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DIAGNÓSTICO E TERAPÊUTICA DOS

39 DERRAMES PARAPNEUMÔNICOS
Evaldo Marchi
Assistente Doutor da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP
Marcelo A. C. Vaz
Assistente Doutor da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP
Roberta K. B. S. Salles
Pós-Graduanda da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP

Introdução decidir por procedimentos menos invasivos, como a


drenagem pleural percutânea guiada por imagem, que
Os derrames pleurais são observados em cerca contribui para o adequado esvaziamento de líquido,
de 40 a 57% das pneumonias complicadas que exi- em especial nos derrames loculados. Ainda nesta li-
gem internação hospitalar 1, 2. Tosse, febre, dor nha de raciocínio, a utilização de agentes fibrinolíticos
torácica e dispnéia persistentes podem ser está ganhando cada vez mais aceitação, por permitir a
indicativos da presença de derrame pleural associa- drenagem do líquido pleural viscoso antes da forma-
do à pneumonia. Em muitos pacientes, quando o ção do empiema franco.
derrame assume pequenas proporções ou o quadro
infeccioso está controlado, a abordagem do espaço Diagnóstico dos Derrames Parapneumônicos
pleural pode ser desnecessária. Nos derrames mo-
derados ou volumosos, ou quando há risco de com- Métodos de Imagem
plicações infecciosas, deve ser considerada a possi- Pequenos derrames (200 a 500 ml) muitas vezes
bilidade de abordagem diagnóstica e terapêutica do são de difícil visualização na radiografia convencional
derrame. de tórax, causando apenas ligeiro velamento do seio
A adequada avaliação dos parâmetros clínicos, costofrênico. A consolidação de um lobo inferior por
radiológicos e laboratoriais é fundamental para a pneumonia pode contribuir para retardar o diagnósti-
decisão de intervenção pleural nas suas diversas co do derrame pleural. Além disto, derrames loculados
formas 3. Dependendo da severidade do quadro podem assumir formas variadas na radiografia, con-
infeccioso, do tempo de início da antibioticoterapia fundindo a análise e interpretação dos achados 5.
e da virulência do agente infectante, 5% a 50% dos Como norma geral, qualquer paciente com pneumo-
pacientes podem necessitar de drenagem pleural. A nia e suspeita de derrame pleural deve ser submetido
abordagem tardia ou inadequada dos derrames se- a radiografias de tórax em decúbito lateral, que per-
cundários à pneumonia implica no aumento das ta- mitem elucidar a presença de derrames de pequeno
xas de morbimortalidade, levando na maioria das volume. Nesta situação, a constatação da presença
vezes ao risco de loculação dos derrames, empiema de derrames com 10 mm ou mais de líquido no
e sepsis. Estudos indicam que o tempo de internação decúbito lateral é indicativo de abordagem da cavida-
hospitalar para os derrames parapneumônicos com- de pleural por toracocentese com fins diagnósticos 1.
plicados ou para o empiema é 3 a 4 vezes maior que A ausência de imagem característica de derrame não
para os derrames não complicados 4. Por outro lado, exclui a presença de líquido, que pode estar loculado,
a abordagem diagnóstica precoce pode permitir exigindo outros métodos auxiliares de imagem para

