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2005\ 2006
Queratocone 2
Índice
ÍNDICE............................................................................................................................................ 2
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 3
TRATAMENTO ........................................................................................................................... 16
CONCLUSÕES............................................................................................................................. 19
GLOSSÁRIO ................................................................................................................................ 20
BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................................... 21
Introdução
Caracterização do Queratocone
O que é o queratocone?
O queratocone é uma patologia não inflamatória, progressiva e bilateral que se apresenta
como um adelgaçamento da córnea.
Este adelgaçamento dá-se ao nível do estroma devido à destruição das fibras de
colagénio, o que vai levar ao surgimento de uma protuberância em forma e cone na zona mais
debilitada normalmente no centro ou na parte inferior da córnea.1
Como se classifica?
O queratocone pode ser classificado pela forma do cone, leituras queratométricas ou pela
progressão, sendo os dois primeiros métodos os mais simples:
Baseado na curvatura:
Ligeiro menos de 45 D em ambos os meridianos
Queratocone 5
As técnicas actuais com as quais se obtém um bom resultado são: paquimetria de ultra-
sons, paquimetria e topografia ópticas e análise numérica das aberrações da superfície interior
da córnea.
Claro que o trabalho exploratório inicial pode ser realizado com recurso a um
biomicroscópio mas, para além da perícia técnica e capacidade de interacção com o paciente, o
optometrista teria que ser capaz de, num curto espaço de tempo, avaliar um grande número de
pontos da córnea o que é manifestamente impraticável. No entanto, de uma forma geral, esta
tarefa não deve ser negligenciada pois normalmente é através dela que surge a suspeita de um
queratocone.
Existem indícios que permitam dizer que uma pessoa irá desenvolver um
queratocone?
Apesar de, na maior parte das vezes, o queratocone aparecer devido a uma desordem
isolada e esporádica, existem indícios de haver uma componente de hereditariedade, surgindo
também bastantes vezes associado a desordens genéticas raras: síndrome de Down e Amaurose
congénita de Leber. Podendo também surgir associado a desordens do tecido conjuntivo, uso de
lentes de contacto rígidas ou ao acto de esfregar excessivamente os olhos.
Será importante referir que relativamente ao uso de lentes de contacto rígidas e esfregar
dos olhos, muito provavelmente não serão a causa do queratocone mas antes actuarão como
factores ambientais que favorecem a progressão da patologia em pessoas geneticamente
predispostas.2
Meios de Diagnóstico
Uma boa parte dos queratocones é diagnosticado através da lâmpada de fenda pela
observação dos sinais típicos e confirmado com instrumentação simples como:
Dispositivo manual de projecção de Anéis de Plácido (queratómetro de Klein);
Distorção das miras do queratómetro;
Observando se obtém reflexo em forma de tesoura com o retinoscópio2
considerando-se os resultados obtidos por estes meios fiáveis e, na maior parte de vezes,
suficientes para uma intervenção adequada nos cuidados de saúde. Acontece que, com a
evolução tecnológica, surgiram várias novas formas de compensação e correcção do sistema
visual que, para serem levadas a cabo correctamente é necessário mais informação acerca da
topografia do olho:
Para uma boa adaptação de lentes de contacto com geometrias complexas ou
personalizadas é necessária informação sobre a superfície onde vão ser aplicadas;
Para realização de cirurgia laser para correcção de ametropias é fundamental ter
conhecimento prévio da inexistência de queratocone pois caso contrário a
operação pode estar condenada ao fracasso;3, 5
A colocação de anéis intra-oculares para contenção do queratocone só pode ser
levada a cabo se o olho tiver espessura suficiente;16
Novas técnicas como o cruzamento do colagénio com riboflavina para aumentar a
espessura da córnea que agora começam a ser experimentadas deverão, ser
aplicadas num estádio precoce da patologia4
Ilustração 1: Oftalmoscopia
Reflexo luminoso de Ruzuti é um exame simples que consiste na projecção de luz no lado
temporal da face ao nível do olho, observando o comportamento do feixe luminoso no lado nasal
ao nível do limbo. Uma deslocação para além do limbo indica um astigmatismo e curvatura
elevados.3
Lâmpada de fenda
A lâmpada de fenda é o único instrumento que permite ao optometrista observar muitos
dos sinais clássicos do queratocone:
Anéis de Fleischer é um anel acastanhado que normalmente circunda a base do
cone. Forma-se quando pigmentos ferrosos se depositam no epitélio. A inspecção
cuidadora das córneas com queratocone revelará esta linha em 50% dos casos.3
Queratocone 9
Paquimetro de Ultra-sons
Este paquimetro utiliza o som em frequências muito elevadas para obter informação
detalhada das estruturas que estão a ser analisadas. Os ultra-sons são transmitidos ao olho
através de um transdutor que é constituído por um material com propriedades piezoeléctricas, e
que recebe as ondas acústicas reflectidas pela interface córnea/ humor aquoso.6 Este
paquimetro baseia-se nos instrumentos de ultra-sonografia de modo A, em que o registo é
unidimensional; isto significa que os impulsos emissores e os seus ecos aparecem no ecrã ao
Queratocone 11
longo de uma linha. A distância que separa dois ecos corresponde ao tempo que os ultra-sons
necessitam para percorrer dois pontos cujas estruturas dão origem ao eco.7
Este tipo de técnica tem como grande vantagem a grande precisão com que determina e
espessura da córnea, podendo detectar as mais pequenas variações. Adicionalmente, dado que
localiza as estruturas através de eco, pode detectar assimetrias da face posterior da córnea que
acompanhadas de adelgaçamento do epitélio, são indetectáveis através de técnicas topográficas.
