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UFJF – Faculdade de Letras

Especialização em Ensino de Língua Portuguesa


Disciplina: Teorias Pragmáticas
Profa. Dra. Amitza Torres Vieira

GOUVEIA, Carlos. Pragmática. In: FARIA, Isabel


Hub et al. (Eds.) Introdução à Linguística Geral e
Portuguesa. Lisboa: Caminho, 1996. p. 383-419.
USO DA LINGUAGEM – PRESSUPÕE
QUE:
• F/O façam uso de determinados conhecimentos
fornecidos pela situação /contexto de uso;
• Não há comunicação fora de um contexto
particular, de uma dada situação social;
• compreender o significado de uma mensagem
não envolve apenas competência linguística;
• O uso da linguagem deve obedecer a escolhas e
restrições de interpretação facultadas pela
situação particular em que ocorre.
Exemplo:
Contexto 1: pedido de informação alfandegária

Agente alfandegário: Cigarros, brandy, whisky?


Sr. Inocêncio: Ah, muito obrigado. Pode ser um café, por favor.

Contexto 2: serviço de bordo

Aeromoça: Cigarros, brandy, whisky?


Sr. Inocêncio: Ah, muito obrigado. Pode ser um café, por favor.

* Para interpretar, o falante precisa recorrer ao seu


conhecimento das regras e princípios que regulam a língua em
situação de uso (o qual está além do conhecimento gramatical
dessa mesma língua).
OBJETO DE ESTUDO DA PRAGMÁTICA:
os princípios que regulam a atividade
verbal
• Perspectiva = a língua é vista como um
instrumento de ação e de comportamento
regidos por regras.
• A Pragmática enquanto disciplina linguística
deve dar conta da relação existente entre as
línguas (sistemas formais) e sua atualização
em situações de uso.
Questão: quais os aspectos centrais para a
comunicação que poderemos definir como
pragmáticos?
• Fatores linguísticos e não linguísticos:
- o que é dito;
- o modo como é dito;
- a intenção com que é dito;
- o posicionamento físico;
- os papéis sociais;
- as identidades;
- as atitudes;
- os comportamentos e as crenças dos participantes;
- as relações entre os participantes.
Contexto situacional x Contexto linguístico (co-texto)
Exemplo
(a) A mesa fez aprovar a moção.
(b) A mesa está posta para o almoço.

Nota: o conhecimento linguístico de aprovar e moção permite identificar


o significado de mesa em (1) como diferente de 2 (b).

MAS há determinados aspectos do significado que não podem ser


determinados apenas pelo contexto linguístico.
2(a) pode querer dizer " Esta Assembléia é uma farsa“

LOGO: pode existir uma discrepância entre o sentido literal e o sentido


que adquire em um dado contexto.

OU
Ana: O telefone
Vera: Estou no banho.
Ana: Tá bom!
• Qualquer investigação em pragmática deve fazer
uma distinção básica entre FRASE e ENUNCIADO.
São unidades de análise diferentes.
• Frase = unidade estrutural do sistema de
organização de uma língua. Ligada ao conhecimento
linguístico. Unidade da sintaxe.
• Enunciado: pertence ao domínio da produção.
Unidade do discurso. Registra as marcas de uma
enunciação individual situado no tempo e no
espaço.
• Uma mesma frase pode dar origem a tantos
enunciados quantas forem as situações de uso. Há
expressões que não são frases ,mas são
enunciados: hum,hu, por favor, etc.
DIFERENTES TIPOS DE SIGNIFICADO

• Significado frástico ou literal - significado das


expressões e nexos semânticos, levando em
conta a própria construção sintática.
• Significado do enunciado – significado da frase
no contexto.

