SOBRE A OBRA Em 1937 o conto Sagarana foi escrito em sua primeira versão. O livro principia por uma epígrafe ( texto breve/um pré-texto que serve de bandeira ao texto principal, por resumir de forma exemplar o pensamento do autor), extraída de uma quadra de desafio, que sintetiza os elementos centrais da obra : Minas Gerais, sertão , bois vaqueiros e jagunços , o bem e o mal. Ainda na primeira versão, o livro foi submetido a um concurso literário: Concurso Humberto de Campos, da livraria José Olympio, sob o título de Contos, onde não conseguiu o primeiro lugar, ficando em segundo. Em 1946 foi escrita a segunda versão do livro, reduzindo de quinhentas páginas das quais antes continha, para cerca de trezentas páginas na versão definitiva. A palavra SAGA é de origem germânica e quer dizer “canto hebróico” / “lenda” e RANA é de origem indígena e quer dizer “ a maneira de” / “espécie de”. Sagarana exemplifica bem o estilo do autor, a sua linguagem inovadora e os seus temas, atrelados à vida rural de Minas Gerais. João Guimarães Rosa combina e recombina habilmente as informações do meio, confundindo lugares e paisagens, mesclando o real, o imaginário e o lendário em sua obra. Não é um livro regionalista já que não se limita a uma localidade especifica. Utiliza linguagens criando neologismos (fenômeno linguístico que consiste na criação de uma palavra ou expressão nova, ou na atribuição de um novo sentido a uma palavra já existente) e palavras formadas por derivações sufixal, prefixal, parassintética e também por abreviação, composição aglutinada e composição justaposta. Algumas figuras de linguagem tais como: metáforas, anacoluto e silepse têm também grande destaque. Guimarães apela para os aspectos auditivos (“canto”) e visuais (“plumagem”), fazendo uma verdadeira arranjo sonoro com as palavras.
Fabulação
É outra característica de Guimarães Rosa que
se sobressai em Sagarana Suas narrativas, repletas de incidentes, casos fantásticos e imaginários, contém às vezes mais de uma “história” dentro da “história”. É o que se pode notar, principalmente, em O Burrinho Pedrês. Espaço e personagens Sagarana se passa no interior de Minas Gerais, na paisagem das fazendas e vaqueiros, mundo da infância e juventude do autor. As histórias são ligadas entre si pelo espaço em que acontecem, e captam os aspectos sociais, físicos e psicológicos do homem interiorano. Narração Os contos O Burrinho Pedrês, A Volta do Marido Pródigo, Sarapalha, Duelo, Conversa de bois e A hora e vez de Augusto Matraga são narrados em terceira pessoa. A onisciência do narrador nos contos em terceira pessoa é relativizada, acentuando a dimensão mítica, política e a alternância de focos narrativos no transcorrer do texto. Já nos contos São Marcos, Minha Gente e Corpo Fechado o narrador aparece em primeira pessoa, foco narrativo ilumina os passos do protagonista, mas também revela certas sutilezas que servem para esclarecer o sentido mais profundo da história. Características literárias Guimarães Rosa é figura de destaque dentro do Modernismo . Isso se deve ao fato de ter criado toda uma individualidade quanto ao modo de escrever e criar palavras, transformando e renovando radicalmente o uso da língua. Utiliza de termos coloquias típicos do sertão aliados ao emprego de palavras que já estão praticamente em desuso. João Guimarães Rosa Nasceu em 27 de junho de 1908, Cordisburgo e faleceu no Rio de Janeiro em 19 de novembro de 1967. Foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata. Estudou várias línguas, como, português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto e um pouco de russo. Lia sueco, holandês, latim e grego. Em 1925, matriculou-se na então "Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais", com apenas 16 anos. Sua estréia nas letras se deu em 1929, ainda como estudante. Escreveu quatro contos: Caçador de camurças, Chronos Kai Anagke (título grego, significando Tempo e Destino), O mistério de Highmore Hall e Makiné para um concurso promovido pela revista O Cruzeiro. Todos os contos foram premiados e publicados com ilustrações em 1929-1930. Em 27 de junho de 1930, casou-se com Lígia Cabral Pena, de apenas 16 anos, com quem teve duas filhas: Vilma e Agnes. Dura pouco seu primeiro casamento, desfazendo-se uns poucos anos depois. Ainda em 