escolhido livremente, e
presta ele mesmo um serviço a cada usuário.

O sistema cooperativista é quem determina o preço do serviço, que foi


previamente estabelecido com o conhecimento de cooperados e usuários,
preservando médico e paciente, de suas condições econômicas e o direito de
livre-escolha.
38

È bem verdade, entretanto, que para o funcionamento e a regulação deste


mercado, foi necessário retirar do médico a capacidade de livre oferta de preços,
mas não a de livre oferta de trabalho.

Algumas premissas necessitam existir no sistema de cooperativismo


médico, para garantir coerência as suas finalidades essenciais:

1º) o sistema visa se antepor ao mercantilismo, isto é propõe-se a evitar a


exploração do médico por grupos econômicos, que o assalariam para auferir
lucros. Esta é a maneira mais encontrada, presente em empresas de medicina de
grupo, seguradoras e clínicas.

2º) deve ser também evitado pelo sistema, a medicina liberal, na qual não
há limitação para o custo do serviço médico. O sistema é quem deve arbitrar o
custo do serviço, com base em um preço justo, acordado entre tomador e
prestador de serviço.

O cooperativismo médico é um sistema cujo objetivo é possibilitar a


divisão eqüitativa e social do trabalho médico. È uma associação de médicos
organizada nos princípios do cooperativismo, união esta que possibilita atender o
usuário dentro de uma finalidade social, uma vez que o mesmo participa do
sistema.

O interesse do médico ao se agrupar na cooperativa é evitar tornar-se


assalariado de uma empresa ou grupo econômico, mas também poder oferecer
seus serviços diretamente ao interessado e ter um público cativo, que será
proporcional ao serviço prestado pelo cooperado, possibilitando desta forma que
se pratique um preço justo, pois haverá volume e quantidade de trabalho
suficiente.

Da parte do usuário o interesse está em ser atendido com hora marcada,


em consultório do médico, sabendo de antemão quanto e quando vai pagar,
podendo fazer um orçamento de suas despesa com antecedência.
39

A administração da cooperativa deve estar voltada ao mesmo tempo para


o trabalho médico e para os serviços que são comuns em outras empresas. Esta
não é apenas a diferença entre cooperativas e empresas mercantis, mas seu
principal desafio.

Os interesses, por vezes são antagônicos: quanto mais trabalho o médico


tiver realizado, sejam consultas, exames ou internações, maior será seu
rendimento. Maior também será a despesa da cooperativa, uma vez que o usuário
paga uma quantia fixa por mês, independente de sua utilização.

Por esta razão existe a necessidade em haver uma co-participação dos


usuários na sua utilização. Desta forma o uso passa a ser mais racional, e o
usuário assume junto com a cooperativa a responsabilidade pelo seu uso.

A primeira experiência em nosso País

Vislumbrando uma resposta aos anseios de uma nova ordem econômica,


e sob forte influência do sucesso das cooperativas na Europa, cerca de 20
médicos de Santos, em São Paulo, liderados por Edmundo Castilho e pelo
advogado do Sindicato dos Médicos, Reginaldo Ferreira Lima, fundaram em 18 de
Dezembro de 1967, a pioneira Cooperativa de Trabalho Médico, com o intuito de
“defender os interesses econômicos dos médicos”.

O registro da cooperativa foi realizado no Departamento de Assistência ao


Cooperativismo (DAC), no Ministério da Agricultura, que até hoje abriga a maioria
das cooperativas, excetuando-se as da área da saúde, vinculadas ao Ministério da
Saúde, através da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), e as de crédito
ligadas ao Ministério da Fazenda, através do Banco Central.

A princípio a causa foi confundida com reivindicação salarial, e tanto


Sindicato dos Médicos, quanto Associação Médica relutavam em encampar a
idéia, mas em pouco tempo, a habilidade dos dirigentes da cooperativa na época,
bem como a realidade das dificuldades vividas pela classe médica, com o
crescimento das empresas de medicina de grupo na região, impulsionou os ideais
40

cooperativistas, e a prática de uma empresa cooperativista. (CARNEIRO 1978,


IRION 1983).

Denominada de UNIMED, que significa “união de médicos” e contando


com o apoio de entidades de classe, como a Associação Medica de Santos, o
Sindicato dos Médicos e o Conselho Regional de Medicina, a cooperativa logo se
engaja na luta contra as chamadas medicinas de grupo ou mercantilistas, e em
1968, Edmundo Castilho divulga um manifesto em defesa das cooperativas e em
repúdio a estes “grupos fechados de pré-pagamento” (CARNEIRO, 1978:39):

“(...) Grupos fechados de pré-pagamento são aqueles formadas por 2


ou 3 médicos que se unem em sociedade comercial com a finalidade de
auferir lucro, na prestação de serviços médicos hospitalares (...)”.

“(...) As Cooperativas assistenciais foram criadas como a antítese dos


grupos fechados de pré-pagamento, representando a maioria em todas
a comunidades médicas e rompendo as tutelas, intervenções de
intermediários e explorações; eles procuram fundamentalmente
defender os padrões éticos e cientifico (...)”.

No início foram realizados contratos do tipo particular, com a propaganda


sendo feita diretamente pelo médico cooperado. Foi também conseguido um
empréstimo junto ao Banco Nacional de Crédito Cooperativo, e em pouco mais de
dois anos de funcionamento a UNIMED de Santos já estava adquirindo sede
própria para a cooperativa.

Passados mais dois anos, em meados de 1972, o sistema já contava com


35 singulares em todo o Estado de São Paulo. Com o sucesso alcançado em São
Paulo, a Associação Médica Brasileira (AMB), através de seu presidente, Paulo
Kassab, e de Edmundo Castilho, que acumulava a presidência da UNIMED, com a
diretoria de saúde da AMB, passaram a realizar caravanas por todo o País,
divulgando o cooperativismo médico e a experiência bem sucedida de São Paulo.
41

Em pouco tempo, Edmundo Castilho, e o advogado Reginaldo Ferreira


Lima, passaram a atender associações médicas de todo o País, para auxiliar na
montagem de cooperativas médicas em boa parte do Brasil. Foi assim que Juiz de
Fora, Uberaba, Uberlândia, Varginha e Montes Claros em Minas Gerais iniciaram
as atividades logo em seguida.

São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, formaram as três


primeiras federações, garantindo base legal e estrutura doutrinária para a
fundação da Confederação das UNIMED’S do Brasil.

Ressalvados os arroubos do momento da criação da UNIMED, e os


excessos do discurso fervoroso contra a “medicina mercantilista”, que perduram
até os dias de hoje, Edmundo Castilho, estava determinando uma nova fase no
conceito de assistência médica em nosso País.

Dificilmente este médico estaria vislumbrando o gigantesco complexo que


se tornaria o Sistema Unimed: 351 Cooperativas em todo o Brasil, 86.000 médicos
cooperados, 16.500 funcionários e 12 milhões de usuários atendidos, atingindo
quase 80% dos municípios brasileiros.2

3.2 A Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico

Como objeto de nosso estudo escolhemos esta Cooperativa de Trabalho


Médico, pela facilidade de acesso aos dados e pela inquietação que nos causava
verificar uma prática de distribuição de renda distante do modelo cooperativista
apregoado na literatura, e nos discursos. O histórico passamos a relatar:

Aos vinte dias do mês de Outubro de 1975, reunidos no auditório do


Hospital Geral e Maternidade de Cuiabá, vinte e dois médicos fundaram a Unimed
Cuiabá Sociedade Cooperativa de Serviços Médicos e Hospitalares, tendo sido
eleito como Presidente, o Dr. Artur Sebastião Bastos Jorge.