Exemplo : " Estou limpo" – jogo, batida policial,


banho, etc.
TEORIA DOS ATOS DE FALA
AUSTIN – importância de seus estudos para a PRAGMÁTICA
Princípio – “dizer pode ser fazer" distingue: enunciados performativo/
constativo
Performativos= enunciados ativos e de caráter contratual, criadores
de um novo estado de coisas. São simultaneamente enunciados e
ações.
Constativos = enunciados analisáveis segundo critérios de condição
de verdade e falsidade.
Exemplo: Falante com uma garrafa de champanhe:
3(a)Eu te batizo com o nome de Admastor.
3(b) Batizei o navio como o nome de Adamastor
a= performativo = cria o acontecimento
b= constativo = representa / descreve verbalmente um
acontecimento.
• Critérios de felicidade/infelicidade x
verdade/falsidade

• Enunciado feliz = deve satisfazer


determinadas condições (batizar = realizar
uma dada sequência de ações e proferir as
palavras apropriadas/convencionais para a
situação)

• Condições necessárias (VER p. 387)


• Estas condições adquirem valores particulares em função
da ação que está sendo realizada. Atos declarativos-
Poder de declarar. Prometer – intenção de cumprir, etc.;
• A fronteira entre performativos e constativos não é
rígida: performativo  constativo e vice-versa (i.e. podem
ser analisados seg. condições de Verdade e/ou de
falsidade)

• (4) O carro de João é vermelho e preto


• Enunciador – dá a entender que acredita na verdade do
que diz. Logo pode ser visto como um ato de fala
representativo.
Dizer, asseverar, afirmar, constatar, declarar, são atos de fala
Hipótese de Austin: os enunciados constativos são casos particulares
dos performativos.

A forma do enunciado linguístico não é suficiente para que o


possamos classificar como uma coisa ou outra.

(5) (a) Prometo que te trago o livro amanhã - performativo explícito


(prometer)

(b) Trago-te o livro amanhã. Performativo primário


(constativo+contexto= performativo)

(6) (a) Foi o Sr Santos quem me vendou o carro. (contexto)


(b) Declaro que foi o Sr Santos quem me vendeu o carro (explícito).

A sinceridade não está apenas no que se diz, mas implica também as


consequências do que se diz. Ex. Prometer e ter a intenção de
cumprir a promessa.
ATOS DE FALA
Tipos de ações realizadas em um único e mesmo ato de fala (p. 390)
Ato locucionário – enunciação de palavras expressões (envolve
Atribuição de referência e de significado).
Ato ilocucionário – uso de um enunciado para efetuar algo:
prometer, ordenar.
Ato perlocucionário – efeitos, resultados produzidos pelo
enunciado-ação.

Exemplo : O cozinheiro de um restaurante diz ao ajudante


(7) A água está fervendo.
Ato ilocucionário: uma afirmação ? uma ordem ? (colocar algo
dentro da panela) uma repreensão ?

IMPORTANTE: convencionalidade e intenção – na


realização/identificação dos atos ilocucionários pretendidos.
FORÇA ILOCUCIONÁRIA E OBJETIVO
ILOCUCIONÁRIO

Objetivo – propósito da ação


Força – intensidade com que o objetivo é
explicitado

Ex. Qual a diferença entre uma ordem e um


pedido?
TIPOLOGIA DOS ATOS ILOCUCIONÁRIOS
Pressuposto:
Ao proferir p ( qualquer conteúdo proposicional), o LOC
exprime crença em p , exprime intenção de fazer p, quer que o
ALOC faça p.

Há uma classe de diferentes atos ilocucionários que o falante


pode realizar por meio do uso que faz da linguagem.
Searle ( filósofo americano) – propõe uma tipologia a partir dos
diferentes objetivos ilocucionários que os atos de fala podem
realizar, considerando no interior de cada tipo, as variações
quanto à FI (força ilocucionária), diferenças de status dos
participantes e das relações de poder que daí decorrem, os
interesses dos LOC e ALOC, a existência ou não do aval de uma
instituição, dentre outras.