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confirmação e orientação diagnóstica. De fato, até derrames, indicativa de uma abordagem mais agres-
30% de pacientes com efusões loculadas necessitam siva, sugere-se a utilização das medidas da
de ultrassonografia ou tomografia computadorizada de desidrogenase lática (DHL), glicose e pH. A DHL,
tórax para diagnóstico dos derrames paraneumônicos6. produto de lise celular, apresenta-se elevada, po-
A ultrassonografia pode, além de localizar a co- dendo freqüentemente alcançar valores maiores que
leção líquida, contribuir para esclarecer a natureza de 1.000 UI/dL nos derrames parapneumônicos com-
seu conteúdo e indicar o ponto mais adequado para a plicados e no empiema. Os níveis de glicose se en-
toracocentese. A utilização de transdutores de alta contram diminuídos (< 60 mg/dL) precocemente,
freqüência permite esclarecer com detalhes as carac- podendo alcançar níveis < 40 mg/dL nos casos mais
terísticas de ecogenicidade do derrame. Por este mé- complicados. Os níveis de glicose diminuem por
todo é possível inferir que o derrame tem característi- intensa glicólise devido ao elevado metabolismo dos
cas de transudato quando se apresenta anecóico ou leucócitos e bactérias. Níveis de pH < 7,2 sugerem
com baixa ecogenicidade, enquanto a presença de atividade exsudativa intensa no líquido pleural, en-
septações ou debris, característicos de restos de fibrina, quanto pH < 7,0 é indicativo de empiema 11.
leva ao diagnóstico de exsudato ou empiema em for- No entanto, a interpretação dos achados
mação 7. laboratoriais sofre a interferência de diversas variáveis,
Nos processos pleurais e parenquimatosos mais acentuadamente na avaliação da medida do pH.
complexos, a tomografia computadorizada é impe- Para tanto, recomenda-se que o líquido obtido por
rativa, podendo esclarecer detalhes da presença e toracocentese seja colhido de forma semelhante ao
diagnóstico diferencial do derrame septado com o obtido para a gasimetria arterial, isto é, com seringa
abscesso pulmonar ou do mediastino, das caracte- heparinizada, e analisado somente em aparelhos de
rísticas de espessamento pleural e eventualmente da gasimetria, já que os valores obtidos em medidores de
atenuação da gordura mediastinal, sugestivas de mesa ou fitas de pH não são confiáveis 12. Na prática
empiema 8, 9 . clínica diária, no entanto, muitos laboratórios se recu-
A ressonância nuclear pode ser utilizada no sam a medir o pH do líquido pleural em aparelhos de
diagnóstico diferencial dos transudatos, exsudatos gasimetria, justificando que os debris do líquido es-
de diferentes etiologias e do empiema, baseado no pesso causam danos ao equipamento. Mesmo com
resultado diferencial das características do sinal essa variável, a medida do pH deve ser utilizada de
obtido. Porém, são necessárias ainda outras evi- rotina para nortear o raciocínio diagnóstico diferencial
dências para o emprego rotineiro deste exame para dos derrames parapneumônicos.
o diagnóstico diferencial dos derrames A análise bacterioscópica do líquido pleural nem
parapneumônicos 10. sempre permite a identificação dos agentes patogênicos
envolvidos. Este fato ocorre provavelmente porque,
Laboratório na maioria das ocasiões, a antibioticoterapia empírica
é instituída precocemente para controle da pneumo-
Os parâmetros laboratoriais são importantes na nia. Determinantes como idade, imunidade e fatores
definição do estágio do derrame parapneumônico de risco para aspiração contribuem para inferir a res-
no momento do diagnóstico, com o objetivo de pre- peito da etiologia dos derrames. Agentes anaeróbios
dizer a forma de terapia a ser instituída. O primeiro são associados mais freqüentemente ao empiema pós-
ítem a ser considerado na avaliação do líquido pleural pneumonia em pacientes com maior risco de aspira-
é seu aspecto macroscópico, que pode ser límpido, ção brônquica, como os idosos, alcoólatras e doentes
turvo ou francamente purulento. Na análise da neurológicos, ou nos pacientes com risco de extensão
celularidade do exsudato parapneumônico, o achado direta de uma infecção localizada, como nos portado-
mais comum é o de um elevado número total de res de neoplasia de pulmão, abscesso subfrênico ou
leucócitos (> 1.000 /cm2), com predominância de de orofaringe. No total, os agentes anaeróbios po-
neutrófilos (> 60%). dem ser encontrados em cerca de 17 a 76% dos
Para o diagnóstico da fase fibrinopurulenta dos empiemas, mas o diagnóstico depende de técnicas