2
www.unimed.com.br/nacional
42

Na época, a maioria dos pacientes ainda era particular, categoria que


praticamente inexiste atualmente, quer pelo surgimento de inúmeros planos e
seguros de saúde ou pelo empobrecimento da população, ou ainda pelos altos
preços da tecnologia médica, ou provavelmente por todos estes fatores em uma
cadeia de causa e efeito.

Vinte e quatro anos depois a Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho


Médico é a nona empresa do Estado de Mato Grosso, com um faturamento anual
de mais de R$ 76.000.000 (Setenta e Seis Milhões de Reais), segundo dados do
balanço anual da Gazeta Mercantil da edição de 1999, ficando atrás, em termos
de faturamento, apenas para as estatais estaduais de energia, água, telefonia
móvel e celular, e das empresas de agribussiness, que ocupam 45% (quarenta e
cinco por cento) da economia do Estado (Atlas do Mercado Brasileiro, Gazeta
Mercantil, 1999).

Com certeza, aqueles médicos não imaginavam que estariam criando uma
sociedade cooperativa com tal pujança econômica. Em termos de mercado, a
Unimed é responsável por uma fatia de 75% (setenta e cinco por cento), segundo
dados do IEL, Instituto Evaldo Lodi, da FIEMT, Federação das Indústrias de Mato
Grosso (1996).

Realmente a situação da Unimed Cuiabá é peculiar: para uma população,


segundo dados do IBGE (1997), na chamada “Grande Cuiabá”, que abriga além
de seu município com 453.904 habitantes, o município vizinho, Várzea Grande,
com 214.668 habitantes, totalizando então 668.572 habitantes, os usuários da
Unimed Cuiabá, somavam em fins de Outubro de 1999, cerca de 160.000 (cento e
sessenta mil) usuários (Departamento de Mercado, Unimed Cuiabá, 1999),
portanto a cooperativa tem entre seus usuários, 24% (vinte e quatro por cento) de
toda a população da Grande Cuiabá.

Tradicionalmente as Cooperativas de Trabalho Médico são fortes em


cidades do interior, aonde há um boa relação e interação entre os médicos,
facilitando a formação de cooperativas, permitindo assegurar uma fatia
43

considerável de mercado. Além disso, a boa relação da Cooperativa com os


médicos acaba criando certa reserva de mercado, dificultando a entrada de outros
planos de saúde na cidade, como ocorreu em Cuiabá.

Atualmente, a Unimed Cuiabá conta além da carteira de 160.000 usuários,


e com 157 funcionários. Em complemento ao plano de saúde, a Cooperativa
possui uma farmácia para venda de medicamentos com desconto de 25% (vinte e
cinco porcento) exclusivamente para os usuários, bem como atendimento médico
domiciliar para pacientes, o Home Care, e um Núcleo de Atendimento em
Medicina Ocupacional para o atendimento à legislação trabalhista.

A área de atuação da Unimed Cuiabá, além do município de Cuiabá,


abrange também os seguintes municípios: Campo Verde, Chapada dos
Guimarães, Jaciara, Primavera do Leste, e Várzea Grande.

O quadro de associados ou cooperados é de 897 (oitocentos e noventa e


sete) médicos. O que eqüivale dizer que a cooperativa tem quase novecentos
donos, traduzindo-se em uma grande complexidade para administrar.

Tradicionalmente, o modus operandi das singulares Unimed’s é bastante


similar. Os médicos que ocupam os cargos de direção da cooperativa, raramente
tem experiência administrativa anterior ou ainda “queda” para os negócios. È
natural que assim o seja, pois este profissional foi preparado por longos anos para
o cuidado com o paciente, e não para atuar em um ambiente de negócios, ou para
a gestão organizacional.

O que ocorre então é uma tentativa de administrar a cooperativa como o


médico administra o seu consultório. Em verdade, o trabalho do profissional
médico pode ser comparado ao de um artesão. Êle o executa em geral sozinho, e
de forma manual. Ao transportar esse modo de administrar para a cooperativa, em
especial as de grande porte, aparecem às dificuldades no dia a dia.

Outro fator, que em nosso entendimento contribui para dificultar a


dinâmica da tomada de decisões, é o caráter democrático da cooperativa.
44

As decisões são sempre em colegiado, por votação, sendo vitoriosa a


maioria simples. Este fato acontece nas Assembléias Gerais, e também no
cotidiano organizacional, obedecendo ao que prescreve a Lei 5764/71, e os
estatutos:

“Art. 47- A sociedade será administrada por uma Diretoria ou um


Conselho de Administração, composto exclusivamente de
associados eleitos em Assembléia Geral, com mandato nunca
superior a 4 (quatro) anos, sendo obrigatória a renovação de no
mínimo 1/3 (um terço) do Conselho de Administração.

O estatuto da Unimed Cuiabá, que guarda semelhança com diversas


outras singulares, diz em seu Art. 39º:

Parágrafo 2º- O Conselho de Administração rege-se pelas


seguintes normas:

A) Reúne-se ordinariamente uma vez por semana, e


extraordinariamente sempre que necessário, por convocação do
presidente, da maioria do próprio Conselho de Administração, ou
ainda por solicitação do Conselho Fiscal;

B) Deliberar validamente com a presença da maioria de seus


membros, proibida a representação sendo as decisões tomadas pela
maioria simples dos votos dos presentes, reservado ao presidente o
exercício do voto de desempate.

C) As deliberações serão consignadas em atas circunstanciadas,


lavradas em livro próprio, lidas, aprovadas e assinadas no final dos
trabalhos pelos membros presentes.

Este ritual não seria impeditivo, ou prejudicial ao ritmo da tomada de


decisões, caso acontecesse somente nas Assembléias Gerais ou em reuniões
extraordinárias.
45

Entretanto, ao atender aos estatutos, não se estabelece uma hierarquia de


necessidades prementes e urgentes, tampouco uma segregação de relevância
para a tomada de decisões.

O que a nossa prática, enquanto dirigente de cooperativa nos mostra, é


uma lentidão excessiva e um apego legalista exagerado aos estatutos.

Acreditamos que parte deste modus operandi está na origem democrática


da constituição das cooperativas, aonde todos são donos do negócio, onde um
homem, um voto e no aparelho fiscalizador, personificado pelo Conselho Fiscal,
que entre suas atribuições, conforme o Art.53º, (item e), do estatuto social da
Unimed Cuiabá prevê:

“Certificar se o Conselho de Administração vem se se reunindo


regularmente e se existem cargos vagos na sua composição”.

Ocorre na prática então, além da morosidade na tomada de decisões,


certa negligência nas tarefas maiores de um Conselho de Administração, que
conforme LODI (1998:5), seriam a de proteger o patrimônio e maximizar o retorno
do investimento, zelar pela observância de valores, e propósitos nas atividades
das empresas, além da formulação de políticas e estratégias corporativas.

Ao ver-se estatutáriamente obrigado as reuniões semanais, e tão somente


a elas, o cotidiano de pouca relevância acaba assumindo papel de destaque nas
atribuições do Conselho de Administração.

Analisando as atas semanais das reuniões do Conselho de Administração,


verifica-se decisões de suma importância, como o descredenciamento de hospitais
ou a aprovação de campanha de marketing para o lançamento de um novo plano
de saúde, ocupando o mesmo espaço, e com igual importância que decisões tão
prosaicas quanto a solicitação da compra de uniforme para um time de futebol de
uma escola do bairro, ou ainda o pedido de compra de rifa para ajudar a festa de
formatura de algum funcionário.
46

LUZ (1998), em um estudo inédito sobre análise de gestão em


cooperativas de trabalho médico, faz severas críticas sobre a administração de
uma singular, relatando as dificuldades que os médicos enfrentam para gerir o
negócio, os conflitos de interesse que surgem, a pouca disponibilidade e o
despreparo dos dirigentes cooperativistas.

