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FELIZMENTE HÁ LUAR!

II ACTO

Didascálias Didascálias e texto


O segundo
acto começa
com o Manuel ACTO II
em cima de
um pequeno Ao abrir o pano a cena está cheia de luz. Manuel estava
banco, para numa posição central, um pouco mais elevado que os
estar um restantes actores.
pouco mais
elevado que
os actores
que estavam
em palco,
que eram só Manuel
os populares
e os antigos Eu sei o que fazer, sei como agir para que as coisas
soldados. mudem....

(Manuel profere estas palavras, depois estica-se e levanta


a cabeça.)

1º Popular
Manuel fala
baixo para Que podes tu fazer? Nada, és tão esfomeado como eu, e
que só os certamente não vais querer a perseguição do Rei, da
presentes policia, e até de Deus...
ouvissem.
Manuel

Pois eu não tenho medo de ninguém.

Antigo Soldado

Pois se não tens... porque falas tão baixinho?

Manuel

Meus amigos, se assim vos posso chamar, eu falo baixinho


porque...

(Pausa)

Não vá andar por aqui um Vicente...

(Manuel espreita à sua volta para ver se está alguém por


perto que o possa ouvir)

1
1º Popular
1º Popular
fala com O Vicente, esse bufo, já está bem na vida, já não liga aos
ironia. pobres.

Manuel

Mas meu amigo, o que não falta são bufos e Vicentes há


muitos por aí...

(Pausa)

Todo o cuidado é pouco...

Antigo Antigo Soldado


Soldado com
tom de voz Pois lá isso é verdade, quantos soldados que combateram
entristecido. comigo hoje estão bem na vida por serem bufos...

(Pausa, e mais triste ainda...)

Pois sofreram como eu e viram muitos camaradas morrer,


A medida que choraram e juraram irmandade, mas depois traidores se
o discurso do tornaram...
Antigo
Soldado vai (...mais triste ainda)
evoluindo,
cenário ia Pior que tudo foi o que fizeram aos sobreviventes como
escurecendo. eles, pois em muitos casos mentiram e entregaram às
mãos da justiça camaradas inocentes! Estes inocentes
morreram e os culpados, como sempre, foram promovidos,
alguns até passaram de soldados a capitães.

Manuel

Manuel fala Temos que acabar com essa raça!


com tom de
voz (Quando Manuel falou o cenário encheu-se de luz)
enfurecida.
1º Popular

Como Manuel? Explicas-me como?


1º Popular
muito Manuel
confuso.
Pois...pois... Teremos que arranjar uma solução

(Falando num tom mais alto)

2
Manuel E conto com vocês para me ajudarem a arranjar uma
senta-se solução para acabar com estes bufos...
calmamente.

1º Popular
Comigo, sabes que podes contar.

Antigo Soldado
(um pouco atrapalhado)
O Antigo
Soldado está Comigo também podem contar...mas será que podemos ir
com cara de comer e beber qualquer coisa...? Não consigo pensar de
quem quer barriga vazia.
pedir algo.
Manuel
(mais calmo)

Sim, está bem, vamos mas é todos para casa descansar e


comer, mas amanhã encontramo-nos aqui logo cedo.

1º Popular

Estou cá logo ao amanhecer.

Manuel

Manuel está Estaremos todos, estou cansado de ver patriotas


bastante inocentes, a serem condenados por actos que não
decidido. cometeram...só porque se calhar até dá jeito ao Rei.

Antigo Soldado
(Falando baixinho)

Cuidado, para que ninguém te oiça a falar assim...


Antigo
Soldado Manuel
mostra algum (Com voz firme e baixando o tom)
medo!
Não tenho medo, mas talvez tenhas razão; é melhor
ninguém desconfiar para podermos pôr os nossos planos
em prática.

1º Popular

Então até amanhã!

Manuel
Despedindo- Bem cedinho!
se uns dos
outros com Antigo Soldado
animosidade (Já com a barriga a dar horas.)

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Podes ficar descansado. Até amanhã.