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adequadas de cultura de anaeróbios, muitas vezes en- mm), derrames típicos não complicados (não
contradas somente em centros especializados 13. loculados, com pH > 7,2; glicose > 40 mg/dL, e
Dentre os agentes aeróbios, o Streptococcus Gram e cultura negativas), derrames complicados
pneumoniae ainda é o mais freqüentemente encon- (limítrofe, simples ou complexo) e empiema (sim-
trado (36%), sendo menos freqüente o S. aureus, E. ples ou complexo). Além de contribuir para sepa-
coli, K. pneumoniae e H. influenzae. Não é rar os derrames parapneumônicos nas suas diver-
incomum, no entanto, o achado de associação aeróbio sas fases e sugerir intervenções específicas nas di-
– anaeróbio, razão pela qual a investigação direta e ferentes situações, o autor reitera a necessidade de
por cultura deve sempre contemplar estas duas possi- abordagem diagnóstica dos derrames > 10 mm,
bilidades 14. observados em radiografias em decúbito lateral, para
coleta de material e estabelecimento da melhor con-
Classificação dos Derrames Parapneumônicos duta terapêutica (Quadro I).
No entanto, trabalhos ulteriores questionam o
Em 1995, procurando estabelecer parâmetros valor da associação pH, DHL e glicose no diagnós-
mínimos para o diagnóstico diferencial dos derra- tico diferencial das diversas fases do derrame
mes parapneumônicos nas suas diversas fases, Light parapneumônico, com relatos de que nem sempre
propôs um modelo de classificação abrangente para valores sugestivos de derrames complicados neces-
os derrames parapneumônicos, estabelecendo 7 di- sitam de abordagem terapêutica mais agressiva 16.
ferentes categorias e tendo como referência a quan- Fundamentado nestas dúvidas, um estudo de
tidade de líquido, as características bioquímicas (pH, meta-análise foi elaborado para evidenciar se estes
glicose e DHL) e bacteriológicas (Gram e cultura), parâmetros isoladamente ou em associação seriam
e a presença ou ausência de loculações 15. capazes de separar os derrames complicados dos não
De acordo com esta classificação, os derrames complicados. A conclusão foi a de que o pH seria o
parapneumônicos podem ser não significantes (< 10 parâmetro mais fidedigno em discriminar esta diferen-

Quadro I: Classificação e Tratamento dos Derrames Parapneumônicos e Empiema.


Categoria Derrame Bioquímica Tratamento
1 Não Significante Ausente Sem Toracocentese
(< 10 mm em decúbito)
2 Típico Glicose > 40 mg/dL Antibióticos
(> 10 mm) pH > 7,2
Gram e Cultura Negativas
3 Complicado Intermediário 7,0 < pH < 7,2 ou Antibióticos e
DHL > 1.000 U e Toracocenteses Seriadas
Glicose > 40 mg/dL
4 Complicado Simples pH < 7,0 ou Drenagem Pleural e Antibióticos
(Não Loculado, Sem Pus) Glicose < 40 mg/dL ou
Gram ou Cultura Positivas
5 Complicado Complexo pH < 7,0 ou Drenagem Pleural e Trombolíticos
(Multiloculado) Glicose < 40 mg/dL ou ou Pleuroscopia
Gram ou Cultura Positivas
6 Empiema Simples Indiferente Drenagem Pleural ou
(Pus Livre ou Loculado ou Pleuroscopia ou Decorticação
Simples)
7 Empiema Complexo Indiferente Drenagem Pleural e Trombolíticos
(Pus e Loculações Múltiplas) Pleuroscopia ou Decorticação

(Adaptado de Light RW. Pleural Diseases, ed. 3. Baltimore. Williams & Wilkins, 1995).