Este autor afirma que três são as bases para a gestão da cooperativa:
Informação, Comunicação e Decisão (LUZ 1998:42).

Sobre a informação, seriam necessários conhecimentos sobre


cooperativismo e medicina supletiva. Na experiência daquele autor, o
conhecimento sobre cooperativismo da singular estudada é precário, e restrito aos
conselhos diretores; A comunicação também deixa a desejar, e um dos motivos
seria o tamanho da cooperativa, que tem cerca de 1.000 médicos cooperados. Em
relação à decisão, esta costuma ser morosa e de pouca flexibilidade.

A partir de 1996, forçado pelo crescimento acentuado da Cooperativa, e o


acirramento no contexto mercadológico e consequentemente em uma maior
complexidade administrativa, o Conselho de Administração da Unimed Cuiabá
optou por imprimir um ritmo arrojado nas ações da organização, e decidiu
profissionalizar a sua administração, contratando no mercado de trabalho
profissionais do ramo, com experiência em administração de planos de saúde.

Redirecionou seu negócio, e contratou Diretor Executivo, Gerente


Administrativo-Financeiro e Contador, todos profissionais recrutados no mercado
de trabalho local e nacional, não sendo sócios da cooperativa, mas integrantes do
corpo técnico da estrutura funcional da mesma.

Os resultados apurados nos balanços dos últimos três anos mostram uma
tendência animadora, após alguns anos de perdas amargadas pela cooperativa,
conforme mostrado na figura de número 02 (dois).
47

Figura 02: Comparativo dos Resultados dos Exercícios de 1994/ 98 da Unimed


Cuiabá.

R$ 1000

Fonte: Balanços Anuais / 1994-98 da Unimed Cuiabá

Administrar uma empresa de convênio médico não chega ser um exercício


de futurologia, mas as dificuldades em estabelecer as bases para um
planejamento de médio e longo prazo são consideráveis, pois a receita é
previsível, através da carteira de clientes.

Como o sistema é de pré-pagamento, isto é, o cliente paga no início do


mês para ter direito ao uso ao longo do período, as receitas são facilmente
reconhecidas, salvo a inadimplência, que neste tipo de negócio não é
considerável, pois sem o pagamento, o cliente perde direito a utilização do plano
de saúde.
48

Os custos assistenciais, entretanto, estão sujeitos a variáveis tão diversas


como: mudanças climáticas, que podem influir em aumento de atendimentos
médicos ou internações hospitalares. Inovações tecnológicas na medicina, que se
traduz em modernos equipamentos de diagnósticos, elevando o gasto com o
paciente. Avanços de técnicas cirúrgicas, que tratam patologias anteriormente não
tratadas, regulamentações governamentais ampliando a cobertura de planos de
saúde, com contratos já em vigor, entre outras.

Entendemos que são mudanças benéficas para o consumidor, mas que


encarecem o custo final, e dificultam a realização de um planejamento eficiente.

Apesar das dificuldades, acreditamos que os últimos dois anos apontam


não só uma recuperação, mas uma tendência, conforme mostram os resultado
dos exercícios anteriormente mostrados.

Para o gerenciamento do cotidiano da organização, foi então proposto


pela consultoria externa, em meados de 1996, um modelo de organograma, o qual
foi adaptado e atualmente encontra-se na versão mostrada na figura 03 (três),
conforme o Regimento Interno da Cooperativa.

A idéia básica transmitida era a de fixar um quadro profissional, (Estrutura


Funcional), subordinado ao Conselho de Administração, responsável por gerir e
cuidar do negócio da organização, quadro este composto por funcionários
contratados, e não por sócios ou cooperados eleitos, garantindo uma continuidade
do trabalho.

O nível imediatamente superior, a macro-estrutura, seria eleita e renovada


periodicamente, conforme o estatuto, sendo responsável pelas diretrizes políticas,
e estratégicas de longo prazo, bem como sendo a visão do associado, do dono,
dentro da empresa.

Esta estrutura organizacional efetivamente agilizou o processo de tomada


de decisões uma vez que a cooperativa é composta de diversos donos, e as
49

decisões importantes são historicamente decididas em assembléias, quase


sempre burocráticas e demoradas, e de caráter pouco pragmático.

Uma vez aprovada e legitimada a nova estrutura organizacional -através


de assembléia- o Conselho de Administração ganhou autonomia para delegar a
tomada de decisões para um nível hierárquico abaixo, que está em completa
sintonia com o cotidiano das operações, e tem além do perfil profissional indicado,
tempo para dedicar-se à organização.

O exemplo adotado pela Unimed Cuiabá, encontra semelhança entre


outras singulares: Unimed Paulistana, em São Paulo; Curitiba, Campinas,
Federação das Unimed do Centro-Oeste, entre outras.

A consultoria também evidenciou a necessidade de uma revisão nos


processos e uma maior informatização para garantir agilidade e confiabilidade na
tomada de decisões, conforme aponta o relatório finalizado em Junho de 1996
(TREVISAN, 1996:28).

Foi também realizado pela consultoria, em conjunto com o Conselho de


Administração, e com o Diretor Executivo contratado, o planejamento estratégico,
e a definição de missão e visão da cooperativa:

Missão:

“PRESTAR ASSISTÊNCIA MÉDICA DE QUALIDADE, A PREÇO JUSTO,


DE FORMA ÉTICA, GARANTIDO TRABALHO PARA O COOPERADO, COM
REMUNERAÇÃO CONDIZENTE, MANTENDO O EQUILÍBRIO FINANCEIRO DA
COOPERATIVA”

Visão:

“SER RECONHECIDA COMO REFERÊNCIA REGIONAL NA


PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR, E
EXEMPLO DE COOPERATIVISMO.”
50

Em verdade os a consultores que realizaram o trabalho na Unimed Cuiabá


mostraram-se surpresos com a gestão pouco profissional, principalmente face aos
recursos movimentados.

Começava, então uma nova fase na cooperativa, com uma gestão


profissionalizada, e com rumos definidos.
51

Figura 03: ORGANOGRAMA DA UNIMED CUIABÁ Assembléia


Geral
Conselho
Fiscal

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE VICE- DIRETOR DE DIRETOR DIRETOR
MERCADO FINANCEIRO SECRETÁRIO
PRESIDENTE

Centro de Comissão
Estudos
Técnica

Comissão
de Ética

Diretoria
Executiva

Assessoria Ass. Técnica


Jurídica Estatística

Auditoria Serviço
Médica Social

Núcleo de Sist.
de Informação

Departamento de
Departamento
Mercado
Departamento de
Atendimento
NSO HOME
Adm. Financeiro CARE

Recursos Contabilidade
Financeiros

Administ. Apoio e Gestão de Gestão de Gestão de Adm.. Vendas Atend. ao Tele Atend.
RH Serviços Contas Ass. Contas Contratos Cooperado Atendimento Local
Contas Ass.
Prestador Intercâmbio
Cooperado
52

3.3 Receitas e Custos em uma Cooperativa de Trabalho Médico

A cooperativa coloca o mercado, à disposição de seus associados


(cooperados), para que estes possam entregar a produção de seu trabalho. Da
mesma forma, os cooperados disponibilizam seus consultórios, através da
cooperativa, para a população que é conveniada da cooperativa.

Esta transação é efetivada através de convênios realizados pela


cooperativa, e da venda de serviços que serão prestados pelos cooperados. Estes
serviços são os Planos de Saúde, que abrangem o atendimento médico e
hospitalar, incluindo desde a consulta médica em consultório particular do médico
cooperado, a realização de exames diagnósticos, e a internação hospitalar.

