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Segundo Antônio Cândido, a literatura brasileira pode ser dividida em três períodos:
1º: a era das manifestações literárias que vai do século XVI à metade do século
XVIII. 2º: a era da configuração do sistema literário que tem início na primeira
metade do século XVIII à segunda metade do XIX. 3º: a era do sistema literário
consolidado, da segunda metade do século XIX até nossos dias.
Barroco
Os ciclos de ocupação da terra sucederam-se em consonância com as possibilidades
demográficas e os interesses econômicos. Do litoral para o interior foram se definindo
manchas de povoamento que originaram ilhas culturais. Estas, segundo Viana Moog,
foram sementes da literatura regionalista que se faz presente ao longo de toda a
história literária do país.
Nesta primeira fase, a literatura brasileira segue o ritmo lusitano do tempo. A obra do
jesuíta, catequista e orador sacro Antônio Vieira (1608-1697) sincretiza marcas
européias, portuguesas e brasileiras. Os 15 volumes de Sermões são de particular
interesse para nossa literatura, principalmente o Sermão da primeiro domingo da
Quaresma (1653) que versava sobre a extinção do escravismo índio e o Sermão XIV
do rosário (1633), sobre os escravos negros. Na História do futuro, Antônio Vieira
escreve um tratado sobre o profetismo onde defende a mística do 5º Império do
Mundo, que seria português, com sede no Brasil. Beirando a heterodoxia, este texto
obrigou seu autor a explicar-se ante o Tribunal do Santo Ofício. Maior orador sacro do
Brasil, o padre Antônio Vieira era um barroco. Sua oratória é prolixa, cheia de
alegorias nas quais revela a argúcia de seu raciocínio.
Frei Manoel de Santa Maria Itaparica, nascido na Bahia em 1704, escreveu uma
epopéia sacra, Eustáquidos (1769), imitação dos épicos, e um poema, Descrição da
cidade da Ilha de Itaparica. Simão de Vasconcelos produziu uma obra de edificação
religiosa em que se distingue a Vida do venerável padre José de Anchieta (1672).
Frei Manuel Calado inspira-se na defesa da terra contra invasores estrangeiros para
criar Valeroso Lucideno (1648). De autoria de Francisco Brito Freire é A Nova
Lusitânia (1675). Nesta primeira fase não se deve estranhar o teor das
manifestações literárias. Primeiro, pela fragilidade da vida intelectual na colônia, fato
compreensível uma vez que a colonização foi um fenômeno burguês, com caráter
empresarial, visando a produção e o lucro no comércio do açúcar. Não havia público
para a produção literária, nem interesse nela, em um meio acrítico e desinteressado
da vida cultural. No entanto, não houve deseuropeização: as estruturas do mundo
que se erigia eram genuinamente portuguesas, embora passíveis de adoçamentos.
As manifestações literárias foram, pois, desdobramentos da literatura portuguesa
que, por sua vez, ainda não tinha desenvolvido, perfeitamente, os gêneros literários.
Salvo raras exceções, a literatura barroca produzida na colônia acabou sendo de
qualidade inferior. A própria obra de Anchieta, a mais alta expressão do barroco no
seu tempo, não teve valor estético de primeira grandeza.
Neoclassicismo e Romantismo
Abrange as transformações do barroco, as tentativas de renovação arcádica e
neoclássica e o romantismo. O início do século XVIII deixa entrever o declínio do
barroco e as aberturas para o iluminismo, este ligado às transformações estéticas
das Academias. No Brasil é coetâneo ao deslocamento do eixo político da Bahia para
o Rio de Janeiro (1760) e a descoberta do ouro em Minas Gerais. Não é estranho
que, nestas áreas, tenha surgido um movimento cultural ligado à crise do
colonialismo e às aspirações de independência política. José de Santa Rita Durão
(1722-1784) escreveu o poema épico Caramuru (1781) onde faz um balanço da
colonização em meio a uma descrição hiperbólica da natureza. Neste poema são
retratados os costumes dos índios, exaltadas a fé e a defesa da terra contra os
invasores. José Basílio da Gama (1741-1795), com mentalidade iluminista e anti-
jesuítica, escreveu o poema Uruguai (1769) em que descreve o choque da cultura
branca com a indígena e, liricamente, adota uma atitude complacente com os
selvagens.
