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Artigo apresentado no I Seminário WebCurrículo – PUC-SP

O uso de ferramentas da Web no Ensino Médio da


Escola Vera Cruz

Agosto/2008

Integração de mídias e tecnologias ao currículo

Lilian Starobinas

Eduardo Mancebo

Solange Wagner Locatelli


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RESUMO

Este trabalho tem por objetivo relatar algumas premissas que orientam a utilização
de tecnologias de informação e comunicação nas práticas educacionais do Ensino Médio
da Escola Vera Cruz, em São Paulo. Descrevemos a infra-estrutura pensada para o uso
cotidiano na escola, e algumas iniciativas, desenvolvidas pela direção ou por disciplinas
específicas, para a inserção do uso e reflexão sobre as tecnologias na vida educacional.
Palavras- chave: tecnologias, educação, escola, reflexão, prática pedagógica

A Escola Vera Cruz1 nasceu em São Paulo há 45 anos, e o Ensino Médio deu início
a suas atividades há 12, atendendo atualmente cerca de 350 alunos. Desde o início do
projeto, o uso de tecnologia foi contemplado de forma integrada à biblioteca, para que a
consulta a CD-ROMs, filmes em VHS e DVD e acervo musical ficassem disponíveis junto
com livros e revistas, de forma a valorizar e estimular todos os recursos de pesquisa. Esse
espaço tornou-se a midiateca, que atualmente possui 34 computadores conectados a
internet, além dos demais materiais. Parte do ambiente pode ser isolado para o uso em aula,
estando disponível também, nessa área, um telão fixo para uso do professor ou para
exibição de áudio-visuais.
Além da midiateca, paulatinamente foram sendo agregados espaços em que havia
disponibilidade de computador conectado à internet, telão e data-show, para uso em aula e
em reuniões de trabalho. A maior freqüência de uso fez com que, no ano de 2008, cada
uma das dez salas de aula passasse a possuir toda a infra-estrutura e equipamentos para uso
em aula: computador, amplificador e sistema de som, data-show e telão, conexão à
internet. Nesse momento, cada professor passou a responsabilizar-se pelo acionamento e
uso dos equipamentos, com eventual auxílio de um funcionário, se necessário.
A Escola utiliza um Portal para interação à distância entre alunos e professores.
Nele são disponibilizados materiais de leitura, orientações de estudo, calendários de
atividades e outros documentos que possam dar apoio às atividades escolares. O Portal
conta também com serviço interno de mensagens e a possibilidade de criação de fóruns.
A inserção do uso das tecnologias da informação e comunicação no cotidiano
escolar segue uma diretriz central à caracterização do projeto global da Escola: uma
adoção progressiva mas cuidadosa, permeada pela reflexão sobre a prática, com o
envolvimento de todos os educadores. Ao mesmo tempo em que apóia as iniciativas de
aproximação e uso desses novos recursos como estratégia pedagógica, a Escola não se
apressa em eleger um único modelo de uso, entendendo que há riqueza na variedade das
propostas. Dessa forma, facilita a inclusão dos profissionais, que se sentem à vontade para
sugerir usos compatíveis ao trabalho que desenvolvem, e dos alunos, que se defrontam
com estímulos e visões variadas sobre o uso da internet.
Por outro lado, a cada ano é mais evidente a necessidade de tornar a escola não só
um espaço de uso das tecnologias, mas também um lugar de discussão sobre o lugar social
das mesmas e sobre as transformações nos comportamentos que advém de sua
disseminação.
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São variados os usos que ocorrem nas diversas disciplinas, ao longo das três séries,
relacionadas à pesquisa, produção de áudio-visual, contatos internacionais, entre outros. A
partir dessas ações o Vera Cruz vem buscando uma atitude proativa na formação de seus
alunos, aliando o ensino para uma maior intimidade com essas linguagens à reflexão
associada à postura ética e responsável de seu uso. A seguir descrevemos algumas ações
específicas, desenvolvidas na Escola ao longo do ano de 2008.

