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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO CEARÁ

CAMPUS IGUATU
CURSO DE LICENCIATURA QUÍMICA

DANIEL DE SOUZA DA SILVA

A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NO ENSINO MÉDIO: UM


ESTUDO DE CASO DO LICEU DE IGUATU/CE A PARTIR DA DISCIPLINA DE QUÍMICA

IGUATU
2016
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO CEARÁ
CAMPUS IGUATU
CURSO DE LICENCIATURA QUÍMICA

Monografia apresentada ao Curso de Licenciatura em Química do


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará - Campus
Iguatu, como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciado
em Química.

Orientadora: Profª. Ms. Célia Maria Freitas Guedes de Amorim.


PROBLEMÁTICA

Química é uma ciência de natureza prática, requerendo uma formação inicial de professores que
contemple em sua matriz curricular práticas inclusivas, o que é difícil em se tratando de licenciatura em
Química no Brasil.
Como tem sido a inclusão das pessoas com deficiência visual no ensino médio a partir da disciplina
de Química.
Para isso, utilizou-se a seguinte pergunta norteadora: “Se a inclusão das pessoas com deficiência
visual é uma realidade cada vez mais latente nas escolas, e a formação do professor de Química não é pensada
para incluir esses alunos, como tem sido a inclusão desses no ensino médio?”
OBJETIVO GERAL

Compreender como se dá a inclusão escolar dos alunos com deficiência visual na disciplina de
química no ensino médio.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Conhecer como o Liceu de Iguatu tem trabalhado para a inclusão educacional dos alunos
com deficiência visual no ensino médio;
• Identificar as dificuldades que esses alunos possuem na disciplina de química;
• Mencionar como a professora de química desses alunos vem trabalhando para que o
processo de ensino-aprendizagem na referida disciplina destes seja positivo.
JUSTIFICATIVA

Tema pertinente as discussões sobre a formação inicial do professor de Química, e por


trazer apontamentos e reflexões que se fazem necessários serem debatidos nas universidades, tendo
em vista que a articulação dessas instituições com as escolas de educação básica se fazem cada vez
mais necessárias para que a inclusão escolar das pessoas com deficiência se torne uma realidade no
Brasil.
Entretanto, a inclusão dos alunos com deficiência visual na educação química é
considerado difícil pela maioria dos professores de química, especialmente porque a química é uma
ciência de natureza prática, requerendo uma formação inicial de professores que contemple em
sua matriz curricular práticas inclusivas.
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL
 Historicamente a educação para alunos com deficiência foi marcada por três etapas: exclusão, segregação e inclusão.
 A educação especial e inclusiva trilhou longos e árduos caminhos no cenário brasileiro, só recente que as conquistas
começaram a atender as expectativas.
 As primeiras instituições públicas voltadas exclusivamente para a escolarização das pessoas com deficiência no país:
Criação Imperial Instituto dos Meninos cegos em 1854, hoje Instituto Benjamin Constant(IBC)
Criação do Instituto Surdo-mudo em 1856 atual Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES)
 CENESP (Centro Nacional de Educação Especial.1973) Finalidade de Investir na formação humana , com principal
finalidade de escolarizar as pessoas com deficiência para que essas pessoas pudessem trabalhar. (KASSAR,2011)
 Constituição Federal de1988 colocou a educação escolar como um direito social pertencente a todos os cidadãos e
cidadãs. A referida CF 1988, já estabelecia que os educandos com deficiência possuíssem o direito do Atendimento
Educacional Especializado (AEE) a ser ofertado na própria rede regular de ensino, todas as pessoas com ou sem
deficiências devem possuir as mesmas oportunidades de acesso e permanência nos espaços escolares.
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL

 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em 1961 e 1971, de forma tímida e superficial.
 LDB de 1996, a educação especial passou a ter mais visibilidade na sociedade brasileira no que tange ao sistema
educacional.

