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  O presente artigo tem por objetivo analisar como as alianças estratégicas
contribuem para que as empresas obtenham vantagens competitivas sustentáveis ao longo do
tempo, além de discorrer sobre sua lógica de criação de valor. Inicialmente é apresentada uma
retrospectiva histórica que permeia a evolução do conceito de aliança até os dias atuais. Em
seguida, na secção 1, a questão da vantagem competitiva é discutida sob o enfoque da teoria
de Michael Porter. A secção 2, por sua vez, trata da criação de valor pelas alianças a partir da
concepção teórica de Yves Doz e Gary Hamel, professores, respectivamente, do @ 



      

 ± INSEAD ± e da    . Por fim,
apresenta-se na conclusão um resumo analítico das duas abordagens e seus aspectos
convergentes.

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Alianças estratégicas, vantagem competitiva, criação de valor.

 
 The objective of this article is to analyze how strategic alliances contribute for long
term sustainable competitive advantages for enterprises, besides broadly debating its logic and
value creation. Initially, historic background is presented from the alliance concept evolution
until nowadays. Following, in section 1, the competitive advantage issue is discussed using
Michael Porter¶s theory. In section 2, on the other hand, deals with the alliance value creation
concept from Yves Doz & Gary Hamel´s theoric background. They are respectively
professors of the European Institute of Business Administration (INSEAD) and the London
Business School. Finally, in the conclusion, an analytic resume about both approaches is
presented as well as its convergent aspects.

1
- Mestre em Administração de Empresas ± Professor da Faculdade 7 de Setembro ± luiz.oliveira@fa7.edu.br
ð

As pesquisas sobre redes inter-organizacionais ± aí incluídas as alianças estratégicas ±


são relativamente recentes. Esses arranjos organizacionais começaram a ser objeto de estudo a
partir de meados da década de 70, na Europa, e a partir da década de 80, nos Estados Unidos
(CRAVENS, PIERCY e SHIPP, 1996).
De acordo com CHANDLER (In: FAULKNER, 1995: 01), historicamente, pode-se
situar o fenômeno das alianças estratégicas a partir da terceira onda do processo de mudança
econômica do Ocidente, desde a Segunda Guerra Mundial, na década de 40.
A primeira onda, no pós-guerra, foi caracterizada pela rigidez organizacional herdada
do período da guerra e pelo protecionismo das economias saqueadas durante aquele período.
Na segunda onda, a partir dos anos 50, observa-se um substancial crescimento das
multinacionais e das organizações multi-divisionais, em que todos os processos
organizacionais (produção, vendas, distribuição) eram realizados internamente na empresa.
Essa fase caracterizou-se pelo crescimento da inflexibilidade, pela diminuição da velocidade
de resposta ao mercado e pela lentidão do fluxo de informações dentro das empresas.
A terceira onda ocorreu no final da década de 70 e durante os anos 80. Durante esse
período, houve um crescimento do número de empreendimentos financiados pelos fundos de
capital de risco e iniciou-se a onda de terceirização das atividades-meio das empresas. O
intenso crescimento das alianças estratégicas durante essa fase correspondeu ± pelo menos em
parte ± a uma resposta a essas mudanças do mercado.
O que se observou ao longo dessas décadas é que o mundo passou por um processo de
rápidas e drásticas mudanças, imprimindo uma dinamicidade jamais vista nas relações sócio-
econômicas de grupos sociais, empresas e países. No centro dessa turbulência está um fluxo
de novas tecnologias e mercados consumidores cada vez mais exigentes e diversificados em
suas necessidades e preferências e altamente competitivos (CRAVENS, PIERCY e SHIPP,
1996).
Essas tendências vieram exigir mudanças organizacionais radicais, forçando as
empresas e a sociedade a reverem seus paradigmas tradicionais. As empresas, em particular,
buscaram desenvolver novas formas organizacionais com o objetivo de se adaptar às ameaças
e oportunidades do novo macroambiente econômico.
Dentre as novas formas de organização empresarial, destacam-se as alianças
estratégicas. De fato, a partir do final da década de 80 e ao longo da década de 90, o tema das
alianças estratégicas emergiu com maior intensidade. Durante esse período, a aceleração do
processo de integração de mercados ± concretizado pela formação de blocos econômicos
como o Nafta, o Mercosul e o Mercado Comum Europeu ± motivou uma maior freqüência de
acordos de cooperação entre empresas dentro e fora dos territórios nacionais1.
Convém ressaltar que, no presente artigo, o conceito de aliança estratégica utilizado é
aquele proposto por DUSSAUGE e GARRETTE (1999, p. 03), para quem alianças
estratégicas são:

