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O STF, a União Gay e o Congresso Nacional:

Pela Sustação da Violação da Competência Legislativa.

“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição. (Art. 1º, parágrafo único, Constituição Federal)”

A decisão do STF no julgamento da ADI 4277 e ADPF 132 – a respeito da chamada


União Gay – ainda repercute na sociedade em geral, principalmente entre juristas e no próprio
Congresso Nacional, um dos Poderes usurpados e vituperados. O que a Suprema Corte fez,
como expliquei aqui neste diário em “O STF, a União Gay e o Ministro Carlos Britto: De
Guardião a Vilão da Constituição.”, enquadra-se no clímax do que tenho denominado de
“judicialização do poder constituinte originário” para não dizer coisa menos “jurídica”. O
autoritarismo da Corte e a violação expressa da competência legislativa do Congresso
Nacional, sequer, fez parte das preocupações “poéticas” de Ministros, como Carlos Ayres
Britto. Como eu disse, o que, de fato, estava ali em jogo não era o mérito em si das ações, mas
a postura da Corte em servir, ou não, de “atalho legislativo” e de instrumento do “ativismo
judicial” ou mesmo do “ativismo autoritário da minoria gay”. A democracia representativa
perdeu, porque, como a Constituição Federal estabelece, o Poder Constituinte pertence à
Nação Brasileira e não aos Poderes Constituídos da República. E a Nação decidiu,
peremptoriamente, em 1988, em Assembléia Nacional Constituinte, que entidade familiar é o
que a natureza diz que é desde que a humanidade foi criada por Deus: Homem e Mulher.

Não cansarei de dizer, como corolário do que disse acima, que ao STF, cabia
estritamente, neste julgamento, ser tão-somente o guardião dos princípios e preceitos
fundamentais que ela, a Nação, definiu no texto constitucional originário, sem ir além, aquém
ou fora dos parâmetros valorativos estabelecidos. A Suprema Corte precisa entender que, ao
decidir sobre questões que envolvem o complexo ideário moral e sociocultural da nação, não
pode fazê-lo com implicações de ordem legiferante e mutacional ou de construção e
desconstrução “legislativa”. Neste sentido, duas coisas me chocam: uma, é o uso arbitrário e
inapropriado da técnica de “Interpretação Conforme”, como expliquei no artigo que citei
acima; a outra, é a incoerência dos ensinamentos do Profº Carlos Ayres Britto que não se
cansava de nos dizer na UFS: “Os poderes constituídos da República Federativa do Brasil não
podem dispor sobre o Poder que sobre eles dispõe: a Soberania do Povo”. Mas não foi isso que
ele mesmo fez e, assim, como Ministro, além de violar a vontade soberana do Povo, usurpou a
própria função do Poder Legislativo, tornando-se, assim, no dizer do jurista italiano Mauro
Cappelletti, um ilegítimo Juiz-Legislador. Para mim, fica claro que o “sábio” sergipano não foi
mais sábio que os Sages da Corte Constitucional Francesa que, julgando caso semelhante,
respeitaram a vontade soberana da Nação Francesa e disseram sem rodeios: “Não cabe ao
Conselho Constitucional substituir seu parecer pelo do legislador” (Décision n° 2010-92 QPC)”.
Além disso, dizer que o sexo do ser humano é um simples “plus”, além de invectivo a Deus, é
de uma insipiência absurda. Vossa excelência só é o que é, Ministro Ayres Britto, porque o sexo
dos seus pais foram ratio essendi de sua existência.
Felizmente no Congresso Nacional já há um movimento para sustar a grave
violação da competência legislativo-constitucional realizada pelo STF. Assim, o Deputado João
Campos do PSDB, junto com outros parlamentares, protocolou o Projeto de Decreto
Legislativo nº 224/2011 que “Susta a aplicação da decisão do STF (...)”, com base nos artigos
2º (independência dos poderes), 22 inciso I (competência privativa do Congresso Nacional para
legislar sobre Direito Civil) e 49, incisos V e XI da Constituição Federal que, assim, preceitua:
“Art. 49. É da Competência Exclusiva do Congresso Nacional: (...) V – Sustar os atos do Poder
Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites da delegação legislativa; (...) XI
– zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos
outros Poderes”. Se o Congresso Nacional assim o fizer e Sustar a inconstitucional e ilegítima
decisão do STF, a Democracia representativa brasileira sairá fortalecida.

Por fim, para a reflexão daqueles que acreditam que o Poder Legislativo é um
estorvo num Estado Democrático de Direito, deixo a seguinte citação do juiz inglês, Lord Devlin
(In “Chorley Lecture”, 1974), a propósito desta “antecipação de consenso legislativo” e desse
“ativismo autoritário” que imperam no nosso Poder Judiciário – a pretexto de “salvar o mundo
através do direito julgado”:

“É grande a tentação de reconhecer o judiciário como uma elite capaz de se


desviar dos trechos demasiadamente embaraçados da estrada do processo
democrático. Tratar-se-ia, contudo, de desviação só aparentemente provisória;
em realidade, seria ela a entrada de uma via incapaz de se reunir à estrada
principal, conduzindo inevitavelmente, por mais longo e tortuoso que seja o
caminho, ao estado totalitário.”

O STF não pode dispor sobre o Poder que sobre ele dispõe: a soberania popular.

Uziel Santana dos Santos


[Jurista e Professor da Universidade Federal de Sergipe.
http://www.uzielsantana.pro.br]

Artigo publicado no Jornal Correio de Sergipe em 29 de maio de 2011.

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