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Editora da FECILCAM
Diretora - Ana Paula Colavite
Vice-diretora - Dalva Helena de Medeiros
Coordenadora Geral - Rosangela Maria Pontili
Coordenador Consultivo- Edson Noriyuki Yokoo
Conselho Editorial
Presidente - Ana Paula Colavite
Cristina Satiê de Oliveira Pátaro
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Editora da FECILCAM
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(44) 3518-1838
www.fecilcam.br/editora/
WILLIAN BELINE
NIELCE MENEGUELO LOBO DA COSTA
(Orgs)
Editora da FECILCAM
2010
Copyleft © 2010. É permitida, com autorização dos organizadores
Willian Beline e Nielce Meneguelo Lobo da Costa, a reprodução parcial
ou total desta obra e sua difusão por todos os meios eletrônicos para uso
pessoal do leitor, desde que não tenha fins comerciais.
Arte de Capa
Alemão
(alemaogod@hotmail.com)
Diagramação
Fernando Árthur de Medeiros Machado
(fernando_amm@hotmail.com)
Editoração e composição
Editora da FECILCAM
Revisão
Célio Escher
celiorevisor@gmail.com
Vários Autores.
ISBN 978-85-88753-09-9
CDD 370.71
Educação Matemática, Tecnologia e Formação de Professores: algumas
reflexões
Autores
Organizadores
Willian Beline
Nielce Meneguelo Lobo da Costa
In Memorian
11 Prefácio
Maria Tereza Carneiro Soares
23 Apresentação
Nielce M. Lobo da Costa, Willian Beline e Suely Scherer
1
mariteufpr@gmail.com
12 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, TECNOLOGIA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
2
Universidade Federal do Paraná
14 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, TECNOLOGIA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
3
Pesquisa desenvolvida com alunos da Dinamarca na faixa etária de 14 e 15 anos,
16 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, TECNOLOGIA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES
em pediam aos alunos que fizessem uma família imaginária e depois distribuir uma
quantia entre elas.
Prefácio 17
4
Formação
5
Questionário
Prefácio 19
Referências
Este livro...
Esta obra tem uma história peculiar: ela germinou a partir de uma
iniciativa da Profa. Ivonélia Crescêncio da Purificação (in memorian), que sonhou
lançar, pela Editora da Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD),
um livro envolvendo o tema Formação de Professores em Matemática e o Uso
de Tecnologias.
Recém-chegada ao Departamento de Matemática da UFGD, com sua
característica vitalidade, começou a unir algumas pessoas, convidando-as e
“encomendando” artigos, os capítulos deste livro, em 2007.
Infelizmente, um acidente automobilístico no dia 7 de março de 2008
ceifou precocemente a vida da Profa. Ivonélia e dos professores Chateaubriand,
Ronaldo e Renato, todos da UFGD. Ao recebermos essa notícia entramos
em choque, ficamos abalados, pois pensávamos: “tão cedo e todos tendo tanto
a contribuir em diferentes espaços da sociedade”. A partir de então coube a
nós, Beline e Nielce, continuarmos o trabalho de organização iniciado pela
professora Ivonélia. Essa nossa empreitada foi então aceita por todos os autores
anteriormente convidados para participarem do livro.
Este livro também fez, porém, parte de outras histórias, planos e
encontros...
Outras histórias, planos e encontros...
Abraços,
Capítulo 1
PROFESSORES DE MATEMÁTICA E AS
TECNOLOGIAS: MEDO E SEDUÇÃO
Ivonélia da Purificação1
Universidade Federal da Grande Dourados
Tatiani Garcia Neves2
Universidade Federal da Grande Dourados
Glaucia da Silva Brito3
Universidade Federal do Paraná
Resumo
Neste artigo descrevemos uma primeira etapa de uma pesquisa realizada com
professores de matemática da Rede Municipal de Ensino da região de Dourados MS.
Apresentamos reflexões de um caminho investigativo sobre as tecnologias na educação
e na educação matemática, resgatando argumentos que considera a formação de
professores de matemática para o uso das novas tecnologias como instrumento valioso
na transformação da sociedade. Destacamos a formação continuada realizada pelos
professores ao longo de seu desenvolvimento profissional, bem como a exploração e
o uso das tecnologias como ferramenta para o processo de ensino-aprendizagem. De
um modo geral, observamos nas etapas de realização desta pesquisa, que os professores
olham com receio o uso das tecnologias na educação não sentindo-se preparados para
utilizá-las com seus alunos.
1
In memorian
2
gntatiani@yahoo.com.br
3
glaucia@ufpr.br
32 I. Purificação, t. g. nEVES e G. S. BRITO
Sociedade Tecnologizada4
4
Utilizamos este termo no sentindo que traz Bazin (1998), quando afirma que
uma sociedade poderá ser tecnologizada, mesmo sem a tecnologia fazer parte da
cultura das pessoas, pois podemos utilizar os mais diversos produtos da tecnologia,
sem que para isso tenhamos ou compreendamos o funcionamento dos mesmos
produtos.
Professores de Matemática e as Novas Tecnologias: medo e sedução 33
Ano Ações
A Secretaria Especial de Informática (SEI) efetuou uma proposta
1979 para os setores educacional, agrícola, da saúde e industrial, visando à
viabilização de recursos computacionais em suas atividades.
A SEI criou uma Comissão Especial de Educação para colher subsí-
1980 dios, visando gerar normas e diretrizes para a área de informática na
educação.
Trajetória da Investigação
5
Vale destacar que, em todo o território brasileiro, a política de colocar compu-
tadores nas escolas e a de formação de professores via Núcleo de Tecnologias
Educacionais (NTE) também se configura neste Estado da União.
42 I. Purificação, t. g. nEVES e G. S. BRITO
continuada nos NTEs; verificar como esses professores fazem uso dos recursos
informatizados no contexto escolar; identificar as facilidades e dificuldades para
essa inserção, bem como, os objetos matemáticos selecionados por eles para
fazer uso do recurso da informática; reconhecer que relações são estabelecidas
com as experiências ocorridas durante a formação inicial e continuada.
Neste trabalho buscamos identificar, descrever e analisar as respostas
dadas por 43 professores de Matemática do Ensino Fundamental de uma cidade
do Mato Grosso do Sul, a um questionário de 35 perguntas, com questões
abertas e fechadas e uma conversa em grupo, quanto ao uso das tecnologias
no processo educacional. A pesquisa foi divida em fases para coleta dos dados:
a) conversação com os participantes; b) aplicação de um questionário; c)
tabulação e análise do questionário; d) retorno ao grupo para apresentação
dos dados e discussão sobre os mesmos dados; e) seleção dos professores que
participaram de uma capacitação no NTE para continuidade da pesquisa; f)
entrevista com esses professores; g) observação da prática desses professores
com o uso da informática; h) discussão sobre a prática com os professores. Os
dados e as discussões aqui apresentadas referem-se às fases a, b, c, d, e.
que possuem limitações quanto ao uso das tecnologias, porém, quando tentam
utilizá-las, a sedução pela nova ferramenta posta em suas mãos faz com que os
medos demonstrados anteriormente sejam superados e que busquem formação
face a esse novo modelo didático de ensino.
Uma das questões solicitadas aos professores foi: -- Sua escola tem
uma proposta pedagógica claramente definida? Você poderia explicar essa
proposta?
14%
Sim - a proposta esta
42% sendo reformulada
Não - sem justificativa
Não respondeu
44%
escolas possuem uma fragilidade de formação nesse campo. Apenas 47% dos
entrevistados já tiveram algum tipo de formação para o uso da informática na
escola, no entanto não exploramos que tipo de cursos foram esses.
5%
2%
16%
30%
Vídeo
Retroprojetor
TV
Computador
28% DVD
24%
Professores de Matemática e as Novas Tecnologias: medo e sedução 45
Quanto a essa resposta, podemos nos perguntar se, de fato, são utili-
zados esses recursos na sala de aula com o aluno, observado antes a falta de
formação frente ao uso da informática ou se essas ferramentas servem apenas
como um disfarce frente às exigências ora impostas pelo diretor em executar
projetos com os alunos fazendo uso das mesmas ferramentas.
Segundo Brito e Purificação (2008), para que as tecnologias não se
constituam apenas em uma novidade e não se prestem ao disfarce dos reais
problemas existentes, julgam conveniente que os professores compreendam
e aceitem que, atualmente, as mudanças nos proporcionam os instrumentos
necessários para respondermos à exigência quantitativa e qualitativa de
educação que ela mesma provoca. O que precisamos saber é como reconhecer
essas tecnologias e adaptá-las às nossas finalidades educacionais.
É possível que, dessa maneira, o professor, ao reconhecer o verdadeiro
significado da utilização de uma ferramenta tecnológica, ele quebre o para-
digma existente em seu interior de que é preciso obter status perante os seus
colegas e adquira uma formação para o uso adequado das novas tecnologias
em sua didática de ensino.
Vamos nos limitar à solicitada resposta da questão seguinte: -- Você
usa recursos tecnológicos normalmente em suas aulas? Se sim, quais?
2%
42% Sim
Não
56% Não respondeu
46 I. Purificação, t. g. nEVES e G. S. BRITO
28% TV e Vídeo
44%
Computador
Retroprojetor
6%
Não respondeu
22%
se, no entanto, que uma grande parcela dos entrevistados não conhece alguns
softwares educacionais básicos para o ensino de algumas disciplinas, conforme
tomemos, por exemplo, a disciplina de Matemática a ser focada na questão
seguinte.
Parece relevante ressaltar, neste momento, o que seria um software
educacional. Para Brito e Purificação (2008), um software é considerado
educacional quando é desenvolvido para atender aos objetivos educacionais
preestabelecidos, sendo que a qualidade técnica se subordina às determina-
ções de ordem pedagógica que orientam seu desenvolvimento. Assim, talvez
possamos definir com um pouco de clareza um software como sendo um
programa educacional capaz de levar ao professor e aos alunos uma nova
maneira de compreender os conteúdos, voltado para o desenvolvimento da
proposta curricular.
Entretanto, pode-se pensar que um software é um programa. Assim,
é provável que, em todos os micros nas salas de informática, os programas
comerciais que já existem em grande quantidade (processadores de textos,
gerenciadores de banco de dados, planilhas eletrônicas, etc.), talvez sejam os
mais utilizados, uma vez que eles se encontram instalados em todas as máquinas.
Ocorre, porém, que, ao solicitarmos a resposta da questão seguinte: -- Quais
são os softwares que são usados nos laboratórios de informática?, obtivemos os
dados seguintes:
2%
Cabri, Pow er Point
10% 2%
2% Cabri, Excel
Matemática
12% especificamente
5% geometria
Matemática
Não respondeu
83%
40 37
35
30
25
20
15
10 6
5
0
Sim - limitações: poucos computadores, Não respondeu
programas em língua inglesa e tempo de
uso restrito.