ligações formadas entre duas ± ou mais ± empresas independentes que optam por
executar conjuntamente um projeto ou atividade específica, coordenando as
habilidades e recursos necessários, ao invés de:
_? executar o projeto ou atividade por conta própria, assumindo todos os riscos e
enfrentando a concorrência sozinho;
_? fundir suas operações ou adquirir e se desfazer de unidades de negócios inteiras.

DUSSAUGE e GARRETTE (1999) afirmam que a principal característica de uma


aliança é a independência das empresas envolvidas na parceria. Para esses autores, as alianças
permitem às empresas unir forças para atingir um objetivo comum sem, contudo, abrir mão de
sua autonomia estratégica e de interesses específicos próprios. A figura que se segue
representa bem o esquema proposto pelos autores:

Figura 1: Representação esquemática de uma aliança.

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? Empresa ³A Empresa ³B
?
?
?
? Objetivos e interesses Aliança Objetivos e interesses
específicos de ³A específicos de ³B
?
?
Objetivos comuns limitados
?
Fonte: DUSSAUGE e GARRETTE (1999, p. 03)

Partindo dessa premissa, o artigo em questão apresenta a estrutura que se segue. Na


seção 1, a questão da vantagem competitiva é discutida sob o enfoque da teoria de Michael
Porter, professor da Universidade de Harvard, e uma das maiores autoridades mundiais sobre
estratégia e competitividade de empresas e países. A seção 2, por sua vez, trata da criação de
valor pelas alianças a partir da concepção teórica de Yves Doz e Gary Hamel, professores,
respectivamente, do @ 


    

 ± INSEAD ± e da 
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A teoria desenvolvida por PORTER (1986, 1990) se reporta à análise dos padrões de
concorrência empresarial e às estratégias adotadas pelas empresas para atuação no mercado e
para obtenção de vantagem competitiva. Para PORTER (1986), a estrutura industrial é
regulada por cinco forças competitivas, a saber: ameaça dos fornecedores, ameaça dos
compradores, grau de rivalidade dos concorrentes existentes, ameaça dos concorrentes
potenciais e dos produtos substitutos.
Os % podem influenciar uma indústria3 na medida em que detenham poder
de negociação suficiente para, através de uma elevação no nível de preços ou redução da
qualidade dos bens e serviços fornecidos, afetar negativamente a rentabilidade da referida
indústria. As condições que determinam o poder de pressão de um grupo de fornecedores são
o grau de concentração e oligopolização, presença ou não de produtos substitutos na venda
para a indústria, grau de importância do produto fornecido para o negócio do comprador; grau
de diferenciação ou de custos de mudança dos produtos fornecidos, e ameaça de integração
para frente por parte dos fornecedores.
Os  
, por sua vez, exercem pressão sobre a indústria ao forçar uma redução
dos preços, ao exigir melhor qualidade e ao instigar os concorrentes uns contra os outros.
Entretanto, o poder de um grupo de compradores depende diretamente do grau de
concentração ou do volume adquirido em relação às vendas do vendedor, da facilidade de
troca de fornecedor, da ameaça de integração para trás por parte dos compradores, do grau de
conhecimento das condições de mercado por parte dos compradores e do baixo nível de
influência do produto da indústria na qualidade dos produtos ou serviços do comprador.
Os  & alteram a estrutura industrial ao competirem por uma
posição mais privilegiada no mercado. A rivalidade é tanto maior quanto seja a percepção que
os concorrentes têm sobre a oportunidade de melhorar a sua posição. O grau de rivalidade da
concorrência existente está diretamente relacionado com a quantidade de concorrentes, com
custos fixos ou de armazenamento altos; com barreiras de saída elevadas e com a ausência de
diferenciação ou custos de mudança.
Os 
 modificam a estrutura industrial porque, ao tentar entrar no
mercado, podem forçar uma redução dos preços ou um aumento dos custos dos participantes.
Segundo PORTER (1986, p. 25), ³a ameaça de entrada em uma indústria depende das
‘    
 existentes, em conjunto com a  que o novo concorrente pode
esperar por parte dos concorrentes já existentes. Assim, barreiras altas implicam uma intensa
retaliação por parte dos concorrentes estabelecidos.
Os   , por sua vez, influenciam a indústria oferecendoo uma
alternativa de preço-desempenho capaz de afetar o nível de lucratividade das empresas
participantes. Assim, ³quanto mais atrativa a alternativa de preço-desempenho oferecida pelos
produtos substitutos, mais firme será a pressão sobre os lucros da indústria. (PORTER, 1986,
p. 39).
Ao lidar com as cinco forças competitivas, uma empresa pode escolher entre três
estratégias genéricas: 