A venda dos Planos de Saúde é realizada diretamente a cada indivíduo ou


família ou através de grupos ou associações de classe ou de interesse comum, o
ainda adquirido pela empresa onde o trabalhador esteja empregado, uma vez que
atualmente o benefício de Plano de Saúde é concedido pela maioria das
empresas, e com custo mínimo para o trabalhador, possibilitando o acesso ao
tratamento medico-hospitalar a um grande número de trabalhadores.

Da venda destes serviços, é que são originadas as receitas da


cooperativa. Há também as receitas que são oriundas, não da comercialização
dos planos de saúde, mas de outros serviços, agregados ao produto principal, que
é a prestação de serviços médico-hospitalares. Na Unimed Cuiabá, há também
receitas advindas da venda de medicamentos da farmácia, de receitas financeiras.

Na Unimed Cuiabá, segundo o relatório anual de 1999, a receita líquida do


ano anterior foi de R$ 94.500.843,30 (noventa e quatro milhões, quinhentos mil,
oitocentos e quarenta e três reais e trinta centavos), colocando-a entre a sete
maiores empresa do Estado.

A Lei Cooperativista, n.º 5764 de 16.12.71, em seu capítulo IV, seção II,
“DO ESTATUTO SOCIAL”, preconiza o conteúdo mínimo em cada estatuto, e um
dos itens obrigatórios em todos os estatutos é o ”objetivo”.
53

No estatuto social da Unimed Cuiabá, em seu capitulo II, artigo 2º, está
explicitado o objetivo desta cooperativa:

“A Cooperativa, sociedade de natureza civil e jurídica própria, sem fins


lucrativos, terá por objetivo a defesa econômica e social dos médicos
cooperados, através do aprimoramento do serviço de assistência médico-
hospitalar que será prestado sob a forma coletiva ou individual”.

Para este fim as cooperativas de trabalho médico, firmam contratos com


os hospitais, laboratórios, clinicas de exames diagnósticos e assemelhadas, para
atender aos associados. Em muitas vezes as Cooperativas arrendam, compram
ou constróem seus próprios serviços, o que é chamado de “recursos próprios”,
quando a Cooperativa é dona do hospital ou laboratório. São nestes itens que se
dá a divisão dos custos de uma Cooperativa.

No quadro 02 (dois), fez-se uma comparação entre nove Cooperativas, de


todo o Brasil, mostrando a similaridade desta composição. Os itens constantes
foram uniformizados para facilitar a comparação. Os dados foram obtidos nos
relatórios anuais de cada cooperativa, no ano de 1999.

Quadro 2 : Comparativo de custos entre Singulares

Adm e Desp.
Singular H.M. Hosp. SADT Interc. Outros Total
Com Pessoal
Cuiabá 34% 22% 20% 4% 5% 10% 5% 100%
Campinas 35% 19% 28% 7% 3% 8% - 100%
Londrina 37% 16% 16% 8% 4% 9% 10% 100%
Recife 18% 46% 12% 4% 6% 8% 6% 100%
Rio 31% 30% 13% 5% 5% 15% 1% 100%
Salvador 32% 32% 7% 10% 5% 10% 4% 100%
Uberaba 41% 24% 19% 6% 3% 6% 1% 100%
Curitiba 40% 23% 12% 7% 4% 10% 4% 100%
Rib. Preto 39% 23% 16% 7% 5% 10% - 100%

Fonte: Relatórios Anuais das Singulares Unimed’s 1999


54

Convenção das abreviaturas utilizadas no quadro anterior:

HM – Honorários Médicos

Hosp. – Hospital

SADT- Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Tratamento

Adm e Com.- Despesas Administrativas e Financeiras

Interc. - Intercâmbio

Estes são os itens que compõe a estrutura de custos das singulares,


cooperativas de trabalho médico. Apesar de não haver ainda um plano de contas
comum entre as diversas singulares, estes itens são iguais em todas elas, pois
fazem parte do cotidiano de comprar serviços de terceiros, pagar honorários
médicos, etc.

Honorários médicos:

É todo o ato médico realizado pelo cooperado. Estão inclusos a consulta


médica, que é a chave ou porta de entrada para os demais serviços, as cirurgias
que são realizadas, bem como os pequenos atendimentos realizados em
consultórios ou prontos-socorros, tais como: curativos, suturas, engessamentos,
etc. Incluem-se também, os atos anestésicos, isto é, as anestesias realizadas em
cirurgias ou outros procedimentos que requeiram analgesias.

Este, com toda razão, é considerado o “ato nobre”, pois é fruto do


trabalho do médico, e realizado personalizadamente e necessariamente pelo
médico, exigindo o emprego direto de sua mão-de-obra, ao contrário, por exemplo,
da maioria dos exames diagnósticos, que podem ser realizados por terceiros, ou
até mesmo por máquinas.

Hospitais:
55

Estão aqui alocadas todas as despesas hospitalares oriundas da


internação do paciente, excetuando-se os honorários médicos. São elas: diárias e
taxas hospitalares, gases medicinais (oxigênio, óxido nitroso, etc.), alimentação,
materiais e medicamentos, e outros itens. Os gastos com os pequenos
atendimentos, ou aqueles realizados em pronto socorro, sem a necessidade de
internação do paciente, também aqui estão incluídos.

SADT (Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Tratamento)

Esta sigla é comumente usada na área de saúde. Aqui estão agrupados


os exames de análises clínicas, mais conhecidos como exames de laboratório:
sangue, urina, fezes, etc., como também os exames de diagnósticos por imagens:
Ultra-sonografias, Raios-X, Densitometria, Tomografia Computadorizada,
Ressonância Nuclear Magnética, etc. São chamados de Serviços Auxiliares, pois
são complementares ao trabalho do médico que prescreve ou não a sua
utilização.

Despesas administrativas e comerciais:

Neste grupo fazem parte as despesas típicas para gerir o negócio,


decorrente de atividades meio, tais como: aluguéis, taxas e impostos, despesas
com manutenção, despesas financeiras, contas de águas, luz, telefone, materiais
permanentes e demais materiais de consumo.

Nas despesas comerciais estão alocadas as propagandas, publicidade,


marketing, despesas com vendas e comissões.

Despesas com pessoal:

Obviamente este item contém as despesas com funcionários


administrativos e técnicos da Cooperativa, com seus respectivos encargos sociais.
56

Estão também aqui contidos os honorários de pró-labore dos Conselhos de


Administração, Comissão Técnica e demais membros de Conselhos eleitos em
Assembléia Geral.

Intercâmbio:

Como as Cooperativas de Trabalho Médico, UNIMED’S, são de atuação


nacional, o sistema adota um mecanismo denominado de Intercâmbio, que se
referem as despesas efetuadas dos usuários de uma singular em outra localidade.
Por exemplo, o usuário da Unimed Cuiabá, que em viagem para São Paulo
necessita de serviços médico-hospitalares, usa o serviço sem desembolsar nada,
e a conta é enviada para a Unimed de origem, no caso, Cuiabá, através de
câmaras de compensação regionais. Assim, o usuário pode ser atendido em todo
o País. Este item representa, então, todos as despesas decorrentes destes
acontecimentos.

Outros:

Por tratar-se de percentual de pouca expressão agrupamos em “outros”, aquelas


despesas não contempladas nos itens anteriores, tais como gastos com
fisioterapia, despesas com médicos não cooperados, etc.

Pode-se observar que o maior percentual de custos é com honorários médicos, ou


seja, os gastos com os médicos cooperados, demonstrando coerência com os
objetivos de uma cooperativa de trabalho médico.

Salvo em alguns raros casos, como na singular de Recife, que o gasto com
honorários médicos é de 18%, a média deste item é em torno de 36% do custo
total.

No caso de Recife, é notório o alto custo hospitalar, elevando a média de gastos


com este item de 23% para 46%, o dobro da média que gastam as demais
singulares.
57

Deve-se ainda considerar que os gastos com exames diagnósticos (SADT), cuja
média é em torno de 16% revertem em alguns casos para os médicos
cooperados, para aqueles que realizam exames, cuja autoria é de exclusividade
do médico, como por exemplo, os exames de anatomia patológica.