As desvantagens prendem-se com o facto de ter que haver um compromisso entre
qualidade das imagens obtidas e profundidade a que se consegue recolher a informação
pretendida, isto é, quanto mais alta for a frequência, melhor será a resolução mas o sinal será
absorvido mais depressa não penetrando tão profundamente nos tecidos.8, 6 Outra desvantagem
adicional tem a ver com o facto deste tipo de equipamentos utilizar de uma sonda em contacto
directo com o olho sendo por isso necessária a utilização de anestésicos locais para a realização
do exame.
Sistemas Ópticos
As tentativas de medição da espessura da córnea remontam a 1723, quando Petit mediu
a espessura de córneas de olhos enucleados de cadáveres. Foi no entanto em 1880 que Blix fez
as primeiras medições in vivo utilizando para o efeito dois microscópios montados com um
ângulo de 40º entre si.9, 6 Após esta data de referência, muitos outros progressos foram levados
acabo no domínio da paquimetria por ilustres investigadores; no entanto não falarei desses
instrumentos pois saem do âmbito deste trabalho.
Mais recentemente e já na era dos sistemas informatizados temos, entre outros, dois
sistemas de diagnóstico que se têm tornado uma referência no mercado. Os instrumentos que a
seguir são referidos, para além de determinarem a espessura da córnea (paquimetria), têm
também a capacidade de apresentar num mapa tridimensional a sua forma (topografia).
Na imagem que se segue temos um exemplo dos mapas obtidos com o Orbscan® para
um paciente com queratocone. Nele é possível ver-se uma área de elevação crescente rodeada
de zonas concêntricas de elevação decrescente e o apex do cone está definido como o ponto
com a elevação máxima.10
Videoqueratoscópio
com movimento de rotação. Este método vai permitir a recolha de informação sobre a superfície
anterior e posterior da córnea a uma velocidade muito elevada que, por um lado, vai permitir a
criação de mapas paquimétricos e topográficos, e por outro, tornar irrelevantes os movimentos
oculares realizados pelo paciente durante a realização do exame.6
Análise de Fourier
Após a realização de vários cortes sagitais e a sua decomposição nos seus harmónicos
fundamentais, é possível reconstruir várias superfícies diferentes recorrendo à união dos
harmónicos do mesmo grau, isto é, podemos obter a primeira superfície através do componente
Queratocone 14
de ordem zero da onda que vai ter a forma de anéis concêntricos individuais (Ilustr.11a), depois
a curvatura de cada anel é decomposta em ondas seno e co-seno por transformações de
Fourier. Na ilustração 11b temos o primeiro harmónico que tem um período de metade do
harmónico fundamental (temos um máximo e um mínimo). Os componentes resultantes de
todos os anéis são reagrupados segundo uma metodologia específica, permitindo que
determinadas características sobressaiam: neste caso a sobreposição das duas imagens torna
obvia a existência de um queratocone.
a) b) c)
Ilustração 11: a) Equivalente esférico, b) harmónico de primeira ordem, c) sobreposição das
duas ondas anteriores
Apesar das vantagens evidentes deste método, ele apresenta limitações. Estas limitações
têm a ver com a dificuldade de detectar variações muito subtis na superfície da córnea, por
estas serem facilmente mascaradas pelos seus componentes esfero-cilíndricos. 11
Surge então a necessidade de desenvolver um método alternativo que torne visíveis estas
variações ligeiras: os polinómios de Zernike.