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ça 17. colhido quando os antibióticos já foram instituídos,
Reconhecendo a dificuldade no estabelecimen- ou porque os laboratórios não dispõem de meios
to dos parâmetros mais adequados, o American adequados de cultura, em especial para anaeróbios.
College of Chest Physicians (ACCP), baseado na A maioria dos antibióticos tem penetração ade-
resposta ao tratamento obtida por avaliação retros- quada no espaço pleural, exceto os aminoglicosídeos,
pectiva de 24 estudos amplos de literatura, elabo- que podem ser inativados no empiema 19. De um modo
rou um consenso de alternativas para a abordagem geral, a escolha inicial dos antibióticos é empírica e
diagnóstica e terapêutica dos derrames fundamentada em dados de maior freqüência de in-
parapneumônicos 18. Este estudo propõe uma clas- fecção pulmonar primária por faixa etária ou por gru-
sificação mais simples, baseada em fatores de risco pos de risco 20, 21.
de evolução desfavorável quando os pacientes não Considerando que a presença de derrame
são submetidos à drenagem precoce do espaço pleural associado à pneumonia é critério de
pleural. Dentre estes fatores de risco, foram consi- internação e tratamento com antibioticoterapia por
derados a hospitalização prolongada, o aumento da via sistêmica, para as pneumonias adquiridas na
morbidade e da mortalidade, a perda funcional comunidade estão indicadas as cefalosporinas de
ventilatória e os riscos de toxicidade local e segunda ou terceira geração ou os antibióticos
sistêmica. A nova classificação estabelece três va- betalactâmicos mais inibidores da betalactamase,
riáveis para análise: anatômica (quantidade e pre- associados a um macrolídeo quando houver sus-
sença ou ausência de loculações), bacteriológica peita de Legionella, Mycoplasma ou Chlamydia.
(Gram e cultura) e bioquímica (pH). A partir da Para os pacientes com pneumonia considerada se-
combinação das variáveis, foram determinadas qua- vera, recomenda-se a associação de macrolídeo com
tro diferentes categorias para os derrames cefalosporina de terceira geração (devido a maior
parapneumônicos. Neste estudo, os autores esta- incidência de pseudomonas associada ao DPOC,
belecem critérios para a indicação de tratamento bronquiectasias e fibrose cística). Pacientes com
clínico ou por drenagem pleural, sugerindo alterna- pneumonia adquirida em ambiente hospitalar devem
tivas terapêuticas para situações específicas. Como receber cefalosporinas de terceira geração, associ-
conclusão, os pacientes classificados dentro das adas ou não ao aztreonam, tendo como alternativas
categorias 1 e 2 (risco de evolução desfavorável o imipenem/cilastatina e as quinolonas. Nos casos
muito baixo e baixo) podem não necessitar drena- suspeitos ou confirmados de infecção pelo S. aureus,
gem da cavidade pleural. Nos pacientes das cate- deve ser considerado o uso de vancomicina ou
gorias 3 e 4 (risco moderado e alto) é recomendada teicoplanin.
a drenagem como procedimento mínimo, devendo
ser considerada a necessidade de terapêutica com- Toracocentese Terapêutica
plementar, como a utilização de fibrinolíticos,
pleuroscopia e cirurgia aberta (Quadro II, no início da A toracocentese é a forma menos invasiva de
página 5). abordagem dos derrames pleurais parapneumônicos,
mas sua indicação como terapêutica exclusiva é dis-
Tratamento dos Derrames Parapneumônicos cutível. Os relatos de literatura indicam de 25 a
94% de sucesso no tratamento do empiema com
Antibióticos toracocenteses terapêuticas de repetição 22, 23. O
consenso da ACCP recomenda que as toracocente-
O estabelecimento do diagnóstico bacterioló- ses de repetição devam ser consideradas na aborda-
gico é fundamental na indicação dos antibióticos gem terapêutica somente nos pacientes incluídos na
ideais para o tratamento dos exsudatos parapneu- Categoria 1 (derrames menores que a metade do
mônicos. Infelizmente, na maioria das situações não hemitórax, com Gram e cultura negativos e pH < 7,2)
é possível estabelecer os agentes etiológicos envol- que apresentarem piora clínica com instituição do tra-
vidos na infecção, seja porque o líquido pleural é tamento conservador 18.