Na análise dos gastos, fica evidente o privilégio garantido ao médico cooperado,


da remuneração do seu trabalho.

3.4 Distribuição de renda na Cooperativa de Trabalho Médico

A distribuição de renda e consequentemente a sua desigualdade tem sido motivo


de estudo pelos economistas há muito tempo. Desde o final do século XIX, o
fenômeno da concentração de renda surge como conseqüência do crescimento do
processo industrial, e da formação de cartéis, fusões e aglomerações de
empresas que o mundo estava experimentando após a revolução industrial. Esta
última metade do século XIX foi marcada pelo capitalismo das grandes
corporações, que incluíam as indústrias de bens de capital, máquinas, navios, e
produtos químicos.

Os efeitos do capitalismo e da livre concorrência, além da concentração


do poder corporativo, influenciou no aumento das desigualdades sociais e da
concentração de renda. O economista liberal clássico, David Ricardo sugere uma
teoria para o processo de distribuição de renda, dividindo em três os principais
fatores de produção: trabalho, capital e terra.

Tal teoria, em especial no tocante a trabalho, é também a mesma visão de


Marx: os trabalhadores recebem um salário que seria para a subsistência, e os
capitalistas se apossam da mais-valia. Assim, o capital se acumula e geram-se
novos empregos, impedindo que o salário suba, não só pelo “exército de reserva”,
mas em decorrência da incorporação de novas tecnologias. (HUNT e SHERMAN,
1998:113).

Em verdade a discussão sobre distribuição de renda, é permeada de


controvérsias até os dias de hoje. BELLUZZO (1973:15-25), explica em seu
58

trabalho versando especificamente das controvérsias, que tudo depende da forma


como está segmentada a sociedade, e que tendo como pano de fundo a situação
das classes sociais no momento da produção, os limites de distribuição de renda
estariam evidentes para cada classe social. Assim o modelo capitalista estaria
assegurando continuamente o seu quinhão.

CASTRO, prefaciando CAMARGO & GIAMBIAGI (1991:10), também


anuncia o desafio em estudar o tema e aponta como uma das dificuldades, a única
fonte de dados disponível para análises, que são as PNAD’s Pesquisa Nacional
por Amostragem de Domicílios, que não contemplam o total das rendas que
compõe as contas nacionais, e que poderiam subestimar algumas rendas, tais
como as auferidas dos lucros das empresas, podendo mascarar uma
concentração que seria ainda maior.

CACCIAMALI, in PINHO (1998:454), também faz restrições quanto a


mensuração da concentração de renda, e sugere que sejam complementadas pôr
análise da evolução de outros indicadores sociais.

O que há de comum entre todos os autores citados é a certeza de que a


distribuição de renda em nosso País é péssima e está entre as piores do mundo.

Como os limites deste trabalho encerram em uma análise da distribuição


de renda dos cooperados da Unimed Cuiabá, não é de nosso interesse aprofundar
uma discussão sobre distribuição de renda em geral, mas apenas contextualizar
esta análise.

Conforme descrito por PINHO (1992:25), em seu quadro demonstrativo,


apresentado neste trabalho, uma das diferenças entre cooperativas e empresas
privadas, é no tocante a distribuição de renda. Enquanto nas empresas privadas a
renda é em função do capital, nas sociedades cooperativas, a renda deve ser
59

distribuída em função do trabalho aportado, ou do serviço realizado em caso de


cooperativas de consumo.

Isto significa dizer que aquele cooperado que mais produz, deverá
receber maior remuneração. Quando se fala em produção em uma cooperativa de
trabalho médico está se falando no trabalho que o médico realiza, ou seja:
consultas, atos cirúrgicos, exames, procedimentos, e internações.

Ao analisarmos os princípios inspiradores do cooperativismo, em especial


o terceiro princípio, “da participação econômica dos sócios” verificamos que a
intenção daqueles realizadores do princípio era a de remunerar de forma justa o
trabalho do cooperado, e em caso de sobras que essas revertessem ao próprio,
resguardando-se os ditames da legislação pertinente (IRION, 1997:73).

O profissional da área médica, ao procurar o ingresso em uma cooperativa


de trabalho, está buscando, além de manter o vínculo de profissional liberal não
assalariado, uma renda que lhe seja razoável.

A alternativa da cooperativa traz em seu bojo uma esperança de dias


melhores. POLONIO (1999:38), afirma que o caráter que inspirou o surgimento
das cooperativas era eminentemente social e que “estas não nasceram para fazer
frente ao sistema Capitalista, mas para reduzir os efeitos perniciosos que este
exercia sobre os cidadãos.”

Em verdade o Cooperativismo guarda em si, até os dias de hoje, muito do


pensamento utópico em suas origens. HENRIQUES DE MIRANDA (1973:23),
afirma que a Doutrina Cooperativista, apoia-se em princípios teóricos
neoclássicos, sem, contudo abdicar de suas pretensões de transformação da
sociedade.

As finalidades e objetivos das cooperativas, segundo QUEIROZ (1998:25)


seriam:
60

a) Melhoria da renda de seus associados, conseguindo valorizar o trabalho e


obtendo melhor negociação com referência à remuneração.

b) Incremento nas condições de trabalho na medida em que a cooperativa


transforma trabalhadores em “empresários”, determinando em conjunto, e de
forma democrática, as regras de atuação da cooperativa.

De fato, a busca de um aumento de renda foi identificado em 83% dos


cooperados entrevistados da UNIMED Cuiabá, conforme aponta a tabulação de
pesquisa realizada.

Realizamos 165 (cento e sessenta e cinco) entrevistas, utilizando o


formulário que se encontra em anexo, que objetivou identificar o tempo que o
médico é cooperado, os motivos de ingresso na cooperativa, e em especial se o
futuro cooperado vislumbrava obter um aumento em sua renda, e em caso
positivo, quanto isso significou.

A amostra foi obtida através dos cooperados que frequentaram durante o


ano de 1998, as Assembléias Gerais Ordinárias ou Extraordinárias, que são os
órgãos máximos em uma cooperativa. Foram realizadas quatro Assembléias, três
Extraordinárias e um a Ordinária, para prestação e aprovação de contas do
exercício anterior.

A freqüência de cooperados em Assembléias gira em torno de 150 a 200


médicos, conforme consta de lista de presença das atas das AGO’s.

Em geral os freqüentadores são os mais interessados na gestão da


Cooperativa, pois as AGO’s são o fórum indicado, estatutariamente para
deliberações e tomada de decisões.

Nestas Assembléias, são debatidos e deliberados assuntos que irão


influenciar diretamente na vida do cooperado, na relação deles com a cooperativa
e com terceiros, e certamente no que diz respeito a seus ganhos. Embora o
Conselho de Administração tenha autoridade para decidir sobre matérias do
61

cotidiano, sempre que uma medida venha trazer um impacto maior sobre a
cooperativa ou cooperados, é de praxe realizar-se uma Assembléia Geral
Extraordinária (AGE), para esclarecimento e respaldo da decisão tomada.

Desta maneira acreditamos ter conseguido os dados daqueles


cooperados mais atuantes ou interessados na Cooperativa.

Os quadros apresentados a seguir de números 3, 4 e 5, apontam os


resultados obtidos nestes questionários.

O questionário aplicado que se encontra anexado no final deste trabalho,


é composto basicamente de três questões, visando identificar o tempo que o
cooperado está atuando na cooperativa, os possíveis motivos que o levaram a
ingressar no sistema cooperativista e se houve aumento de sua renda a partir da
sua entrada na cooperativa. Em caso positivo, há um sub-item, visando quantificar
este aumento.

