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CASO CLINICO 12

Introdução à Clínica Médica MM372


30 e 31 de Maio – 2011

QUEIXA PRINCIPAL – “DOR ABDOMINAL E AMARELÃO”

ANAMNESE: Uma mulher de 70 anos apresenta-se no serviço de emergência


com um quadro de náuseas, vômitos, icterícia e dor no quadrante superior direito
há uma semana. Sua enfermidade começou gradualmente com anorexia e
desconforto no quadrante superior direito (há 10 dias) acompanhados de náuseas
e vômitos (há 5 dias). Há 3 dias o marido notou que a pele e os olhos da paciente
estavam discretamente amarelados. A paciente refere que há dois dias notou que
sua urina ficou escura (como se fosse coca-cola) as fezes ficaram extremamente
brancas (massa de vidraceiro). A dor nas últimas 24 horas piorou muito e tornou-
se constante e em peso, parecendo melhorar e piorar, irradiando-se para cima em
direção a linha hemiclavicular direita. Ao ser adminitida no hospital a paciente
vomitava muito não comia há 24 horas e apresentava-se com dor severa (VSA=9).

Dicas para o raciocínio clínico: Pense... Quais os mecanismos fisiopatológicos


que podem levar a icterícia desta paciente.

Causas Mecanismos
01 Icterícia Hemolítica Destruição excessiva das hemácias
02 Icterícia Hepatocelular Hepatites, medicamentos, cirrose
03 Icterícia Obstrutiva colestática Cálculo, estenose ou neoplasia que
obstrua o colédoco.
Tríade:

ICTERÍCIA ACOLIA COLÚRIA

ICTERÍCIA COLESTÁTICA

Acolia: ausência de bile.

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Colúria: presença de elementos biliares, p.ex., pigmentos, sais, bile, na urina,
condição que acompanha ger. a icterícia; coluria ou colúria
Icterícia: síndrome de várias moléstias, caracterizada pela coloração amarela dos
tecidos e das secreções orgânicas, resultante da presença anormal de pigmentos
biliares; iterícia.

Dicas para o raciocínio clínico: Pense... Como se trata de uma icterícia colestática,
sua tarefa semiológica é determinar se a causa é intra ou extra-hepática.

Conduto cístico

Conduto Hepático
comum
A

Papila de Vater

Visualize no desenho acima as principais causas de colestase intrahepática (A)


e extrahepática (B)
A- Hepatite, doenças hepáticas produzidas pelo álcool, cirrose biliar primária, efeitos de
medicamentos e mudanças hormonai, como ocorre na gravidez (colestase da gravidez)
B- Cálculo no canal biliar (coledocolitíase), estenose de um canal biliar ou um cancro do
mesmo, o cancro pancreático e a inflamação do pâncreas.

Dicas para o raciocínio clínico: Pense... Dor na icterícia pode auxiliar na etiologia. .

O dogma de que icterícia indolor equivale a câncer e de que icterícia dolorosa


significa cálculo biliar não é confiável, pois pode, em ambos os quadros, pode
haver dor ou não, entretanto a dor pode sugerir uma etiologia.

DOR FORTE E EM CÓLICA Doença litiásica.


SUGERE?
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DOR CONSTANTE E EM PESO? Processo neoplásico ou inflamatório
que distende a cápsula de Glisson.

REVISÃO DE SISTEMAS: A paciente nega sintomas de artrite, artralgia,


prurido ou urticária (sugerindo hepatite) nem qualquer alteração no hábito
intestinal. Negou tosse, expectoração, hemoptise, febre ou perda de peso.
Nega qualquer cirurgia prévia. Apresenta uma intolerância a glicose há 12
anos, controlada com dieta rigorosa e metformina 500mg via oral de 12/12
horas. Hipertensão recente tratada com hidroclorotiazida 25mg manhã.

CONDIÇÕES E HÁBITOS DE VIDA: Fumou 30 cigarros brancos ao dia por


muitos anos seguramente mais de 30 anos. Parou há 10 anos por extensa
propaganda antitabágica. Bebe de uma a duas taças de vinho à noite no jantar
há 20 anos. Não come frutos do mar crus, não tomou injeções ou transfusões
de sangue no passado. Nega contato com águas paradas recentemente.

ANTECEDENTES MÓRBIDOS FAMILIARES: História familiar negativa para


doença, cálculo ou câncer biliar e ninguém em sua casa ou na família
apresentou icterícia recentemente.

EXAME FÍSICO:
A paciente quando entrou no consultório revelou ao médico uma franca icterícia
(figura 1), estava extremamente ansiosa, com uma posição antiálgica
segurando o hipocôndrio direito (e era nitidamente obesa).
PA- 160/90 mmHg braço direito sentado. FC-90; Pulso - 90; FR-18; Temp-
38,50 C; Peso 74Kg; altura 172cm. Peso 96kg, altura 1,58m.