V Fórum de Debates do Ensino Médio Vera Cruz

O Fórum de Debates é uma atividade que reúne todos os alunos do Ensino Médio
para um trabalho conjunto durante uma manhã. A cada ano seleciona-se um tema. O deste
ano, realizado no dia 20 de maio, tinha como título “Comunicação digital: comportamentos
e valores”. O evento contou com duas séries de palestras simultâneas, de profissionais
experientes no mundo digital: Bárbara Dieu, educadora, organizadora de projetos
colaborativos e membro de várias comunidades de práticas internacionais, Juliano Spyer,
especialista em mídias digitais e autor do livro “Conectado – o que a internet fez com você
e o que você pode fazer com ela”, Simonetta Persichetti, jornalista, crítica de fotografia,
que trabalha com as questões da exposição de imagens na sociedade midiatizada, e Hernani
Dimantas, coordenador do LIDEC – Escola do Futuro – USP, responsável pelo conteúdo
do ACESSA-SP, programa de inclusão digital do estado de São Paulo e articulador do
METARECICLAGEM, movimento independente de apropriação de tecnologia social. A
proposta era propiciar uma reflexão sobre a liberdade e a responsabilidade envolvidas no
uso dessa nova forma de comunicação, bem como ampliar a compreensão do seu uso e
potencialidades.
Como aquecimento, cada turma discutiu em sala, nos dias anteriores, o texto
“Nasce o homem algorítmico2, de Silvio Meira. Após as palestras e questões dos alunos,
foram realizadas oficinas com grupos menores, compostos por jovens das três séries e com
a coordenação de professores e representantes de alunos. As dinâmicas foram variadas,
algumas delas utilizando os vídeos com a versão em português de “A máquina somos
nós”3, de Michael Wesch e o anúncio da Telefônica Argentina (En tu casa sos capaz de
todo)4.
A escolha do tema do Fórum deu-se pela percepção da expansão do uso de
dispositivos digitais pelos jovens e pelo meio social em que eles circulam, sem um
processo paralelo de reflexão sobre as questões decorrentes desse uso. Assim, a Escola
optou por ampliar a discussão, ao invés de encerrar-se numa postura de puro cerceamento,
frente a práticas como a exposição da privacidade da sala de aula por meio de fotos ou
vídeos não autorizados. A orientação do evento tinha um viés intencional de falar das
diversas possibilidades de colaboração e bons usos da Rede. A preocupação em evidenciar
a necessidade de uma orientação ética não se tornou o centro do debate, uma vez que essa é
uma demanda é tida como necessária a qualquer situação no espaço escolar (e fora dele),
seja qual for o recurso envolvido.
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Oficina de Linguagem Virtual

Em 2008 foi criado o curso Oficina de Linguagem Virtual, com o objetivo de


aproximar os alunos do 2º colegial de questões relativas à compreensão e utilização de
ferramentas que possibilitam o contato com o chamado “Mundo Virtual”. O curso,
ministrado pelo professor Eduardo Mancebo, é semestral, e atende 25 jovens por turma,
durante 1h15 por semana. A outra oficina, que atende os demais alunos da série no mesmo
horário, tem como tema "Linguagem Visual".
Partindo do questionamento do próprio conceito de “Virtualidade”, o curso
apresenta aos alunos questões como ética, condutas, valores e procedimentos que podemos
adotar nesse mundo conectado e as diversas opções de utilização deste Universo; várias
alternativas para se atingir uma determinada meta. A solução passa pelo conjunto de
habilidades e aptidões de cada pessoa, muito mais uma questão de encontrar o caminho
“mais conveniente” do que o caminho “certo”. Aborda a importância da utilização destes
recursos não apenas na escola, mas também nas etapas de vida seguintes, como o curso
superior e a atuação profissional.
O cuidado com a excessiva exposição (no MSN e Orkut, por exemplo), os
conceitos de Público e Privado são enfocados de forma prática, com exemplos do
cotidiano. Hardware e Software também são confrontados, num paralelo com o real e o
virtual, O tangível e o não-tangível, que, no entanto, também existe.
Cobra-se do aluno que assuma uma postura conceitual, comprometendo-se com as
regras combinadas com o grupo. O que pode, o que não pode, como o uso do celular, mp3
e jogos. Durante o semestre, buscando melhor compreender a dinâmica de concentração e
foco em sala de aula, foi revogada a proibição da utilização de mp3: os alunos poderiam
escutar suas músicas, porém apenas em um ouvido, durante as atividades no micro. Em
caso de perda do controle, seria retomada a proibição. O resultado foi bastante positivo!
Diversos alunos mais agitados passaram a se concentrar melhor e outros simplesmente se
recusaram a escutar música, justificando que isso atrapalharia sua concentração no trabalho
a ser realizado. Houve também os que “compartilharam” o fone com os colegas ou
namoradas.
Voltado também para uma abordagem prática da utilização dos equipamentos, o
curso visa à integração com as outras disciplinas do 2º colegial, como regras para o
refinamento de buscas; o estudo do funcionamento do site Del.icio.us, citado no curso de
História; a criação e uso de um grupo de discussão, em conjunto com Química, ou mesmo
o apoio na orientação e produção do trabalho final resultante da viagem do Estudo do
Meio.
No primeiro semestre, por exemplo, foi abordado o conceito de “Pegada
Ecológica”5. Reunidos em grupos para discussão, cada aluno realizou seu próprio teste,
que revela o impacto humano destrutivo no planeta.
Propondo uma conscientização da turma, foi apresentada a comparação de toda a
classe, revelando as variáveis que afetam o impacto, relacionadas a conceitos presentes nas
disciplinas de Biologia, Geografia, História e Matemática, fundamentalmente dependentes
da atuação pessoal do aluno.
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Gerenciamento de links, crítica de fontes e consciência da autoria