Quadro 3 – Quantidade e percentual de cooperados, segundo o tempo de


cooperativa.

Tempo de Cooperativa N.º de Cooperados %

Até 2 anos 20 12,0

De 2 a 4 anos 38 23,0

De 4 a 8 anos 72 44,0

Mais de 8 anos 35 21,0

Total 165 100


62

A maioria dos cooperados entrevistados, representando 65% do total, situa-se


com mais de quatro anos de tempo de cooperativa.

A amostra indica uma população de cooperados com experiência na cooperativa,


e também com interesse, pois estes são os partícipes das Assembléias Gerais,
cuja presença é voluntária.

O indicativo de apenas 12% de cooperados novatos, com até dois anos de


cooperativa demonstra que no início das atividades não há uma participação mais
efetiva nas Assembléias.

O cooperado recém chegado à cooperativa está preocupado em montar seu


consultório, ampliar sua clientela, conforme demonstra o quadro a seguir, para
posteriormente dedicar-se, ou perceber a importância da cooperativa em seu
negócio.

Quadro 4 - Quantidade e percentual de cooperados, segundo o motivo de


ingresso na Cooperativa.

MOTIVO DE INGRESSO N.º de Cooperados %

Aumento da Renda 137 83,0

Garantia de Trabalho 32 19,0

Defesa da 26 16,0
Profissão/Classe

Manutenção do Vínculo 28 17,0


de Profissional liberal

Ampliar a Clientela 78 47,2


63

Outros 9 5,4

A pesquisa apontou que 83% dos cooperados entrevistados assinalaram


como motivo de ingresso na Cooperativa o aumento de renda.

Se incluirmos os cooperados que atribuíram o quesito “Ampliar a


Clientela” (as respostas foram múltiplas, com o cooperado assinalando mais de
um quesito), que também traduz um aumento de renda, podemos constatar que a
grande motivação de ingresso na Cooperativa, é a de buscar um incremento na
renda do cooperado.

Verifica-se também que esta preocupação não é apenas do cooperado


que recém entrou na Cooperativa, pois conforme indica o quadro 03, na página
anterior, a maioria dos cooperados que responderam a pesquisa, estão na faixa
de mais de quatro anos de cooperativa.

Quadro 5 – Quantidade e percentual de cooperados em relação a


aumento de renda

Aumento de Renda N.º de Cooperados Percentual

Não houve aumento _____ _____

Até 10% 28 17,0%

Entre 10 % e 20% 71 43,0%

Mais de 20% 66 40,0%

TOTAL 165 100%


64

A totalidade de cooperados que respondeu a pesquisa afirmou ter


aumento em sua renda mensal, sendo que quarenta por cento dos cooperados
indicou em acréscimo de mais de 20% em sua renda.
De fato, a expectativa de aumento de renda, quando da entrada na
cooperativa foi concretizada, em que pese haver ainda uma concentração na
distribuição desta renda, conforme demonstrado na figura 04, da página 53.
Esta expectativa é de certa forma natural, uma vez que o profissional
médico dispõe de seu consultório, para a cooperativa, e em contrapartida a
cooperativa oferece o trabalho do médico cooperado para os associados.
O fato de não haver, nos questionários respondidos, qualquer cooperado
mencionando que não houve aumento de renda quando da entrada na
cooperativa, é um indicativo relevante de comprovação da eficácia do sistema
cooperativista de trabalho médico, no tocante a aumento de renda.

A fonte de referência dos dados que se utilizou para esta análise, foram os
relatórios emitidos pela gerência administrativo-financeira da Cooperativa, os
balancetes mensais, e o Balanço Anual de 1999.

Para analisar a distribuição de renda entre os médicos cooperados da


Unimed Cuiabá, realizou-se uma classificação por faixas de ganho com intervalos
de R$1.000,00 (um mil reais) até R$10.000,0 (dez mil reais) e após isto mais duas
faixas com intervalos de R$5.000,00 (cinco mil reais), em razão de um intervalo
menor não ser significativo. O total são 13 faixas de renda.

Os cooperados que operaram com a cooperativa durante o ano de 1999


foram em número de 804.

Isto é, do total de 897 cooperados, que são sócios da Unimed Cuiabá,


804 efetivamente produziram naquele ano, ou seja, realizaram consultas, exames
e demais atos médicos. Os demais (93 cooperados), não produziram por motivos
65

diversos, tais como: licenças médicas, licenças para estudos, aposentadorias,


licenças para exercer cargos públicos, etc.

O item analisado é honorários médicos, que corresponde ao que foi


produzido pelo cooperado no período correspondente.

O montante despendido para pagamento de honorários médicos no ano


de 1999 foi de R$ 33.732.000,00 (trinta e três milhões, setecentos e trinta e dois
mil reais), representando 34% do total dos custos com a cooperativa durante o
ano, sendo a média mensal de R$2.811.000,00 (dois milhões, oitocentos e onze
mil reais).

Analisou-se a distribuição da renda entre os cooperados da Unimed


Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico durante o ano de 1999, e pode-se
observar uma concentração de renda da seguinte ordem:

1) 27% (vinte e sete por cento) do total de cooperados, ou seja, 217


médicos recebem até R$ 1000,00 por mês.

2) 45% (quarenta e cinco) dos total cooperados, ou 360 (trezentos e


sessenta) médicos, recebem até R$ 2.000,00 (dois mil reais), por mês, como
produção de seu trabalho.

3) 58% (cinqüenta e oito por cento) dos cooperados, ou seja 464


(quatrocentos e sessenta e quatro) médicos recebem até R$3.000,00 (três mil
reais), por mês, atingindo a terceira faixa de renda , conforme demonstrado na
figura 04.
66

Figura 04 - Distribuição percentual do número de Cooperados em relação a renda mensal no


ano de 1999.

Fonte: Relatório Anual de 1999, Unimed Cuiabá.

Nas últimas cinco faixas, isto é, cooperados com renda acima de


R$6.000,00 (seis mil reais) encontram-se somente 81(oitenta e um) cooperados,
representando somente 10% do total.

Por outro lado, estes 81 (oitenta e um) cooperados concentram 35% da


despesa total com a produção dos cooperados.

Pela análise dos dados, evidencia-se uma concentração de renda, que


pode significar um distanciamento do que preconiza o sistema cooperativista, e
com tendências a repetir o modelo capitalista encontrado em empresas de saúde
de cunho mercantilista, combatidas pelo cooperativismo.

Não foi possível identificar uma relação entre tempo de cooperativa e


renda do cooperado, mas em relação a especialidade em que o médico atua, foi
identificado uma concentração de alocação de recursos, em três especialidades
67

básicas: ginecologia/obstetrícia, cardiologia e pediatria. Não é por outra razão que


estas são chamadas de especialidades básicas, pois concentram o maior volume
de atendimento.

De acordo com o Relatório Financeiro de 1999, as três especialidades


representaram 30% do dispêndio de custos com a produção médica. As demais
51 especialidades tiveram um comportamento similar, distribuindo eqüitativamente
o restante do gasto.

Somente os gastos com produção médica, representando atos médicos,


isto é, consultas, cirurgias e exames realizados exclusivamente e diretamente
pelos médicos cooperados é que estão contemplados nesta análise de renda dos
cooperados.

Os demais procedimentos, mesmo que realizados em ambiente hospitalar


ou ambulatorial, como sessões de fisioterapia ou ainda os exames laboratoriais de
análises clínicas, não estão computados, por tratarem de procedimentos, em que
a presença do médico não é requerida diretamente.
68

4 - CONSIDERAÇÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS

Passados mais de cento e cinqüenta anos da experiência de Rochdale,


podemos observar que a contribuição de Robert Owen foi inestimável, não só para
a nossa economia, mas para a melhoria das relações entre trabalhadores e
patrões.