Polinómios de Zernike
Qualquer superfície tridimensional circunscrita por uma curva circular pode ser
representada pela soma de polinómios de zernike.11 Estes polinómios normalmente são
expressos em coordenadas polares ( , ) na pupila, onde =r/rmax é a coordenada radial relativa,
rmax o raio máximo da pupila e o ângulo azimutal.13 Basicamente, temos a análise de Fourier
aplicada a pontos (x, y, z) de uma superfície.
Dada a complexidade que rodeia a explicação da forma matemática como os polinómios
de zernike são obtido, iremos reter apenas que este método permite descrever e classificar
qualquer desvio comparativamente à frente de onda que seria gerada pela reflexão de um feixe
de luz numa superfície esférica perfeita;11 e a notação usada é: Z nm ( , ) onde n indica o grau
informação que podemos retira da curvatura; podendo, em última análise ter um polinómio de
grau infinito que representa uma córnea real e integra em si o total das aberração, que é a soma
dos seus componentes.12 Isto quer dizer que podemos, para cada termo do polinómio, atribuir
um tipo específico de aberração corneal.11
Ilustração 12: Aberrações ópticas associadas a cada grau dos polinómios de Zernike13
Assim, quanto maior é a aberração total do sistema óptico, mais polinómios serão
necessários para uma descrição precisa da córnea em análise. Isto quer dizer que, normalmente
4 a 6 graus bastam para descrever uma córnea normal enquanto uma superfície com
queratocone necessita de 8 a 12 graus para ser caracterizada.11
Este método de análise abriu novas possibilidades de estudo até ao momento
impraticáveis e por isso é visto com muito optimismo por muitos investigadores.11, 13
Claro que todas as novas técnicas têm limitações e imprecisões que só através da
investigação poderão ser detalhadamente analisadas, corrigidas e identificadas as situações
limite para as quais não é aplicável.
Assim, no estado actual da arte , há a necessidade de salvaguardar determinados
pressupostos: nomeadamente o diâmetro mínimo da pupila (pois um diâmetro inferior a 3mm
não vai apresentar aberrações significativas)13, devendo ser levado também em linha de
consideração algumas limitações do próprio modelo matemático14 ou o facto do modelo não
caracterizar adequadamente a córnea para um número relativamente baixo de graus.15
Relativamente à última observação, o problema é facilmente ultrapassável pelo avanço na
capacidade de processamento dos meios informáticos que agora permitem mais cálculos por
unidade de tempo.
Queratocone 16
Tratamento
O tratamento do queratocone depende do seu grau de severidade. Na fase inicial da
doença, o uso de óculos é bem sucedido no restauro da visão. Contudo, à medida que a doença
progride, o paciente necessitará de lentes de contacto para obter acuidade visual óptima.
Quando o paciente não tolera o uso de lentes de contacto, ou o queratocone evolui a um
ponto que as lentes de contacto já não dão uma resposta adequada, é possível recorrer à
cirurgia para resolver o problema.
É importante referir que, antes de recomendar a um paciente a cirurgia, deve repensar a
estratégia de adaptação de lentes que está a utilizar ou enviar o paciente a um colega para este
testar uma nova abordagem; isto porque a maioria dos pacientes enviados para realização de
cirurgia são rejeitados e corrigidos opticamente4
Óculos
Este meio de correcção é utilizado na fase mais inicial do queratocone. Proporciona uma
correcção visual adequada, evitando por algum tempo uma intervenção mais agressiva para o
olho.2 É inclusive recomendado que o uso de óculos seja prolongado o máximo possível no
tempo (desde que a qualidade de visão não se deteriore significativamente) para que o paciente
tenha uma percepção significativa da melhoria da visão na altura de adaptar as lentes de
contacto, e assim mantenha a motivação durante o, por vezes difícil, período de adaptação das
mesmas.4
Lentes de contacto
A lente de contacto, mesmo depois de aplicada, tem tendência a manter a sua forma
original, permitindo que as irregularidades menores da córnea se preencham com lágrima.
Quando não há intolerância às lentes de contacto por parte do paciente, esta é a forma de
correcção preferida pois para além de esteticamente agradável, representa uma solução
bastante eficaz e duradoura. Claro que à medida que a patologia progride, terá que se passar de
lentes macias e de geometria mais simples, para lentes rígidas e de geometrias mais complexas.
Daí que do ponto de vista do optometrista o procedimento de adaptação de lentes de contacto
em pacientes com queratocone é muito exigente e como tal, por vezes evitado.
As complicações que normalmente surgem associadas ao uso de lentes de contacto são:
abrasão corneal, cicatrizes apicais, neovascularização induzida pela hipoxia, desconforto ocular e
problemas associados ao posicionamento da lente na córnea.2
Tratamento cirúrgico
Quando as alternativas com recurso a lentes de contacto se esgotam, a cirurgia pode
tornar-se necessária para se obter um grau de visão adequado. A opção cirúrgica mais comum é
a queratoplastia penetrante (transplante de córnea), mas existem outras opções como os anéis
intracorneais ou epiqueratoplastia entre outras.