Figura 1: Icterícia de escleras

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A palpação do fígado estava aumentado (15cm na linha hemiclavicular direita à
percussão e 4cm abaixo do gradil costal à palpação) extremamente doloroso.
Abdômen não distendido e foi pesquisado o sinal de Piparote encontrava-se
negativo. O sinal de Murphy estava ausente. Foi procurado estigmas de
doença hepática crônica (cirrose) todos negativos. Foi também pesquisado
Asterix e sinal de Babinski e Hoffman todos ausentes.

Dicas para o raciocínio clínico: Como é realizado e o que significa sinal de Murphy
positivo.

O sinal de Murphy é um sinal médico presente no exame físico de um paciente.


É indicativo de colecistite, quando o paciente suspende a inspiração por dor à compressão do
rebordo costal direito.

O método para pesquisar a presença do sinal é o seguinte: o examinador, à direita do paciente


em decúbito dorsal, traça uma linha imaginária da Espinha Ilíaca Ântero-Superior Esquerda até
o Rebordo Costal Direito que passe pelo umbigo, encontrando o ponto de cruzamento com a
Linha Hemiclavicular Direita; coloca sua mão esquerda de modo que o polegar se insinue sob o
rebordo costal direito ao nível da borda interna do músculo reto anterior - sobre o ponto
imaginário anteriormente descrito, enquanto a face palmar da mão direita apóia-se sobre o
flanco afectado. Sem afrouxar a pressão exercida pela mão palpadora, manda-se o paciente
inspirar profundamente. Em caso de dor, o paciente interrompe o movimento respiratório e
realiza um padrão respiratório do tipo Kussmaul, ao mesmo tempo em que reclama da
palpação dolorosa.

Dicas para o raciocínio clínico: Como é realizado e o que significa sinal de Piparote
presente.

Sinal do piparote ou Sinal de onda líquida é um sinal médico indicativo de


ascite. Um impulso percebido através da transmissão pelo líquido acumulado, através de uma
percussão em um dos flancos.

Para realizar o procedimento pede-se para o paciente (ou outra pessoa) colocar a mão na linha
mediana do abdômen (apoiar com certa firmeza - não apoiando a palma, mas sim a lateral da
mão esticada na linha médiana) e então realiza-se a percussão em um dos lados do abdômen.
Observa-se se há transmissão de onda de líquido para o lado oposto do abdômen. Caso haja
proseguimento da onda para o lado oposto do abdômen o sinal é considerado positivo.

Dicas para o raciocínio clínico: Quais os sinais de doença hepática crônica


(cirrose).

Fraqueza, varizes esofágicas, hipertensão portal, ascite, insuficiência renal,


encefalopatia hepática, debilidade muscular, eritema palmar, flexão dos dedos das mãos
(contratura de Dupuytren), aranhas vasculares, sinal da cabeça de Medusa, ginecomastia,
perda de cabelo, atrofia testicular, neuropatia periférica. Uma obstrução crónica do fluxo da bile
pode produzir icterícia, comichão* e a formação de pequenos nódulos amarelados na pele,
especialmente à volta das pálpebras. A desnutrição deve-se, em geral, a uma falta de apetite e

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à absorção insuficiente de gorduras e de vitaminas lipos-solúveis, resultante da fraca produção
de sais biliares.
*Comichão: sensação cutânea desconfortável que leva um indivíduo a coçar ou friccionar a
pele; prurido.

Dicas para o raciocínio clínico: O que é o Asterix ou sinal de Flapping e qual o seu
significado?

O "flapping" é o sinal característico de Encefalopatia hepática porém não


específico desta síndrome. Consiste no tremor involuntário das mãos à dorsiflexão em "bater
de asas".

EXAMES COMPLEMENTARES:
1- Hemograma:
Eritrócitos- 4,400,000 yL (VR- 4,32 à 5,72).
Hg- 13,4g/dl (VR 12 à 16g/dl).
VG- 45% (VR-38,8 à 50%).
VCM- 89mm3 (VR- 84 à 99mm3).
HCM- 30 pg (VR- 26 à 32 pg).
CHCM- 32pg (VR 31 à 36 pg).
RDW- 14% (VR 11,8 à 15,6%).
Leucócitos – 10.000 (com 50% de linfócitos e 50% de
polimorfonucleares sendo 5% dos linfócitos atípicos).
Plaquetas: 225.000/yL (VR- 150mil à 450mil yL)

2- Função renal e amilase normais.


3- Glicemia de jejum 240mg/dl.
4- TAP com RNI de 1.4
5- Bilirrubina total de 12,MG/dl (direta 7mg/dl e indireta 5mg/dl).
6- AST (TGO) – 1.100 UI/L e ALT (TGP) 800 UI/L (VR menor que 40 UI/L).
7- Fosfatase Alcalina 200UI/l.
8- ECG e RX simples de abdômen são normais.
9- Parcial de urina ausência de urobilinogênio.