Esse ano teve início uma proposta com os alunos do 2o ano do Ensino Médio, sob
orientação da professora Lilian Starobinas, voltada a aperfeiçoar o olhar crítico para as
fontes de pesquisa na internet. A existência de um blog de apoio ao curso de história6
estabeleceu-se como referência de espaço em que os alunos podiam ter acesso a materiais
usados em aula (vídeos, apresentações de slides), e links sugeridos para pesquisa, além de
reflexões associadas ao tema em estudo.
Desde as primeiras atividades, foi estabelecida uma rotina de orientação para o
gerenciamento de links de pesquisa: cada aluno que deseja usar a internet como fonte de
pesquisa em seus textos, deve criar para si uma página de links favoritos online e salvar as
páginas consultadas ali, agregando palavras-chave adequadas. Utilizamos o Del.icio.us7, e
cada aluno, na sua bibliografia, deveria mencionar seu endereço, para verificação posterior.
Essa prática tem como objetivo auxiliar os alunos a organizarem seu material de pesquisa
na rede, e permitir que eles reúnam referências que possam voltar a usar posteriormente.
Também facilita a verificação, pelo professor, das fontes utilizadas.
Uma iniciativa do curso de história foi estimular a produção escrita com a criação
de consciência da audiência para qual o texto se volta. Assim, trabalhamos com os alunos a
idéia de que suas produções não deveriam visar somente a professora, mas o público jovem
e adulto, de uma maneira geral. Com essa determinação, publicamos, primeiramente no
mural da escola e posteriormente no site8, doze textos, selecionados entre uma centena,
produzidos como exercício de reflexão e crítica da cobertura de mídia sobre a disputa no
Partido Democrata para a vaga a candidato a presidente dos EUA. Entrelaçando o estudo
da história com a avaliação sobre como os discursos de campanha abordam o passado, os
alunos puderam escolher um material de mídia (artigo de jornal, vídeo de campanha,
podcast) e escreveram seu texto dialogando com esse material.
Associado a esse trabalho, investimos também na compreensão da natureza do
hipertexto, focando a reflexão nas decisões sobre a criação de links e a qualidade das
fontes linkadas. Com esses objetivos em mente, utilizamos a produção de um texto
descritivo sobre aspectos relacionados à expansão dos EUA no século XIX para que cada
grupo produzisse um hipertexto, selecionando os aspectos relevantes que mereceriam o
aprofundamento a partir da visita a um site. Ao apresentar seu hipertexto para a turma, o
grupo precisava justificar o porquê da seleção dos links e apresentar o site linkado. A
avaliação contemplou tanto a correção e qualidade do texto como o bom uso da estratégia e
a pertinência e riqueza dos sites escolhidos. Alguns grupos que apostaram na utilização de
cópia literal, sem menção da fonte, tiveram seus trabalhos invalidados, o que permitiu uma
boa discussão sobre a inadequação dessa prática.
No desenvolvimento de trabalhos posteriores, foi possível notar que vários dos
alunos se apropriaram do gerenciador de links para o uso em outras disciplinas e mesmo
para seus interesses pessoais. A partir de alguns sites apresentados foi possível auxiliá-los a
verificar questões como a origem dos materiais, autoria, consistência dos dados, pobreza
de informações, viés ideológico acentuado, entre outras características.
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Fórum de discussão de Termoquímica