 Para Mantoan (2005), considera que a inserção dos alunos com deficiência nos espaços escolares surge para burlar
um sistema historicamente hegemônico, implicando, assim, em profundas mudanças para todos que deles fazem
parte.
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL
A INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO:
ALGUMAS ABORDAGENS ESTATÍSTICAS
A inclusão educacional de alunos com deficiência deve ser pautada na aproximação entre O
ensino/educação especial e regular, pois “não há porque haver dois tipos de sistemas de ensino paralelos”
(MONTILHA et al., 2009, p. 334), já que as próprias legislações oficiais propõem que A educação especial
deva acontecer dentro da própria escola comum, abrangendo, assim, A todos para uma real democratização
E expansão do ensino.
Nesse contexto, é perceptível o aumento no número de alunos com deficiência matriculados
nas escolas comuns a partir desse investimento do governo federal, entretanto, cabe ressaltar que esses
número ainda deixam a desejar quando comparado ao número total de pessoas com deficiência no país,
especialmente em determinadas regiões brasileiras.
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL
A INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO:
ALGUMAS ABORDAGENS ESTATÍSTICAS
Gráfico 1 – Quantidade de alunos com deficiência matriculados no Brasil em 2010 e 2015
250000
O gráfico 1 aponta a quantidade de alunos com deficiência matriculados
Quantidade de alunos matriculados

200000 por etapa/nível/modalidade da Educação Básica em todo o Brasil nos

150000
anos 2010 e 2015. Como observado, houve um aumento de quase 100%
no número de matrículas em 2015 no ensino fundamental II, porém, nas
100000
outras etapas/níveis da Educação Básica esse número, apesar de ter
50000
crescido, apresenta-se muito pequeno, o que, muitas vezes, é ocasionado
0 pela evasão escolar e pela reprovação, o que leva os alunos com
Funda Funda
Pré EJA
Creche mental mental Médio EJA I
Escola Médio deficiência a entrarem no processo de distorção série-idade (SILVA,
I II
Series1 2010 286 1,610 12,573 121,19 31,238 41,722 3,386
Series2 2015 512 1,793 20,059 213,71 59,241 53,399 6,528 2015).
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL
A INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO:
ALGUMAS ABORDAGENS ESTATÍSTICAS
Gráfico 2 – Quantidade de alunos com deficiência matriculados no Ceará em 2010 e 2015
250000
No cenário estadual, o Ceará também está caminhando para a inclusão escolar das
pessoas com deficiência, entretanto, essa caminhada está, assim como a nível
Quantidade de alunos matriculados

200000

nacional, a curtos passos, como observado no gráfico 2. Assim, como a nível


150000 nacional, o Ceará apresentou um aumento de quase 100% no número de
matrículas de alunos com deficiência no Ensino Fundamental II. Quando
100000
comparado os níveis iniciais, intermediários e finais da Educação Básica, é
possível supor que muitos desses alunos com deficiência encontraram dificuldades
50000
de acesso nas séries iniciais da educação escolar e, também, dificuldades de
0 permanência nas séries finais da Educação Básica, resultando em um alto índice
Pré Fundam Fundam EJA
Creche Médio EJA I
Escola ental I ental II Médio
de reprovação e até mesmo de evasão/abandono escolar, como apontam Montilha
Series1 2010 286 1,610 12,573 121,19 31,238 41,722 3,386
Series2 2015 512 1,793 20,059 213,71 59,241 53,399 6,528 et al., (2009).
OS (DES)CAMINHOS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL:
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO E IMPACTOS NO
SISTEMA EDUCACIONAL
A INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO:
ALGUMAS ABORDAGENS ESTATÍSTICAS
Gráfico 3 – Quantidade de alunos com deficiência matriculados no município de Iguatu/CE em 2010 e 2015
Já no cenário local, o município de Iguatu/CE, local da nossa
2500
pesquisa, apresenta um número muito pequeno no número de alunos com
Quantidade de alunos matriculados

2000
deficiência quando comparado aos níveis nacional e estadual. Como observado no
1500 gráfico 3, o maior aumento se deu no Ensino Fundamental 2, onde houve um
crescimento de pouco mais de 300%. Ainda, não diferente dos níveis nacional e
1000
estadual, percebe-se um grande contraste entre as séries iniciais, intermediárias e
500 finais da Educação Básica, remetendo, novamente, aos pensamentos que denotam

0
dificuldades das famílias ao buscarem matrícula para os seus filhos nas escolas
Funda Funda
Pré EJA
Ano Creche mental mental Médio EJA I comuns, bem como a permanência dos mesmos até a conclusão da Educação
Escola Médio
I II
Series1 2010 1 9 41 26 3 61 2 Básica.
Series2 2015 2 11 168 133 39 11 3
E QUANDO FALTA A VISÃO? ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A
DEFICIÊNCIA VISUAL