 , %
 e %'.
Ao adotar a estratégia de liderança em custo, a empresa objetiva minimizar seus custos,
seja através do aumento substancial da escala de produção, seja por meio de um forte controle
de custos e despesas gerais ou mesmo através da redução de custos em áreas como P&D,
assistência, força de vendas, publicidade.
A estratégia de diferenciação, por sua vez, visa ³...diferenciar o produto ou o serviço
oferecido pela empresa, criando algo que seja considerado único ao âmbito de toda a
indústria. (PORTER, 1986, p. 51). Assim, as fontes de diferenciação para uma empresa e
seus produtos e serviços podem ser a marca, a tecnologia empregada, os serviços
personalizados, a rede de fornecedores.
Com a estratégia de enfoque a empresa opta por atuar em um ambiente competitivo
estreito dentro de uma indústria, como um segmento específico de clientes ou um
determinado mercado geográfico, por exemplo. Ao fazê-lo, a empresa pode adotar um
enfoque nos custos ou na diferenciação.
É importante ressaltar que, para PORTER (2000, p. 24), as coalizões (alianças) entre
empresas ± antes de serem estratégias competitivas  ± são, na verdade, ³boas
ferramentas para ajudar a empresa a defini-las. Ademais, PORTER (1990, p. 51) argumenta
que as ³inter-relações entre unidades empresariais podem ter uma influência poderosa sobre a
vantagem competitiva, reduzindo o custo ou acentuando a diferenciação.
Diante das estratégias acima mencionadas e da visão que tem sobre as alianças,
PORTER (1990, p. 52) considera que:

As coalizões podem permitir o compartilhamento de atividades sem a necessidade


de entrar em novos segmentos de indústria, áreas geográficas ou indústrias
relacionadas. As coalizões também são um meio de se obter as vantagens de custo
ou de diferenciação dos elos verticais, sem uma verdadeira integração, mas
superando as dificuldades da coordenação entre empresas puramente independentes.

É bem verdade que esse autor aborda o tema das alianças estratégicas sob a ótica da
inter-relação entre unidades empresariais controladas por um mesmo grupo empresarial,
sejam elas pertencentes a uma mesma indústria ou a indústrias relacionadas. Entretanto, é
possível ± sem prejuízo de inconsistência teórica ± extrapolar essa abordagem para as inter-
relações entre empresas independentes entre si que atuam em uma determinada indústria ou
em indústrias relacionadas4. Portanto, a análise que se segue destaca os conceitos centrais da
teoria de PORTER (1986, 1990) e os relaciona com a realização de alianças como forma de se
criar uma vantagem competitiva para as empresas envolvidas nesses tipos de arranjo
organizacional.
Segundo PORTER (1990, p. 52), ³as coalizões são acordos de longo prazo entre
empresas que extrapolam transações de mercado normais, mas que não chegam a ser fusões
totais. Sob essa ótica, o autor considera coalizões as licenças de tecnologia, acordos de
fornecimento, acordos de 
 e sociedades em cota de participação, por exemplo.
PORTER (1990) observa que as coalizões se prestam bem à ampliação do  

