ABAIXO ASSINADO COM VISTA À SUSPENSÃO DA APLICAÇÃO DO
NOVO MODELO DE AVALIAÇÃO EM NOME DE UMA AVALIAÇÃO
PROMOTORA DO SUCESSO E DA DIGNIFICAÇÃO DA CARREIRA DOCENTE EX.MA SRª PRESIDENTE DO CONSELHO PEDAGÓGICO DA ESCOLA SECUNDÁRIA DE ALCOCHETE Os professores da Escola Secundária de Alcochete, abaixo assinados, declaram o seu mais veemente protesto e desacordo perante o novo Modelo de Avaliação de Desempenho introduzido pelo Decreto Regulamentar n.º 2/2008. Não está em causa a necessidade de os professores serem avaliados no desempenho das suas funções nem a urgência de se alcançarem níveis de sucesso mais elevados. Tal só valorizaria a nossa profissão, contribuindo, assim, para a qualidade e o prestígio do ensino público. O actual modelo foi implementado apressadamente e imposto de forma unilateral. Ora, qualquer avaliação de professores deve ser amplamente debatida por estes e merecer um largo consenso para que todos, ou a maior parte, se revejam nos seus princípios e objectivos, se sintam motivados para aperfeiçoarem as suas práticas e se empenhem na sua aplicação. Os professores não rejeitam a avaliação, mas exigem que esta seja encarada de forma séria e construtiva, o que pressupõe um debate, uma reflexão conjunta e uma fundamentação dos pressupostos, objectivos e modos de operacionalização da mesma. Contestamos, portanto, o facto de este modelo de avaliação estar a ser imposto pelo Ministério da Educação aos professores sem que estes tenham tido a possibilidade de o discutir amplamente nem de propor quaisquer alterações e, pior ainda, sem demonstrar qualquer sensibilidade aos repetidos apelos dos docentes no sentido de alterar este processo conflituoso que só está a provocar um grande desânimo e mau ambiente entre os professores. Este é um modelo que não merece a confiança dos docentes não só porque não garante imparcialidade nem justiça, mas também porque a selecção dos avaliadores não se baseou em critérios que lhes confiram qualquer legitimidade na sua função. Com efeito, o concurso para acesso à categoria de Professor Titular não teve em conta a competência pedagógica nem o envolvimento e dedicação dos docentes, valorizando apenas o desempenho de cargos nos últimos anos e ignorando o trabalho efectivo dos professores com os seus alunos, o seu envolvimento na comunidade educativa e a sua valorização científica e académica. Desta forma, temos por exemplo situações de avaliadores com menos habilitações académicas que os avaliados ou casos em que os avaliadores, por terem desempenhado muitos cargos nos últimos anos, beneficiando assim de grandes reduções de carga lectiva, têm menos experiência didáctica e pedagógica bem como um menor investimento na sua formação pessoal do que os avaliados. Esta situação é inaceitável e provoca um profundo sentimento de revolta entre os professores. Além disso, não há garantias de imparcialidade, pois grande parte dos professores encontra-se, segundo a alínea c) do número 1 do artigo 44º e a alínea d) do número 1 do artigo 48º do Código de Procedimento Administrativo, legalmente impedida de participar no processo de avaliação. Este processo caracteriza-se ainda pelo excesso de procedimentos burocráticos, pressupostos na sua operacionalização, que têm conduzido a uma morosa e complexa leitura, descodificação e elaboração de documentos com vista à clarificação de conceitos, ao desenvolvimento de instrumentos de registo, à definição de indicadores de medida e à reformulação e adaptação dos elementos de referência da avaliação, como são o Projecto Educativo, o Regulamento Interno e o Plano Anual de Actividades. Estes procedimentos, aliados ao desenvolvimento dos requisitos legais para concretizar este modelo de avaliação, que foram sendo regulamentados e introduzidos de forma apressada, leviana e avulsa, à medida das conveniências e para colmatar deficiências e omissões detectadas, conduziram ao estado actual das nossas escolas: locais onde reina a burocracia absurda que impede a concretização daquilo que verdadeiramente é relevante no processo de ensino/aprendizagem. O horário dos professores, imposto pelo Ministério, é largamente insuficiente face à existência de uma grande sobrecarga de trabalho. Dez ou onze tempos de trabalho individual não são suficientes