No 2.o trimestre de 2008, alunos do 3.o ano do ensino médio da Escola Vera Cruz,
sob a orientação da professora Solange Wagner Locatelli, desenvolveram um trabalho de
Termoquímica que durou cerca de um mês e meio. A proposta era de que os alunos, em
grupos e em casa, estudassem tópicos de termoquímica e o produto final seria uma
apresentação lúdica sobre o tópico: as formas de determinação da variação de entalpia.
Como não haveria muito tempo disponível para esclarecimento de dúvidas durante
as aulas, os alunos propuseram a criação de um fórum de discussões9, onde poderiam
enviar suas dúvidas quando estivessem estudando em casa. O objetivo inicial era o
esclarecimento de dúvidas básicas do tema.
Um aluno criou o fórum de discussões e foram nomeados mais três alunos, um de
cada classe, para serem responsáveis pela tutoria do espaço. Toda a turma podia postar
perguntas e comentários no fórum. Esses alunos tutores e a professora Solange eram
responsáveis pelo bom andamento, pelo encaminhamento de questões, pela busca de
possíveis respostas e discussões.
Todos os alunos se inscreveram no fórum e o que se observou foi um grande
envolvimento por parte de 20% da turma, onde o espaço virtual tornou-se palco de grandes
discussões e aprofundamentos do tema abordado. Mais de 500 mensagens foram trocadas.
Estudantes que não costumam se manifestar em sala tiveram uma participação mais ativa
no diálogo na internet. Alguns alunos também relataram que houve uma troca de suas
horas de vídeo game e Orkut pela participação ativa no fórum de discussões, já que a
maioria deles utiliza a internet diariamente.
Foram feitos muitos encaminhamentos e orientações sobre as discussões, inclusive
levando a questões reflexivo-filosóficas acerca do conteúdo e de interações
interdisciplinares, como com a física, por exemplo.
Como resultado os alunos conseguiram esclarecer adequadamente suas dúvidas
sobre o tema e, principalmente, trocar, questionar e aprofundar muitos aspectos entre eles
próprios. Conforme relato deles foi muito bom estudar dessa forma, foi instigante e
motivante e até sugeriram que outros trabalhos sejam feitos da mesma forma futuramente.
O desempenho da turma na avaliação do tema, de forma geral, foi muito superior à
da turma do ano passado que não desenvolveu o trabalho, tornando clara a eficácia desse
tipo de ferramenta no aprendizado de química.

Considerações finais

O viés de abordagem do uso das tecnologias de informação e comunicação na


Escola Vera Cruz tem se mostrado adequado, por permitir uma ampliação consciente, sem
que se abra mão das demais estratégias de trabalho relevantes à proposta pedagógica.
Como desafio, a Escola busca agora sistematizar as experiências já em curso, para
poder aperfeiçoá-las e aprofundá-las. Dessa forma, será possível agregá-las às práticas
educacionais consolidadas reunidas pela Escola ao longo de sua história.
6

1
http://www.veracruz.edu.br/
2
http://www.cartanaescola.com.br/edicoes/23/nasce-o-homem-algoritmico
3
http://br.youtube.com/watch?v=NJsacDCsiPg
4
http://br.youtube.com/watch?v=01vbd7efrys
5
www.pegadaecologica.siteonline.com.br
6
http://sobrehistoria.wordpress.com
7
http://del.icio.us
8
http://www.veracruz.edu.br/noticias.ler.php?id=112
9
http://z9.invisionfree.com/quimica/

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