 
5 sem que haja necessidade de ampliar ± concretamente ± sua presença no mercado.
Assim, são considerados pelo autor dois tipos de coalizões: as coalizões verticais e as
coalizões horizontais. Como exemplos desses dois tipos básicos de coalizões têm-se,
respectivamente, um acordo de fornecimento e uma parceria com outra empresa da mesma
indústria para realização de 
 conjunto.

Para entender-se como as alianças estratégicas se inserem na Teoria da Vantagem


Competitiva de PORTER (1990), é necessário, antes, apreender-se o conceito de 

 

 proposto por esse autor. Tal conceito considera que uma empresa pode ser desagregada
em suas atividades de relevância estratégica de forma que seja possível compreenderem-se o
comportamento dos custos ± e suas fontes ± e os potenciais de diferenciação. Assim, a
empresa obtém vantagem competitiva ao executar estas atividades estrategicamente
importantes com o menor custo possível, ou melhor, com os custos menores do que a
concorrência. A cadeia de valor pode ser mais bem visualizada pela figura a seguir:

Figura 2: A cadeia de valor genérica


?
?

? Infra-estrutura da empresa
ATIVIDADES DE

MARGEM
? Gerência de recursos humanos
APOIO

? Desenvolvimento de tecnologia

Aquisição
?

MARGEM
Logística Operações Logística Marketing Serviços
? Interna Externa & Vendas
?

ATIVIDADES PRIMÁRIAS

Fonte: PORTER (1990, p. 35)


?
Agregar valor a um produto, portanto, implica executar uma ou mais atividades ±
primárias e/ou de apoio ± a um custo menor ou de uma forma melhor que os concorrentes.
Dada a complexidade cada vez maior das inter-relações econômicas em um contexto de
mercado hipercompetitivo, é pouco provável que uma empresa detenha competência
suficiente para dominar todas as atividades da cadeia de valor. Assim, as alianças estratégicas
se prestam muito bem ao objetivo de se compensar as lacunas de competência que a empresa
apresente ao longo de sua cadeia de valor, através do compartilhamento de atividades com
outras empresas que agreguem maior valor ao seu produto.
A Figura 3, que se segue, divide as formas de compartilhamento das atividades de valor
em cinco categorias de inter-relações empresariais: produção, mercado, aquisição, tecnologia
e infra-estrutura.
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Aquisição . Insumos adquiridos . Aquisição conjunta

. Tecnologia comum dos produtos . Desenvolvimento conjunto de

. Tecnologia comum dos processos tecnologia

. Tecnologia comum em outras . Projeto de interface conjunto


Tecnologia
atividades de valor
. Um produto incorporado a outro

. Interface entre produtos

. Necessidades comuns de infra- . Levantamento compartilhado de capital


estrutura da empresa (financiamento)
. Capital comum . Contabilidade compartilhada
. Assessoria jurídica compartilhada
Infra-estrutura
. Relações com o governo
compartilhadas
. Contratação e treinamento
compartilhados

. Localização comum de matérias- . Logística interna compartilhada


primas . Atividades indiretas de produção
Produção
. Necessidades comuns de suporte de compartilhadas
fábrica

. Comprador comum . Marca registrada compartilhada


. Canal de compras comum . Venda cruzada de produtos

. Mercado geográfico comum . Pacote de vendas


Mercado
. Departamento de 

compartilhado

. Rede compartilhada de serviço/suporte

Fonte: Adaptado de PORTER (1990 pp. 310, 311)