O canal visual é um sentido capaz de conectar, ligar e integrar os demais sentidos do copo
humano, permitindo “associar som e imagem, imitar um gesto ou comportamento e exercer uma
atividade exploratória circunscrita a um espaço delimitado” (SÁ; CAMPOS; SILVA, 2007, P. 15).
Com o auxílio das tecnologias assistivas, as pessoas com deficiência visual podem ter uma
vida igual a das pessoas que não possuem a deficiência.
As tecnologias assistivas podem ser compreendidas como recursos que visam dar
autonomia e amenizar as dificuldades de pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida
(SILVA; SILVA, 2013).
E QUANDO FALTA A VISÃO? ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A
DEFICIÊNCIA VISUAL
O SISTEMA BRAILLE E OUTRAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
VISUAL

Dentre as TAS mais utilizadas pelas pessoas com deficiência visual está o sistema
braile de leitura e escrita, especialmente entre as pessoas com cegueira. O ministério da educação
lançou a grafia química braile que normatiza a utilização do sistema braile na disciplina de química.
Figura 1 –
Cela básica do sistema Braille
E QUANDO FALTA A VISÃO? ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A
DEFICIÊNCIA VISUAL
O SISTEMA BRAILLE E OUTRAS TECNOLOGIAS ASSISTIVAS PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
VISUAL

Figura 2 – Alfabeto em Braile e Numerais em Braile

Fonte: Disponível em: < http://goo.gl/aFmP8I>. Acesso em 10 set. 2016.


A EDUCAÇÃO QUÍMICA NO CONTEXTO DA DEFICIÊNCIA VISUAL:
DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA OS ALUNOS E PROFESSORES
Assim, segundo Vitaliano (2008 apud BENITE; BENITE; VILERA-RIBEIRO, 2015), existem
fatores que são determinantes no processo inclusivo das pessoas com deficiência nos espaços escolares.
Dentre eles, pode ser citada:

• Insegurança que os professores de Química possuem em abordar os alunos com deficiência visual na
sala de aula;

• Dificuldade na identificação da melhor forma em abordar os conteúdos químicos para os alunos com
deficiência;

• Identificação da necessidade educativa especial que o estudante com deficiência requer;

• Identificação dos pontos (habilidades) positivos e negativos dos alunos com deficiência visual, onde o
professor pode potencializar os pontos positivos e procurar desenvolver os pontos negativos desses
alunos e,

• Como incluir os alunos com a deficiência nas diversas situações que acontecem na sala de aula.
METODOLOGIA

• Estudos qualitativos

• O objeto de estudo : Educação especial na educação química.

Assim, adotou-se o estudo de caso enquanto método investigativo em decorrência de o


mesmo possibilitar ao pesquisador conhecer o objeto de estudo de forma mais ampla e com maior
profundidade e refletir sobre o processo de inclusão escolar das pessoas com deficiência.
METODOLOGIA

• Local e sujeito da pesquisa


Escola de ensino médio liceu de Iguatu dr. José Gondim, localizada no município de Iguatu/CE.

• Instrumentos de coleta e análise dados


Aplicação de um questionário estruturado aos sujeitos da pesquisa.
( 01 aluna baixa visão, a coordenadora escolar e uma professora de química)
RESULTADOS E DISCUSSÕES
O LICEU DE IGUATU E A INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
NO ENSINO MÉDIO