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Drenagem Pleural bito de drenagem para menos que 100 ml / dia para os
derrames não empiemáticos. No empiema, é conve-
A drenagem pleural é considerada a forma mais niente aguardar a parada total da drenagem, seguida
eficaz de tratamento dos derrames parapneumônicos da confirmação por imagem (ultrassom ou tomografia)
nas categorias 3 e 4 do consenso americano, isto é, da obliteração total do espaço pleural. A drenagem
para os derrames volumosos com Gram ou cultura prolongada (maior que 7 a 10 dias), a septação pre-
positivas e pH < 7,2, ou para o empiema franco. coce do derrame ou a presença de espessamento
Também deve ser considerada na categoria 2 quan- pleural, apontam para a utilização de alternativas tera-
do o derrame recidiva após toracocentese inicial ou pêuticas mais agressivas.
há piora no estado clínico do paciente 18.
A drenagem deve ser realizada de maneira efi- Fibrinolíticos
caz, com adequado posicionamento do dreno na
cavidade, e de preferência mantida sob sucção com O derrame pleural parapneumônico pode evo-
pressão negativa para melhor esvaziamento do con- luir com a formação de septações,
teúdo. Há discussão a respeito do calibre do dreno compartimentalizando o espaço pleural. As lojas cri-
a ser utilizado. Estudam mostram que drenos de adas retêm coleções líquidas em diferentes fases de
calibre fino, guiados ou não por métodos auxiliares evolução (da fase exsudativa até a empiemática), difi-
de imagem (ultrassom ou tomografia), podem ser cultando a penetração de antibióticos no líquido e o
tão eficazes quanto os de calibre mais grosso 24. A acesso adequado para a drenagem pleural. As
vantagem do cateter de fino calibre é a de permitir septações são resultantes da ativação do sistema de
maior conforto aos pacientes, além de poder ser coagulação, com formação de uma grande malha de
realizada por clínicos ou radiologistas treinados. A fibrina dentro da cavidade pleural, seguida pela migra-
presença de pus franco e espesso deve ser considera- ção e proliferação de fibroblastos. O resultado final é
da como indicação de utilização de drenos mais a deposição de colágeno com desenvolvimento de
calibrosos. Os parâmetros para retirada do dreno são espessamento pleural. A abordagem cirúrgica, quan-
a melhora clínica e radiológica, e a diminuição do dé- do já existem traves fibrosas, lojas empiemáticas ou

Figura 1: Fluxograma de ativação do sistema de coagulação. O fibrinogênio ativado forma dois compostos,
o fibrinopeptídeo A e a fibrina. A fibrina e o fibrinogênio são degradados por ação da plasmina, com a
formação de D-Dímero e de PDF (produto de degradação de fibrina). A plasmina é ativada pelos ativadores
de plasminogênio e pela estreptoquinase.