Alguns dos pressupostos de elegibilidade para a realização da cirurgia são: ter uma
grande área de adelgaçamento em relação à periferia da córnea, se já não é possível estabilizar
as lentes de contacto ou se a córnea apresenta uma neovascularização significativa.4
Queratoplastia penetrante
Epiqueratoplastia
Anéis intra-corneais
Apesar de haver muita controvérsia em relação à utilização dos anéis de Ferrara (ou
Intacts) tanto para correcção da miopia como no queratocone, esta técnica tem vindo a
popularizar-se devido ao facto de ser menos invasiva, reversível e ajustável, isto é, os anéis
pequenas semicircunferências de PMMA são aplicados no estroma não havendo interacção
com o interior do globo ocular (e por isso menos riscos de infecção) e caso o procedimento não
obtenha os resultados desejados pode ser revertido não provocando danos na córnea.
Dependendo do estado de desenvolvimento do queratocone, esta técnica pode prevenir ou
adiar o transplante da córnea; sendo o prognóstico tanto melhor quanto menos avançado estiver
o queratocone.16, Erro! Marcador não definido.
Como limitação importante à utilização deste método temos a espessura da córnea no
momento da cirurgia pois esta nunca pode ser inferior nem demasiado aproximada da
espessura do próprio anel.16
Queratocone 19
Conclusões
Este trabalho teve como objectivo a compilação de informação sobre o queratocone,
tentando fazer uma exposição simples e clara do que é a patologia, como pode ser detectada e
quais os tratamentos disponíveis actualmente; não podendo ser visto como a súmula do
conhecimento actual sobre este tema.
O seu conteúdo foi intencionalmente simplificado para que a informação possa chegar ao
cidadão comum que apenas quer saber alguma coisa sobre o seu problema e as alternativas de
tratamento disponíveis.
Penso também ser um documento interessante para os colegas optometristas que, no seu
gabinete, se deparem com a necessidade de fazer uma consulta rápida sobre a patologia;
deixando-lhes ainda um alerta particular para o facto de deverem fazer uma avaliação ocular
muito detalhada quando um paciente seu colocar a hipótese de uma correcção de ametropias
com recurso a cirurgia laser.
Para terminar, ainda que tenha sido falado ao longo deste trabalho sobre o carácter
extraordinário da utilização dos métodos avançados de diagnóstico precoce, estes começam a
ser integrados na rotina dos gabinetes de oftalmologia e optometria; com vantagens evidentes
para o paciente e técnico de saúde que ficam com um histórico da evolução ocular, tornando
qualquer intervenção mais eficaz.
Queratocone 20
Glossário
Abrasão corneal: Eliminação de fragmentos de epitélio da córnea.17
Amaurose congénita de Leber: Distúrbio circulatório no qual a obstrução temporária de vasos
oculares com detritos em circulação leva à turbidez da visão ou cegueira temporária
(segundos a minuros).18
Ametropias: Defeito óptico do olho que altera a refracção.18
Apex corneal: ponte de maior curvatura da córnea
Astenopia: Cansaço ocular
Biomicroscopia: Também conhecido como Lâmpada de fenda, trata-se de um sistema óptico
que permite o visionamento in vivo as estruturas oculares de forma ampliada.
Bowman, membrana: Ver córnea
Córnea: Superfície transparente mais anterior do globo ocular composta por várias camadas de
células. Da superfície exterior para a interior temos: epitélio, membrana de Bowman,
estroma, membrana de Descemet e endotélio.Erro! Marcador não definido.
Descemet, membrana: Ver córnea
Diplopia: Termo médico para visão dupla.18
Down, Síndrome: Anomalia cromossómica caracterizada por atraso mental e aparência física
peculiar.18
Endotélio: Ver córnea
Epitélio: Ver córnea
Estroma: Ver córnea
Fotofobia: Sensibilidade anormal ou intolerância em relação à luz.18
Hipoxia: Nível de oxigénio abaixo do normal.
Klein, queratómetro: É um instrumento composto por um disco de plácido (ver Plácido, anéis)
auto iluminado com uma bateria alojada no suporte para a mão.19
Neovascularização: Surgimento de novos vasos sanguíneos
Plácido, anéis: Consiste num disco com linhas brancas e pretas intercaladas e concêntricas.19
PMMA: Polimetilmetacrilato (polímero utilizado na produção de material oftálmico)
Queratocone 21
Bibliografia
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