O Liceu de Iguatu Dr. José Gondim teve a sua fundação no ano 2000, porém só começou
a funcionar no ano de 2001, a partir do decreto Lei nº. 26. 306, de 30 de julho do mesmo ano.
A escola possui 969 alunos regularmente matriculados, dentre estes, 17 alunos com
deficiência (física, intelectual, visual, múltiplas, surdez e síndrome de down).O corpo docente é
composto por 48 professores (sendo 34 efetivos e 14 temporários), além de 3 intérpretes de libras
(um com formação em nível superior, e dois com formação em nível médio), 1 professora da sala
de recursos multifuncionais - SRM para a realização do atendimento educacional especializado e 1
professor do sistema braile. Dos 5 profissionais que trabalham diretamente na SRM, três atuam
com a deficiência visual.
Com exceção dos professores que atuam na SRM/AEE, nenhum professor na escola possui
formação inicial ou continuada para atuar na educação especial ou inclusiva.
Nesse contexto de inclusão escolar, sabe-se que a quantidade de alunos nas salas de aula
que possuem alunos com deficiência pode influenciar de forma positiva ou negativa o processo de
ensino-aprendizagem.
A coordenação do Liceu de Iguatu aponta que a lotação segue as normas oriundas da
Secretaria de Educação do Estado (SEDUC), que, por sua vez, todos os anos lança uma nova
portaria que irá nortear a lotação tanto do corpo docente como discente da escola. Como exemplo, a
coordenadora aponta que “no ano passado [2015] eram apenas 25 alunos por sala, incluindo os
alunos com deficiência, porém, esse ano a portaria estabeleceu que as salas de aula que possuem
alunos com deficiência poderiam ter 35 alunos matriculados, e isso eu vejo como uma perca tanto
para os professores como para os próprios alunos”.
A escola possui dois laboratórios educacionais de informática, entretanto, os adaptados
localizam-se na SRM, no entanto, essa realidade não condiz com os pressupostos de uma educação
especial na perspectiva da educação inclusiva, especialmente porque “a inclusão implica em uma
mudança de paradigma educacional, que gera uma reorganização das práticas escolares:
planejamentos, formação de turmas, currículo, avaliação, gestão do processo educativo” (Mantoan,
2005, p. 30).
O laboratório de química, segundo a coordenadora não é adaptado para alunos com
deficiência visual “porque na época em que a escola foi construída a inclusão desses alunos não era
uma realidade em Iguatu, especialmente no ensino médio, porém, os alunos com deficiência visual
fazem o processo de reconhecimento do laboratório com o auxílio de um professor de química,
conhecendo as vidrarias e os equipamentos desse espaço”.
Gonçalvez et al (2013) aponta que a adaptação de práticas laboratoriais a partir de materiais de
baixo custo podem reverter esse cenário excludente na educação química, possibilitando a inclusão dos
alunos com deficiência visual na maioria das atividades desenvolvidas nesse espaço educacional.
Compreendendo que o processo de inclusão escolar das pessoas com deficiência deu-se
apenas recentemente a partir da obrigatoriedade da LDB/96, o Liceu de Iguatu é uma instituição
que está, na medida do possível, incluindo cada vez mais esse grupo de aluno, englobando boa parte
dos diferentes tipos de deficiência existentes, o que se torna um processo positivo para todos os que
compõem a escola.
Apesar de alguns distanciamentos existentes na referida escola, as aproximações
referentes ao processo de inclusão são mais latentes e visíveis, tornando o Liceu uma escola cada
vez mais inclusiva no sentido da educação especial.
A ALUNA COM DEFICIÊNCIA VISUAL E O SEU PROCESSO DE ENSINO-
APRENDIZAGEM NA DISCIPLINA DE QUÍMICA