Dicas para o raciocínio clínico: Por que a ausência de urobilinogênio dentro da


urina auxilia no raciocínio etiopatológico deste caso?

Uma quantidade aumentada de bilirrubina formada na hemólise, leva a uma


concentração aumentada de urobilinogênio no intestino. Em doenças hepáticas (como a
hepatite) o ciclo enterohepático do urobilinogênio é inibido, o que aumentada ainda mais os
níveis intestinais de urobilinogênio.

Numa obstrução biliar, uma baixa quantidade de bilirrubina conjugada chega ao intestino para a
conversão a urobilinogênio. Com uma limitada quantidade de urobilinogênio disponível para
reabsorção e excreção, a quantidade de urobilina encontrada na urina é baixa. Altas

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concentrações, no fígado, de bilirrubina conjugada, que é solúvel, entram na circulação onde
são excretadas através dos rins. Esses mecanismos são responsáveis pela urina escura e
fezes claras observadas no obstrução biliar.

Ausência de urobilinogênio na urina pode ser resultado de icterícia completa obstrutiva ou de


tratamentos com antibióticos de amplo espectro, que destroem a flora bacteriana intestinal,
além de uma falha na produção de bilirrubina ou obstrução de sua passagem.

Baixa concentração de urobilinogênio pode ser resultado de icterícia enzimática congênita


(síndromes hiperbilirrubínicas) ou de tratamento com drogas que acidificam a urina, como ácido
ascórbico ou cloreto de amônio.

Níveis elevados podem indicar icterícia hemolítica, sobrecarga hepática, quebra excessiva de
hemácias, produção de urobilinogênio aumentada, reabsorção - um grande hematoma, função
hepática comprometida, infecção hepática, envenenamento ou cirrose hepática.

O médico fez um teste terapêutico utilizando uma ampola de vitamina K EV que


normalizou o TAP com RNI dentro de 24 horas.

Dicas para o raciocínio clínico: Como a relação entre transaminases e fosfatase


alcalina pode auxiliar na etiologia da icterícia.

Relação AST/ALT

• além das características individuais, a relação entre o aumento das enzimas tem valor
diagnóstico
• tanto a AST quanto a ALT costumam subir e descer mais ou menos na mesma
proporção em doenças hepáticas
• elevações pequenas de ambas, ou apenas de ALT em pequena proporção, são
encontradas na hepatite crônica (especialmente hepatite C e esteato-hepatite não
alcoólica)
• como na hepatite alcoólica há maior lesão mitocondrial, proporcionalmente, do que nas
outras hepatopatias, observa-se tipicamente elevação mais acentuada (o dobro ou
mais) de AST (que é encontrada nas mitocôndrias) do que de ALT, ambas geralmente
abaixo de 300 U/L
• elevações de ambas acima de 1.000 U/L são observadas em hepatites agudas virais
ou por drogas

Fosfatase alcalina

• trata-se não de uma enzima, mas de uma família de enzimas, presente em


praticamente todos os tecidos; no fígado, é encontrado principalmente nos microvilos
dos canalículos biliares e na superfície sinusoidal dos hepatócitos
• o aumento da fosfatase alcalina hepática é mais evidente na obstrução biliar, aonde o
acúmulo de sais biliares a solubilizam e a obstrução promove a sua regurgitação entre
as células hepáticas até o sangue
• em casos de elevação da fosfatase alcalina aonde não observa-se sinais clínicos ou
laboratoriais de doença hepatobiliar, é possível a diferenciação entre as principais
isoenzimas (hepática, óssea e intestinal) para localizar a fonte da alteração.
• valores normais variam de acordo com a idade: 1 dia de idade: até 250 U/L; 2 - 5 dias:
até 231 U/L; 6 dias - 6 meses: até 449 U/L; 7 meses - 1 ano: até 462 U/L; 2 - 3 anos:
até 281 U/L; 4 - 6 anos: até 269 U/L; 7 - 12 anos: até 300 U/L; 13 - 17 anos: até 187
U/L (mulheres) e 390 U/L (homens); adultos: 35 a 104 U/L (mulheres) e 40 a 129 U/L
(homens)

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ECOGRAFIA DE ABDOMEN- Mostrou um fígado aumentado de volume, sem
presença de cálculos em vesícula biliar, ausência de abscesso hepático,
nódulos metastáticos ou hipertensão porta. Ausência de dilatação dos ductos
intrahepáticos. Achados compatíveis com hepatopatia difusa aguda.

SOROLOGIAS VIRAIS demonstraram IgM anti-HAV e IgG anti HAV fortemente


positivas.

REFERÊNCIAS:
1-HARRISON Medicina Interna 170 Edição

Página 7
2-Mario Lopes, Semiologia Médica 60 Edição.

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