Todos os
9% 5% conteúdos
Geometria
5%
16%
Sim, sem justif icativa
Não, sem justif icativa
Não respondeu
79%
Não respondeu
Não respondeu
Professores de Matemática e as Novas Tecnologias: medo e sedução 53
7% 2%
2 anos
3 anos
não utiliza
91%
Considerações Finais
Referências
Capítulo 2
Resumo
O objetivo deste texto é trazer à formação de professores uma discussão que possa
apresentar subsídios para a disciplina que lida com a tecnologia ou para as atividades
em que ela está envolvida nos cursos de licenciatura. Faz parte de uma reflexão feita
durante pesquisa que tem como foco a formação de professores mediada pela tecnologia.
Essa reflexão tem oportunizado encontrar uma diversidade de elementos que estão
presentes na relação da tecnologia com a sociedade, que intervêm e interferem nas
ações educacionais. A pesquisa tem apresentado subsídios para perceber que o desen-
volvimento tecnológico tem forte participação na sociedade, interferindo em todas as
atividades profissionais no que diz respeito às ecologias ambiental, social, da subjetivi-
dade humana (mental) e cognitiva. Essa percepção se faz necessária para a organização
do trabalho pedagógico no que diz respeito à educação e ao conhecimento.
1
As ideias deste texto foram apresentadas numa comunicação oral no VIII Peda-
gogia em Debate e III Colóquio Nacional de Formação de Professores, realizado
pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), de 3 a 5 de setembro de 2008.
2
E-mail: rocha_karlo@yahoo.com.br ou carlos.rocha@utp.br
60 C. A. ROCHA
1. Introdução
A escola única com qualidade igual para todos não era necessária,
pois na primeira etapa do processo de industrialização foi possível
a países como o nosso estabelecer um parque industrial razoável
contando com uma base estreita de mão-de-obra qualificada,
somada a um contingente enorme de trabalhadores pouco educados
e mal preparados para enfrentar desafios mais complexos. (SILVA
FILHO, 2001, p. 87).
qualidade, que tenha repercussão no mercado. Desta forma, cita ele, “[...] na
maioria dos países europeus, foi preciso um século para que se atingisse essa
performance, no Japão 70, na Coréia e Taiwan menos de 30 e em Cingapura
menos de 20” (SILVA FILHO, 2001, p. 87).
Dessa forma, percebemos que a educação sofre, ao longo do tempo,
interferências do contexto sociopolítico e econômico. A história das reformas
educacionais brasileiras tem mostrado isso, pois, estudando as motivações que
levaram às definições das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
desde os anos 60 do século XX, encontramos interesses diferentes do que
somente aqueles que visam melhorar o ensino para que todos tenham acesso.
Os interesses são outros e todos apontam para o mercado ou para aqueles
ligados à economia e ao capital. Uma investigação na educação, para identificar
o eixo principal em torno do qual acontecem as ações educativas, mostrará as
inter-relações e as interferências que os interesses econômicos e capitalistas,
por intermédio do trabalho e da tecnologia, têm no ambiente educacional.
Chamando ainda a atenção sobre a interferência do contexto
na educação, Silva Filho aborda a necessidade de o indivíduo saber ler e se
expressar, interpretar a realidade, lidar com conceitos científicos e matemá-
ticos, trabalhar em grupo, resolver problemas complexos, entender e usar a
tecnologia, se quiser se integrar ao contexto da época e à atividade econômica
(SILVA FILHO, 2001).
Isso pode ser considerado como pressão que o indivíduo sofre vinda
do contexto social e econômico, fazendo com que ele busque na educação
saída para se firmar no mercado. A educação, diante dessa demanda, tem que
ter um currículo que atenda às necessidades apontadas por Silva Filho. Nesse
sentido, muitas atividades foram feitas, mas temos percebido que as soluções
que a educação buscou foram, na sua grande maioria, influenciadas pelas
intenções dos interesses momentâneos do capital, reforçadas pelo advento das
necessidades que os avanços científicos e tecnológicos geraram para a socie-
dade, que, na grande maioria, é consumista, individualista e preocupada mais
em manter o status quo que lhe garante a sobrevivência.
Dessa forma, as ações de formação de professores são ditadas por
essa demanda do contexto, que interfere na ação educacional. O que não pode
ocorrer é que essa interferência aconteça em detrimento da integridade do
ser humano em seus aspectos ambientais, sociais, mentais e políticos, porque,
62 C. A. ROCHA
3
Nota do autor: Esses dados sobre Nassim Mehedff encontram-se na 7ª edição do
livro (2001) em que está inserido o artigo, cuja 1ª edição é de 1994.
64 C. A. ROCHA
lidade social, apregoada como uma das finalidades essenciais de uma empresa,
principalmente se ela quiser obter algumas benesses do mercado e dos órgãos
financeiros, governamentais e outros. Muitas pessoas e instituições estão
criando e incentivando atividades de inclusão, com leis, projetos e programas
que se preocupam com aqueles que são excluídos, principalmente por causa
de sua deficiência ou falta de escolaridade. Essas ações ocorrem não porque
querem fazer o bem, mas para lhes garantir uma visibilidade que lhes dê vida
ativa no mercado, garantindo-lhes o lucro. É claro que, nesse meio, há ações
sérias e comprometidas verdadeiramente com a inclusão dos excluídos de
qualquer ação social. Por isso que, nas atividades formativas de professores, é
importante ocorrerem ações de estudos e pesquisas com o intuito de possibilitar
aos profissionais da educação o desenvolvimento de um senso crítico, de tal
forma que possa distinguir uma coisa da outra.
Para esse fim, que fique claro, inicialmente, que a tecnologia não é
neutra, descomprometida, mas está também a serviço do consumismo desen-
freado, dos interesses camuflados de progresso, dos lucros a qualquer preço,
da promoção de poucos em detrimento de muitos. Essa tecnologia, quando se
trata da informação e da comunicação, também está recheada de interesses,
que devem ser desvelados, revelados e revestidos, na educação, quando esta
a utiliza, dos valores éticos e morais que garantam ao indivíduo se perceber
coletivo e com responsabilidades no grupo a que pertence.
Por isso este artigo tem o objetivo de apresentar subsídios para que
a ação de formação de professores, tanto inicial como continuada, tenha uma
preocupação em compreender e perceber a responsabilidade das tecnologias
no complexo das relações do ser humano com o ambiente circundante. Da
mesma forma, a relação dele com a sua própria subjetividade e com os outros
socialmente, no intuito de discutir e procurar saídas para a inclusão social
de todos, em tudo aquilo que um cidadão deve possuir para sua integridade
individual, social e política.
para penetrar nos meandros das relações que envolvem a sociedade. Com os
recursos metodológicos que a educação sabe trabalhar é possível conhecer
essas possibilidades, pois há disciplinas no contexto escolar que buscam
compreender os conceitos que envolvem todas as relações humanas, desde
os planos biológico, físico, biosférico, até aqueles voltados para a sociologia,
a antropologia, a psicologia e outras que se interconectam, possibilitando
adentrar no conhecimento das relações sociais e mentais. Esse ferramental
a educação tem e pode muito bem fazer essa articulação ético-política que
Guatari apresenta, através de uma inter- e transdisciplinaridade que envolve
compromissos, responsabilidades, consequências, principalmente nos aspectos
que dizem respeito à vida saudável da coletividade e dos indivíduos.
Contribui para esse discurso o que diz Pierre Lévy, quando discute
sobre o desenvolvimento da inteligência. “A inteligência ou a cognição são
o resultado de redes complexas onde interage um grande número de atores
humanos, biológicos e técnicos” (LÉVY, 1993, p. 135). Conforme ele, não é
uma ação isolada, pessoal, mas há interação de muitos elementos que contri-
buem para esse desenvolvimento, não descartando uma grande e necessária
interferência individual. Diz ainda Lévy:
Não sou “eu” que sou inteligente, mas “eu” com o grupo humano
do qual sou membro, com minha língua, com toda uma herança
de métodos e tecnologias intelectuais (dentre as quais, o uso da
escrita). Para citar apenas três elementos entre milhares de outros,
sem o acesso às bibliotecas públicas, a prática em vários programas
bastante úteis e numerosas conversas com os amigos, aquele que
assina este texto não teria sido capaz de redigi-lo. Fora da coletivi-
dade, desprovido de tecnológicas intelectuais, “eu” não pensaria. O
pretenso sujeito inteligente nada mais é que um dos micro atores de
uma ecologia cognitiva que o engloba e restringe. (LÉVY, 1993, p.
135).
4
Nota do autor: Ecosofia é um termo que foi explicado no terceiro parágrafo do
tópico 3 (Tecnologia, Conhecimento e Educação) deste capítulo.
A Formação de Professores nos Cursos de Licenciatura e a Tecnologia 73
consequências têm surgido a cada dia, motivados por esses novos saberes. A
educação não pode ficar de fora disso, pois deve dar aos envolvidos no processo
educacional tudo o que for necessário para viver esses novos tempos.
4. Algumas Considerações
5
Tecnologia assistiva é “[...] tecnologia destinada a dar suporte (mecânico, elétrico,
eletrônico, computadorizado etc.) a pessoas com deficiência física, visual, audi-
tiva, mental ou múltipla”. (SASSAKI, 1996, p.1).
A Formação de Professores nos Cursos de Licenciatura e a Tecnologia 79
uma série de valores agregados, que vão desde o descarte rápido do produto
até a propaganda futura e tudo o que lhe diz respeito, como grife, destinatários,
etc. Isso é uma das consequências que a modernidade e o avanço tecnológico
trouxeram.
Outra questão a se considerar é a que diz respeito às alterações na
moral e na ética. Os avanços da biotecnologia têm trazido à baila algumas
discussões que envolvem a ciência, por exemplo, no caso dos transplantes, na
clonagem de células e de seres vivos, no uso das células-tronco, no conheci-
mento do código genético (Projeto Genoma), na questão dos transgênicos,
entre outros. Isso tem alterado as formas de entender e de tratar alguns
assuntos, sendo necessárias, muitas vezes, mudanças nas leis. Tudo isso tem
feito prosperar uma ciência nova, a bioética, que tenta explicar e preencher
o vazio das compreensões que se tem que ter desses fenômenos dos novos
tempos.
Percebemos, com tudo isso, que é muito complexa a ligação da
tecnologia com a sociedade e a vida e, em consequência, com a educação. Há
um grande desenvolvimento científico e tecnológico que afeta a vida de todos,
criando novos conceitos, novos comportamentos, fenômenos os mais variados,
situações novas que requerem estudos, pesquisas, adaptação de currículos,
metodologias e uma série de elementos de caráter pedagógico e educativo.
Como todos esses pontos apresentados em toda a argumentação
do texto têm uma grande importância na formação dos professores para a
Educação Matemática e qualquer outra área do saber, é que se coloca a neces-
sidade de não se restringir o conteúdo da disciplina apenas às tecnologias da
informação e da comunicação. Que a disciplina tenha, porém, um novo olhar
e os currículos possibilitem ir mais além, tendo em vista o sistema de relações
que a tecnologia tem com a formação dos profissionais, formando um grande
leque de possibilidades e de necessidades de atenção em relação às suas futuras
ações. Que, além de ter momentos de instrumentalizar o futuro professor em
relação às tecnologias da informação e da comunicação, haja também uma
atenção a outras tecnologias, novas ou não, desvelando os elementos impor-
tantes na rede de relações que têm implicações diretas ou indiretas com a
formação, dando-lhes uma roupagem educacional sistêmica, equilibrada e
consequente. Essa atenção se dá em vista das interferências da tecnologia nas
ecologias ambiental, social e da subjetividade humana, envolvendo totalmente
A Formação de Professores nos Cursos de Licenciatura e a Tecnologia 83
o ser humano em sua relação com a natureza e a vida, com os outros seres e
consigo mesmo, numa dialética constante que forma a dinâmica da vida em
todos os níveis: material, mental e espiritual.