VER – QUADRO 1 Tipologia dos atos ilocucionários (p. 392)


POSTULADOS CONVERSACIONAIS DE GRICE
Postulados básicos
"a linguagem é uma manifestação social
configurada em função da necessidade
comunicativa dos falantes" (p. 402);

"as nossas trocas conversacionais são, até certo


ponto, esforços de cooperação e cada
participante reconhece nelas um propósito
comum ou um conjunto de propósitos ou pelo
menos uma direção mutuamente aceita" (p.402)
Princípio da Cooperação
Envolve um conjunto de princípios que regulam o
comportamento linguístico , descritos como
Máximas Conversacionais. Dão expressão ao
nosso conhecimento empírico de que como
falantes "somos cúmplices uns dos outros na
realização de nossos objetivos ilocucionários" (p.
403).
A eficácia da comunicação depende e resulta do
uso que fazemos das máximas conversacionais e a
sua violação (ex. mentira, sarcasmo, ironia) pode
resultar em mal-entendidos.
Exemplo: Um lavrador encontra outro.

Antonio: Olá, Chico, a minha mula está com a


mesma doença que a tua teve. O que lhe deste?
Chico: Terebentina.
Uma semana mais tarde voltaram a se encontrar
e o Antonio gritou: Chico, dei terebentina à
minha mula, como me tinha dito, e ela morreu.
Chico: Aconteceu o mesmo à minha.

Comentário= A pergunta de Antonio “o que é que lhe


deste?" não era apenas um pedido de informação, mas
também um pedido de conselho. Chico trata a pergunta
como um mero pedido de informação = sentido literal.
Violação à máxima da relevância. A resposta de Chico
não foi relevante para o propósito comunicativo da
pergunta de Antonio.
Viola também a máxima da quantidade porque disse
menos do que deveria dizer, omitiu dados
importantes: que o remédio foi ineficaz, já que sua
mula morreu.
Se a intenção de Chico foi a de causar a morte da
mula do outro lavrador, ao violar as máximas
conversacionais, conseguiu o efeito perlocucionário,
por exemplo, de causar transtorno ao outro.

Exemplo da carta do professor (violação da máxima


da relevância)
PRESSUPOSIÇÃO
Todo enunciado pressupõe a verdade de certas
proposições que não constituem, entretanto, o
que é afirmado explicitamente no enunciado.

(34) (a) João vai se divorciar.


(b) João não vai se divorciar
(35) João é casado.

A relação entre (34) e (35) é a relação de sentido


que se estabelece entre o posto (o que se diz) e o
pressuposto (o que está implícito ).
Ponto de vista Semântico - o pressuposto persiste
mesmo quando o posto é negado ou interrogado. ( João
vai se divorciar? Pp. João é casado)

PROBLEMAS no tratamento semântico da


pressuposição:
O contexto em que uma frase é enunciada pode
influenciar os juízos dos falantes quanto à presença
ou não de tal pressuposição; a pressuposição pode
não ser verdadeira (ou não se confirmar) em um
dado contexto;
Ex.: Maria adoeceu antes de terminar a tese.
pp. Maria não terminou a tese. (porque adoeceu)
pp. Maria terminou a tese. (apesar de ter adoecido)
PRESSUPOSIÇÃO PRAGMÁTICA

O tratamento da pressuposição é dependente da


situação de enunciação.

(36) Apresenta-me tua esposa.


pp. X é casado.

(37) (a) O joão pediu a ao Manuel que lhe


apresentasse a sua esposa.
(b) O Manuel é casado.
Segundo Fillmore (1971, apud p. 406),
as pressuposições devem ser vistas
como condições que, em uma dada
situação comunicativa, devem ser
satisfeitas para que um dado
enunciado possa ser realizado de forma
eficaz, o que, segundo a Teoria dos Atos
de Tala, corresponderia a condições de
felicidade que todo enunciado deve
satisfazer.
O ato de fala diretivo " Fecha a janela" deve
ter como pressuposto que “A janela está
aberta" no momento da enunciação. Se já
estiver fechada, não estará satisfazendo a
condição preparatória.