Na manhã seguinte…

Na manhã MANUEL
seguinte
começaram a Então já sabem?
juntar-se (fala de mão á frente da boca)
como
combinado Foi levado o nosso General…
(Diz com voz nervosa)

(Pausa)
Sabiam?

Falando alto (não espera pela resposta e responde ele próprio)


e
descontrolad Já todos sabíamos que isto iria acontecer.
o

RITA
Calma homem…temos que ter calma.

Faz um gesto
de carinho ao 1ºPOPULAR
seu Manuel
Ouviu-se um burburinho toda a noite…
(Franzindo as sobrancelhas)

2º POPULAR
(Dizendo baixinho)
Falava-se nisto há já algum tempo…

O ANTIGO SOLDADO

(com voz rouca de nervosismo)


O nosso General tem muita coragem.
Faz um gesto
com o braço
erguendo-o (levanta a cabeça e diz com voz firme)
em sinal de Ele não vai estar desaparecido muito tempo.
luta
Pressinto-o.

Faz um gesto

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simples RITA
levando a sua Meu deus… que se passa que até me arrepiei.
mão direita
ao coração.
Esse pressentimento parece que passou também por mim.
(Diz ficando pálida)

Fala
encolhendo
os braços
(Entram os dois polícias)

1º POLÍCIA
Que se passa aqui... Toca a andar…

(Dá dois passos)


Embora daqui…todos…
Todos se
calam com a
chegada dos MANUEL
polícias
Não estamos a fazer mal. Nem podemos falar com os
amigos.
Falam com (Diz em meias palavras)
intolerância

Depois falamos… Até amanhã pessoal.


Já de saída
do palco (Agarra no braço da mulher)
Anda mulher, vamos embora...

O ANTIGO SOLDADO
Vamos embora…até amanhã.
(diz de cabeça baixa)

Todos saem e
o palco fica 1º POPULAR
vazio Alguém sabe o que se está a passar?
(Com um ar espantado)

Sabem?

MANUEL
Não sei, mas com tanta gente…
Na manhã
seguinte as (Pausa)
ruas estão Há confusão…
apinhadas de
gente que

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grita e
esbraceja. 2º POPULAR
(Chega esbaforido e eufórico e grita)

Há Revolução amigos!

MANUEL
Os militares fizeram a revolta?
(pergunta confuso)

(De passagem os dois polícias em passo de corrida…)

1º POLÍCIA
Todos se Sim… Esta noite as tropas revoltaram-se…
movem no (Falam com emoção)
palco como
se
estivessem 2º POLÍCIA
também na Revoltaram-se contra os governadores do reino.
revolta.

O ANTIGO SOLDADO
(Visivelmente triste por se sentir velho.)

Quem me dera ter idade para poder fazer parte destas


tropas.
Os polícias já
com voz
diferente do MANUEL
dia anterior. (De cabeça baixa mas com ar feliz)
Que iremos ter nós agora?

(Pausa)
Que se irá passar?
Fala com O nosso General…
muita (diz com voz trémula)
emoção.
Ai o nosso General…

Manuel
afasta-se
para um
extremo do
palco e fala MANUEL
baixo. (Dizendo baixinho)

Poderá haver a possibilidadede o general ter sobrevivido?

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(Pausa)
Manuel Será que isto tudo não foi um pretexto para levar o povo ao
murmura; desespero... perder a vontade de lutar?
começa a
pensar na
possibilidade Amigos OUÇAM – ME!
de Gomes Vamos procurar o nosso General, pode ser que ainda se
Freire estar encontre vivo.
vivo.
O ANTIGO SOLDADO
(Visivelmente triste.)
Com ar
triunfante O nosso bom General já pereceu...foi enforcado para os
Manuel vai lados de S. Julião... ficou a pendular por semanas...
para a frente
do palco e 1º POPULAR
berra. Achas que os regentes perdiam a oportunidade de pôr fim
a tão bravo soldado? Seria a sua desgraça.

MANUEL
Eu acho que o covarde do Beresford não lhe faria nada... o
povo iria logo sobre ele... seria revolta popular na certa...