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grandes espessamentos, sempre é acompanhada de é de 250.000 UI, diluída em 50 ml de solução fisioló-
maior morbidade. gica e administrada 1 ou 2 vezes ao dia até a observa-
A determinação do melhor momento para a ção de resposta clínico-radiológica, ou seja, aumento
adequada abordagem terapêutica, clínica ou cirúr- do volume de drenagem e melhora da imagem radio-
gica, é fundamental para estabelecer o método mais lógica, com desaparecimento das loculações. A ad-
adequado a ser utilizado 25. Os trombolíticos fo- ministração deve ser feita por via intrapleural, se pos-
ram sugeridos como alternativa ao tratamento dos sível através do dreno torácico, o qual deverá perma-
derrames pleurais septados por sua interação no sis- necer fechado por duas horas após a instilação. Usu-
tema de coagulação. Tanto a estreptoquinase quan- almente a resposta é rápida e raramente requer mais
to o TPA (fator ativador de plasminogênio) atuam do que 3 doses, contudo podem ser administradas até
ativando o sistema fibrinolítico (Figura 1) e destru- 6 doses (a dose total máxima recomendada é de
indo a malha de fibrina formada 26. Sem a malha de 1.500.000 UI). Quando não se observa resposta ao
fibrina, os fibroblastos não têm substrato para mi- trombolítico até o terceiro dia pós inicio do tratamen-
grar e produzir colágeno, diminuindo a formação to, preconiza-se a limpeza cirúrgica da cavidade.
de loculações e a evolução para espessamento Febre, calafrios e reações alérgicas são as rea-
pleural. ções adversas mais comuns relatadas com a utilização
Na literatura, não há consenso a respeito da da estreptoquinase. Existem raros casos descritos de
utilização dos trombolíticos, porém duas diferen- complicações sérias como sangramento pleural,
tes abordagens são consideradas. A primeira reco- fibrilação ventricular e insuficiência respiratória aguda
29
menda a utilização de trombolíticos a partir da co- . Os trombolíticos administrados no espaço pleural
locação do dreno torácico no tratamento dos não alteram a coagulação sistêmica, sendo considera-
empiemas instalados ou em formação, independen- das drogas seguras para a prática clínica. As contra-
temente de haver loculações, com o objetivo de indicações absolutas para sua utilização são a existên-
evitar a formação de traves de fibrina e septações cia de reação alérgica prévia ao trombolítico ou a pre-
27
. Foi demonstrado, com esta estratégia, que os sença de sangramento ativo no espaço pleural.
trombolíticos aumentam o volume de líquido dre- A uroquinase é outro trombolítico que pode ser
nado, mas não alteram o tempo de internação nem utilizado, contudo é mais difícil de ser obtido em nosso
o número de complicações do derrame meio. Tem o mesmo grau de eficácia da estrepto-
parapneumônico. A segunda estratégia descrita quinase, com a vantagem de apresentar menores índi-
utiliza o trombolítico no momento em que se inicia ces de reação alérgica. A dose preconizada é a de
a formação das septações. Nesta situação, o 100.000 UI, diluída e administrada como a
trombolítico conseguiu desfazer as lojas pleurais, estreptoquinase.
evitando procedimentos auxiliares mais complexos,
como a pleuroscopia 28. Pleuroscopia
A tendência atual é a de utilização de fibrinolíticos
o mais precocemente possível no controle dos derra- A toracoscopia é uma alternativa considerada
mes que apresentarem sinais de loculação. Esta alter- eficaz para o tratamento dos derrames
nativa deve ser considerada como um passo interme- parapneumônicos complicados com loculação e difi-
diário na abordagem dos derrames septados, situan- culdade de drenagem. Os estudos controlados de li-
do-se entre a drenagem pleural simples e a teratura sugerem que os resultados com a pleuroscopia,
pleuroscopia para higiene da cavidade pleural 18. indicada precocemente nos empiemas loculados, são
Neste sentido, para maior efetividade desta forma de melhores que a drenagem com fibrinolíticos 30, em-
tratamento, recomenda-se a utilização do trombolíti- bora o número de pacientes avaliados tenha sido
co nas primeiras duas semanas após a formação das pequena para uma conclusão definitiva. A tendên-
septações. cia atual, considerando a menor agressão ao paci-
O fibrinolítico mais utilizado na prática clínica é a ente, é a de indicar inicialmente os fibrinolíticos para
estreptoquinase. A dose habitualmente recomendada os derrames septados, seguido da pleuroscopia

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Quadro II: Risco de evolução desfavoravél em pacientes com derrame parapneumônico. 18
Anatomia Bacterioscopia Bioquímica# Categoria Risco Drenagem

A0 DP Pequeno e Bx Cultura e
< 10 mm 1 Gram Cx pH 1 Muito Não 2
indeterminados indeterminado Baixo

A1 DP Moderado e B0 Cultura e
> 10 mm Gram Negativos 3 e C0 pH > 7,2 2 Baixo Não 4
< ½ hemitórax

A2 DP Extenso B1 Cultura e ou C1 pH < 7,2 3 Moderado Sim


> ½ hemitórax 5 ou Gram Positivos
loculado 6
espessamento 7

B2 Pus 4 Alto Sim


#
: pH por gasimetria é ideal; glicose pode ser usada (P0 > 60 mg/dL; P1 < 60 mg/dL).
Os valores de pH e glicose ainda não se encontram bem estabelecidos.
1
: a experiência clínica indica que derrames < 10 mm resolvem espontaneamente.
2
: se A0 + P1 ou B1 , considerar que P1 ou B1 podem ser falso-positivos.Considerar toracocenteses de repetição se piora clínica ou
aumento do derrame.
3
: independente do uso prévio de antibióticos.
4
: se evolução clínica desfavorável, considerar toracocenteses repetidas ou drenagem.
5
: derrames volumosos evoluem pior após drenagem, pela tendência à loculação.
6
: loculações pleurais indicam pior prognóstico.
7
: espessamento pleural à tomografia sugere empiema.