O enfoque da disciplina ou das discussões num curso de formação
de professores precisa, portanto, mudar e levar em conta as conotações até
aqui apresentadas, com o seu conteúdo indo muito além dos aspectos de
instrumentalização do aluno para a sua futura profissão. É importante rever o
próprio título da disciplina, que considere tanto a instrumentalização, quanto
todas essas relações da tecnologia com o indivíduo, a educação, a sociedade
e a natureza. Dessa forma, a formação terá uma preocupação e uma prática
que incentivem os futuros profissionais a uma participação maior no sistema
de relações que envolve a sociedade, a política, a economia, o trabalho e seus
atributos, inserida num contexto atualizado e comprometido com um desenvol-
vimento sustentável equânime na partilha dos bens coletivos e individuais.
5. Referências
Capítulo 3
Resumo
1
Esse artigo é um recorte, que toma por base a pesquisa feita em tese de doutora-
mento intitulada “Formação de Professores para o Ensino de Matemática com
a Informática Integrada à Prática Pedagógica: exploração e análise de dados em
bancos computacionais”. PUCSP, 2004.
2
nielce.lobo@gmail.com
86 N. M. L. Costa
Introdução
Formação de Professores
profissional docente.
Diversos autores têm analisado esse conceito; seguirei Ponte (1997),
que o define como sendo:
3
As TICs são as tecnologias de processamento, de armazenamento e de pesquisa de
informação; de controle e automatização de máquinas, ferramentas e processos;
e de comunicação, transmissão e circulação da informação realizada por compu-
tador (COELHO, 1986).
Reflexões sobre Tecnologia e Mediação Pedagógica ... 93
4
Os conceitos de informação e conhecimento são distintos. A informação é “exterior
ao sujeito e de ordem social”, o conhecimento é “integrado ao sujeito e de ordem pessoal”
(LEGROUX, 1981 apud ALTET, 2001, p. 28).
96 N. M. L. Costa
ao aluno a partir do nível mais fácil para o mais difícil. Essa concepção
de Educação é baseada no modelo empirista e assume que a retenção
do conhecimento se dá como conseqüência da contigüidade e da
freqüência com que ele é transmitido. Se o professor se esmera na
preparação e na transmissão do conhecimento ao aluno, e se o aluno
realiza um bom trabalho na memorização desse conhecimento, está
garantido o sucesso do processo de ensino. (p. 20).
Esse tipo de ensino não é o que mais interessa no atual contexto social,
pois desenvolver a capacidade de memorização de informações não satisfaz
nem significa ensino bem-sucedido. Quando a tecnologia se incorpora ao
processo educacional, o objetivo não está no aprimoramento das técnicas de
transmissão de conteúdos, mas no desenvolvimento de novas metodologias,
que a transformem em aliada do professor na criação de ambientes de aprendi-
zagem. Para Valente (1993, p. 6): “A verdadeira função do aparato educacional
não deve ser a de ensinar, mas sim a de criar condições de aprendizagem. O
professor deve deixar de ser o repassador do conteúdo [...] e passar a ser o criador
de ambientes de aprendizagem e o facilitador do processo de desenvolvimento
intelectual do aluno”.
Valente (1993a, p. 42) esclarece que essa é uma maneira diferente de
conceber os processos de ensino e de aprendizagem:
Uma vez mudado o foco, tanto professores quanto alunos devem estar
num constante processo de aprender a aprender. É inegável que estamos diante
de uma nova linguagem comunicacional, que é a digital, e é necessário que ela
seja incorporada às normalmente usadas nos processos pedagógicos (a oral e
a escrita). Além das habilidades consideradas essenciais – expressão verbal,
escrita e raciocínio matemático –, é preciso desenvolver, nos alunos e nos
professores, novos talentos, tais como a fluência tecnológica e a capacidade
de resolução de problemas, e estimular os chamados três “Cs” – comunicação,
colaboração e criatividade (BEHRENS, 2000), ou seja, as competências em se
comunicar, desenvolver atividades de forma colaborativa e ser criativo no
contexto de atuação.
Processos de formação dos docentes, para o uso do computador em
Educação, nesse paradigma, devem ser desenvolvidos, segundo Almeida (1997,
p. 199):
5
En la medida en que una propuesta se centra en el aprendizaje (autoaprendizaje e
interaprendizaje) y no en la enseñanza, el rol protagónico del proceso se desplaza
del docente al educando. Este solo hecho abre el camino al acto educativo,
entendido como construcción de conocimientos, intercambio de experiencias,
creación de formas nuevas. Y es precisamente ese protagonismo, ese quehacer
educativo, el que permite una apropiación de la historia y de la cultura. (PEREZ
E CASTILLO, 1999, p. 43 apud MASETTO, 2000, p. 141).
98 N. M. L. Costa
6
O ciclo descrição-execução-reflexão-depuração será detalhado na próxima
seção.
Reflexões sobre Tecnologia e Mediação Pedagógica ... 99
e ação;
definição ou adaptação de normas regimentais e administrativas às
características das ações de formação;
perspectiva de formação continuada.
tal modo que ele trabalhe individualmente para aprender e, em grupo, para
colaborar na aprendizagem. O professor e os estudantes devem ser considerados
como parceiros, ou seja, deve-se desenvolver o senso de corresponsabilidade.
Quanto ao docente, ele deve sair da posição de conhecedor absoluto do tema
em estudo e lançar-se no processo de construção de conhecimento pondo-se
em contato direto com seus alunos e, se necessário, pesquisando com eles.
Naturalmente, esses novos papéis a desempenhar podem gerar descon-
forto e insegurança tanto para o professor quanto para o aluno. É, contudo,
interessante assinalar que, nesse processo, o professor se aproxima dos alunos,
passa do papel de autoridade inconteste do saber para o de mediador entre
o aluno e o saber, e, em determinadas situações, aprende durante o próprio
processo de ensino. Quanto ao aluno, ele deixa de receber as respostas prontas
e passa a conduzir a própria aprendizagem.
É preciso considerar, ao planejar ações de formação do professor
mediador, que o objetivo principal passa a ser o desenvolvimento do processo
de aprendizagem, e que isso exige a utilização de novas metodologias didáticas
para promover a interação, a pesquisa, o debate e o diálogo. Nesse sentido, é
necessário que o professor acredite na capacidade do aluno, quer para aprender,
quer para orientar-se em sua própria aprendizagem.
Segundo Masetto (2000), na mediação pedagógica deve-se: dialogar
sempre e considerar as necessidades momentâneas do mediado e a dinâmica de
cada atividade; trocar experiências, debater dúvidas e lançar questões nortea-
doras; desencadear e incentivar reflexões; garantir a dinâmica do processo de
aprendizagem; propor situações-problema e desafios; relacionar a aprendizagem
com a sociedade; orientar o aprendiz em suas dificuldades e colocá-lo diante de
situações éticas, sociais e profissionais; incentivar a crítica e a comprovação da
validade das informações obtidas.
O autor salienta que a metodologia escolhida, assim como a avaliação
da aprendizagem, são partes integrantes do processo de mediação pedagógica.
O método de trabalho pode contemplar diversas técnicas, quer as tradicionais
quer as inovadoras, mas deve escolhê-las sempre tendo em vista os princípios
ético-pedagógicos do professor e os objetivos visados. Quanto ao processo de
avaliação, ele deve ser integrado ao processo de aprendizagem e apresentar como
característica a diversidade e a continuidade, isto é, deve ser variado e perpassar
todo o processo de aprendizagem, e não apenas espelhar momentos particulares.
Reflexões sobre Tecnologia e Mediação Pedagógica ... 105
7
Autopoiese é a auto-organização criativa do ser. Segundo Maturana e Varela
(1995): “[...] a característica mais marcante de um sistema autopoético é que
ele se levanta por seus próprios cordões e se constitui como distinto do meio
circundante mediante sua própria dinâmica, de modo que ambas as coisas são
inseparáveis produzindo-se continuamente a si mesmas (p. 87).
106 N. M. L. Costa
8
A expressão “comunicação mediatizada” é usada por Belloni (1999) para designar
os elementos por meio dos quais ocorre a mediação; por exemplo, pode ser o
telefone, o computador, etc.
9
Os “cidadãos comuns” sobre os quais o autor se refere são, nesse contexto, os não
Reflexões sobre Tecnologia e Mediação Pedagógica ... 107
10
Objects-to-think-with.
110 N. M. L. Costa
está criando suas próprias soluções, está pensando e aprendendo sobre como
buscar e usar novas informações (aprendendo a aprender)” (1997, p. 3). As
descrições do aluno são todas registradas na programação, e esses registros
podem auxiliar a aprimorar o raciocínio, porque eles permitem a recuperação
de cada uma das etapas e possibilitam a discussão das estratégias usadas e a
reflexão sobre as formas de pensamento empregadas (pensar sobre o pensar).
Valente argumenta que: “O computador para ser efetivo no processo
de desenvolvimento da capacidade de criar e pensar não pode ser inserido
na Educação como uma máquina de ensinar [...], deve ser usado como uma
ferramenta que facilita a descrição, a reflexão e a depuração de idéias”. (1993b,
p. 42). Partindo dessa argumentação, ele acrescenta que “os tutoriais e demais
softwares que promovem o ensino [pressupõem] que a tarefa do professor é
passível de ser totalmente desempenhada pelo computador e, talvez, com
muito mais eficiência” (1997, p. 2). Esse tipo de ensino, efetuado apenas via
transmissão de informações, não produz, contudo, o profissional/aprendiz que
se deseja hoje, tópico que já foi objeto de discussão neste capítulo. Para Valente,
as indispensáveis competências e atitudes a desenvolver nos alunos não podem
ser apenas transmitidas. Antes, precisam ser construídas de forma individual
e devem “[...] ser fruto de um processo educacional em que o aluno vivencie
situações que lhe permitam construir e desenvolver essas competências. E o
computador pode ser um importante aliado nesse processo” (ibidem, p. 2).
Para além dessa aliança, e a despeito de a forma mais eficiente para a
aprendizagem ser o uso de softwares que funcionem como ferramenta, é impor-
tante salientar que ”[...] o ciclo descrever-executar-refletir-depurar-descrever
não se realiza simplesmente posicionando-se o aprendiz diante do computador.
A interação aluno-computador necessita da mediação de um profissional – o
agente de aprendizagem – que tenha conhecimento do significado do processo
de aprender por intermédio da construção do conhecimento” (VALENTE,
1999a, p. 109).