Dadas as diversas formas possíveis de cooperação, PORTER (1990) ressalta que o
compartilhamento de uma atividade de valor resultará em vantagem competitiva para a
empresa na medida em que essa atividade representa uma fração importante dos custos
operacionais e os mesmos possam ser reduzidos através do compartilhamento. Da mesma
maneira, o compartilhamento de uma atividade que contribui para a diferenciação resultará
em vantagem competitiva desde que aumente a singularidade desta atividade ou reduza o
custo de ser singular.
Em síntese, é razoável afirmar-se que a utilização das alianças como meio de obtenção
de vantagem competitiva implica dois processos fundamentais: a desintegração e a
reconfiguração da cadeia de valor (YOSHINO e RANGAN: 1996). O primeiro processo ±
desintegração ± consiste na desagregação e avaliação das atividades de valor da empresa com
objetivo de se determinarem aquelas que podem ser parcialmente ou totalmente atribuídas a
outras empresas. O segundo processo ± reconfiguração ± diz respeito à reestruturação da
cadeia de valor da empresa de modo que algumas atividades de valor fiquem totalmente ou
parcialmente sob responsabilidade de outras empresas, enquanto outras atividades são
limitadas à empresa.



 
 
  
  
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Segundo DOZ e HAMEL (1998), a competição empresarial moderna se desenvolve em


duas direções. A primeira direção está fundada na desregulamentação dos mercados e na
integração econômica de países e regiões e confronta empresas locais com empresas
estrangeiras na mesma arena. A segunda deriva do surgimento de novas tecnologias que
alteram e reconfiguram completamente as indústrias estabelecidas. Ambas as direções
demandam das empresas o desenvolvimento de capacidades e infra-estrutura em ciclos
temporais cada vez mais breves.
Diante desse cenário, as alianças estratégicas representam uma possibilidade concreta
de reposicionamento competitivo das empresas e, neste sentido, podem assumir três
propósitos básicos, a saber: a 
, a  

 e a

  


 (DOZ e HAMEL, 1998 pp. 04, 05).
A cooptação através da aliança estratégica ± como o próprio termo revela ± tem por
objetivo transformar concorrentes atuais e potenciais concorrentes em aliados e,
eventualmente, em fornecedores estratégicos de insumos e competências complementares
para o desenvolvimento de um novo negócio. Ressalte-se, aqui, que o termo µcooptação¶ não
encerra em si nenhuma conotação pejorativa. Pelo contrário, indica que, ao incorporar-se um
concorrente na aliança, sua ameaça pode ser neutralizada e até mesmo seus insumos e
serviços podem ser utilizados para agregar valor à aliança.
A co-especialização, por sua vez, permite às empresas aliadas criar valor por meio da
combinação de recursos e competências diferenciados que cada uma possui. A importância da
co-especialização cresce na proporção em que os negócios se tornam mais complexos e as
empresas se vêem mais focadas em poucas competências essenciais.
Finalmente, as alianças estratégicas podem funcionar como um canal de aprendizagem e
internalização de novas competências, principalmente aquelas de caráter tácito e, portanto,
difíceis de obter. Mais que isso, o conhecimento apreendido no interior da aliança pode ser
alavancado em outros negócios externos a ela mesma.
A lógica de criação de valor através das alianças repousa exatamente na realização
desses propósitos, não importando se na perspectiva de uma competição global ou de
reconfiguração radical das indústrias estabelecidas, conforme discutido anteriormente.
Para DOZ e HAMEL (1998, p. 35), as empresas que decidem por aproveitar as
oportunidades oferecidas pela µglobalização¶ da competição carecem, via de regra, de massa
crítica, conhecimento dos mercados em que pretendem atuar e/ou de competências que,
geralmente, estão fora do seu escopo de atuação. Além disso, a reestruturação dos mercados e
a emergência de novas indústrias exigem que as empresas mais competitivas assumam
posições de comando, criem novas oportunidades e/ou adquiram novas competências. Cada
uma dessas demandas corresponde a uma oportunidade de criação de valor para as empresas e
as alianças podem vir a ser a estratégia adequada para tal.
A conjugação dos propósitos básicos das alianças com as demandas competitivas que se
apresentam às empresas, discutidas acima, permite a construção não apenas de uma, mas de
três lógicas que sublinham a criação de valor, a saber (DOZ e HAMEL, 1998, p. 37):