1930, forma-se em Medicina. Guimarães Rosa vai exercer a profissão em Itaguara, pequena cidade que pertencia ao município de Itaúna (MG), onde permanece cerca de dois anos. Guimarães Rosa, durante a Revolução Constitucionalista de 1932, trabalha como voluntário na Força Pública. Posteriormente, efetiva-se, por concurso. Em 1933, vai para Barbacena na qualidade de Oficial Médico do 9º Batalhão de Infantaria. Antes dos seus 31 anos, ele participa de outros dois concursos literários. Em 1936, a coletânea de poemas Magma recebe o prêmio de poesia da Academia Brasileira de Letras. Um ano depois, sob o pseudônimo de "Viator", concorre ao prêmio HUMBERTO DE CAMPOS, com o volume intitulado Contos, que em 46, após uma revisão do autor, se transformaria em Sagarana, obra que lhe rendeu vários prêmios e o reconhecimento como um dos mais importantes livros surgidos no Brasil contemporâneo. Sua segunda esposa foi Aracy de Carvalho. No Brasil, em sua segunda candidatura para a Academia brasileira de letras, foi eleito por unanimidade (1963). Temendo ser tomado por uma forte emoção, adiou a cerimônia de posse por quatro anos. Faleceu três dias após essa posse, em 19 de novembro. Se o laudo médico atestou um infarto, sua morte permanece um mistério inexplicável. PRINCIPAIS OBRAS Romance Grande Sertão: Veredas (1956). Contos Sagarana (1946); Corpo de Baile (1956); Primeiras Estórias (1962); Tutaméia – Terceiras Estórias (1967); Estas Estórias (1969); Ave, Palavra (1970). Sagarana Sagarana compõe-se de nove contos: 1- O burrinho Pedrês 2- A Volta do Marido Pródigo 3- Sarapalha 4- O Duelo 5- Minha Gente 6- São Marcos 7- Corpo Fechado 8- Conversa de bois 9- A hora e vez de Augusto Matraga O BURRINHO PEDRÊS Sete de ouros é um burrinho velho, escolhido para uma viagem ao sertão com bois de cortes e vaqueiros. No trajeto, depois de uma forte chuva a boiada chegou ao córrego da Fome que estava cheio seria uma travessia perigosa. Major Saulo pede cautela. Mas a travessia é normalmente. No meio do caminho, Major Saulo ordenou que Francolim trocasse de montaria com João Manico, que estava montado sobre o velho burrinho. Francolim pediu para que quando estivessem chegando ao povoado a troca fosse desfeita, pois não ficava bem para ele encarregado do Major, ser visto montado em Sete-de-Ouros. Badu está na fazenda há apenas dois meses e já tomou a namorada do Silvino. Assim, os dois viram inimigos. Todos previam que ainda sairia morte entre os dois. A chegada ao povoado foi uma festa. Na volta, Baldu bêbado ficou por último e por maldade deixaram- lhe o Burrinho pedrês. O Córrego da Fome transbordara, inundando alem das margens. Foi uma tragédia, todos morreram, apenas o burrinho com Badu agarrado às crinas e Francolim agarrado à cauda, conseguiu atravessar o mar de águas. A volta do marido pródigo Homens trabalham duro escavando o solo para dele retirar minério. Seu Marra é o encarregado, de olho em todos para que o trabalhe ande como o esperado. Lalino é um mulato vivo e malandro. Suspeitam de que Ramiro, um espanhol, está de olho na mulher de Lalino, que está disposto a ir embora. Pede dinheiro a Ramiro com o argumento de que quer ir embora sem a mulher, mas falta-lhe dinheiro para viajar. Ramiro empresta o dinheiro. Um mês depois, Maria Rita, esposa de Lalino, ainda vivia chorando, em casa. Três meses passados, Maria Rita estava morando com o espanhol. Depois de alguns meses no Rio de janeiro, Lalino resolve voltar e se depara com a esposa e Ramiro juntos. Pede ajuda a Oscar, filho do Major Anacleto, que lhe arranja um emprego de cabo eleitoral na campanha do Major. Ele usa toda a sua lábia para convencer os eleitores e consegue. O Major acaba expulsando os espanhóis e unindo Maria Rita e Lalino. Sarapalha
A sezão (febre/malária) avança por um povoado