112 N. M. L. Costa
Considerações Finais
Referências
Capítulo 4
Suely Scherer1
Centro Universitário de Jaraguá do Sul – UNERJ
Universidade Federal do Paraná – UFPR
Resumo
1
susche@gmail.com
118 S. SCHERER
1. Introdução
Ao planejar e agir na formação de professores não podemos mais pensar
apenas em momentos presenciais. Entende-se que é necessário contemplar as
possibilidades de processos de ensino e aprendizagem a distância e realizados
em ambientes virtuais de aprendizagem que se utilizam de internet. Ou seja, é
necessário pensarmos em processos de educação bimodal – parte presencial e
parte a distância. Assim, fazendo um recorte da minha pesquisa de doutorado
(SCHERER, 2005), irei analisar, neste artigo, movimentos de comunicação
e de aprendizagem presentes no desenvolvimento da disciplina de Estatística
Aplicada à Educação, do curso de Pedagogia (habitação em educação infantil
e séries iniciais do ensino fundamental) de um Centro Universitário de Santa
Catarina. Os sujeitos da pesquisa sou eu (professora da disciplina) e um grupo
de acadêmicas do curso, formandas de 2006.
Os registros usados para análise foram copiados de espaços virtuais
que constituíam o ambiente virtual da disciplina: fóruns, espaço de projetos
e webfólios (diários de bordo dos alunos). A análise apresentada neste artigo
aborda a organização da disciplina no formato de educação bimodal e os
movimentos de comunicação e aprendizagem dos sujeitos envolvidos nesse
processo. São identificadas atitudes da professora e das alunas que favoreceram
a aprendizagem das alunas (futuras professoras que ensinarão matemática), na
disciplina de Estatística Aplicada à Educação.
O artigo aponta movimentos importantes para a formação inicial
de professores que ensinam/ensinarão matemática, identificando atitudes da
professora (eu) e especialmente de uma acadêmica. A escolha da acadêmica
foi realizada pelo fato de ela ser silenciosa em espaço presencial e comunicativa
em ambiente virtual.
Oi, H.H.B.! Gostei da tua explicação. Mas, será que como cada 1% vale 0,3, e não teríamos
que pegar 20 x 0,3 ao invés de 0,3 x 20? Lembras do que discutíamos em sala? Veja também
no fórum sobre porcentagem, esta discussão está por lá. Outro problema, como explicarias
a questão: De 40 morangos que estavam na caixa que comprei, 8 estavam podres. Qual o
percentual de morangos da caixa que estavam podres? E bons? Aguardo novidades... Bjs.
Suely (Intervenção da professora em um webfólio de aluna).
12/05/2004- Penso que seja a última vez que eu escreverei aqui, gostei muito de participar
do webfólio, foi um pouco diferente do que da 1ª fase, na minha opinião desse semestre foi
melhor, pois você questinou mais, estava em cima toda hora...um exemplo é da porcentagem,
se você não fizesse tanta pergunta, quem sabe eu não teria aprendido tanto porcentagem como
aprendi este semestre. Obrigada!!!! Beijos, H.H.B.!!!
O fato de desafiar os alunos para refletirem não implica que eles atinjam
a abstração, mas o professor habitante está sempre planejando ações para
compreender o processo de aprendizagem do aluno, desafiando para que ele
avance. No momento da socialização, da exploração da linguagem oral, muitas
alunas expressaram a forma como estavam pensando o problema, outras perma-
neciam em silêncio, talvez pensando e operando2 sobre a questão, ou não.
2
Operações, segundo Piaget (1973), qualitativas ou métricas, de correspondência,
reciprocidade ou complementaridade.
Educação Bimodal no Curso de Pedagogia 125
Em relação a segunda questão acho que eu não saberia calcular a porcentagem sem a ajuda
de uma calculadora. Eu lembro de quando aprendi porcentagem na escola, eu entendi muito
bem o assunto, porém não vi utilidade nele e acabei esquecendo. J.V.
Para descobrir o valor do desconto primeiramente preciso saber quanto vale 1% de R$30,00.
Para isso eu divido o valor da calça por 100%, que é igual a 0,3, ou seja 1% de R$30,00 é
R$0,3. Como eu quero descobrir o valor de 20% eu multiplico o 1%, que é 0,3, por 20 que
é igual a 6. Então, o desconto da calça será de R$6,00. J.V.
Quando penso em situações para explorar com alunos, penso logo em coisas de criança. Por
exemplo: Desenho animado, qual criança não gosta disso. Podemos fazer uma pesquisa na
sala de qual desenho cada criança assiste e faxer um levantamento no quadro de quantos
votos teve cada desenho. [...] Enfim, são várias as possilbilidades. Enquanto escrevo essa
contribuição, me imagino na sala fazendo esses exercícios com os aluno. J.V.
É impressionante como podemos mudar a forma de pensar de uma criança somente com uma
atividade como essa. As vezes eu paro e me imagino em uma sala de aula... Será que eu vou
Educação Bimodal no Curso de Pedagogia 127
Professora, sei que não sou uma aluna muito participativa em sala, mas quando realmente
tenho alguma dúvida ou alguma colocação para fazer eu faço. Estou tentando menlhorar,
pois sou muito insegura na hora de “falar em público”. J.V.
...não estou conseguindo nem acompanhar os fóruns direito, mas vou falar um pouco de mim.
Estou um pouco confusa quanto à questão do arredondamento, todas as vezes que eu leio as
contribuições fico confusa, depois entendo de novo e quando leio novamente me confundo.
(nossa que confusão...) um fato interessante que aconteceu comigo hoje foi quando dei a
minha contribuição no fórum de População e Amostragem. Eu quis dar um exemplo e na
hora de explicar não conseguia calcular a porcentagem nem com a ajuda da calculadora. [..]
Só consegui resolver essa questão com a ajuda da famosa “regra de três”, mas não o porquê
de utilizar ela.... J.V.
Hoje eu estava vendo algumas contribuições do fórum e tive a impressão que a nossa turma
não gosta muito de pensar. Comparei o nº de contribuições dos fóruns de População e
128 S. SCHERER
Pelo que percebi, a T.H. quis colocar um exemplo de arredondamento com o nº 5 a ser
abonado, mas para isso acontecer temos que arredondar o nº 45,850505 para somente 1
casa decimal. [...] Aproveito para colocar outro exemplo, pois percebi que muita gente ainda
está com dúvida quanto ao arredondamento:92,62450 arredondando para 3 casas decimais..
J.V.
F.R. Também fico meio confusa, quando penso que sei tudo, vejo que não sei quase nada(Ainda
bem...), mas vou tentar esclarecer sua dúvida: Eu comprei um vestido que custa R$90,00,
paguei a vista e ganhei 5% de desconto. Pego o valor do vestido e divido por cem: 90:100=
0,9... Se eu quero saber o valor de 6% eu multiplico o resultado por 6: 0,9x6=5,4... Então,
o desconto que tive foi de R$5,40... Se eu quisesse calcular 12% do valor, multiplicaria por
12...e assim por diante. Não sei se te ajudou...Espero que sim...Beijos. J.V.
Quanto estatística descritiva e inferencial, ainda estou com um pouco de dúvida. Tentei
pesquisar na internet, mas não consegui encontrar algo que me esclarecesse. Será que alguém
podia me ajudar? Eu lí as contribuições, mas ainda não ficou bem claro. J.V.
10/03 - Em sala de aula, ensinaria estatística atraves dos próprois alunos. Ex.: Calcular
a porcentagem de meninos e meninas na sala, ou de morenos, loiros ou negros... Por fim,
os materiais importantes para ensinar conceitos e construir gráficos seriam: um tema da
realidade e do interesse deles, muita imaginação e muita atenção dos alunos. J.V.
11/06 - Acho que todo tipo de material é válido(reciclável, sucata...). Para ensinar esta-
tística às crianças precisamos de vários materiais, assim, podemos trabalhar no “concreto”
e trabalhar com o lúdico delas. Também deve-se começar trabalhar com os instrumentos
matemáticos(régua, compasso...), para a criança começar a ter uma noção de espaço. O
material não é o mais importante. O que importa de que forma iremos trabalhar com esse
material. [...]É muito importante as crianças estudarem as tabelas e gráficos pois há um
monte de informações e ela tem que saber interpretá-las. J.V.
Referências
Capítulo 5
Willian Beline2
Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão – FECILCAM
Rosana Figueiredo Salvi3
Universidade Estadual de Londrina - UEL
Resumo
Este texto tem por objetivo apresentar uma proposta de encaminhamento quanto à
formação continuada de professores da Educação Básica que ensinam Matemática
para a utilização dos recursos tecnológicos em sua prática pedagógica. Esta proposta
vai ao encontro dos processos de educação continuada desenvolvidos pelos Asses-
sores Pedagógicos das CRTEs (Coordenações Regionais de Tecnologia na Educação)
1
Uma versão preliminar deste texto foi publicada e apresentada no IX ENEM -
Encontro Nacional de Educação Matemática, Belo Horizonte - MG, 18 a 21 de
julho. Ver: Beline e Salvi (2007).
2
wbeline@gmail.com
3
salvi@uel.br
134 W. BELINE e R. F. SALVI
1. Introdução
4
Logo é uma linguagem de programação interpretada, voltada principalmente para
crianças e aprendizes em programação. Logo implementa, em certos aspectos, a
filosofia construtivista, segundo a interpretação de Seymour Papert, cocriador
da linguagem junto com Wally Feurzeig. Seymour Papert, matemático, trabalhou
com Piaget, daí a ideia da filosofia construtivista, é cofundador do Media Lab no
MIT. (Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Logo).
5
Papert denominou de construcionista a abordagem pela qual o aprendiz constrói,
por intermédio do computador, o seu próprio conhecimento.
136 W. BELINE e R. F. SALVI
6
Aversão persistente; má vontade (Dicionário Aurélio).
Professor de Matemática: Uma Proposta de Formação Continuada ... 137
Algo que sempre nos chamou a atenção, e isso se tornou mais percep-
tível nas visitas às escolas e nas conversas com os professores da rede pública
estadual do Paraná, é a não utilização dos laboratórios de informática por
muitas escolas que os possuem.
Diante disso, ao realizarmos as entrevistas com os Assessores Pedagó-
gicos, procuramos averiguar se isso também acontecia nas escolas em que eles
assessoravam7.
Ao serem questionados8 sobre a utilização, por parte dos professores,
dos laboratórios, recebemos as mais variadas respostas, conforme Beline
(2006).
Não usam porque não tem. Teve professor que terminou curso
recentemente com a gente aqui, em Abril [2006], e que já pediu
“posso trazer meus alunos aqui? Tem como trazer?”, e teve outros
que vieram de municípios distantes que disseram “há, mas que pena
que eu não vou conseguir usar isso com meu aluno, porque não tem
máquina na minha escola”. “Há, mas tem jeito de instalar isso aqui
no meu computador em casa?” (Entrevista 5, p. 4, grifo nosso).
7
Cada Assessor Pedagógico tem sob sua responsabilidade algo em torno de 10
escolas para fazer atendimento. Este é composto basicamente de assessoria aos
professores da escola.
8
Instrumento 3, questão 11.