quando não se consegue controle eficaz. qüência cada vez menor. A toracotomia permite uma
Quando indicada precocemente no tratamento avaliação ampla da cavidade e do parênquima pulmo-
do empiema, a toracoscopia higiênica da cavidade nar, sendo possível desfazer lojas pleurais, realizar a
empiemática apresenta resultados comparáveis aos segmentectomia ou lobectomia de áreas consideradas
da toracotomia aberta com decorticação pulmonar, necróticas, e drenar amplamente a cavidade pleural.
com as óbvias vantagens de custo e de uma evolu-
ção pós-operatória muito menos tormentosa para Drenagem aberta e Pleurostomia
os pacientes 31.
A drenagem aberta, sem selo d’água, está
Toracotomia e Decorticação indicada nos casos de pacientes muito debilitados e
com empiemas crônicos (usualmente sem resolu-
A toracotomia, seguida de decorticação, está ção após 30 dias de tratamento) que não suportam
indicada nos pacientes com empiema que não obti- procedimentos mais agressivos como a decorticação
veram adequada expansão pulmonar, em especial pulmonar. Nesta situação, o dreno deve ser lavado
nos casos de fístula persistente do parênquima, ou freqüentemente para a retirada de restos de fibrina,
quando há coleções encistadas residuais pós-trata- aguardando-se a obliteração espontânea da cavida-
mento com fibrinolíticos ou pleuroscopia 32. Os de ou melhora do estado geral do paciente para a
índices de sucesso com a toracotomia para o trata- indicação de decorticação. Nos casos em que a
mento do empiema estão próximos dos 100%, em- cavidade residual é extensa e há previsão de fecha-
bora, com a antibioticoterapia instituída precoce- mento em prazo longo, indica-se a ressecção de
mente para o tratamento das pneumonias e as alter- parte de 1 ou 2 arcos costais na porção mais depen-
nativas menos agressivas modernamente disponí- dente da cavidade, com a transformação da loja
veis, este procedimento tenha sido indicado com fre- empiemática em pleurostomia.

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Conclusão para complementarem a drenagem pleural, dependen-
do da avaliação clínica dos pacientes e da experiência
O estabelecimento de uma nova proposta de clas- do serviço. Baseado nestes dados, o ideal é a adoção
sificação, baseada nos resultados de estudos amplos de uma rotina de diagnóstico e de propostas terapêu-
de literatura dos últimos 30 anos, representa uma gran- ticas para a abordagem dos derrames
de contribuição para a abordagem diagnóstica dos parapneumônicos (Figura 2).
derrames parapneumônicos nas suas diversas fases. É patente nos trabalhos de literatura, a preocu-
Fundamentada em parâmetros mínimos (característi- pação em relação à necessidade de abordagem mais
cas do derrame, medida de pH e presença de bacté- precoce dos derrames para a obtenção de resultados
rias no líquido pleural), a proposta estabelece a ne- mais adequados no tratamento. Sobretudo, o grande
cessidade ou não de drenagem da cavidade pleural desafio a ser vencido é o do estabelecimento de um
como procedimento mínimo para os casos de derra- diagnóstico laboratorial de qualidade, que permita uma
mes volumosos com presença de bactérias ou pH < avaliação fiel dos resultados, principalmente do pH,
7,2. Enfatiza ainda que, devido à dificuldade em ava- bacterioscopia e cultura, cabendo àqueles que lidam
liar os resultados das diversas formas de tratamento com a rotina diagnóstica dos derrames pleurais, esta-
propostas na literatura, a utilização de fibrinolíticos, a belecer e exigir os meios necessários para a adequada
pleuroscopia e a toracotomia são alternativas válidas avaliação do líquido pleural.

Figura 2: Fluxograma de orientação diagnóstica e terapêutica na abordagem dos derrames pleurais (DP)
parapneumônicos

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Livro de Atualização em Pneumologia - Volume IV - Capítulo 39 - Página 9

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