1.? Obtenção de capacidades competitivas através da cooptação;


2.? Alavancagem de recursos co-especializados;
3.? Obtenção de competência através da aprendizagem internalizada.
A Figura 4, que se segue, ilustra as três lógicas de criação de valor a partir das
demandas competitivas estabelecidas pela µglobalização¶ e pelas novas tecnologias:

Figura 4: As lógicas de criação de valor através de alianças

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?
?
Construindo
? Alcançando novos Preenchendo lacunas de
massa crítica mercados habilidades
?
?
Obtendo
? força Obtendo competência
competitiva através da Alavancando recursos através da aprendizagem
co-especializados
?
cooptação internalizada

?
?
Construindo posições de Criando novas Construindo
comando
? em coalizões oportunidades novas
competências
?
?
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?
Fonte: DOZ e HAMEL (1998 p. 36)

Cabe destacar, aqui, alguns pontos que permitem compreender melhor as três lógicas de
criação de valor através das alianças.
A 
 desempenha dois importantes papéis de acordo com o contexto em que se
desenrola a competição empresarial. Na perspectiva da competição global, a cooptação vem a
ser uma estratégia de criação de massa crítica, tão necessária àquelas empresas que se
pretendam competidores de classe mundial. À medida que a competição empresarial sai do
âmbito regional e passa a ter um caráter mundial, o número de concorrentes se torna muito
maior, o que demanda uma certa estrutura de recursos humanos, físicos e financeiros para
enfrentá-los (DOZ e HAMEL, 1998, p. 39).
Por outro lado, diante de um cenário de criação de novos mercados intensivos em
tecnologia, a cooptação se torna fundamental na construção de posições de liderança nesses
mercados, através de coalizões competitivas, principalmente naquelas indústrias onde
vigoram altos índices de padronização tecnológica. Em indústrias dessa natureza, uma rede de
aliados permite a criação de sólidas vantagens competitivas para aquelas empresas que se
posicionam primeiro frente ao mercado. A construção de uma posição de liderança no
mercado implica, no mais das vezes, (DOZ e HAMEL, 1998, p. 40):

1.? explorar novas oportunidades e aglutinar recursos de natureza tão diferenciada que uma
empresa sozinha não poderia fazê-lo;
2.? cooptar empresas concorrentes e empresas complementares, de maneira que possam
contribuir com suas competências e recursos, além de ser uma forma de evitar que elas
integrem uma coalizão rival;
3.? assumir, rapidamente, uma posição de liderança na aliança, principalmente quando a
vantagem competitiva das empresas que se posicionam rápido é significativa.

Em suma, nas indústrias mais intensivas em tecnologia, as alianças criam valor ao


mesmo tempo que permitem às empresas envolvidas estabelecer, mais rapidamente, os
padrões técnicos do mercado, além de favorecê-las na obtenção de lucros acima da média e na
ampliação de sua influência, para além do seu tamanho e dos seus recursos.
A criação de valor através da  