às margens do Rio Pará. As pessoas abandonam o povoado deixando tudo para trás, as que não se vão morrem. Pouco acima das margens do rios moram, na fazenda abandonada, três pessoas: Primo Ribeiro, Primo Argemiro e uma mulher, já com idade. Os dois começam a se lembrar do passado. Ribeiro fala da esposa Luísa que fugiu com um boiadeiro e Argemiro assume o amor que sentia pela esposa do primo. Ele muito irritado, expulsa Argemiro, enquanto a doença atinge os dois. Duelo Turíbio foi pescar mais voltou antes do esperado, pegando sua esposa o traindo com Cassiano Gomes. Fingiu de que nada sabia e apenas voltou mesmo para a casa no dia seguinte, como se nada tivesse visto. No outro dia Turíbio foi até a casa de Cassiano e confunde ele com o irmão, atira e mata Levindo Gomes. Cassiano persegue Turíbio durante meses o qual foge para São Paulo e sem vingar a morte do irmão, Cassiano morre do coração. Mais antes contrata os serviços de um caboclo que lhe devia favores, Timpim. Quando Tiríbio voltava para casa, depois de saber da morte de seu “inimigo”, acompanhado por um rapaz, esse mesmo que o assassina mostrando ser o tal de Timpim. Minha gente
Caminham, pelo sertão de Minas, o narrador,
José Malvino e Santana que iam para a fazenda do tio Emílio candidato as eleições. O narrador se “apaixona” pela prima Maria Irma, e não é correspondido. Vai embora da fazenda mais retorna quando seu tio ganha as eleições. Assim, sua prima o apresenta para Armanda, noiva de Ramiro. Ele se casa com ela e Maria Irma casa-se com Ramiro, conseguindo realizar seu “plano” em separar Armanda e Ramiro e ainda se casar com ele. São Marcos Mangolô era um velho e negro, morava no Calango-Frito e tinha fama de feiticeiro. José, narrador-personagem “brinca” com Mangolô ao passar perto de sua casa, falando frases racistas e provocativas. Mangolô não gostou da brincadeira. Fechou-se na casa e bateu a porta. Izé, como é conhecido o protagonista, recita por zombaria a oração de São Marcos para Aurísio Manquitola e é duramente repreendido por banalizar uma prece tão poderosa. Certo dia em uma caminhada normal, ele fica misteriosamente cego. Perdido e com medo ele recita a oração de São Marcos. Encontra a casa de Mangolô e tenta estrangular o feiticeiro, mais ao retomar a visão, percebe que o velho havia colocado uma venda nos olhos de um boneco para “vingar-se” das constantes zombarias. Tudo terminou em paz. Para garantir tranqüilidade, o narrador deu um dinheiro a João Mangolô. Era a garantia de que, agora, eram amigos. Corpo fechado O narrador , médico, é convidado por Mané Fulô, para ser padrinho de casamento. Mané detesta qualquer tipo de trabalho e passa o tempo a contar histórias para o doutor: de valentões; de ciganos que ele, Mané, teria ludibriado na venda de cavalos; de sua rivalidade com Antonico das Pedras, o feiticeiro. Mané possui um cavalo, Beija- Fulô, e Antonico é dono de uma bela sela mexicana; cada um dos dois gostaria muito de adquirir a peça complementar. Targino o valentão do lugar, fala abertamente que vai passar uma noite com a noiva de Mané. Este fica desesperado.Aparece então Antonico e propõe um trato a Mané : vai fechar-lhe o corpo (mata-lo), mas exige em pagamento o cavalo. Mané aceitou. Em seguida, Antonico enfrenta Targino e o mata. O casamento realiza-se e Mané Fulô assume o posto de valentão, por ter matado Targino. Conversa de bois Em uma viagem com o carro puxado por bois, eles começam a conversar, mostrando suas opiniões sobre algumas coisas, como, os homens. Tiãozinho que viajava no carro com o pai morto emum carro carregado por rapaduras, estava meio durmindo e meio acordado. É como se seu pensamento entrasse na conversa dos bois. Eles entendiam o pensamento dele: falava em vingança, em morte. De repente, meio inconsciente, Tiãozinho deu um grito.Os bois saltaram, todos a um tempo, e Agenor Soronho (amante do mãe de Tiãozinho e o mesmo, batia e judiava do menino) caiu do carro. Uma das rodas do carro passou por cima do pescoço dele, quase o degolando. Estava morto. A hora e a vez de Augusto Matraga Nhô Augusto manda e desmanda no povoado, não se preocupa com nada. Um dia a mulher o abandona e seus capamgas se colocam a serviço do seu maior inimigo, por não estarem satisfeitos com o pagamento recebido por ele. Espancado e muito ferido ele é encontrado por um casal de negros e melhora. Passa a viver uma vida de penitência (tentando pagar seus pecados e ser salvo). Trabalha duramente. Com o tempo, Nhô resolve sair do Tombador (onde morava e trabalhava. Encontra-se por acaso com Joãozinho Bem-Bem, que está prestes a executar uma família, como forma de vingança. Nhô Augusto pede a Joãozinho Bem-Bem que não cumpra a execução. O jagunço encara essa atitude de Nhô Augusto como uma afronta e os dois travam o duelo final, no qual ambos morrem.