A cena começa a ficar sem luz, Manuel e os restantes


populares vão a gesticular e a gritar em buscar do seu
Manuel herói...Gomes Freire de Andrade. Um foco intenso centra-
convicto se em Matilde, que se encontra solitária no meio do palco,
argumenta. unindo as palmas das mãos e estabilizando-as em frente ao
peito, como se fosse proferir uma oração.

Todos se Matilde
movem no
palco (Olha para o foco de luz.)
gesticulando
com os Tu, que estás aí? Se existes, explica-me esta traição
braços, indo tamanha? Estive sempre a teu lado e o que me deste?
a caminha do
forte. (Coloca um joelho no palco.)

Tristeza, muita! Mágoa, bastante! Aflição, imensa!


Melancolia, demasiada! Desgosto, profundo! Angústia,
excessiva dor!

(Junta o semelhante no palco.)

Não é só por mim que choro, mas pelo próximo! O meu


homem vivia pela liberdade, pelos direitos, pela igualdade,
pela fraternidade e… por mim. Sim, também por mim! Mas
sempre com os olhos postos no povo. Nesse que a cada dia

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longo que passa, vai ficando sem o pouco que restava… a
esperança na liberdade, a pouca alegria de viver… e até o
pão já levaram.

O povo (Levanta-se, volta-se de costas para o público e eleva os


circula pelo braços aos céus.)
palco
confusament Salve o povo, meu senhor! Salve o meu homem, meu
e quando senhor! Salve todos os que querem o bem, meu senhor!
subitamente
ficam (Volta-se para o público.)
imóveis.
O meu homem não morreu! Tamanho homem não morre!

(A luz apaga-se lentamente, Matilde retira-se e o povo


começa a circular novamente.)

(O palco começa novamente a iluminar-se e no canto


esquerdo, numa
Fala com a espécie de sala , estão sentados Frei Diogo de Melo e
voz rouca de António Sousa Falcão.
tanto gritar Matilde entra novamente em palco, a dita sala era a de sua
pelo General. casa… Os dois levantam-se em simultâneo, ficando em
Desespero e silêncio .)
revolta na
voz da
Matilde. MATILDE
(Dirigindo-se aos dois)
Sobe um
pouco mais o Meus amigos que ainda bem que aqui estão!
tom de voz. Certamente pensam o mesmo que eu…

Levanta (Sousa Falcão aproxima-se de Matilde não a deixando


ainda mais a terminar.)
voz.
SOUSA FALCÃO
Sim Matilde… nós também temos a certeza que aqueles
fanáticos do Conselho de Regência ainda nada fizeram com
o general… e informaram-nos que o exército não está a
cumprir as ordens de Beresford, já ninguém tem medo
destes ditadores! Tudo está a mudar, minha amiga!

(Pausa)

Mas é preciso rapidamente levarmos ao local onde se


encontra Gomes Freire, um advogado, que por sinal eu sou!

(Olhando também para o público.)

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Todo o cidadão tem direito a defender-se. Já lá vai o tempo
em que isso nem podia ser pronunciado!
Com a voz
emocionada e
ansiosa. (Frei Diogo aproxima-se de Sousa Falcão e levantando os
dois braços, mostrando a sua inquietação.)

Tentando FREI DIOGO


acalmá-la, Meu amigo, não é hora de relembrar outros tempos, mas
segura-lhe sim de ajudarmos um amigo que precisa do nosso apoio e
ajuda.
nas mãos.
(Olhando para Matilde.)

Com o nosso advogado Sousa Falcão, iremos


imediatamente a S. Julião, para primeiro saber que
acusações pendem sobre o General e depois iniciarmos a
sua defesa. Tenho a certeza que tudo não passou de um
mal entendido que será esclarecido com toda a justiça e
dignidade.
Levanta a voz
devido à
revolta que SOUSA FALCÃO
(Já mais calmo e dirigindo-se aos dois.)
sente com as
injustiças. Não percamos tempo meus amigos, ainda temos um longo
caminho até lá chegarmos!

Em tom de
repreensão.

Agora com
voz serena e
muito seguro
do que diz.

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