LOGO - a pressuposição pragmática de um


enunciado diz respeito ao conjunto de
condições que devem ser satisfeitas para
que o ato ilocucionário seja apropriado às
circunstâncias de sua realização (p. 406).
INFORMAÇÃO PARTILHADA

(38) (a) O João esqueceu-se de trazer o livro.


(b) O João deveria ter trazido o
livro/Esperava-se que o João trouxesse o livro.

(39)(a)Foi o PS que ganhou as eleições em


1975, não foi?
(b) Houve eleições em 1975.
IMPLICATURA CONVERSACIONAL

Além dos casos de correspondência ou não entre o


que o falante quer dizer e o que o seu enunciado
realmente diz, há casos em que o falante apenas
INSINUA o que quer dizer, deixando apenas sugerido
o seu objetivo ilocucionário.

Tipos de implicaturas:
Convencionais:
Ele é inglês; logo é corajoso.
Implicatura: Todo inglês é corajoso
Implicatura decorrente do significado convencional
das palavras.
Implicaturas conversacionais ( = não-convencionais):
Antonio: Você viu João?
Pedro: O casaco dele está na cadeira.
Implicaturas que tem seu valor determinado em
função do contexto conversacional em que
ocorrem.
Aparentemente Pedro viola a máxima da
relação, mas sua fala será interpretada em
termos do que o Antônio supõe ter sido uma
resposta a sua pergunta, sendo reinterpretada a
resposta com base no princípio de que Pedro
está tentando ser cooperativo.
As implicaturas conversacionais estão
fundamentalmente ligadas ao princípio da cooperação
e às máximas conversacionais.

(41) A: Quer ir logo à noite ao cinema?


B: Maria vai lá em casa me mostrar as fotografias das
férias.

B não viola o princípio da cooperação, pois sua


resposta é feita por meio da explicitação das razões
que o impedem de ir ao cinema (implicitamente, B dá
uma resposta negativa ao convite de A). Então, B não
viola o princípio da cooperação.
Implicaturas conversacionais generalizadas

(43) (a) Ontem à noite vi João com UMA mulher.


(b) Ontem à noite vi João com A mulher.

Uso da artigo definido ou indefinido – sentido


geral de esposa x não-esposa.

(b) a mulher- é interpretada como "esposa",


se João for casado.
PRINCÍPIO DE DELICADEZA ( Polidez)

Um dos princípios que regula o comportamento social, mas que


tem reflexos no comportamento verbal.

A Teoria da Polidez de Brown e Levinson (1987) é construída


tendo como parâmetros duas teorias: (1) A Teoria dos Atos de
Fala e (2) as Máximas Conversacionais de Grice.

(1) Considerando-se a força ilocucionária dos enunciados, por


exemplo, os falantes podem se utilizar de estratégias linguísticas
que atenuam/minimizam ou aumentam/maximizam a força
com que um enunciado é empregado.

Ex. Feche a porta X Você poderia fechar a porta?

Ato diretivo.- 2º ato atenuado. Transforma uma ordem em um


pedido.
Este conhecimento faz parte da competência
comunicativa do falante. Como por exemplo,
fazer escolhas linguísticas, em função da
relação de poder existente entre ele e o seu
interlocutor, grau de intimidade, etc.

Professor x aluno - dissimulação =


maximização reprimenda.

(48) O senhor importa-se, por favor, de não


copiar a prova do seu colega (colar).
(2) Segundo Brown e Levinson, muitas das
violações às máximas conversacionais de Grice
podem ser explicadas se os falantes se
orientam para o Princípio da Polidez.

Ex. eufemismos
Tio Felipe deixou-nos ontem.
Tio Felipe morreu ontem..

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