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Minicurso on-line de Finanças Públicas para Concursos

Aula 01 - Evolução do papel do Estado na economia

Recentemente, a crise mundial iniciada em setembro de 2008, nos

chamou a atenção para um tema até então abordado somente nos meios

acadêmicos ou estudado de forma não-reflexiva por candidatos de

concursos públicos: a intervenção do Estado na economia com o propósito

de garantir o bem-estar social e o crescimento econômico. Vamos, então,

falar um pouco deste tema.

Tradicionalmente, o estudo deste assunto divide-se em duas

abordagens: a clássica e a keynesiana.

Na visão clássica do pensamento econômico, oriunda do século 19,

o Estado deveria interferir minimamente e somente em setores

considerados estratégicos como segurança nacional (bem público) ou,

ainda, que não fossem atendidos adequadamente pela iniciativa privada,

como saúde e educação (bens semipúblicos) 1. Este modelo de intervenção

ficou conhecido como Estado Mínimo. Esta ideia tem raízes no

pensamento de Adam Smith que, ao escrever a Riqueza das Nações

(1779), apregoa o liberalismo econômico e a filosofia do laissez-faire,

nos quais a iniciativa privada e o individualismo na busca pelo lucro seriam

suficientes para mover a economia e promover o bem-estar de todos. E,

para combater os eventuais excessos do capitalismo selvagem, Smith

também desenvolveu a ideia da Mão Invisível, que seria uma espécie de

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Veremos mais detalhes acerca dos tipos de bens, na aula sobre bens públicos.

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mecanismo natural que entraria em ação frente aos extremos cometidos

pelo mercado, mantendo-o em equilíbrio.

Para os clássicos a intervenção mínima do Estado, que deveria ter

um papel muito mais regulador, justificaria um mínimo de tributação para

atender a um orçamento público reduzido.

Esta tributação deveria se dar, preferencialmente, de forma indireta

a fim de não comprometer a riqueza gerada pela sociedade e que seria a

principal fonte de recursos para novos investimentos e, desta forma,

fomentar o crescimento da economia. Neste modelo, essencialmente, não

existe planejamento macroeconômico.

Apesar da oposição de alguns teóricos, o modelo clássico funcionou

relativamente bem até 1929 quando a quebra da bolsa de valores de

Nova Iorque, motivada pelo excesso de oferta de bens, chacoalhou os

mercados e deixou desconcertados os economistas e os governos que,

posteriormente, assistiram atônicos ao desequilíbrio total da atividade

econômica, com forte queda na produção de bens e crescente número de

desempregos, mergulhando os Estados Unidos, e depois o mundo, em

uma profunda recessão. Este período ficou conhecido como a Grande

Depressão.

A partir deste momento, era impossível que a Mão Invisível

continuasse a regular os mercados visto que nem a oferta agregada (a

produção das empresas) nem a demanda agregada (agora a crescente

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massa de desempregados) conseguiam se adequar a nova realidade

econômica.

Entra em cena a visão keynesiana, elaborada pelo economista

inglês John Maynard Keynes que, em 1936, propõe a inversão da Lei de

Say2 que regia o pensamento clássico de até então. Ou seja, a demanda é

que dita a oferta, e que para que isso acontecesse efetivamente, o Estado

deveria intervir diretamente na economia a fim de estimular a demanda

agregada (emprego e renda), se utilizando de instrumentos de política

fiscal e também atuando de forma direta como produtor de insumos e

empregos e como consumidor, absorvendo boa parte da produção gerada

pela iniciativa privada (evitando os excedentes de produção). Lembrando

que o Estado ainda manteve o seu papel regulador.

Como se pode imaginar, a maior intervenção do Estado gerou um

necessário aumento no nível de tributação com o propósito de financiar o

agora robusto e frequentemente deficitário orçamento público.

Este modelo de Estado ativo e intervencionista perdurou até meados

dos anos 1970, quando novas mudanças no cenário mundial tornaram

insustentável a sua manutenção.

Vamos ver como esse assunto vem sendo explorado pelas bancas

nestas três questões recentes da ESAF.

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A oferta cria sua própria demanda.

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(STN – 2008) Sobre a Escola Clássica (Liberalismo) é correto afirmar:

a) trata-se de um sistema econômico baseado na livre-empresa, mas com


acentuada participação do Estado na promoção de benefícios sociais, com
o objetivo de proporcionar padrões de vida mínimos, desenvolver a
produção de bens e serviços sociais, controlar o ciclo econômico e ajustar
o total da produção, considerando os custos e as rendas sociais.

b) admite, por princípio, que a ação do Estado deve restringir-se ao


mínimo indispensável, como a defesa militar, a manutenção da ordem, a
distribuição da justiça e pouco mais, pois a iniciativa privada faz melhor
uso dos recursos públicos.

c) deu-se a partir das décadas de 1980 e 1990, a reboque da crise fiscal,


do início do processo de globalização da economia e da ineficiência do
Estado na produção de bens e serviços.

d) de caráter nacionalista e intervencionista, preconiza para o Estado uma


política econômica e financeira fundada na maior posse de dinheiro e
metais preciosos, acreditando que nisso reside a base da prosperidade.

e) corresponde fundamentalmente às diretrizes estatais aplicadas nos


países desenvolvidos por governos social-democratas. Nos Estados
Unidos, certos aspectos de seu desenvolvimento ocorreram,
particularmente, no período de vigência do New Deal.

