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O autor Pedro Goergen, na apresentação da sua obra, tem a preocupação natural de indicar

a estrutura, o conteúdo de cada uma das suas partes, bem como as expectativas com as
quais se expõe ao público na abordagem do tema. Chama-nos positivamente a atenção
quando de forma esclarecedora e antecipatória assume sua aproximação teórica de Jürgen
Habermas que, como outros que o antecederam, reconhece as aporias do projeto iluminista
e não abre mão do conceito moderno de razão. Situa-se, portanto, numa ótica segundo a
qual mantém-se a possibilidade de um projeto emancipador da humanidade e, por
conseguinte, discordante dos "chamados pós-modernos para os quais o conceito de razão
com traços de universalidade e a possibilidade de interferir nos caminhos da humanidade
são idéias do passado, hoje vazias de sentido" (p. 2). Ele pensa, todavia, "que muitos
insights pós-modernos são altamente esclarecedores das condições históricas em que
vivemos..." (p. 2).

preocupação passa a ser com o aclaramento de posições de Habermas sobre a modernidade,


que diferenciam suas críticas daquelas apontadas por Lyotard. "Enquanto Habermas segue
defendendo (com correções de rota) a racionalidade moderna, Lyotard entende que ela
faliu" (p. 30). Parece ser este um dos principais empenhos do autor: evidenciar que
Habermas "está nitidamente preocupado em salvar a razão do relativismo consciente,
relativismo esse que significa, de imediato, abrir mão de qualquer projeto emancipador para
a sociedade. Este é o ponto fulcral de todo este debate em termos políticos, éticos e
educativos

partindo do pressuposto de que a modernidade não foi su­
perada, argumenta que dentro das próprias condições instauradas pela 
modernidade é possível avançar, sair da camisa­de­força de uma 
racionalidade fechada, por meio do uso do que chama de “razão 
comunicacional”, uma razão dialógica, no lugar da razão auto­referente, 
trazendo a idéia de uma teoria da ação comunicativa. Segundo ele, se 
entendermos o saber
...como transmitido de forma comunicacional, a racionalidade limita­se à ca­
pacidade de participantes responsáveis em interações de se orientarem em
relação a exigências de validade que assentam sobre o reconhecimento
intersubjetivo. (1990, p.289)
Muda o centro de referência, instaurando­se uma racionalidade que
implica consciência reflexiva das expressões humanas, uma 
racionalidade, que cria no diálogo os pontos de apoio de sua validade. 
Isso pressuporia a diferenciação clara do mundo dos fatos objetivos, do 
mundo das normas sociais e do mundo da experiência interior. A noção 
habermasiana de racionalidade comunicativa, segundo Wellmer (1991, 
p.92), refletiria a condição cognitiva e moral dos humanos num mundo 
“desencantado”. É por isso, ainda segundo esse autor, que Habermas 
pode pensar a ação comunicativa como portadora potencial de uma 
racionalidade diferenciada, que só se pode manifestar depois
que se tenha destruído o dogmatismo implícito das concepções de mundo 
tradicionais, e onde os requisitos de validade possam ser construídos pela 
argumentação, pelo confronto de diferentes posições, na procura de 
consensos aceitáveis. A argumentação, como meio de se obter consenso 
intersubjetivo, assume um papel fundamental, quando ela e as formas de 
ação comunicativa substituem outros meios de coordenação de ações, de 
integração social e de reprodução simbólica, constituindo o que 
Habermas denomina “racionalização comunicativa”.
Como encaminhar, nesse caso, então, a discussão do pós­moderno?
Assim como os que postulam a continuidade da modernidade nos tempos
atuais, a posição dos que postulam o contrário – seu fim – emerge da 
crise nos estatutos da própria modernidade. O termo pós­modernidade 
tem­se mostra do polissêmico, sendo utilizado no mais das vezes de 
modo genérico. De qualquer forma denota o que vem depois da 
modernidade, sendo problemático seu sentido, justamente por tentar 
traduzir um movimento da cultura em sociedades em rápida mutação, 
movimento que se ainda está produzindo, sem que se distingam 
consolidações que ajudem a qualificá­lo melhor. Pós­moderno designaria 
uma ruptura com as características do período moderno, o que, como já 
dissemos, para muitos analistas ainda não aconteceu de modo claro.
Pode­se adotar a posição de que estamos vivendo a transição para a pós­
modernidade e que os sinais, as tendências verificáveis traduzem 
caminhos mais do que posições consolidadas. Na expressão de Rouanet 
(1987, p.230), a polissemia desse conceito é devida ao fato de que ele 
reflete “um estado de espírito, mais do que uma realidade já 
cristalizada.”
No entanto, o termo tem sido usado cada vez com maior freqüência e
vem sendo empregado para traduzir a posição do saber nas sociedades 
mais desenvolvidas, posição que se delineia nos cenários atuais, 
cibernético­informáticos, informacionais e comunicacionais. Conforme 
Lyotard (1993, p.15), designa­se com essa expressão “o estado da cultura 
após as transformações que afetaram as regras dos jogos da ciência, da 
literatura e das artes”. Ou seja, a expressão tenta traduzir as mudanças de 
estatuto dos saberes, que se processam ao mesmo tempo que as 
sociedades entram na idade dita pós­industrial.