140 W. BELINE e R. F. SALVI
9
O termo capacitação refere-se aos cursos e oficinas que as CRTEs ministram em
Informática na Educação para os professores da rede pública estadual.
Professor de Matemática: Uma Proposta de Formação Continuada ... 141
estaduais. Uma proposta que coloque o professor como sujeito ativo em seu
processo de construção de conhecimento, assim como valorize o assessora-
mento prestado pelos Assessores Pedagógicos nas escolas.
Para fundamentar esse novo encaminhamento nos pautamos nas
seguintes teorias: ciclo de aprendizagem e da espiral de aprendizagem apoiados
em Valente (2002; 2005) e Almeida (1996); do profissional reflexivo apresen-
tado por Schön (1995) e do trabalho colaborativo tratado por Boavida e Ponte
(2002).
Antes de apresentarmos tal encaminhamento, gostaríamos de eviden-
ciar, num primeiro momento, os passos por nós percorridos para se chegar
ao que iremos apresentar como proposta metodológica para as capacitações
ministradas pelas CRTEs.
Em 2005, ao participarmos da disciplina intitulada Modelagem
Matemática e suas perspectivas na Educação Matemática, no Programa de Pós-
Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática da Universidade
Estadual de Londrina (UEL), estudamos um assunto que tratava das atividades
em Modelagem Matemática em sala de aula que poderiam ser abordadas em
três momentos (DIAS, 2005, p. 41-2):
10
Alguns Assessores nos disseram que os professores não utilizam os laboratórios
porque não os têm em suas respectivas escolas. Existem, no entanto, como já
comentamos anteriormente, escolas que, mesmo possuindo esses laboratórios,
não o têm utilizado com seus alunos.
Professor de Matemática: Uma Proposta de Formação Continuada ... 143
Olha, hoje [2006], dá para dizer que as escolas que têm computadores
que funcionam e que foram capacitados, estão utilizando, que no
todo aqui em nossa cidade em torno de 5,5% das escolas. Algumas
não se utilizam, algum professor ou outro que utiliza (Entrevista 9,
Assessor Pedagógico 5, p. 5).
11
Instrumento 3, questão nº 11.
Professor de Matemática: Uma Proposta de Formação Continuada ... 145
Algo que recomendamos, para amenizar tal problema, seria que, logo
após a realização das capacitações, o Assessor Pedagógico acompanhasse os
professores participantes em suas primeiras incursões nos laboratórios com
seus respectivos alunos. Professores sentem medo de ir para os laboratórios
sozinhos, pois como menciona Penteado-Silva (1997), eles adentram na
chamada zona de risco12. A figura do Assessor Pedagógico, nesses primeiros
contatos do professor com o laboratório de informática em suas aulas, é muito
importante para uma maior utilização desses laboratórios nas escolas.
12
Caminhos que levam a incertezas e imprevisibilidade, nos quais é preciso avaliar
constantemente as consequências das ações propostas (BORBA; PENTEADO,
2001).
146 W. BELINE e R. F. SALVI
professor converse e troque idéias” (p. 29, grifo nosso). Acreditamos que esse
conversar e trocar ideias deva ser dirigido pela dinâmica do trabalho colabora-
tivo, conforme apontam Boavida e Ponte (2002).
Penteado (2004), ao tratar de capacitações em que professores somente
participam de cursos de curta duração (30 a 40 horas), ressalta que, nesse
modelo, a interação entre a turma é muito pequena e que esses cursos não
suprem às necessidades dos participantes.
4. Considerações Finais
5. Referências
Capítulo 6
Ivonélia C. da Purificação2
Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD
Resumo
O presente trabalho busca analisar a prática de professores das séries iniciais do Ensino
Fundamental que, usando o software Cabri-Géomètre, após um período de formação
continuada com o mesmo programa, desenvolvem ações metodológicas e reconstrução
de conceitos, num processo de reflexão sobre a própria aprendizagem e sobre/para
a prática pedagógica. As atividades foram realizadas no laboratório de informática
das escolas dos participantes da pesquisa. O caminho investigativo desenvolveu-se
com: uma entrevista; realização de atividades com o uso do Cabri-Géomètre pelos
professores e seus alunos; e diálogos com os professores sobre a atividade realizada.
1
Texto para o XIV Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE):
Trajetórias e processos de ensinar e aprender: lugares, memórias e culturas. Porto
Alegre, 2008.
2
In memorian
154 I. c. Purificação
A investigação
3
Cabri-Géomètre – versão I.
158 I. c. Purificação
Ma: - Muitos até se revelam lá no laboratório de informática, na sala são alunos que
não fazem as atividades, e tem que sempre ficar cobrando, e no laboratório são os
primeiros a terminarem e ainda ajudam os colegas. Sabem abrir, fechar, mexem em
tudo como gente grande.
An: - Acho assim, questão de geometria, que é muito deixada de lado, e muito pelo
fato do professor não saber.
My- Formar o próprio conceito, fugir do conceito do livro, por exemplo, do que é o
ponto, a reta.
Ma: - Você consegue achar um triângulo? Aluna:- Não, eu acho que falta fazer dois pontos
aqui.
Ma: - Mais dois pontos? Aluna:- É
Ma:- Então o que você ia fazer pra achar? Que ainda faltou dois pontos e ia dar quantos
pontos? Cinco? Aluna:- Sim
Ma:- Você ia fazer mais dois ainda, dois e dois... quanto dá? Aluna - Quatro
Ma:- Isso. Quatro e você ia achar um triângulo? Aluna:- Não
Ma:- Espaço? Dá espaço e solta, o que apareceu? Aluna:- Um ponto
Ma:- Um ponto, agora vai de novo na flechinha, espaço o que aconteceu? Falta um ponto.
Você fez? Aluna:- Três.
Ma:- O que é um triângulo, K (nome da aluna)? Aluna:- A parte de cima parece um
telhado de uma casa e uma linha reta.
Ma:- Quantos pontos você precisou para fazer um triângulo? Aluna:- Três
Ma:- E se você fizesse quatro pontos aqui, você ia achar um triângulo? Aluna:- Não, ia
achar um quadrado.
Ma:- Vamos fazer uma reta. Como que se acha uma reta? Alunos: F10, criação e enter.
Ma:- Você sabe me dizer em que forma essa reta está? Em que posição? Se está na diagonal
ou na vertical? Aluno M: - Na horizontal.
Ma:- Na horizontal, então? Em que posição está a sua, aluna K? Aluna K:- Na
horizontal.
Ma:- O que é uma reta? Aluno M: - É um risco.
Ma:- Um risco? Aluna K:- Uma linha reta sem uma curva é uma linha bem reta.
Ma:- Isso, uma linha bem reta. Aluna K: - Uma reta sem fim.
Ma:- Como você fez o segmento? Aluna K: - Eu fiz um ponto e apertei F4 e apareceu uma
flechinha aqui.
Ma:- E como é que você conseguiu chegar com o segmento? Você precisou do quê? Aluna
K: - Do F10 e fui no segmento.
Ma:- E do segmento, mas apareceu o segmento? E aparece o quê? Aluna K:- Esse ponto.
Ma:- E pra você fazer um segmento é preciso só de um ponto? Aluna K:- Não, um de cada
lado, 2 pontos.
Ma:- Isso. Um ponto de cada lado, e a reta e o segmento? Aluna K:- A reta, ela se define e
o segmento ela pode ser, ficar tanto pequena quando grande.
164 I. c. Purificação
Lo: - O que vocês estão fazendo? Alunos: - Nós estamos tentando fazer uma estrela.
Lo: - Qual o primeiro passo que você usou para fazer a estrela? Alunos: - Criação.
Lo:- Cria o quê? O ponto. Aluno:- Não! O triângulo.
Lo: - Ah, você foi direto no triângulo! Que outro jeito você poderia fazer essa estrela.-
Criação, marcar o ponto. Aluno: Com as retas.
Lo: - Com as retas. Mas daí será que, com as retas, não vai ficar grandão e passar pelo visor?
O que é menor para a gente usar, menor que a reta? Alunos: - Triângulo... segmento...
Lo: - Isso, segmento. Também dá para fazer uma estrela.
An: -Isso, mexe o ponto. O que acontece? Será que o ponto sai da reta? Experimenta mexer,
movimentou? Aluno:- Desceu.
An: - Desceu, será que ele saiu da reta? Aluno:- Saiu. Aluno:- O meu não mexe. (outro
aluno).
An:- Vai mexer o ponto. E o ponto vai junto com a reta? Aluno:-Vai.
An: - Ok! Vão em construção, não é criação, e façam ponto sobre o objeto. Ah! Tá apagado,
não dá para fazer ainda. Aluno:- Só tem uma janela.
An: - Então voltem lá em criação e criem uma reta, pode ser longe do ponto A. Depois façam
ponto sobre o objeto. Nomeia de B. Aluno:- Agora dá.
An: - Mexam a reta. Quem conseguiu? Aluno:- Mexe! Só que o ponto vai junto.
An:- Isso! O ponto vai junto, e por que o ponto vai junto? Aluno:- Porque ele está sobre o
objeto.
An:- Muito bem. Agora mexe o ponto B. Conseguiu tirar ele da reta? Aluno:- Não.
An: - Não, sabem por quê? Aluno: -Não.
An: O ponto B é o que está lá em cima, tá grudado na reta e vocês construíram em cima do
objeto, o ponto que vocês construíram fora, ele está fora da reta e ele se movimenta sozinho.
Consideracoes Finais
Referências
Capítulo 7
Resumo
O texto reflete a busca de ideias a partir dos quais se possa sustentar nossa intenção de
elaborar elementos que subsidiem um currículo apropriado para o ensino de Matemá-
tica em escolas indígenas da região de Dourados Sul, do Mato Grosso do Sul, onde se
1
In memorian Os professores Chateaubriand Nunes Amâncio, Ivonélia Crescêncio
da Purificação, Renato Gomes Nogueira atuavam no curso de Matemática da
Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD e na Licenciatura Plena em
Matemática e na Licenciatura Intercultural Indígena, e eram membros do Grupo
de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática – GREPEMAT.
2
Professora da Secretaria Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul, cedida
através de convenio para a UFGD para o curso de Licenciatura Intercultural
Indígena, Mestranda do Programa de Pós Graduação em Matemática da Univer-
sidade Federal de Mato Grosso do Sul, liamendeso@yahoo.com.br.
172 C. N. Amâncio, I. C. Purificação, R. G. Nogueira. ET. AL.
Introdução
3
Fonte: “Projeto Criança Kaiowá e Guarani em Mato Grosso do Sul: a realidade
na visão dos índios” (2005).
4
Estão incluídas nesse levantamento apenas as áreas demarcadas. Algumas dessas
áreas indígenas ainda não foram demarcadas e se encontram em situação de
conflito.
5
Formulação explicitada em documentos oficiais.