A aluna com deficiência visual participante da presente pesquisa possui baixa visão
adquirida na infância, enxergando pouco, porém, necessitando do sistema braile como forma de
leitura e escrita. A mesma possui 26 anos de idade e encontra-se matriculada no terceiro ano do
ensino médio. Segundo a fundação das nações unidas para a infância (UNICEF), a faixa etária
indicada para a inserção dos alunos no ensino médio é entre 15 a 17 anos (UNICEF, 2014).
Nessa faixa etária, acrescenta-se mais 3 anos referentes as 3 séries do referido nível de ensino.
O fator distorção série-idade é fortemente presente no processo educacional das
pessoas com deficiência.
Uma situação mais agravante, a referida aluna relata que “só fui alfabetizada aos 16
anos de idade quando eu estudava o Fundamental I no Carlos de Gouveia”, vindo a concluir o
fundamental II somente aos 22 anos. Posteriormente, em 2013, a aluna buscou matricular-se no
Liceu de Iguatu para cursar o ensino médio a partir das conversas com outras pessoas que
conheciam a escola, “e isso me motivou a estudar aqui, porque aqui já tinha pessoas que também
tinha deficiência”.
Em termos de estrutura física do liceu, a aluna aponta que, apesar de adaptações
existentes na mesma, sente-se insegura com “medo de cair e se machucar”, porém, de todas as
escolas que ela já estudou, a aluna afirma que “aqui é a mais segura de todas”.
Assim, em se tratando de inclusão escolar, o estado percebe ser mais viável ofertar o
direito à matrícula, mas não garantir a permanência dos alunos com deficiência em seus espaços.
Sobre os seus estudos na disciplina de química, a aluna relatou que só frequentou o
laboratório de química uma vez no primeiro ano, porém, “a professores focou mesmo foi na
adaptação de materiais para mim”.
A parceria da escola com os bolsistas do programa institucional de bolsa de iniciação à
docência (PIBID) - subprojeto de química do instituto federal de educação, ciência e tecnologia
do Ceará Campus Iguatu - “é algo muito proveitoso na escola, pois facilita o meu entendimento
nas coisas de química”.
Logo, percebe-se que essa parceria, no contexto do Liceu de Iguatu, está contribuindo de
forma positiva para a aprendizagem dos alunos com deficiência, o que, por sua vez, é benéfico para
a própria formação dos professores de química, tendo em vista que os licenciandos estão tendo a
oportunidade de vivenciar práticas educativas de inclusão escolar.
A aluna aponta ter muitas dificuldades em sua aprendizagem, especialmente “porque têm muitas
fórmulas e teorias, e, apesar de a professora explicar passo a passo as estruturas, o que ajuda bastante, eu
tenho muita dificuldade.” A aluna complementa a sua fala ao refletir que “o fato de eu estar na escola já é um
avanço, mas precisa avançar muito mais. Tipo, o professor precisa ter conhecimento sobre o braile para poder
adaptar nossos materiais”.

As queixas apresentadas pela aluna denotam que as suas dificuldades são potencializadas ainda
mais pelo fato de a sua professora de química não ter o mínimo conhecimento sobre o sistema de leitura
e escrita em braile, todavia, mesmo a professora não tendo essa formação para o braile, a mesma pode e deve
buscar apoio na SRM para que os materiais sejam adaptados a partir de uma parceria entre professor e SRM,
especialmente porque a maior parte dos professores não compreende que o AEE ofertado na SEM tem caráter
complementar o ensino comum, e não substitutivo.
Em termos de relação professora-aluna, a aluna apontou não haver nenhuma
dificuldade, tendo uma boa relação com a sua professora de química, tendo, inclusive, apoio da
professora em atendimentos individuais no contra turno escolar, como relatado pela aluna: “como
eu venho para o AEE no contra turno, sobra tempo e a professora de química vem me ajudar,
porque na sala tem muita gente e, às vezes, eu não consigo aprender bem, daí ela me dá essa
ajuda fora de sala.”
Em termo de ensino-aprendizagem, a utilização das TAS podem melhorar e
potencializar esse processo de forma positiva, no entanto, a aluna salienta que as TAS existentes
na escola são insatisfatórios para ela, especialmente no que diz respeito a adaptação de materiais
escolar.
Como exemplo, a aluna cita que “não tenho acesso aos livros em braile. No primeiro
ano eu não tinha livro em braile. No segundo e no terceiro eu já tive, mas eram capítulos soltos,
não tinha o livro de química completo em braile.”
Nesse contexto, percebe-se que a inclusão escolar da referida aluna na disciplina de
química não foi, não é, nem está sendo um processo fácil, no qual nem todos os que dele fazem
parte estão procurando assegurar a permanência dessa aluna na escola, pois, como a mesma
apontou, “estar na escola já é uma conquista”.
Desse modo, a inclusão escolar dessa aluna enquanto pessoa com deficiência visual não
acontece conforme a legislação, remetendo as reflexões de Saviani (2009) ao apontar que as
legislações brasileiras são apenas um aglomerado de teorias que ocupam espaço, seja na internet,
seja nos espaços governamentais, as quais a sua aplicabilidade é extremamente falha e ineficaz,
necessitando do estado uma atuação mais séria no que diz respeito à educação especial.
A PROFESSORA DE QUÍMICA NO CONTEXTO DA ALUNA COM
DEFICIÊNCIA VISUAL: DESAFIOS, REALIDADE, E PERSPECTIVAS

A mesma possui graduação em licenciatura em química, porém não possui nenhum curso na área da educação
especial e/ou inclusiva.