 também pode ser analisada a partir dos
contextos de competição global e de novos mercados baseados em tecnologia. Com efeito, as
empresas que se lançam no mercado mundial precisam de parceiros locais para ganhar acesso
a novos mercados geográficos, ao mesmo tempo em que identificam nos parceiros globais as
competências complementares de que necessitam para competir em mercados
tecnologicamente complexos (DOZ e HAMEL, 1998, p. 45).
Para entrar em novos mercados geográficos, as empresas globais freqüentemente
recorrem às alianças com empresas locais, pois seus recursos raramente são suficientes para
permitir uma rápida expansão em mercados desconhecidos. Nada obstante, o relacionamento
entre os parceiros locais e globais apresenta um delicado equilíbrio. De um lado, a empresa
estrangeira contribui para a aliança com recursos financeiros e habilidades especializadas. De
outro, a empresa local oferece seu conhecimento sobre o mercado interno e as competências
necessárias para eliminar as barreiras à entrada. Segundo DOZ e HAMEL (1998, p. 47, 48),
este equilíbrio é afetado, por exemplo, quando a empresa estrangeira esteja familiarizada com
o novo ambiente competitivo e adquira uma certa autoconfiança, a ponto de prescindir cada
vez mais da empresa local. Por certo, outros fatores influenciam o equilíbrio das alianças,
principalmente aqueles relativos às características do mercado e à natureza dos produtos
envolvidos.
De acordo com DOZ e HAMEL (1998, p. 48), as indústrias emergentes se caracterizam
pela complexidade de seus produtos. No entanto, as empresas modernas freqüentemente
estabelecem suas estratégias focadas em algumas poucas competências essenciais6. A
especialização cada vez maior das empresas vem reforçar ainda mais a necessidade de
complementaridade de habilidades através de coalizões competitivas. Assim, as alianças
estratégicas permitem a composição de competências específicas de cada empresa,
desenvolvidas, inclusive, a partir de diferentes áreas do conhecimento e já testadas em
diversas outras experiências anteriores.
Por fim, DOZ e HAMEL discutem a criação de valor através da

  


. Para esses autores, as empresas recorrem com freqüência às alianças para
aprender e internalizar novas habilidades e tecnologias porque este tipo de solução se revela
mais adequado do que outras alternativas, como o desenvolvimento interno ± por ser
demorado e incerto e a aquisição ± pela dificuldade de transferência da tecnologia.
Conforme explicitado anteriormente, a competição em escala mundial expõe as
empresas locais a concorrentes com habilidades e tecnologias mais desenvolvidas. A menos
que essas lacunas tecnológicas e de habilidades sejam preenchidas rapidamente, as empresas
mais frágeis não resistirão por muito tempo, até mesmo porque as empresas mais competitivas
estão continuamente desenvolvendo e aperfeiçoando novas habilidades (DOZ e HAMEL,
1998: 52). Entretanto, se, por um lado, a competição global ameaça as empresas de fraca
competitividade, por outro, oferece às mesmas a oportunidade de aprender e internalizar as
melhores tecnologias e competências disponíveis em todo o mundo, e as alianças podem ser a
estratégia mais indicada para acessá-las.
Enfim, há de se destacar ± e reforçar ± que o processo de criação de valor através das
alianças estratégicas, sob o enfoque de Doz e Hamel, encerra um caráter dualista, a saber: ao
mesmo tempo em que a empresa contribui para a aliança com suas habilidades e recursos, ela
extrai de seus parceiros as habilidades e recursos de que necessita. Com efeito, o caráter dual
das alianças é expresso muito bem pelo termo 

, uma vez que este é um
relacionamento do tipo µtoma lá, dá cá¶, ou ainda, como afirmam DOZ e HAMEL (1998, p.
55), ³vencer através das alianças é, em um grau significativo, vencer dentro das alianças.


Porter representa a escola norte-americana de administração de negócios, portanto,


fundamentada em valores culturais notadamente idiossincráticos, individualistas e
independentes, representados muito bem pelo arquétipo do  . Apesar disso, esse
traço da cultura de negócios dos EUA, aos poucos, vem assumindo outros contornos,
conforme LIPNACK (1994, p. 29) destaca:
?
Oriente e ocidente estão se movendo para formar redes de organizações a partir de
direções diferentes. No oriente, o grupo como um todo tem historicamente sido
considerado mais importante do que cada um dos seus participantes individuais. No
ocidente, damos mais ênfase ao indivíduo do que ao grupo como um todo. Portanto,
nos EUA, encontramo-nos explicando

como meio de desenvolver uma
organização mais cooperativa e grupo-orientada, sem diminuição da importância
individual dos seus participantes. Enfatizamos a importância de fatores grupais
como cooperação e planejamento na busca de um equilíbrio com as tendências
culturais para o individualismo.