A formação de professores indígenas: reflexões sobre o currículo de matemática ... 175
de uma escola que organiza e transmite os saberes marcados por uma episte-
mologia racionalista, fortemente impregnada pela cultura capitalista. De outro
lado, a construção de uma escola indígena, constituída a partir de um diálogo
intercultural e marcada pela presença e pela participação das comunidades no
seu destino. Essas são contradições encontradas em direção da construção de
uma “Escola Indígena”, aquela capaz de preparar os alunos indígenas para os
desafios que a sociedade envolvente lhes impõe, sem, no entanto, desrespeitar
suas crenças e práticas culturais (Cf. MAHER, 2006, p. 28-29). Em meio a
essas contradições estão presentes dificuldades, que vão desde a organização
curricular, às relações com o saber estabelecido no interior da escola indígena, a
questão da língua e das linguagens, até a falta de materiais didáticos adequados
às especificidades dessas comunidades.
Esse movimento se reflete, objetivamente, na formação dos profes-
sores indígenas ,que “[...] é hoje um dos principais desafios e prioridades para
a construção de uma Educação Escolar Indígena pautada pelos princípios
da diferença, da especificidade, do bilingüismo e da interculturalidade”
(GRUPIONE, 2006, p. 50-51).
Nesse contexto temos, em andamento em Mato Grosso do Sul, o Curso
Normal em Nível Médio, Formação de Professores Guarani e Kaiowá – Projeto
Ara Verá (Espaço-tempo iluminado), que consiste de um curso de magistério
especifico de nível médio. Esse projeto já formou cerca de 130 professores
e eles atuam nas comunidades indígenas dessa região. Atualmente está em
andamento a terceira turma, com aproximadamente 85 cursistas/professores
de diversas aldeias dessa etnia do Estado do Mato Grosso do Sul.
Essa experiência vem proporcionando um outro olhar sobre a reali-
dade das escolas indígenas e os aspectos ligados ao ensino e aprendizagem da
Matemática, algo que desperta o interesse em identificar os processos pelos
quais os Guarani e Kaiowá constroem as suas relações com o espaço e o tempo,
e como esse saber assume uma linguagem própria. Além disso, como essas rela-
ções são e podem ser tratadas na escola indígena com o aprender, no sentido
queCharlot6 (2000) apresenta a questão da relação com o saber e da relação
6
A relação com o saber é o conjunto das relações que um sujeito estabelece com
um objeto, “um conteúdo de pensamento”, uma atividade, uma relação inter-
pessoal, um lugar, uma pessoa, uma situação, uma ocasião, uma obrigação, etc.,
176 C. N. Amâncio, I. C. Purificação, R. G. Nogueira. ET. AL.
Consideração Finais
Referências
Capítulo 8
Maurício Rosa1
Universidade Luterana do Brasil – ULBRA
Marcus Vinicius Maltempi2
UNESP - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro
Resumo
Neste capítulo tratamos da união do lúdico com a tecnologia digital, por meio da
construção de jogos eletrônicos do tipo RPG (Role-Playing Game), como possibilidade
para o ensino e a aprendizagem de matemática. Trazemos dados de uma pesquisa para
analisar o software que viabiliza tal união, o RPG Maker – a que denominamos de tecno-
logia lúdico-educativa –, a partir de um contexto baseado nas ideias construcionistas
e de seres-humanos-com-mídias. Defendemos que as tecnologias lúdico-educativas
possuem aspectos que podem favorecer a prática educativa matemática.
1
E-mail: mauriciomatematica@gmail.com
2
E-mail: maltempi@rc.unesp.br
186 M. ROSA e M. V. MALTEMPI
Introdução
3
Role-Playing Game significa “jogo de interpretação de personagem” ou “jogo de
faz-de-conta” e é uma modalidade dentre os jogos que utiliza como base a inter-
pretação e a imaginação dos seus participantes, ou seja, do jogador e do mestre
(pessoa responsável em construir a atmosfera do jogo, além de conduzir a história
no mesmo jogo).
A Tecnologia Lúdico-Educativa como “Atriz” ... 187
4
Entendemos a tecnologia lúdica como “atriz” no sentido de atuante no processo
de construção do conhecimento. Identificamos isso segundo a ideia de atores
humanos e não humanos na produção do conhecimento matemático apresentado
por Borba e Villarreal (2005).
188 M. ROSA e M. V. MALTEMPI
5
Entre outras características, possibilita a liberdade de criação e de representação
de situações do cotidiano, de forma que as ações criadas são vinculadas ao espaço
192 M. ROSA e M. V. MALTEMPI
Foi criado por uma empresa japonesa chamada ASCII, possui versões para
o inglês e para o português, as quais são disponibilizadas para download na
internet (é um software gratuito, disponível em: <http://superdownloads.ubbi.
com.br/>. Acesso em: 12 out. 2003).
O RPG Maker foi utilizado por nós no desenvolvimento de uma
dissertação de mestrado (ROSA, 2004) e no curso de extensão denominado
“Informática e Jogos: a tecnologia lúdica aplicada à educação” (ROSA;
MALTEMPI, 2006), curso que foi desenvolvido totalmente a distância e
apresentou a construção de jogos eletrônicos do tipo RPG como contexto
pedagógico. A construção de RPGs eletrônicos foi, portanto, a principal ativi-
dade realizada pelos alunos que participaram da coleta de dados da pesquisa de
mestrado e do curso citado.
Tal construção nos leva a pensar que há necessidade de um progra-
mador para que tal ação seja viável. Realmente, a criação e a programação de
jogos eletrônicos, no geral, é uma das tarefas mais complexas no mundo da
informática, no entanto o RPG Maker oferece um ambiente visual para cons-
trução de jogos, em que elementos da interface são diretamente manipulados
pelo usuário via mouse. Atualmente há uma versão denominada RPG Maker
XP, na qual a resolução de tela foi aumentada em relação a versões anteriores,
assim como, o suporte às imagens (32 bits).
A evolução dos software de autoria implicou em uma grande contri-
buição à comunidade interessada em jogos eletrônicos, possibilitando a usuários
não programadores construírem seus próprios jogos sem grandes dificuldades.
Com isso, nós nos preocupamos em estudar a classificação do RPG
Maker em relação às possibilidades de uso dele na educação. Buscamos
entender tal tecnologia com intuito de evidenciar também as possibilidades
de uso na Educação Matemática, quando se trabalha com a construção e a
aplicação de jogos eletrônicos educativos.
Em um primeiro momento, vemos o RPG Maker como um programa
de autoria, pois, de acordo com Behrens (2000, p. 98), a
(25/06/03)
Mediador: Que tipo de ação? Pessoal, só um pouquinho! Rônei, que tipo de ação,
dentro do teu mapa aí, desse joguinho, no que tu fez até agora, que tipo de ação
poderia ensinar Números Inteiros?
Rônei: Ah! Sim! Conversando com outras pessoas!
Mediador: Conversando o quê, por exemplo?
Rônei: Tipo assim! Eu ponho um carinha no canto aqui, daí eu pergunto, como
assim, que temperatura que estava? E o cara fala assim. [o aluno identifica
os valores numéricos dados às temperaturas, tanto positivos quanto negativos,
caracterizando-os como representatividade dos Números Inteiros]
Mediador: Daí, como é que o cara vai aprender Números Inteiros assim?
Rônei: Ah! Vai tá aí escrito!
Mediador: Escrito só, Rônei? Tá, não tá errado, mas você tem que começar a
elaborar melhor isso na tua cabeça.
(02/07/03)
Rodrigo: Apaga essas casas!
Rônei: Ããããm? Não! (Não põe agora, não!)
Rodrigo: Vamos fazer dois, três, quatro, cinco, seis!
Rônei: Põe assim... Número maior, se não, não vai dar graça! Quinze positivos!
[Rônei identifica o número 15 como um número mais apropriado para a questão
proposta pela dupla na identificação dos números das casas de uma rua que haviam
construído].
A Tecnologia Lúdico-Educativa como “Atriz” ... 195
(18/08/03)
Rodrigo: O barquinho vai ter que ficar mais para cá! O barquinho vai ter que ficar
mais para cá!
Marina: Aí o rio separa!
Nathália Y.: (Ou a floresta?!)
Rodrigo: Porque a hora que ele ultrapassar o muro, o muro não vai abrir mais, aí o
barquinho vai ter que estar para o outro lado, aí o barquinho não vai ser, tipo assim,
deles. Entendeu?
Marina: O barquinho não pode... sei lá!.
Rodrigo: Vamos dizer assim que o...
A Tecnologia Lúdico-Educativa como “Atriz” ... 197
uso dos consumidores finais de seu produto. Nesse caso, isso representa algo
que contribuiu muito para a reorganização das ideias dos alunos, pois estavam
em um ambiente que necessitava disso constantemente.
Desse modo, em relação à construção de jogos eletrônicos na Educação
Matemática, corroboramos o pensamento de Kafai (1994, p. 310, tradução
nossa), que diz que:
O RPG Maker, por sua vez, funciona como ferramenta que permite
essa construção prévia do jogo e do conhecimento correlato a ele, construído
através das ações vivenciadas pelos personagens em seu mundo, ou seja, em
um contexto específico. Logo, ao construirmos jogos eletrônicos, podemos
dizer que é adicionada à ideia de construção mental, segundo Papert (1994,
p. 127), a questão da construção “no mundo”, a qual possui sintonia com
o conceito de um produto (o jogo) que possa “[...] ser mostrado, discutido,
examinado, sondado e admirado [...]” como uma constatação da produção do
conhecimento, tornando-se menos uma doutrina puramente mentalista.
Assim, ao usar o RPG Maker, os alunos representam o conhecimento
matemático através das ações das personagens em contextos que favorecem
essa representatividade e avançam em suas conjecturas ao descrever, executar,
refletir e, muitas vezes, depurar o conhecimento que estão querendo repre-
sentar. Essa é uma alternativa que se caracteriza por analisar a interação do
estudante em sala de aula a partir da construção de um RPG eletrônico que
envolva o conteúdo programático de matemática em um aspecto subjetivo,
utilizando-se da imaginação, da fantasia e do lazer como fontes enriquecedoras
do saber.
Isso, então, pode caracterizar o RPG Maker também como um aplica-
tivo, pois os aplicativos (programas de fácil utilização voltados a um usuário
final e dirigidos a uma atividade específica) formam outra categoria, dentro
da classificação dos software, os quais se apresentam como ferramentas para
o uso educacional, mesmo não sendo criadas inicialmente para isso. Entre os
aplicativos enquadram-se os processadores de textos, as planilhas eletrônicas,
programas criadores de apresentação e gerenciadores de banco de dados, entre
outros (BEHRENS, 2000, p. 98).
Dessa forma, o aplicativo RPG Maker apresenta uma interface de
fácil manipulação e, dentro desse aspecto, foi construído para usuários finais
com diferentes perfis e destinado a uma atividade específica que é construir
RPGs eletrônicos. Pode ter, no entanto, sua atividade estendida à Educação
Matemática, pois, além de contruir de maneira específica jogos eletrônicos que
visam a ensinar um conteúdo matemático específico, por exemplo, Números
Inteiros, o RPG Maker sugere a investigação de conceitos da matemática
existentes no próprio software, a partir da construção de um jogo qualquer
(nesse caso, não necessariamente educacional). Isso é assim porque existem
200 M. ROSA e M. V. MALTEMPI
(18/08/03)
Mediador: Entre os números vai ter sinais ou não? [o professor/pesquisador se refere
a uma ideia que os participantes tiveram em colocar um robô como personagem do
jogo, com um número de série que serviria como objeto a ser operado pelo jogador e,
dessa forma, o resultado permitiria ou não a continuidade do jogador na aventura,
no caso, a soma correta dos algarismos indicaria a continuidade do jogo].