As relações de trabalho foram flexibilizadas, e surgiram oportunidades


para a criação de novos postos de trabalho.

O Cooperativismo tem o mérito de conseguir seus feitos, sem se


contrapor frontalmente com o Capitalismo, mas mostrar-se como opção. Em boa
parte, por causa da existência e simplicidade de seus valores e princípios.

É como diz o presidente da Aliança Cooperativista Internacional (ACI), o


engenheiro agrônomo brasileiro Roberto Rodrigues, (1998):

“... Na margem esquerda corre o Comunismo ortodoxo, na margem direita


o Capitalismo selvagem, enquanto o Cooperativismo é o leito caudaloso
do rio como única opção. Atualmente êle é a ponte entre o mercado e a
satisfação dos cooperados, a felicidade...”

Em verdade o cooperativismo consegue promover a geração de riqueza,


sem a exclusão social, figurando efetivamente como uma forma alternativa de
trabalho e renda, na medida em que consegue reter para o grupo associado a
mais-valia, que em uma relação de trabalho fica em poder do empregador.

Também contribui para a melhoria das condições de trabalho, uma vez


que as cooperativas transformam empregados em empresários, atuando de forma
democrática, embora esta atuação apresente as dificuldades que uma gestão
democrática representa, com a necessidade de realização de assembléias de
associados, com uma regular freqüência, que seria desnecessário em uma
empresa mercantil.
69

Possibilitam, desta forma que os próprios associados exerçam a direção e


fiscalização da cooperativa.

O estudo do funcionamento de uma Cooperativa de Trabalho Médico


permitiu uma visão geral de sua gestão, bem como evidenciou a
representatividade do Cooperativismo em nossa economia.

As relações entre a cooperativa e os seus cooperados mostram também


uma singularidade em relação as demais empresas. Não apenas na quantidade
de sócios que é maior, no caso da Unimed Cuiabá, são quase oitocentos, mas na
atuação deles no cotidiano que também é diferente.

O sentimento de “dono” mostra-se mais presente nesta relação, embora


em boa parte das vezes, este sentimento não é traduzido em ações eficazes para
a organização, em virtude da pouca visão de conjunto, ou do negócio, ou ainda
por entender que por ser ”dono”, tem o direito de administrar como melhor lhe
convier, conforme sua experiência própria, em geral oriunda da administração de
seu consultório.

Ficou claro também que a Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho


Médico pôde oportunizar trabalho para quase mil médicos, que tiveram facilitados
o seu acesso ao mercado, tendo como respaldo, uma empresa consolidada e
estabelecida, como também uma marca forte e a tradição de um mais de um
quarto de século de existência.

Assim sendo, o sistema cooperativista efetivamente contribuiu para uma


melhoria de renda dos médicos cooperados da Unimed Cuiabá, na medida em
que houve a oferta da sua produção, ou seja, do trabalho, para os associados do
plano de saúde comercializado pela cooperativa.

Devemos, entretanto questionar, se a concentração de renda verificada


entre os cooperados da Unimed Cuiabá, significa um afastamento daqueles
princípios do cooperativismo, e se há de fato uma distorção.
70

É também patente, que o profissionalismo da gestão cooperativista é vital


para a manutenção da cooperativa no mercado.

O ganho advindo com a profissionalização da Unimed Cuiabá, está bem


representado nos resultados financeiros apresentados, e na melhoria da gestão
organizacional, cuja deficiência foi apontada em relatório apresentada pela
consultoria contratada.

Talvez o maior desafio, seja administrar uma cooperativa, preservando os


princípios e valores do cooperativismo, e manter a empresa cooperativa saudável
financeiramente.

È manter o equilíbrio entre os ganhos dos cooperados, a qualidade dos


serviços prestados, e a satisfação dos usuários, que com freqüência apresentam
objetivos e interesses antagônicos: quanto maior a produção, maior ganho do
médico cooperado, mas maior custo para a cooperativa.

Uma certeza temos pela frente: a solução não é pessoal, mas coletiva.

Acreditamos que como sugestão para futuros trabalhos, poderia ser


aprofundada a discussão sobre o afastamento dos princípios cooperativistas, na
relação empresa cooperativa e sociedade cooperativista.

Também seria de utilidade tentar estabelecer uma relação entre as


especialidades médicas que eventualmente concentram a renda da produção da
cooperativa

Um estudo sobre a tomada de decisão em cooperativas, em comparação


com empresas mercantis, seria da mesma forma útil para entender melhor a
gestão cooperativista.

O impacto de novas tecnologias na área de saúde e sua repercussão nos


custos assistenciais, também seria de interesse um estudo neste sentido.
71

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALVES, E. Modernização Produtiva e as Relações de Trabalho, Petrópolis, Vozes,


1997.
ANTONI, A. Cooperativas de Trabajo. 1ª Ed. Buenos Aires, Intercoop, 1980.
ARAUJO, C. E. P. Cooperativismo e Acumulação: Um Estudo de Caso, Brasília,
UNB, 1980, Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), 169p.
BARBOSA, L. B. O Gerenciamento dos Recursos Humanos na Prestação de
Serviços Públicos de Saúde: A Experiência do PAS. Uma Visão dos
Gerentes, São Paulo, PUC, 1998, Dissertação (Mestrado em Administração),
140p.
BELLUZZO, L. G. M. Distribuição de Renda: uma Visão da Controvérsia. In:
Anais do I Encontro Anual da Associação Nacional de Centros de Pós Graduação
em Economia, São Paulo. 1973 50 p, p.15-35.
BENATO, J. V. A. O ABC do Cooperativismo. São Paulo, OCESP- Organização
das Cooperativas do Estado de São Paulo, 1997.
_______________ Administração Financeira em Sociedades Cooperativas. São
Paulo, OCESP, 1993.
BERQUÒ, E. S. Bioestatística. 2ª Ed. São Paulo, EPU, 1981
BIANCALANA FILHO, C. Cooperativismo sob a Ótica da Sociologia. São Paulo,
Revista UNIMED Ano 5, N° 18, 1992.
BRASIL. Lei nº5764, de 16 de Dezembro de1971. Define a Política Nacional de
Cooperativismo, institui o regime jurídico das cooperativas e dá outras
providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 17 de
Dezembro de 1971.
BULGARELLI, W. Regime Tributário das Cooperativas, São Paulo, Saraiva, 1974
CAMARGO, J. M., GIAMBIAGI, F. (Org.). Distribuição de Renda no Brasil. 2 Ed.
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991.
CAMPOS, É. M. Manual Interativo para Constituição de Cooperativas. Cuiabá,
OCEMAT Organização e Sindicato das Cooperativas do Estado de Mato-Grosso,
1987
72

CARNEIRO, P. P. Cooperativa Médica. 2 Ed. Belo Horizonte, Júpiter; 1978.