O seu contato com alunos que possuíam algum tipo de deficiência se deu no ano letivo de 2015 no próprio Liceu
de Iguatu, “onde eu tinha alunos com baixa visão, cegos, e, também, alunos surdos, tudo na mesma sala de aula”.

De início, a referida professora aponta que foi um choque de realidade, pois até então vinha trabalhando apenas
com alunos sem deficiência, o que não demandava tanto de mim como agora.

A partir de então, a professora conta que foi se adentrando no processo de inclusão, “buscando acompanhar de
perto a aprendizagem dos meus alunos, e visitando a sala de recursos multifuncionais, pois às vezes o pessoal de lá me
ajuda ao trabalhar com os alunos com deficiência”.

A professora comenta que a adaptação de materiais para a sua aluna com deficiência visual não é fácil, porém,
busca, na medida do possível, “adaptar alguns materiais junto com ela, e, depois de produzidos, os materiais ficam na sala
de recursos multifuncionais para ajudar ela e outros alunos que precisarem.”
Apesar de não ter formação na área da educação especial e/ou inclusiva, a professora em questão
aponta que “o Liceu possibilita formações a partir dos profissionais da sala de recursos multifuncionais, porém,
nem todos os professores buscam essa formação. Também há um interesse pessoal de cada um, e, na realidade,
a aprendizagem acontece mais na sala de aula a partir da nossa interação com o interprete de libras, que a
gente vê os sinais e vai aprendendo, porque o braile é mais difícil.” A professora aponta ainda que a inclusão vai
acontecendo mesmo é no dia a dia, na relação aluno-professor.
Assim, Retondo e Silva (2008) consideram que formar professores, independente da área de atuação,
para incluir os alunos com deficiência é algo que se faz necessário e com urgência no Brasil, pois é a partir da
formação do professor que a aprendizagem desse grupo de alunos começará, de fato, a acontecer.
Por fim, a professora apontou que sente grandes dificuldades em trabalhar com alunos com deficiência
visual, o que não acontece com os alunos que são surdos, pois eles têm um interprete, e o deficiente visual não
tem ninguém para auxiliá-lo, porém, tal pensamento não deve ser utilizado como justificativa para o
impedimento da aprendizagem desses alunos (SILVA; SILVA, 2013; SILVA; DAMASCENO, 2015)
especialmente porque a sua deficiência limita-se apenas no campo da visão e, por mais que o cognitivo seja
influenciado pela perca da visão, cabe ao professor buscar meios que facilitem o ensino e a aprendizagem da
química a partir do aguçamento dos outros sentidos do aluno, especialmente o tato a partir da adaptação de
materiais. Assim, o capítulo a seguir trará as considerações finais da presente pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como discutido ao longo da presente pesquisa, há um caminho muito longo entre o acesso e a
permanência dos alunos com deficiência nas instituições de ensino brasileiras. Em se tratando das pessoas com
deficiência visual, diversos fatores internos e externos tornam-se barreiras de impedimento para que estes alunos
possam concluir os seus estudos como qualquer outra pessoa que não possui deficiência.
O Liceu de Iguatu é tido como escola referência na inclusão de alunos com deficiência no ensino
médio, entretanto, na disciplina de química a inclusão desses alunos ainda deixa a desejar, especialmente por
ausência de materiais adaptados e tecnologias assistivas acabam contribuindo para que esses alunos possuam
ainda mais dificuldades, a ressalva é por conta da professora de química busca, juntamente com a SRM,
amenizar essas dificuldades.
A referida escola, apesar de ter adaptações para alunos com deficiência visual, não possui um
laboratório de química acessível, entretanto, a partir da implantação da SRM na escola, a inclusão dos alunos
com deficiência tornou-se algo mais concreto e possível.
Em se tratando do processo ensino-aprendizagem na disciplina de química, a aluna com deficiência
visual apontou que as dificuldades são inúmeras e que apesar da atenção dada pela sua professora, os
conteúdos da disciplina não são fáceis e, quando aliados à ausência de materiais adaptados, a aprendizagem
torna-se algo quase impossível.

Assim, pode-se concluir que o Liceu de Iguatu, apesar dos (des)caminhos já trilhados, está se
empenhando para tornar-se uma escola inclusiva, porém, em se tratando do ensino de química, muito ainda há
de ser feito para que, de fato, os alunos com deficiência visual possam ter uma boa educação.
OBRIGADO!

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