Nesta linha, Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810) escreveu uma coleção de poemas
de amor dedicados à Marília que contêm reflexões sobre o destino, externando uma
visão horaciana do mundo. Autor também de Cartas chilenas (1789), poema satírico
contra a sociedade e o governador de Minas.
A invasão da poesia pela música leva às modinhas, poesia musicada, inspirada nas
áreas de ópera. Com elas, a poesia penetra mais e diminui a distância entre cultos e
incultos. Figuras representativas do último grupo dos românticos foram Franklin
Távora, Bernardo Guimarães e Alfredo d'Escragnolle Taunay. Franklin Távora (1842-
1888), teórico e romancista, escreveu sobre Pernambuco do século XVIII, adotando
restrições à tendência da literatura de se relacionar com a cultura européia.
Estabelece-se o conflito entre a tendência de vinculação à Europa e aquela que busca
estabelecer uma tradição local, extremos entre os quais se debateria a consciência
literária. Alfredo d'Escragnolle Taunay (1843-1899) compõe Inocência (1872) com
cenário e costumes sertanejos, além de diálogos naturais pelo tom e vocabulário.
Taunay voltou-se, depois, para o romance urbano, onde se destaca O declínio (1899)
que trata do descompasso entre a paixão e o envelhecimento.
Importante, ainda, é citar o grupo da revista Festa (1928) onde aparece Cecília
Meireles (1901-1964), e da revista Estética (1924-1925), dirigida por Sérgio Buarque
de Holanda (1902-1982) e Prudente de Morais Neto (1905-1927). Aos modernistas
de São Paulo, ligou-se um dos maiores poetas brasileiros: Manuel Bandeira. A parte
mais importante de sua poesia está reunida em Libertinagem (1930).
A partir dos núcleos de São Paulo e Rio de Janeiro, a renovação literária se expandiu
pelo Brasil através de manifestos, grupos e intercâmbio, frutificando, principalmente,
em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Os anos de 1930 e 1940 aceitaram,
plenamente, o modernismo ao lado do qual floresceu o regionalismo crítico do
Nordeste.
Murilo Mendes (1901-1975) inicia sua produção com poesia humorística, sofre
influências do surrealismo refletida na obra O anjo (1934), e desagua no mistério e
na transcendência após sua conversão ao catolicismo refletida em A invenção de
Orfeu (1952).
Ainda na ficção, o realismo cientificista do século XIX é substituído pela visão crítica
das relações sociais, principalmente em Érico Veríssimo e José Américo de Almeida.
No romance psicológico caminha-se pela introspecção da psicanálise. Socialismo,
freudismo, catolicismo são usados para a compreensão do homem social. Na poesia,
o concretismo - ou poesia concreta - impôs-se depois de 1956 como expressão da
vanguarda estética. O grupo inicial é o da Antologia Noigrandes. Nomes de proa são
os de Haroldo de Campos, Auto do possesso (1950), Augusto de Campos, O rei
menos o reino (1951) e Décio Pignatari, O carnaval (1950). O grupo abandona o
verso e busca uma linha de sintaxe espacial. O ponto de partida da estética é a
estrutura verbo-visual. Inova no campo semântico (ideogramas), sintático
(redistribuição de elementos do discurso), léxico (neologismos, estrangeirismos,
tecnicismos), morfológico (desintegração dos sintagmas nos seus fonemas), fonético
(aliterações, assonâncias), topográfico (abolição do verso, uso construtivo de espaços
em branco).
Como seu pai o fizera, destacou-se como importante cidadão da cidade do Porto.
Pertencente à classe dos letrados, muito próxima aos reis, foi cavaleiro de Afonso V,
João II e Manuel I.
Sua importância para a história do Brasil e dos descobrimentos portugueses reside
na Carta ao Rei D. Manuel o Venturoso escrita, em dias sucessivos, após a chegada
da expedição de Cabral à Bahia, na qual narra o desenrolar dos acontecimentos.
Quanto aos indígenas, há certa ambigüidade, pois, embora a primeira parte do texto,
relativa aos primeiros dias na terra, faça referências à beleza e inocência de homens
e mulheres, sublinhando sua humanidade, na segunda parte eles aparecem como
“seres bestiais”.
De qualquer modo, apesar da visão etnocêntrica a permear o texto, o autor faz, sem
dúvida, uma imagem paradisíaca do homem primitivo.