CAVALIERI, C.H. Distribuição de Renda e Consumo Agregado: Uma Avaliação
para o Brasil. São Paulo, EAESP/FGV, 83p. Dissertação. (Mestrado em
Administração).
COSTA, R. M. A Livre Escolha do Cooperado. São Paulo, Revista UNIMED,
Jan/Fev, 1996
CRUZIO H.O. Como Organizar e Administrar uma Cooperativa, Rio de Janeiro,
FGV, 2000.
D’AVILA, F. B. Pequena Enciclopédia de Moral e Civismo, Rio de Janeiro,
FINAME, 1972
DONNANGELO, M. C. F. Medicina e Sociedade- O médico e seu mercado de
trabalho, São Paulo, Pioneira, 1975.
ECO, U. Como se faz uma tese. São Paulo, Perspectiva, 1991.
FRANKE, W. Direito das Sociedades Cooperativas, São Paulo, Edusp, 1973.
Fundação IBGE Contagem da População de Mato-Grosso, Rio de Janeiro, 1997
Fundação IBGE. PNAD- Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Rio de
Janeiro 1999.
Gazeta Mercantil Balanço Anual São Paulo, Gazeta Mercantil, 1999
_____________ Atlas do Mercado Brasileiro. São Paulo, Gazeta Mercantil, 1999
GIMENES R. M. T. Estrutura de Capital e Capacidade de Autofinanciamento das
Cooperativas Agropecuárias Consolata (Copacol) e Mista do Oeste do
Paraná (Coopagro): Um Estudo de Caso. São Paulo, PUC, 1995, Dissertação
(Mestrado em Administração) 157 p.
HENRIQUES DE MIRANDA, V. M. Doutrina e Empresa Cooperativas:
contribuição para o Estudo do Cooperativismo na Região de Araraquara.
Araraquara, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Araraquara, 1973, Tese
(Doutoramento em Filosofia), 229 p
HOFFMAN, R. Estatísticas para Economistas 3ª Ed. São Paulo, Pioneira, 1998.
____________. Distribuição de Renda. Medidas de Desigualdade e Pobreza. São
Paulo, EDUSP, 1998.
HOLYOAKE, G.K. Os 28 Tecelões de Rochdale. Porto Alegre, W S Editora, 2000.
73

HUNT, E. K. & SHERMAN, H. J. 16 ª ed. História do Pensamento Econômico.


Petrópolis, Vozes, 1998.
IEL/FIEMT Anuário Estatístico. Cuiabá, FIEMT Federação das Indústrias do Estado
de Mato Grosso, 1996
IRION, J. E. Cooperativismo e Economia Social. 3ª Ed. São Paulo, STS, 1997.
___________O Sistema e o Complexo UNIMED, São Paulo, Edições do Autor,
1990.
___________ As laranjas e o arco-íris, 4 ª ed., São Paulo, Edições do Autor, 1995.
___________ Cooperativismo médico UNIMED, São Paulo, Edições do Autor,
1987.
___________ Cooperativismo e a Constituição UNIMED. São Paulo, Revista
UNIMED, ano VII, n.º 31, 1994.
____________ Valores do Cooperativismo. São Paulo, Revista UNIMED, ano V,
n.º 20, 1992
KOSLOVSKI, J.P. Autogestão nas Cooperativas: Liberdade com
Responsabilidade. Curitiba, OCEPAR, 1992.

LIMBERGER, E. Cooperativa. Noções Básicas. Nova Petrópolis, Linha Imperial,


1969
LUZ, N.W. Análise da Gestão de uma Cooperativa de Trabalho Médico Através
do Processo Decisório. Um Estudo de Caso da Unimed Florianópolis.
Florianópolis, UFSC, 1998, Dissertação (Mestrado em Ergonomia) 108p.
LUZ FILHO, F. Teoria e Prática das Sociedades Cooperativas. 6ª ed. Rio de
Janeiro, Pongetti, 1986.
LODI, J. B. Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. São
Paulo, IBGC, 1998.
MARX, K. & ENGELS, F. O Manifesto Comunista. 6ª ed. São Paulo, Paz e Terra,
1998.
MILLER, P.C. Cooperativas de Trabalho. Cuiabá, UNIC Universidade de Cuiabá,
1999, Monografia (Curso de Ciências Contábeis), 58p.
MONTEIRO, S. T. Cooperativas: Anotações para Estudo e Debate. Porto Velho,
74

EMATER-RO, 1989
OLIVEIRA, T. C. O Desenvolvimento das Cooperativas de Trabalho no Brasil.
Brasília, OCB Organização das Cooperativas do Brasil, 1984.
OLIVEIRA JÚNIOR. C. C. Avaliação da Eficiência Empresarial das Cooperativas.
Curitiba, OCEPAR, 1991.
PEREIRA, M. A. G. Um Estudo Exploratório: As Empresas Comunitárias em
Toledo no Estado do Paraná. São Paulo, USP, 1985, Dissertação (Mestrado
em Administração), 124p.
PÈRIOS, W. Cooperativismo de Trabalho: Manual de Organização São Paulo,
Perspectiva Econômica, 1997
PINHO, D. B. Economia e Cooperativismo. 2ª Ed., São Paulo, Saraiva, 1997.
________________________. Cooperativas Brasileiras de Trabalho. São Paulo,
FAPESP, 1993.
________________________. A Doutrina cooperativa nos regimes capitalista e
socialista- suas modificações e sua utilidade 2ªEd. São Paulo, Pioneira, 1966
____________ (Org.) Manual do Cooperativismo, Vol. 3: Tipologia
Cooperativista. São Paulo, CNPq, 1984.
PINHO, D.B. & VASCONCELLOS, M. A. S. (Org.). Manual de Economia. 3ª Ed. São
Paulo, Saraiva, 1998
POLONIO, W.A. Manual das Sociedades Cooperativas. 2ª Ed. São Paulo, Atlas,
1999.
POSSAS, M. L. Dinâmica da Economia Capitalista: Uma Abordagem Teórica.
São Paulo, Brasiliense, 1987.
PERIUS, V. As Cooperativas de Trabalho: Alternativas de Trabalho e Renda.
São Leopoldo, UNISINOS, 1995.
QUEIROZ, C. A. R. S. Manual das Cooperativas de Serviço e Trabalho. São
Paulo, STS, 1997
RIBEIRO, M. S. & LISBOA, L.P. Balanço Social: Instrumento de Divulgação da
Interação da Empresa com a Sociedade. In: Anais do 23° Encontro Anual da
Associação Nacional dos Programas de Pós Graduação em Administração. Foz de
Iguaçu, 1999, 238p.
75

RODRIGUES, R. A Segunda Onda: Uma Visão Cooperativa .Buenos Aires,


Omnicom, 1998.
RUDIO, F.V. Introdução ao Projeto de Pesquisa Científica 15ª Ed., Petrópolis,
Vozes, 1990.
STAUBER, E. As Conseqüências Fiscais Decorrentes do Entendimento da
Teoria do Proprietário nas Sociedades Cooperativas. São Bernardo do Campo,
Instituto Metodista de Ensino Superior, 1996, Dissertação (Mestrado em
Administração), 155p.
SANTOS, N. J. As Cooperativas de Trabalho na Flexibilização das Relações de
Trabalho. São Paulo, PUC, 1999, Dissertação (Mestrado em Administração), 77p.
TREVISAN, CONSULTORES E AUDITORES LTDA. Relatório Final de Consultoria
em Gestão. São Paulo, 1996
UNIMED DO BRASIL Relatório Anual 1999. São Paulo, 1999
UNIMED CUIABÁ Relatório Anual do Exercício de 1999. Cuiabá, 1999.
_________________Estatuto Social. Cuiabá, 1997.
ZYLBERSZTAJN, D. XI Congresso Brasileiro de Cooperativismo. Brasília, OCB,
1997.
76

ANEXO I

QUESTIONÁRIO

1)- Há quanto tempo você está na Cooperativa?

( ) até 2 anos ( ) de 2 a 4 anos ( ) de 4 a 8 anos ( ) mais de 8 anos

2)- Assinale os motivos que o levaram a ingressar na Cooperativa:

SIM NÃO

a)Aumento da Renda ( ) ( )

Se sim, em que percentual?


( ) até 10%
( ) entre 10% e 20%
( ) mais de 20%

b)Garantia de Trabalho ( ) ( )

c)Defesa da Profissão/Classe ( ) ( )

d)Manutenção do vínculo de Profissional Liberal ( ) ( )


(Não Assalariado)

e)Ampliação da clientela ( ) ( )

f)Outro(s):_________________________________________________________
__________________________________________________________________

You might also like