Com efeito, a análise que se delineia, aqui, sobre a obtenção de vantagem competitiva a
partir das alianças estratégicas, representa uma extrapolação da teoria de Porter sobre as inter-
relações entre unidades empresariais corporativas7 (PORTER, 1990), uma vez que o ele não
aborda diretamente a questão das alianças estratégicas entre empresas independentes ±
provavelmente devido à cultura individualista do empresariado norte-americano, o qual, em
última instância, constitui o objeto de estudo desse autor. Entretanto, sua análise de alianças
estratégicas no âmbito dos 
  de negócios das grandes corporações é bastante
representativa da importância desta ferramenta gerencial para a competitividade empresarial.

Em contraponto, o enfoque da criação de valor através das alianças estratégicas,


oferecido por Doz e Hamel, tem raízes na escola européia de administração, a qual privilegia
sobremaneira as teorias de estratégias relacionais e de interdependência empresarial8.
LIPNACK (1994, p. 30) registra que

A Europa abriga a ênfase da civilização ocidental no indivíduo, mas não chega aos
extremos dos EUA. A coordenação da Europa freqüentemente vem de cima para
baixo, de uma multiplicidade de nações, principados, cidades-estados e grupos
étnicos, todos de pequenas proporções. A Comunidade Econômica Européia
constitui um dos grandes experimentos do planeta em termos de rede planejada para
beneficiar todos os seus participantes, nacionais e individuais. No tocante a
empresas de pequeno porte, a Europa apresenta lições de redes empresariais
flexíveis; para empresas de grande porte, exemplos como o dos mercados internos
da ABB constituem avançadas inovações administrativas.

A abordagem de Doz e Hamel se fundamenta, portanto, no conceito de 



 , ou
seja, na conjugação de aspectos de cooperação e de competição que caracterizam a dinâmica
entre independência e interdependência empresarial.

As duas abordagens, no entanto, convergem no sentido de dotar as organizações de


ferramentas de gestão estratégica que as possibilitem adquirir uma competitividade
sustentável de longo prazo e, assim, vencer a corrida pelo mercado e pelo futuro.

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1
Entre 1987 e 1992, mais de 20 mil alianças estratégicas foram formadas, comparadas com cerca de 5 mil, no
período de 1980 a 1986 e 750 durante a década de 70 (Palestra do Sr. Henrique Neves, Vice ± Presidente da
Shell Brasil, no CONARH-97);
2
Respectivamente, Instituto Europeu de Administração de Empresas e Escola de Administração de Londres;
3
PORTER (1986: 24) define uma indústria como ³... o grupo de empresas fabricantes de produtos que são
substitutos bastante aproximados ente si.;
4
Esta extrapolação teórica é feita pelo próprio PORTER (1985) em seu livro ³ 

 O‘

  , onde ele aborda as alianças formadas por empresas multinacionais sob a ótica da estratégia global;
5
Por escopo da empresa entenda-se o limite entre as atividad es que uma empresa executa internamente e as que
ela obtém em transações de mercado (PORTER, 1990: 56);
6
³Uma competência essencial é um conjunto de habilidades e tecnologias que permitem a uma empresa oferecer
um determinado benefício aos clientes. (HAMEL, 1995: 299);
7
Por µunidades empresariais corporativas¶ entendam-se aquelas empresas pertencentes a um mesmo grupo
empresarial ou  ;
8
Um detalhamento das estratégias relacionais pode ser encontrado no livro ³Strategor: strategie, structure,
décision, identité. Politique générale d¶entreprise, por InterEditions, Paris, 1988;
9
O termo 

 deriva da contração das palavras 
 (cooperação) e 

 (competição).

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