Marina: Ah, não sei! (...) Qual o número de série, vamos supor –5 –4 –4 –4 +5
+7.
Rodrigo: Tu não acha complicado, não? [O professor/pesquisador percebe que
Rodrigo mostrava que ainda não compreendia como efetuar a adição com números
negativos]
Mediador: Daí que tá, aí entra Números Inteiros, se não, não entra Números
Inteiros. Tu não pode dizer que a soma deu negativa, pois nunca vai dar negativa
né, pois se eu só tiver números Naturais, a soma será sempre positiva, eu não vou
ter um número negativo e um positivo, entendeu? [o Mediador percebe a hesitação
de Rodrigo e faz ele e os colegas pensarem em questões Matemáticas ligadas ao
que planejavam para a ação do jogo, permitindo a reorganização do pensamento
deles].
(06/10/03)
Aprendiz E: Pois é? Tá errada, pois é!? Agora, aqui que complicou! [A partir de
alternativas apresentadas no jogo, como possibilidades para o jogador continuar na
partida, as aprendizes depuram as ideias apresentadas em cada uma delas]
Aprendiz F: Sinais iguais vai dar um número positivo.
Mediador: Sinais... o que que são?
Aprendiz F: Dois sinais iguais vão dar um número positivo, então esta tá errada.
[fala sobre multiplicação de números com o mesmo sinal predicativo].
Aprendiz E: Anhann! Então é zero e dois. E agora?[refletindo sobre outra
alternativa]
Aprendiz F: Dois sinais iguais vão dar um número positivo.
Aprendiz E: Tá certo! E nesse?
Aprendiz F: Dois sinais...
Aprendiz E: Aqui é menos, né? Não é dividir, pois dividir é dois pontinhos.
Aprendiz F: Dois sinais diferentes... dois sinais iguais dá um número positivo...
(...)
Aprendiz E: E nesse é zero! Ahnhann!
Referências
Capítulo 9
Marilena Bittar1
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS
Resumo
Este texto tem por objetivo contribuir com a discussão sobre a integração de softwares
educacionais evidenciando características técnicas e didáticas de alguns materiais e
discutindo, mais especificamente, possibilidades de uso de um deles. Essa discussão
é feita articulada à escolha pedagógica do professor, na intenção de contribuir com
seu trabalho cotidiano. Para tanto é feita inicialmente uma apresentação geral da
informática na Educação; em seguida, são apresentados alguns softwares destinados
ao ensino de Matemática. Finalmente, é relatada uma investigação realizada com um
software de Álgebra em uma escola de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, para
ilustrar o estudo.
1
marilena@nin.ufms.br
216 M. BITTAR
Introdução
2
Entende-se, neste texto, software fechado como sendo aquele em que as atividades
vêm prontas; não há como o professor preparar atividades novas para os alunos.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 217
3
Cabe ressaltar que a Matemática é uma área privilegiada tanto pela quantidade
de materiais (softwares) existentes quanto de pesquisas relacionadas ao uso dos
mesmos materiais. Entretanto, poucas pesquisas tratam do uso que o professor faz
de um software em sala e, também, poucos são os textos destinados a difundir as
pesquisas para os professores.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 219
Para responder a essa questão seria preciso olhar para dentro das escolas
e ver qual é a política de implementação do uso das tecnologias adotada, o
que obrigatoriamente exige um olhar mais amplo, dirigido às políticas públicas
de Educação. Não faremos aqui um estudo detalhado dessa questão por não
ser o objeto principal deste texto, mas como se trata de um ponto delicado e
importante na implementação de qualquer inovação no campo da Educação,
é importante que a comunidade de educadores tenha consciência da comple-
xidade dessa questão para agir de forma a influenciar as tomadas de decisão.
Outra questão que é fundamental e está no centro da discussão sobre a inserção
da tecnologia na Educação, diz respeito à postura do professor frente a essa
nova ecologia do cotidiano escolar, e um dos primeiros passos dessa caminhada
é justamente o conhecimento do professor sobre essa nova ecologia e como ele
se coloca nesse sistema.
Muitas escolas, públicas e privadas, dos Ensinos Fundamental e Médio,
têm sido equipadas com laboratórios de informática e têm feito uso das tecno-
logias com seus alunos. É possível verificar duas formas de uso da tecnologia na
Educação: a) criação de uma disciplina de informática educativa desenvolvida
por um professor de laboratório, que trata de variados assuntos com os alunos,
mas, em geral, não há ligação entre a aula de informática e as outras aulas,
como Ciências, Matemática ou Português; b) aulas realizadas com o professor
de uma determinada disciplina, por exemplo, Matemática, que leva seus alunos
ao laboratório para realizar tarefas relativas ao conteúdo estudado.
Algumas escolas desenvolvem esses dois tipos de ações, sendo que o
professor de informática tem, por vezes, a função de auxiliar o professor da
disciplina na escolha do software e na preparação das atividades. Outras escolas
não têm curso de informática, porém têm um responsável de laboratório cuja
função é trabalhar junto com os professores no uso da informática. A dificul-
dade quando se tem uma pessoa responsável por tal preparação é o fato de que
dificilmente ela conhecerá as características da disciplina em questão nem a
variedade de materiais disponíveis, o que dificultará a elaboração de atividades
tendo em vista os objetivos de aprendizagem. Assim, esse auxílio acaba sendo
ligado mais diretamente a questões técnicas, tais como gerenciamento do labo-
ratório, funcionamento das máquinas, conservação e produção de material,
etc., do que aos aspectos didático-pedagógicos da disciplina. Acreditamos que
é responsabilidade de cada professor se apropriar desses instrumentos, pois
220 M. BITTAR
ele tem o conhecimento sobre sua disciplina, seus objetivos, sua metodologia
de trabalho e seus alunos, o que é necessário para uma escolha coerente das
atividades a serem realizadas. Os professores necessitam, portanto, conhecer
as tecnologias disponíveis e estudar possibilidades de uso dessa ferramenta
como mais um recurso didático para o processo de aprendizagem. É importante
ressaltar que não se trata de tornar a aprendizagem mais fácil aligeirando o
ensino. Ao contrário, a aprendizagem deve ser favorecida com situações que
a tornem mais significativa e que os alunos possam interagir entre si e com
a máquina, construindo conhecimentos, vivenciando situações que, muitas
vezes, não tinham sentido, ou tinham outro sentido, no ambiente papel e
lápis.
Fazemos uma distinção entre integração e inserção da tecnologia da
Educação. Essa última significa o que tem sido feito na maioria das escolas:
coloca-se o computador nas escolas, os professores usam, mas sem que isso
provoque uma aprendizagem diferente do que se fazia antes e, mais do que
isso, o computador fica sendo um instrumento estranho (alheio) à prática
pedagógica, sendo usado em situações incomuns, extraclasses, que não serão
avaliadas. Defendemos que o computador deve ser usado e avaliado como um
instrumento como qualquer outro, seja o giz, um material concreto ou outro.
E esse uso deve fazer parte das atividades rotineiras de aula. Assim, integrar
um software à prática pedagógica significa que o mesmo poderá ser usado em
diversos momentos do processo de ensino, sempre que for necessário e de
forma a contribuir com o processo de aprendizagem do aluno.
Dessa forma, integrar um novo instrumento em sala de aula implica
mudanças pedagógicas, mudanças do ponto de vista da visão de ensino, que
devem ser estudadas e consideradas pelos professores. Algumas questões podem
nortear o trabalho do professor: Como preparar uma aula utilizando esse novo
recurso? Como inserir efetiva e criticamente a tecnologia no processo de ensino
e aprendizagem? Que mudanças pedagógicas ocorrem quando se introduz a
Informática na Educação? Que aspectos devem ser considerados no momento
de escolher o material a ser utilizado? Não pretendemos responder a todas
essas questões neste texto, porém dar pistas de respostas a elas.
Um material, qualquer que seja ele, deve ser escolhido em função dos
objetivos do professor, e não o contrário. Muitos professores em curso de
formação de formação continuada, ou em outros eventos, perguntam, por
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 221
Calculadora
Será discutido aqui o uso da calculadora, que pode ser uma calcula-
dora simples, contendo somente as quatro operações, e que pode ser usada
desde a primeira série do Ensino Fundamental. Não é raro ouvir, de profes-
sores, supervisores e outros, que o uso da calculadora nas primeiras séries do
Ensino Fundamental é inapropriado. Argumentam para tal que o aluno não
aprenderá os algoritmos ou a Matemática, e que esse uso pode tornar o aluno
incapaz de realizar cálculos sem o auxílio de uma calculadora. Assim como
outros pesquisadores e professores, discordamos dessa posição, pois a calcula-
dora oferece possibilidades de desenvolver certas atividades que contribuem
de forma importante para a construção do pensamento matemático. Vamos
ilustrar nosso ponto de vista com dois exemplos de natureza distinta: 1) efetuar
cálculos como, por exemplo, 25,235x8,04. Esse tipo de atividade pode ser ou
não interessante: tudo depende do contexto em que ela é explorada. De fato,
pedir simplesmente ao aluno para efetuar esse cálculo usando a calculadora,
parece sem significado, porém se o aluno está resolvendo um problema em
que esse cálculo aparece, a calculadora terá aqui um papel de facilitadora das
contas a serem feitas, deixando ao aluno mais tempo para pensar no problema
que ele está resolvendo, o que é recomendável; 2) levar o aluno a encontrar
regularidades e, a partir daí, elaborar conjecturas, por exemplo, propor diversas
multiplicações por 10, em seguida por 100. Nesse caso, a calculadora está sendo
um instrumento que pode permitir levar o aluno a elaborar seu conhecimento,
atribuindo-lhe papel ativo no processo de ensino e aprendizagem. Por meio
da observação dos resultados das multiplicações propostas, o aluno poderá
elaborar a regra da multiplicação por 10, por 100 e assim por diante. Temos,
assim, um caso em que o uso da calculadora pode provocar uma mudança
da prática do professor: ao invés de apresentar uma regra pronta, o aluno vai
construí-la. Não nos deteremos muito na discussão sobre a calculadora, uma
vez que nosso objetivo maior são os softwares educacionais.
Softwares Educacionais
Aplusix4
4
Esse software foi desenvolvido pela equipe Did@TIC, do Laboratório Leibniz,
França. Maiores informações sobre o software assim como exemplos de atividades
podem ser encontradas no site: <http://aplusix.imag.fr>.
224 M. BITTAR
5
Essa funcionalidade do Aplusix foi explorada pela professora na experiência rela-
tada nesse texto.
6
Ao abrir o Aplusix, o aluno recebe uma mensagem de que tudo o que ele faz
poderá ser visto pelo professor e isso é feito por uma questão de ética adotada
pelos construtores do software.