para responder às inúmeras tarefas e funções que são atribuídas aos docentes ou solicitadas: elaboração de objectivos; planificação de aulas; análise de estratégias; criação de recursos diversificados e inovadores (muitas vezes inexequíveis dada a falta de meios e condições nas escolas); ensino diferenciado; preparação de instrumentos de avaliação diagnóstica, formativa e sumativa; correcção dos mesmos; reflexão sobre os resultados; reformulação de práticas; preparação e participação em reuniões; dinamização/participação em actividades. Este modelo de avaliação preconiza ainda a tendência para o individualismo quando a escola deve ser prioritariamente um espaço de partilha de saberes e de experiências, conducente a uma aprendizagem conjunta e enriquecedora. Os professores estão, portanto, exaustos e desmotivados, faltando-lhes tempo e serenidade para se dedicarem ao que deve ser a sua preocupação essencial: os alunos. Se todos os professores se sentem esmagados sob o peso de uma burocracia excessiva, inútil e irrelevante no contexto do ensino/aprendizagem, o que dizer dos professores avaliadores? A esses coube-lhes em “sorte” assumir múltiplas funções, cujo desempenho exigirá um esforço sobre-humano: para ser professor, avaliador, muitas vezes, coordenador de Departamento, membro do Conselho Pedagógico, da Comissão de Avaliação de Desempenho, entre outros, é preciso inventar horas, abdicar da vida pessoal, da família, deixando para trás toda uma vivência, essa sim, verdadeiramente enriquecedora das práticas pedagógicas. Para cumprir todos esses papéis, o professor avaliador dispõe apenas de um tempo de 45 minutos semanais, retirados à componente não lectiva, por cada quatro avaliados para realizar todas as tarefas associadas ao processo de avaliação (entrevistas, assistência a aulas, reuniões…). Acrescente-se que, para desempenhar as funções de avaliador, para as quais a grande maioria dos professores não tem formação, esses precisam ainda de adquirir alguns conhecimentos sobre o assunto, o que ainda os sobrecarregará mais. Outro aspecto negativo a destacar é o facto de este modelo penalizar os docentes que faltam por motivos justificáveis segundo a lei, como nos casos de licença por maternidade ou de doença prolongada, ao adiar a sua avaliação, revelando-se fortemente discriminatório, num claro desrespeito pelos princípios consagrados na nossa Constituição no que respeita à igualdade de oportunidades. Acresce ainda que a formação necessária para avaliadores e avaliados, que começou a ser ministrada já depois da entrada em vigor do novo modelo, não só ainda não conseguiu abranger todos os professores, como seria desejável, como se tem revelado muito aquém das expectativas quanto ao esclarecimento do processo de avaliação, porventura devido à enorme complexidade e pouca exequibilidade do mesmo. Finalmente, dizem-nos que esta avaliação será uma valorização da nossa carreira, que possibilitará o reconhecimento do mérito a quem o tem. Todavia, este decreto cria um sistema de quotas que restringe a atribuição das menções qualitativas de Excelente e Muito Bom, estabelecendo percentagens máximas para tais classificações, o que manipula a avaliação e põe em causa a sua transparência e idoneidade. Para concluir, queremos reafirmar que quando o modelo de avaliação for sério, justo, imparcial, prático, objectivo, consensual, aplicável, razoável, promotor de facto da valorização da carreira, os professores subscrevê-lo-ão. Enquanto a avaliação for apenas sinónimo de subjectividade, parcialidade, injustiça, insegurança, desconfiança, trabalho acrescido, peso burocrático impeditivo de os professores se dedicarem às tarefas pedagógicas, temos de dizer NÃO; enquanto for apenas uma máscara do propósito economicista de impedir que a maioria dos professores atinjam o topo da carreira, temos de dizer NÃO. Assim, enquanto as arbitrariedades, injustiças e incoerências deste modelo de avaliação não forem corrigidas, os professores signatários desta moção, por não lhe reconhecerem qualquer efeito positivo sobre a qualidade do ensino/aprendizagem e das suas práticas pedagógicas, solicitam ao Conselho Pedagógico que suspenda a aplicação deste modelo de avaliação de desempenho. Alcochete, 12 de Novembro de 2008