Comentários:

a) (falso) conforme vimos, à exceção do início da sentença, todo o


resto é exatamente o contrário do pensamento clássico.

b) (correto) a opção define corretamente a visão clássica.

c) (falso) o examinador tentou confundir o candidato, pois o que se


passou no período mencionado na questão foi o neoliberalismo.

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d) (falso) a questão aborda outro período histórico, que no Brasil,


ocorreu entre as décadas de 1930 e 1940, durante o Estado Novo.

e) (falso) o New Deal foi uma série de acordos implementados pelo


governo Roosevelt nos Estados Unidos durante a Grande Depressão
e, portanto, em período posterior ao solicitado na questão.

(STN – 2005) Baseada na visão clássica das funções do Estado na


economia, identifique a opção que foi defendida por J.M. Keynes.

a) As funções do Estado na economia deveriam ser limitadas à


defesa nacional, justiça, serviços públicos e manutenção da soberania.

b) As despesas realizadas pelo Governo não teriam nenhum


resultado prático no desenvolvimento econômico.

c) A participação do Governo na economia deveria ser maior, assumindo


a responsabilidade por atividades de interesse geral, uma vez que o
setor privado não estaria interessado em prover estradas, escolas,
hospitais e outros serviços públicos.

d) A economia sem a presença do governo seria vítima de suas


próprias crises, cabendo ao Estado tomar determinadas decisões sobre o
controle da moeda, do crédito e do nível de investimento.

e) A atuação do Governo se faria nos mercados onde não houvesse


livre concorrência e sua função seria a de organizá-la e defendê-la,
para o funcionamento do mercado e para seu equilíbrio.

Comentários:

a) (falso) a opção aborda a visão clássica da economia.

b) (falso) os gastos públicos são justamente o principal instrumento do


Estado para fomentar a demanda agregada.

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c) (falso) a opção é generalista. É possível afirmar que a iniciativa


privada não tenha interesse em investir em bens públicos devido
aos altos custos envolvidos, mas o mesmo não se pode afirmar em
relação aos bens semipúblicos tais como hospitais e escolas. Além
disto, o gasto público não deve ser indiscriminado, e sim voltado ao
fomento da demanda agregada.

d) (correto) esta é a própria visão keynesiana. O Estado deve intervir


diretamente nesses itens como forma de prevenir as crises.

e) (falso) a opção é verdadeira, mas não atende ao enunciado da


questão. Ela trata da ação do Estado como forma de corrigir uma
falha de mercado, no caso, a ausência de livre concorrência típica
dos monopólios naturais3.

(APO – MPOG – 2008 – ESAF) 8 - Ao longo da história e, principalmente,


nos dois últimos séculos, a participação do Estado na economia vem
crescendo por várias razões. Identifique a única opção incorreta no que se
refere às razões do crescimento da participação do setor público na
atividade econômica.

a) Durante períodos de guerra, a participação do Estado na economia


aumenta, mas o gasto público se reduz.

b) Mudanças tecnológicas, como, por exemplo, a invenção do motor de


combustão significou maior demanda por rodovias e infraestrutura.

c) Crescimento da renda per capita, que gera um aumento da demanda de


bens e serviços públicos.

d) Novos grupos sociais passaram a ter maior presença política,


demandando assim novos empreendimentos públicos.

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Veremos mais deste assunto na aula sobre Falhas de Mercado.

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e) Mudanças da Previdência Social, pois, à medida que essa instituição


passou a ser também um instrumento de distribuição de renda, isso levou
a uma participação maior do Estado no mecanismo previdenciário.

Comentários:

a) (falso) Ora, isto não faz o menor sentido. Em período de guerra, o


gasto público aumenta enormemente e as consequências são diretas
sobre a economia. A guerra fomenta o crescimento econômico. Há
países que até inventam guerras para justificar o aumento dos
gastos públicos.

b) (correto) Este é um grande impulsionador de gastos do governo


para atender as novas expectativas da sociedade.

c) (correto) Quanto maior a renda disponível, mais o indivíduo irá


consumir e demandar bens e serviços públicos. Se ele compra um
carro, vai querer ruas e estradas. Se comprar uma casa, vai querer
esgotamento sanitário, iluminação pública e segurança.

d) (correto) Não podemos subestimar a força dos grupos sociais na


mobilização das agendas de políticas públicas.

e) (correto) Este assunto será abordado na aula 02, quando


comentarmos sobre o papel distributivo de renda via seguridade
social.

Na próxima aula, iremos abordar a função do bem-estar e suas

políticas.

Aguardo por sugestões, críticas ou, quem sabe, até algum elogio.

Seu retorno é importante para que eu possa aprimorar o meu trabalho.

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Obrigada pela sua atenção!

Renata Castro Ventura

Referencial bibliográfico:

FERREIRA, Marlos Vargas, Finanças para concursos públicos. - Rio de

Janeiro, Ed. Elsevier, 2008.

VASCONCELLOS, Marco Antonio S., Manual de Economia – Equipe de

professores da USP. 3° Edição – São Paulo - Ed. Saraiva, 2001.

VASCONCELLOS, Marco Antonio S., Fundamentos de Economia. - São

Paulo - Ed. Saraiva, 2000.

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