226 M. BITTAR
Cabri-Géomètre7
7
Cabri-Géomètre foi desenvolvido no Instituto de Informática e Matemática
Aplicada de Grenoble - França. Para maiores informações sobre a concepção do
software e a equipe que o desenvolve, visite o site: <http://www-cabri.imag.fr>.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 227
SuperLogo
8
Dissemos se tratar de validação pragmática pelo fato de não ser exatamente uma
demonstração matemática. O valor atribuído a esse tipo de validação dependerá
do objetivo da atividade. Como não é objetivo deste texto realizar uma discussão
aprofundada sobre validação e provas, não nos deteremos nesse ponto do
artigo.
9
Diversas pesquisas confirmam essas afirmações, como, por exemplo, Bittar (2004)
e Laborde, C. e Capponi, B. (1994).
10
Trata-se de um ambiente que contém toda uma estrutura cognitiva relativa a um
conteúdo específico. Indicamos aqui a leitura de Papert (1980), onde o autor
discorre sobre micromundos e, em especial, sobre o SuperLogo.
11
No site <http://www.nied.unicamp.br> podem ser encontrados vários resultados
de pesquisa sobre o uso deste software no ensino.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 229
Graphequation
12
No site <http://www.mat.ufrgs.br/~edumatec> são dados uma versão de Graphe-
quation e exemplos de atividades.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 231
(BITTAR, 2001). Esse software tem uma interface fácil de ser compreendida
e manipulada por alunos e professores, e propicia a realização de um trabalho
diferente do habitual, mais dinâmico e provocador de aprendizagem. A seguir
são apresentados dois tipos diferentes de atividades desenvolvidas com esse
material.
Esse tipo de software pode ser encontrado sob vários tipos: jogos de
simulação, jogos de pergunta-resposta, jogos em que o aprendiz joga contra
a máquina usando um conhecimento específico, etc. Esses últimos tratam
conteúdos específicos, tais como frações, verbos ou o corpo humano. Nessa
categoria podem-se encontrar softwares destinados a várias faixas etárias.
Vários livros didáticos das séries iniciais do Ensino Fundamental trazem atual-
mente um disquete ou CD com um jogo, visando motivar o aluno a estudar.
Esses softwares são chamados “fechados”, o que significa que o professor não
elabora uma atividade a ser realizada com o software, pois as atividades já vêm
prontas. Nesses casos, é preciso ter cuidado, pois, muitas vezes, esse material
traz, implicitamente, uma concepção não muito clara do papel do erro. Com
efeito, no caso em que a interatividade entre o aluno e a máquina se baseia na
“prática estímulo-resposta”, ocorrem, com frequência, casos em que o acerto
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 233
do aluno é premiado e seu erro, punido. Ou seja, errar é ruim, feio e tem
consequências que podem ser graves, como, por exemplo, alguns jogos nos
quais, ao errar a resposta esperada, o usuário é vaiado ou recebe alguma repri-
menda nesse sentido. Ora, diversas pesquisas em Educação têm mostrado a
importância do erro no processo de construção do conhecimento, portanto ele
não pode ter esse caráter punitivo, que impedirá o aluno de tentar se exprimir
ou tentar uma nova solução ao problema que lhe é posto13. Por outro lado, um
jogo pode não ter esse caráter punitivo e representar, ao contrário, uma fonte
de aprendizagem para o aluno por meio da qual ele se diverte. Se conseguimos
tornar a aprendizagem algo prazeroso ao aluno, acreditamos cumprir uma
de nossas tarefas como educadores que acreditam que o aluno constrói seu
conhecimento e que, para tanto, ele deve se identificar com o que faz.
13
É verdade que isso pode acontecer, ou não, tanto em um jogo quanto em um
software educativo. No caso do Aplusix, como visto anteriormente, o usuário
recebe apenas a indicação de que, em uma determinada etapa de seu trabalho,
cometeu um erro.
14
A análise dos dados foi realizada com a ajuda do software Anaïs, especialmente
desenvolvido para o tratamento dos dados obtidos com o Aplusix.
234 M. BITTAR
não consegue identificar, apesar da correção, onde está seu erro ou então ele
apaga tudo o que fez e copia o que está no quadro-negro. Do ponto de vista da
aprendizagem, muito se perde, uma vez que a correção é feita sobre a produção
do professor e não sobre a produção do aluno.
Quando o aluno resolvia fazer um teste para avaliar seu trabalho, ele
tinha, imediatamente, ao final, sua pontuação, e podia ver o que havia errado,
inclusive tendo, nesse momento, o direito de corrigir o que errou, ganhando
as retroações do software. Essa funcionalidade do Aplusix foi muito apreciada
pelos alunos, pois, como afirmaram vários deles ao serem entrevistados: “A
gente não precisa esperar para saber como se saiu no teste e pode fazer isso
sozinho”. A partir das retroações do software, eles tentavam compreender o
que não estava correto em suas resoluções, chamando o professor somente
quando não conseguiam superar essas dificuldades.
O nível de autonomia dos alunos cresceu a cada sessão. Cada estudante
trabalhou de acordo com seu nível, o que é muito diferente de uma situação em
sala de aula com papel e lápis, pois, nesse caso, o professor prepara um trabalho
(lista, por exemplo) para toda a classe, uma vez que dificilmente conseguirá
elaborar listas diferentes para atender às necessidades especiais de cada aluno.
O que se observa nesses casos é que os alunos mais avançados perdem o inte-
resse e aqueles com maiores dificuldades não conseguem acompanhar a média
da turma. O que pretendemos com essa proposta foi analisar, junto com a
professora, se esse software realmente favoreceria um trabalho que respeitasse
as diferentes posições de cada sujeito relativamente ao saber15. A análise das
realizações das sessões permitiu observar justamente a presença dessa variável
no trabalho proposto. Alguns alunos trabalharam mais de uma família em uma
15
Permitindo que o aluno trabalhe de acordo com seu tempo e dificuldades, o
professor poderá melhor identificar onde estão as reais dificuldades dos alunos e
como eles podem superá-las, ou que tipo de situação pode elaborar para favorecer
a superação de tal dificuldade. Esse não foi, porém, o objetivo central de nossa
investigação.
A escolha do software educacional e a proposta pedagógica do professor 237
mesma sessão e outros ficaram mais de uma sessão em uma mesma família. Isso
se deu em virtude dos resultados obtidos por eles nos testes. Vale lembrar que
eles decidiam quando mudar ou não de família.
Do total de 60 alunos, 54 participaram de pelo menos cinco sessões, de
uma ou duas horas, e como eles escolheram o momento de mudar de família de
exercícios, eles atingiram diferentes famílias ao longo das sessões, tendo, assim,
diferentes progressões. A Tabela 2 mostra essas progressões: a maioria dos
estudantes (34) atingiu as famílias 3 ou 4. Isso significa que, em uma situação
usual, todos os alunos ficariam retidos nessas famílias, porém observamos isso
não ocorrendo tendo 19 alunos nas famílias 5 ou 6, ou seja, que tiveram outro
tipo de progressão.
Nº de horas
trabalhadas 5 6 7 8 9
Famílias atingidas 3 4 5 2 3 4 5 2 3 4 5 6 2 3 4 5 6 3 4 5 6
Nº de alunos que
atingiram cada 1 1 1 1 1 3 5 1 3 2 1 2 1 5 2 5 1 8 6 2 2
família
Tabela 2. Distribuição de alunos em relação ao número total de horas traba-
lhadas e às famílias de exercícios atingidas.
Concluindo...
Referências
Capítulo 10
Resumo
1
e-mail: taniammcampos@hotmail.com
2
e-mail: mkarrer@uol.com.br
3
e-mail: silalevicente@gmail.com
244 T. M. M. CAMPOS, M. KARRER e S. A. S. VICENTE
Introdução
4
A captura das telas foi realizada por meio do programa Irfanview32.
Função logarítmica: a utilização do software Winplot ... 251
tadores utilizados por esses estudantes, a fim de avaliar suas construções nesse
ambiente. Durante a condução do design, o professor-pesquisador realizou
questionamentos a partir das produções parciais apresentadas pelos sujeitos.
Para capturar esses diálogos, cada estudante recebeu um gravador no início
da seção. Desta forma, para a análise dos dados coletados, foram utilizados
três tipos de instrumentos: a produção escrita presente nas fichas distribuídas,
a produção oral proveniente dos diálogos estabelecidos entre o professor-
pesquisador e os sujeitos e as construções das telas capturadas.
Com o intuito de explorar as diversas conversões, optamos por utilizar
o software Winplot naquelas que envolviam o registro gráfico, uma vez que ele
possibilita, conforme já relatado, o trabalho simultâneo com três diferentes
registros: o gráfico, o simbólico-algébrico e o numérico. A figura seguinte
contém um exemplo da tela desse software, com a presença simultânea desses
três registros da função logarítmica de base 10, ou seja, de f(x)=logx.
Estudante B:
Estudante C:
Estudante A:
Estudante B:
registros solicitados.
Em geral, observamos que as conversões requeridas não são transfor-
mações nas quais os estudantes apresentam facilidades. Os relatos orais foram
primordiais, pois nos forneceram mais dados para avaliar a real compreensão
desses sujeitos. É provável que tais dificuldades ocorram pelo fato de essas
conversões, em especial a transformação entre gráfico e língua natural escrita,
não constituírem uma prática usual no ensino de Matemática.
Apresentando uma análise individualizada de cada sujeito, pôde-se
observar que o Estudante A mostrou um bom conhecimento dos registros
envolvidos nas atividades e habilidade em coordenar as conversões entre esses
mesmos registros. Nos momentos em que apresentou respostas incompletas,
frequentemente detectou esses problemas quando questionado pelo professor-
pesquisador.
O Estudante B, na maior parte do experimento, mostrou difi-
culdades em estabelecer as conversões requeridas. É provável que tais
dificuldades decorram do fato de as conversões entre as representações
serem não congruentes, nas diversas situações propostas. Isso pôde
ser constatado, por exemplo, quando ele apresentou problemas de
interpretação gráfica. Ao afirmar que log 1 x > log 1 x é verdadeiro
2 5
para qualquer x, esse aluno não estabeleceu a relação entre o registro gráfico e
o algébrico, uma vez que ele apenas comparou os valores das bases. Apesar de
esse aluno inicialmente se fixar exclusivamente nas representações fornecidas
pelo software, ele utilizou seus recursos para testar suas conjecturas, principal-
mente o da tabela de valores.
O Estudante C mostrou grande habilidade em resolver situações que
requeriam a conversão do gráfico para a língua natural, porém, quando a situ-
ação envolveu o registro simbólico (cf. descrito na atividade 1), o estudante
apresentou dificuldades na conversão.
Diante das dificuldades apresentadas pelos estudantes, o professor-
pesquisador solicitou explicações verbais, a fim de compreender o que eles
estavam querendo representar. Em diversos momentos, a produção verbal
revelou que os estudantes possuíam uma compreensão satisfatória da situação
requerida, o que não se refletia em suas produções escritas.
A seguir, apresentaremos sugestões de outras duas atividades que
266 T. M. M. CAMPOS, M. KARRER e S. A. S. VICENTE
Considerações Finais
Referências