Habermas prefere compreender a modernidade como um “projeto 
inacabado”, sugerindo que “deveríamos aprender com os desacertos que 
acompanham o projeto” Será que “dizer que somos pós­modernos dá um 
pouco a impressão de que deixamos de ser contemporâneos de nós mesmos”? 
Mas se ainda reivindicarmos nossa “condição moderna”, como tratar de todas 
as mudanças que marcam a cultura contemporânea, e que a tornaram tão 
estranha a certas noções fundamentais à modernidade?
O que pretendo, aqui, é investigar brevemente a aplicação do conceito de “pós­
modernidade” à cultura contemporânea e as possíveis “razões” dessa 
aplicação. Articula­se, logo de início, uma problemática: se a pós­
modernidade, como o próprio termo sugere, caracteriza­se em primeira 
instância como uma reação (ou rejeição) à modernidade, seria ela o triunfo do 
irracionalismo, ou a pós­modernidade pressupõe, em última análise, algum 
conceito de “razão”, para além de seu relativismo epistêmico mais
superficial? Caso a resposta seja positiva, quais são “As ‘razões’ da pós­
modernidade”?

O pensador brasileiro Sérgio Paulo Rouanet no seu estudo “As origens do Iluminismo”
(1987) oportunamente observa que o prefixo pós tem muito mais o sentido de
exorcizar o velho (a modernidade) do que de articular o novo (o pós-moderno). Ou
seja, o que há é uma “consciência de ruptura”, que o autor não considera uma “ruptura
real”. Rouanet escreve:

“depois da experiência de duas guerras mundiais, depois de Aushwitz, depois de


Hiroshima, vivendo num mundo ameaçado pela aniquilação atômica, pela
ressurreição dos velhos fanatismos políticos e religiosos e pela degradação dos
ecossistemas, o homem contemporâneo está cansado da modernidade. Todos
esses males são atribuídos ao mundo moderno. Essa atitude de rejeição se
traduz na convicção de que estamos transitando para um novo paradigma. O
desejo de ruptura leva à convicção de que essa ruptura já ocorreu, ou está em
vias de ocorrer (...). O pós-moderno é muito mais a fadiga crepuscular de uma
época que parece extinguir-se ingloriosamente que o hino de júbilo de amanhãs
que despontam. À consciência pós-moderna não corresponde uma realidade
pós-moderna. Nesse sentido, ela é um simples mal-estar da modernidade, um
sonho da modernidade. É literalmente, falsa consciência, porque consciência de
uma ruptura que não houve, ao mesmo tempo, é também consciência
verdadeira, porque alude, de algum modo, às deformações da modernidade”.

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